A impenhorabilidade do bem de família do fiador

Resumo: Esta monografia tem como objetivo esclarecer as controvérsias apresentadas entre os dois dispositivos em análise, distinguindo o bem de família voluntário e involuntário e as suas limitações. Expondo os fatos do nascedouro jurídico, através da criação da Lei nº 8.009/90, demonstrando, assim, que o ordenamento jurídico busca o bem estar social, implantando novos dispositivos, mantendo um equilíbrio nas relações jurídicas e buscando os direitos inerentes à pessoa humana. Esta monografia faz uma comparação entre uma pessoa passar a perder a moradia e se resguardar por dívida relativa ao bem garantido. Aponta-se também que existe a instituição voluntária em que o instituidor vai ao cartório e lavra a escritura e a involuntária que não necessita fazer o mesmo.[1]

Palavras-chave: Bem Voluntário. Bem Involuntário. Fiança Locatícia.

Abstract: This monography has a purpose to make clear the controversies shown between the two devices in analysis distinguishing the voluntary and involuntary happiness of the family and their limitations. Exposing the facts from the juridic birth, through the law creation 8.009/90, showing this way that the juridie ordain seems for the social wel-fare state inserting now devices, keeping a balance in the juridic relations and searching for the rights inherent to the human person. Being this monography making a comparison between a person who loses his annual rent for a lodging and to be on one´s guard for the relative debt of the warranty object of esteem. Thinking of a family who is taking financial troubles and does not fulfill with the duties life, pays for this with his own residence. Also one points out oneself that exists a volunteer institution in which the establisher goes to the scripture and the involuntary who does not need to do the same.

Keywords: A Voluntary Happiness. An Involuntary Happiness. Notary Security. 

Sumário: 1.  Introdução. 2.  Da impenhorabilidade do bem de família. 2.1  Origem. 2.2  Histórico. 2.3  Conceito de Bem de Família. 3.  Tipos de bem de família. 3.1  Bem de Família Voluntário. 3.2  Bem de Família Legal – Lei nº 8.009/90. 3.3  A Fiança Como Garantia do Contrato De Locação. 3.4  Distinção entre Bem de Família Voluntário e Bem de Família Legal. 3.4.1  Classificação. 3.5  Da Legitimidade Para Instituição do Bem de Família. 3.6  O Posicionamento de Doutrinadores. 3.7  Extensão do bem voluntário e involuntário. 3.8  Exceções a impenhorabilidade. 3.9  Benefícios da ausência da inalienabilidade. 4.  O art. 82 da lei nº 8.245/91 e os efeitos na fiança. 4.1  A Emenda Constitucional nº 26. 4.2  Da solvabilidade do devedor. 4.3  A Recente Decisão do Supremo Tribunal Federal. 4.4  Posicionamento do Código De Defesa do Consumidor. 4.5  O projeto de Lei nº 6.413/2009 e a impenhorabilidade do imóvel. 5.  Conclusões. Referências.

1.  INTRODUÇÃO

O suscitado tema "bem de família", abordado pelos manuais, trata algumas questões discutidas, por conta da regulamentação na Lei e por sua pouca utilização. O intuito deste estudo é levar à tona, apresentando ao conhecimento do Leitor o propósito do instituto, esclarecer todas as dúvidas surgidas ao longo dos anos, comparando a Lei do bem de família com os artigos do Código Civil, instigando o debate.

A importância da família para o equilíbrio do ser humano é incalculável, pois é no ambiente familiar que o indivíduo aprende os conceitos de amor, ética, caráter, respeito ao próximo, solidariedade, dentre outros, que no decorrer do trabalho vamos elucidar mais sucintamente. É esse aprendizado que torna possível uma sociedade mais digna e mais respeitada perante os homens, e é por isso que se diz que a família é a base da sociedade.

Vejamos que se eventualmente, uma pessoa constitua um família e que consiga de uma forma ou de outra adquirir uma residência, e ali no seio familiar, der todo o amor a seus filhos, pois, é ali que se constitui uma personalidade do ser humano, e por motivo maior o pai ou a mãe falecem e deixam os filhos a mercê, como ficariam essas crianças? Ou, se por uma falha dos genitores o imóvel que residem se aglomerem altas dívidas oriundas de impostos não quitados ou dadas como garantia, estaria a família a perder sua única residência?

Quem sustenta o Estado é a sociedade e este tem o dever de conferir proteção especial à família, dever esse que está na própria Constituição Federal de 1988, art. 226, caput. Na esfera dessa proteção especial é que são editados e criados novos horizontes no que diz respeito às regras de proteção à família, entre elas as do bem de família.

O instituto do bem de família, desde o seu surgimento, no Estado do Texas, teve como advento a Lei do Homestead (casa-lugar), em 1839, objetivando povoar o imenso território americano e proteger a família com a isenção de penhora sobre a casa onde mora. Espalhou pelos Estados Unidos, que passou a adotar o Homestead Federal, apresentando-se sob duas formas: o formal e o legal.

O instituto foi seguido no Brasil pelo Código Civil de 1916, sob o modo voluntário, porém, com a instauração deste dispositivo, a população, de uma maneira geral, não recepcionou bem estes artigos do aludido Código. No entanto, posteriormente com a publicação da Lei nº 8.009/90, a concordância das pessoas que eventualmente utilizavam foi boa, tanto que, o instituto difundiu-se amplamente e, consequentemente, o bem de família, a partir desse acontecimento, passou também na forma legal ou involuntária.

Com o nascimento da Lei nº 8.009/90, o mercado de locações caiu logo após o surgimento do artigo 82 da Lei nº 8.245/91, onde este alterou o artigo 3º da Lei nº 8.009/90, sobrepondo mais uma exceção à regra geral da impenhorabilidade, tornando, assim, penhorável o bem de família do fiador locatício, até então impenhorável, por esse motivo, as pessoas ficaram com medo de ser fiador, e as imobiliárias, na grande maioria das vezes, só firmam acordo com fiança garantida.

Com a publicação da Emenda Constitucional nº 26/2000 ficou a controvérsia, pois foi introduzido o direito à moradia no arrolamento dos direitos sociais previstos no artigo 6º da Constituição Federal. Com isso, duas correntes de pensamento surgiram: a primeira, que intercede a penhora do bem de família do fiador da locação e admite a recepção da Lei nº  8.009/90 pela Emenda Constitucional e a segunda, que sustenta a tese da impenhorabilidade do bem de família do fiador locatício, em razão da não recepção da exceção do inciso VII do artigo 3º da Lei nº 8.009/90. Esta, porém, incluiu à moradia um direito social.

Resultando numa polêmica, o STF[2] entendeu, por maioria, não haver incompatibilidade entre a Lei e a referida Emenda, concluindo, então, pela penhorabilidade do bem de família do fiador da locação, pois, com a emenda a moradia ficou sendo um direito de todos, porém não explana de que forma. Por outro lado, a Lei nº 8.009/90, artigo 3º, VII, reza que é penhorável o bem de família no caso de garantia de fiança locatícia. Entretanto, entende-se que o fiador garante o pagamento caso o devedor não pague, e que este tem a livre escolha de assinar ou não.

2.  DA IMPENHORABILIDADE DO BEM DE FAMÍLIA

2.1.  ORIGEM

O Brasil recepcionou a Lei do Texas nos Estados Unidos, conhecida como homestead em 1839. Naquela época, aquele estado passava por uma grave crise e resolveu promulgar tal Lei para que pessoas não se preocupassem por eventuais penhoras devido a dívidas. Com isso, passou, então, a impenhorabilidade da pequena propriedade destinada à moradia e ao sustento da família. Consequentemente, houve mais segurança para todos que ali desejassem morar com os familiares. Tudo isso com o objetivo de expandir a povoação naquela localidade. Como elucida Venosa:

“No Brasil, o bem de família foi influenciado pelo homestead que teve sua criação na República do Texas, Estados Unidos, através da publicação do Homestead Exemption Act, em 1839, que, por consequência da grave crise econômica, promulgou tal Lei permitindo que ficasse isenta de penhora, a pequena propriedade, destinada a propriedade do devedor, dando assim, mais segurança a família que ali queria se instalar objetivando expandir ainda mais a povoação naquela localidade”. (VENOSA, 2010, p.1553).

2.2.  HISTÓRICO

No decorrer dos anos, tentou-se a introdução do bem de família na nossa legislação, no entanto, por mais que os legisladores tivessem a boa fé e tentasse, a chegada foi árdua e lenta. Com o Decreto nº 737, de 25 de novembro de 1850, já engatinhavam indícios que se isentava alguns bens de penhora, tendo como objetivo direto preservar o executado. Em meados de 1893, foi apresentado ao Congresso Nacional um projeto de Lei que tratava sobre a impenhorabilidade de alguns bens, como por exemplo, o seguro de vida estabelecido pelo devedor em benefício de pessoas de sua família, o imóvel onde morava o devedor e sua família e também alguns dos utensílios a ela pertencentes. Foi exposto o projeto do Código Civil, também em 1893, que apresentava a proposta da constituição do “lar de família”.

Como ensina Hora Neto:

“Inobstante a importância capital do bem de família, mormente em países de largas dimensões territoriais como é o caso do Brasil, o fato é que a sua introdução no direito pátrio deu-se com dificuldade e maneira delongada, materializada que foi pela polêmica havida entre os seus defensores e os seus opositores.

De forma perfunctória, todavia, registra a doutrina que o vetusto Regulamento nº 737, de 25/11/1850, serve de exemplo como um vestígio do bem de família, posto que isentava de penhora alguns bens do devedor, apesar de ainda não excluir da execução a moradia do executado.” (HORA NETO, 2010, p. 4).

O projeto foi abordado objetivando o direito dos cônjuges ou até mesmo terceiros, de constituir o “lar de família”. Com isso iria torná-lo inalienável e indivisível durante o período do casamento e até mesmo após seu fim; ou ainda enquanto a mulher for viúva ou também ter filhos menores, frutos do matrimônio. Com o Código Civil de 1916 é que a figura do bem de família passa a ser inclusa na nossa legislação, mesmo que de forma discreta e deficiente.

Porém, o Código Civil de 1916 de Clóvis Beviláqua[3] não estava incluso o instituto do bem de família, cabendo ao Senado Federal apresentar uma proposta para a inclusão de quatro artigos. Então, o bem de família foi regulamentado nos artigos 70 a 73 do código de 1916. A finalidade do legislador era a simples proteção da família, evitando que sua moradia fosse penhorada. Contudo, os quatro artigos introduzidos no código trataram de forma simples o assunto, deixando vaga a Lei. Por exemplo, ela não abordou sobre assuntos quanto ao valor do imóvel, seu tamanho ou sobre os bens que os guarnecem, entretanto, deixou a desejar tal citação, que é de fundamental importância.

Como explana Hora Neto:

“O Projeto Beviláqua saiu da Câmara e chegou ao Senado sem qualquer previsão acerca do bem de família. Contudo, durante sua tramitação no Senado, mediante emenda publicada no órgão oficial em 05/12/1912, o bem de família foi enfim introduzido e incluído no direito pátrio.” (HORA NETO, 2007, p. 4).

Anos mais tarde, fora publicada em 1973 a Lei nº 5.869, regulamentando o atual Código de Processo Civil. Entretanto, restaram vigentes os artigos mencionados anteriormente por expressa determinação do artigo 1.128, VI, da citada Lei. Logo, após quatro anos publicou-se a Lei nº 6.742/79, que vem a acabar com o limite de valor, só então com o atual Código Civil de 2002; limitou-se o valor para 1/3 (um terço) do patrimônio líquido do instituidor.

A respeito desse tema, Hora Neto diz:

“Inicialmente, essa espécie de bem de família era previsto pelo Código Civil de 1916, que dele cuidava em quatro artigos (70 a 73), no Livro II, intitulado "Dos Bens". Posteriormente, com o advento do Decreto-Lei nº 3.200, de 19 de abril de 1941, foi estabelecido valores máximos dos imóveis classificados como bem de família, limitando assim tais valores, sendo que essa limitação foi afastada pela Lei nº 6.742, de 1979, possibilitando a isenção de penhora de imóveis de qualquer valor. Outros diplomas legais também trataram do tema (a Lei 6.015/73, arts. 260 a 265) e o Código de Processo Civil de 1973(art. 1.218, VI)”. (HORA NETO, 2007, p.5).

De início, tal princípio foi acolhido em nosso ordenamento jurídico para benefício do pequeno produtor rural, dando uma maior segurança nos investimentos e assegurando ainda mais o ambiente familiar. A Carta Magna de 1988, em seu art.5º, XXVI, proclama que “a pequena propriedade rural, assim definida em Lei, desde que trabalhada pela família não será objeto de penhora para pagamentos de débitos decorrentes de sua atividade produtiva”.

Em 29 de março de 1990, com a promulgação da Lei nº 8.009/90, que reza exclusivamente sobre a impenhorabilidade do bem de família, só veio a inovar os avanços da história jurídica que ficou conhecido como bem de família legal, ou seja, o bem fica impenhorável independente do seu registro no oficio imobiliário, afastando questões de burocracia e que dificultava o acesso à população de baixa renda. Convém ressaltar, ainda, que toda a evolução histórica percorre necessidades que vão além daquelas encontradas no âmbito interno de um País, o que não foi diferente no Brasil.

Hora Neto (2007) verifica que ao longo da história da legislação pátria, brevemente relatada, a introdução do bem de família desde os primórdios não foi de fácil manejo. No entanto, ao longo dos anos, os legisladores tornaram-se mais atentos ao assunto e chegou-se a uma evolução considerável, tornado o instituto acessível.

2.1.  CONCEITO DE BEM DE FAMÍLIA

Venosa (2010) explica que o bem de família é um mecanismo que visa em sua essência garantir uma proteção maior à família, tornando o bem imóvel onde reside a salvo de possíveis credores.

Quando falamos de bem de família, estamos falando de proteção da entidade familiar no que diz respeito à moradia contra credores, podendo estes ser residencial urbano ou rural. O melhor neste dispositivo é que também as pertenças se incluem a tal blindagem, entretanto, é válido ressaltar que poderá abranger valores mobiliários, isto é, poderá o instituidor, se sentido incapaz de mantê-lo ou manter sua família, poderá o mesmo, sobrepor em aplicações financeiras, aluguéis, dentre outros, que se acharem necessários para a manutenção do imóvel.

As finalidades suscitadas estão previstas expressamente em nosso Código Civil de 2002, no artigo 1.712, que diz:

“O bem de família consistirá em prédio residencial urbano ou rural, com suas pertenças e acessórios, destinando-se em ambos os casos a domicílio familiar, e poderá abranger valores mobiliários, cuja renda será aplicada na conservação do imóvel e no sustento da família.”

O conceito de bem de família não é apenas conceituar casa e sim o local onde as pessoas adquirem educação, saúde e é formada a personalidade, cria-se um vínculo afetivo com sua família e parentes, isto é, onde o ser humano cria seu próprio mundo. Contudo, essa pessoa fará um mundo melhor lá fora e, consequentemente, uma sociedade mais humana.

Como ensina Santiago:

“A importância da família para o equilíbrio do ser humano é imensurável, pois é no seio familiar que o indivíduo aprende os conceitos de amor, ética, caráter, respeito ao próximo, solidariedade e etc, ou seja, aprende a viver em sociedade”. (SANTIAGO, 2004, p.1).

 O Estado entende que o indivíduo é de grande importância para a constituição de uma nação forte, pois é interessante que a sociedade como um todo viva em harmonia, pois é a partir dela que é formada uma nação.

3  TIPOS DE BEM DE FAMÍLIA

3.1  BEM DE FAMÍLIA VOLUNTÁRIO

No nosso novo Código Civil, o bem de família encontra-se regido nos artigos 1.711 a 1.722, o qual há uma limitação para que haja um freio nas intenções de pessoas que quiserem blindar a residência em que vivem. Esse limite é proporcional aos bens do instituidor, com isso, o novo Código deixou relevante um terço do patrimônio líquido, pois, até então, o antigo código não havia se posicionado nesse sentido, citava em um capítulo sobre bem de família. Contudo, entende-se que estaria muito vago, faltava assim uma especificação, mais aprofundamento no vasto tema ora discutido, nesse sentido, o legislador, deu ênfase a fraudes contra credores, pois era uma prática muito constante. Contudo, instituía como bem de família para fugir de dívida oriunda da referido bem, mas o caso é que dívidas anteriores a data da instituição não ficará a salvo de uma provável penhora de bens, mas também o dispositivo não deixa a salvo dívidas provindas do próprio imóvel, como é o caso de um bem que nunca se pagou IPTU após a instituição fica vulnerável a questionamentos sobre o mesmo de se no caso for, quando existirem outros bens residenciais.

Como explana Diniz:

“[…], e tem por escopo assegurar um lar à família ou meios para seu sustento, pondo-a ao abrigo de penhoras por débitos posteriores à instituição, salvo as que provierem de tributos relativos ao prédio (IPTU ou ITR, p. ex), ou de despesas condominiais, visto que, pela sua natureza de obrigações propter rem, decorrem da titularidade do domínio ou da posse sobre a coisa, não podendo deixar de ser pagas, sob pena de execução do bem que as gerou, mesmo que seja bem de família”. (DINIZ, 2010, p. 217).

Vale salientar que o bem de família voluntário só pode ser constituído pela vontade expressa do autor, não sendo possível o mesmo com o bem involuntário, que o proprietário não precisa se preocupar com a instituição do bem. Contudo, no caso do voluntário, o Código Civil deixa claro que para se instituir tal prerrogativa será necessário ir ao cartório, lavrar a escritura e posterior registro do mesmo. Só com esse último que se efetivará a intenção do proprietário, contudo, também poderá ser feito testamento. Entretanto, quando o casal ou entidade familiar possuir vários imóveis que utilizem como residência, e não deseje que a impenhorabilidade recaia sobre o de menor valor, deverá fazer escritura pública, registrando o de maior valor. Evidenciando também que, não apenas a família com o devido matrimônio tem esse direito, mas também, constituída pela união estável, famílias monoparentais e de acordo com a Súmula nº 364 do STJ, até mesmo pessoas solteiras separadas e viúvas.

Reiterando estas ideias, Gonçalves leciona:

“O bem de família obedece a requisitos intrínsecos e extrínsecos, como condição de validade e eficácia. Quando aos últimos figura a existência de ser instituído por escritura pública ou testamento. A declaração de última vontade, como é cediço, é essencialmente revogável. Pode o instituidor, assim, seja cônjuge, entidade familiar ou terceiro, revogar a todo tempo o testamento, inviabilizando unilateralmente o estabelecimento do bem de família.

Por outro lado, tratando-se de negócio jurídico causa mortis, só terá eficácia com a morte do testador. No respectivo inventário, serão pagas, com prioridade, as dívidas que o de cujos deixou, pois serão sempre anteriores à constituição concretizada a partir do falecimento, dívidas estas que poderão, eventualmente, absorver todos os bens da herança. O imóvel destinado para bem de família do beneficiado depende dessa circunstância” (VELOSO, apud GONÇALVES, 2010, pp.562, 563).

Segundo Gonçalves (2010), fica evidenciado que deve ser utilizado imóvel como residência efetiva de permanência duradoura, ou de outro meio que justifique ser de sua propriedade, para que não haja descaracterização da sua utilização, pois o que insinua é o vínculo dos moradores com seu imóvel. Entretanto, os móveis que guarnecem dentro da residência também são protegidos pelo dispositivo citado, porém, alguns não, como por exemplo: obras de arte, automóvel, dentre outros que não são usados para o bem estar das pessoas que ali vivem. Gonçalves elucida, quanto à revogação, que está a critério do interessado, a qualquer momento, solicitar ao juiz para fazê-lo, porém, em se tratando de proprietário vivo, em se tratando de testamenteiro morto, deverá ser aberto inventário e pagar todas as dívidas originadas deste ato, contudo, entende-se que esse procedimento seja primordial para o beneficiado.

A validade da impenhorabilidade do bem de família de acordo com o artigo 1.716 do Código Civil de 2002 permanece até enquanto um ou ambos os cônjuges falecer, ou, na falta destes, até que os filhos completem a maioridade, pois, presume-se que com o falecimento de um dos cônjuges, ficando vivo um deste, ainda se está configurada a entidade familiar, porque fica configurada a família monoparental, contudo, a Lei também resguarda as famílias que por ventura forem constituídas por apenas um dos pais, porém, a norma, pensando na possibilidade dos filhos perderem os genitores por algum motivo, estes estariam em má situação, porque não haveria mais a figura da família, mas, se pensou também nessa possibilidade, contudo, como ficariam os filhos sem a figura dos que sempre lhes sustentaram? Haveria um verdadeiro caos e muitas pessoas, até mesmo relativamente incapazes, estariam definitivamente sem uma moradia digna e, consequentemente, haveria uma tragédia humana de grande proporção. Então, foi pensando nisto que também se deu prioridade aos filhos menores, para que fiquem assegurados até enquanto atingirem a sua maioridade.

Como explana Diniz:

“Tal isenção perdurará enquanto viver um dos cônjuges ou companheiros (na nova redação proposta pelo projeto de Lei nº 7. 312/2002 ao artigo 1.716), ou, na falta deles, até que os filhos atinjam a maioridade (Código Civil, artigo 1.715 e 1.716). O óbito dos cônjuges, ou companheiros, e a maioria da prole extinguem aquela isenção, logo o prédio será levado a inventário e partilha, sendo entregue a quem de direito (herdeiro legítimo, herdeiro testamenteiro e legatário) somente quando a cláusula for eliminada, ficando sujeito ao pagamento dos credores do de cujos.” (DINIZ, 2007, p.217).

O pré-requisito é que o objeto protegido não seja superior a um terço do patrimônio líquido do instituidor, porém a Lei não deixa claro qual o valor máximo que se possa habitualmente alegar. No aludido dispositivo, almeja-se, então, aos interessados um meio de resguardar o bem em que possuem, podendo o cônjuge, companheiro e terceiros utilizarem deste meio para assegurarem que sua família não pague pelos fatos ocorridos durante a sua vigência.

Conforme nossa legislação e comentado por Gonçalves:

“O aludido artigo 1.712 do Código Civil admite que valores imobiliários sejam abrangidos no bem de família, limitados, porém, segundo o artigo 1.713 do mencionado código, caput, ao “valor do prédio em bem de família, à época de sua instituição”, não podendo excedê-los em nenhuma hipótese. Deverão eles ser devidamente individualizados na escritura pública ou testamento (§1º). Se consistirem em títulos nominativos, “a sua instituição como bem de família deverá constar dos respectivos livros de registro” (§2º).

Os referidos valores ficam vinculados ao domicílio familiar, devendo a renda por eles produzida ser aplicada na conservação do imóvel e na subsistência da família. O bem de família – salvo quando instituído por terceiro – não representa alienação ou transferência da propriedade. O instituidor ou instituidores continuam donos do bem afetado, que, obstante, recebe uma destinação especial e se transforma em bem de família.” (GONÇALVES, 2010, p.565).

É de suma importância salientar que sofrerá nulidade todo ato deste tema suscitado, em que toda e qualquer vontade das pessoas que por ventura quiserem instituir seu bem de família precisam impreterivelmente registrar no cartório de imóveis o testamento ou escritura pública.

Dessa forma, Diniz ensina:

“Deverás, pelo artigo 1.711 do Código Civil, os cônjuges, ou entidade familiar (companheiros e integrante-chefe da família mono-parental), mediante escritura pública ou testamento, podem destinar parte de seu patrimônio para instituir bem de família, desde que não ultrapasse um terço do patrimônio líquido existente ao tempo da instituição, mantidas as regras sobre a impenhorabilidade do imóvel residencial estabelecida em Lei especial (Lei de Registro Públicos, artigos 261, 264 e §§ 2º e 3º).” (DINIZ, 2007, p. 218).

No caso de morte dos cônjuges que constituíram o bem de família, é passado ao filho mais velho a administração do bem aludido e este beneficio é estendido até que os filhos atingissem a maioridade, salvo se algum dos filhos for incapaz, nos termos da Lei, pois seria um desastre se o filho que não pode se sustentar, não tivesse uma casa pra morar.

Vejamos que o bem que se perfaz bem de família precisa ser de fato e de direito uma residência e que seja utilizado como moradia para que se concretize tal dispositivo como devido, fica assim visto como não residência e, consequentemente, é possível a penhora. O que busca neste dispositivo é tornar o bem de família como impenhorável, porém, é necessário que o proprietário cumpra com os requisitos necessários para que não adquira problemas futuros como no fato narrado, não esquecendo também que este serviço possui várias exceções que devem ser levadas em conta.

3.2  BEM DE FAMÍLIA LEGAL – LEI Nº 8.009/90

Bem de família legal, também denominado involuntário ou obrigatório, adveio da Medida Provisória nº 143, de 08/03/1990, editada pelo Presidente da República, José Sarney, e aprovada pelo Congresso Nacional, e só depois foi devidamente convertida na Lei nº 8.009/90.  Essa Lei foi e será lembrada com muito carinho, até porque, no Brasil, existem muitas famílias carentes que não possuem vários imóveis, como poderia ir ao cartório fazer uma escritura resguardando um bem de família de possível penhora.

Contudo, os juristas criaram um dispositivo que não necessitasse de nenhum ato por parte do proprietário, tornando-o, assim, um direito adquirido, ou seja, automaticamente o dono da moradia e todos que guarnecem a residência, estão protegidos contra credores posteriores à aquisição do bem, pois não há coisa melhor que o cidadão ter a certeza que o bem estar da sua família estará blindado. Por outro lado, essa Lei trouxe outros excludentes como os veículos de transporte, obras de arte e adornos suntuosos, isto é, objetos considerados, desnecessários para sobrevivência da pessoa, ou melhor, explicando, bens supérfluos que para sobreviver não são necessários a uma família, é o que se entende como uma possibilidade de penhora, do indivíduo que está devendo e que foram penhorados seus pertences.

Estamos diante de princípios constitucionais em que temos a certeza de não fazer comparação ou distinguir que tipo de família, pois família a que se refere é uma visão familiar como um todo, ou melhor, dizendo, legítima ou ilegítima. Contudo, devemos deixar claro que essa Lei veio assegurar impenhorabilidade, com isso fica livre a alienabilidade, deixando o proprietário com a faculdade se assim o necessitar da alienação a qualquer hora e momento, possuindo mais de uma residência, observado requisitos da Lei especial.

Por outro lado, muitas pessoas utilizam essa Lei para aplicar calote, se resguardando da premissa que não penhora, porém, a mesma condena aqueles que, precisando de algum tipo de crédito financeiro, como por exemplo, a bancos, estes vão recusar-se por que o possuidor possui um único bem que é aquele em que utiliza para a sua moradia e de seus familiares.

Todavia, essa Lei veio assegurar que o bem de família do casal fique livre de penhora sem a necessidade de registro no cartório de imóveis, por dívidas contraídas por cônjuges ou pelos filhos que sejam seus proprietários e nele residam, salvo dispositivo em contrário, conforme ensina Gonçalves:

“A Lei nº 8.009, de 29 de março de 1990, veio ampliar o conceito de bem de família, que não depende mais de instituição voluntária, mediante as formalidades previstas no Código Civil. Agora, como foi dito, resulta ele diretamente da Lei, de ordem pública, que tornou impenhorável o imóvel residencial, próprio do casal, ou da entidade familiar, que não responderá por qualquer tipo de dívida civil, comercial, fiscal, previdenciária ou de outra natureza, contraída pelos cônjuges ou pelos pais ou filhos que sejam seus proprietários e nele residam, salvo nas hipóteses expressamente previstas nos artigos 2º e 3º, I a VII(fiança em contrato de locação, pensão alimentícia, impostos e taxas que recaem sobre o imóvel etc.)” (GONÇALVES, 2010, p.567).

Vale ressaltar que tal Lei livra o bem imóvel de penhora, mas, se a residência for alugada a impenhorabilidade recairá somente aos móveis que estiverem na moradia se por ventura pertencer ao locatário e que estejam totalmente quitados. Com isso, fica evidente que o locador que de boa fé aluga um imóvel, este nada tem a perder no que diz respeito à penhorabilidade de seus bens.

O bem de família legal também, como o voluntário, guarnece os móveis que se encontram no interior da residência necessário à sobrevivência e que não dependem de seu valor para constituí-la como explana Hora Neto:

“Quanto ao objeto, é o imóvel residencial (rural ou urbano), assim como os móveis que guarnecem a residência do proprietário ou possuidor, independente do seu valor ou forma de constituição, sendo que, na hipótese de o devedor possuir domicílio plúrimo ou tiver pluralidade de domicílios, como assim previsto no artigo 71 do Código Civil, a impenhorabilidade recairá sobre o imóvel de "menor valor" […]”. (HORA NETO, 2007, p. 06).

Apesar das críticas surgidas, a Lei nº 8.009/90 foi interpretada como constitucional, pois vem sendo e é usada para dar garantias às pessoas mais necessitadas no tocante a um todo, pois se for entendido inconstitucional, teria uma grande repercussão na sociedade e no judiciário, contudo, o instituidor, neste entendimento em evidência, é o Estado, que cria o devido dispositivo com o intuito de manter a ordem e o bem estar para a maioria das pessoas que dele dependa por um pouco de atenção.

É de suma importância ressaltar que o bem de família involuntário destaca em sua redação que é impenhorável deixando de lado a inalienabilidade, com isso, o possuidor tem a livre faculdade de, se assim o quiser, vender ou mesmo alienar, como no caso hipotecar este, deixando a salvo todas as restrições, estando em plena e total consciência do poder judiciário.

Esclarecendo, o que se presa com essa Lei não é que fique tutelado apenas um lado, até porque se busca um equilíbrio entre as duas partes. Assim sendo, podemos manter o equilíbrio, ajustando as diferenças existentes entre credor e devedor de um modo que fique bom para ambas as partes em conflito.

3.3  A FIANÇA COMO GARANTIA DO CONTRATO DE LOCAÇÃO

O Código Civil de 2002, no seu artigo 818, diz que uma pessoa ao aceitar ser fiador está garantindo que se o devedor não pagar a dívida, este pagará, pois, ao locar um imóvel o locador exige fiador. Existem contratos, por exemplo, em banco, onde o interessado se sujeita a todo tipo de negócio para ter acesso ao que pretende. Nesse sentido, é imposto ao mesmo um fiador para dar andamento ao processo, este fica obrigado a concordar, pois, não o fazendo, o almejado fica a perder.

Como elucida, Hora Neto:

“Doutrinariamente, diz-se que a fiança tem os seguintes caracteres: é um contrato unilateral, porque gera obrigações unicamente para o fiador; é solene, porque depende de forma escrita, imposta por Lei (art. 819 do Código Civil de 2002); é gratuito, em regra, porque o fiador ajuda o afiançado, nada recebendo em troca, salvo, é claro, a fiança onerosa, tipo a fiança bancária; é benéfico, porque não admite interpretação extensiva e apenas interpretação restritiva (art. 114 e 819 do Código Civil de 2002), sendo por isso mesmo um contrato personalíssimo ou intuitu personae; e é um contrato acessório e subsidiário, porque depende da existência do contrato principal e tem sua execução subordinada ao não cumprimento deste, pelo devedor principal.” (HORA NETO, 2007, p. 06).

Como se pode ver, o doutrinador aponta as características esclarecendo todos os requisitos de um contrato de locação.

O contrato de fiança tão somente pactuado no sentido formal, digo, de forma escrita ou solene, também é constituído como acessório, pois a sua existência se concretiza se houver outro negócio. Esse contrato é gratuito, pois na maioria dos casos não é prestado nenhum tipo de pagamento, porém a Lei não se opõe ao pagamento ao fiador; é unilateral porque gera obrigações só ao fiador e direitos ao afiançado, pois se o afiançado não cumprir com o adimplemento será cobrado somente do fiador; é benéfico, pois só admite interpretação restritiva e, por fim, é um contrato subsidiário, porque, precisa ter outro contrato, chamado de contrato principal, pois se o mesmo não for cumprido, poderá o segundo ser executado.

Explica Roque e Junqueira:

“O contrato de fiança é regulado pelo Código Civil Brasileiro (Lei Federal nº 10.406/2002), cujo art. 818 expressa: "Pelo contrato de fiança, uma pessoa garante satisfazer ao credor uma obrigação assumida pelo devedor, caso este não a cumpra". A fiança é uma das quatro garantias que podem ser exigidas pelo locador em um contrato de locação de imóvel urbano e, apesar de ter sua base primária no Código Civil, quando a fiança é prestada em benefício de um locatário de imóvel, prevalecem as disposições especiais da Lei do Inquilinato (Lei Federal nº 8.245/91)”. (ROQUE; JUNQUEIRA, 2010, p.1).

Nos moldes da ênfase dos autores, podemos dizer que o contrato de locação de imóvel se faz necessário à presença do fiador extrajudicial, pois este é quase que unânime, entretanto, este é necessário na maioria dos contratos, pois com essa figura terá uma garantia maior. O fiador assegura que o devedor principal pagará, então, fica este submetido a citação pelo judiciário para que cumpra com o acordado.

Ficam então evidenciadas as funções do fiador no contrato de locação de imóvel, uma vez que se o devedor principal não quitar o débito, o fiador passa a ser devedor e a responder pela dívida contraída não por ele, e sim, pelo afiançado, mas o judiciário não se preocupa com tal indagação, visando assim o cumprimento do contrato.

É de se imaginar que tal dívida seja por motivo de força maior e na maioria das vezes não sabido. Este por sua vez, em determinados casos, entra em contratos por só obter apenas um imóvel e, não possuindo outro, não poderá ser penhorado, mas ainda por cima existe a figura dos bens que estão sob tutela de essências à família. Também ficam resguardados os bens móveis que ali se encontrem, até por que, por exemplo, numa casa se faz necessário uma geladeira, um fogão dentre outros, com isso, fica então todos resguardados pelo nosso ordenamento jurídico em vigor.

3.4. DISTINÇÃO ENTRE BEM DE FAMÍLIA VOLUNTÁRIO E BEM DE FAMÍLIA LEGAL

3.4.1 Classificação

a) Bem de família voluntário: é formado pela total e plena vontade do possuidor do bem, este, se faz pela escritura pública, testamento ou doação, entretanto, só é ratificada com o registro da escritura pública no cartório de registro de imóveis ou quando se dirimir a abertura e posterior cumprimento do testamento, mas vale salientar que o valor do bem de família não pode ultrapassar um terço do patrimônio na época do registro, porém, verifica-se certo tipo de preconceito, já que nesse tipo segurança do bem de família só é constituído por pessoas que possuem mais de um imóvel. Assim, fica evidenciada a exclusão de parte da sociedade, contudo, favorece a classe mais rica, já que a pessoa que possui apenas um imóvel não pode usufruir de tal disposto auferido pelo nosso ordenamento jurídico.

Convém ressaltar, ainda, que o objeto tem uma maior variedade, que abrange o imóvel residencial urbano e rural com total enquadramento dos utensílios, salvo disposto em Lei, abrange também o aluguel e com esse dinheiro custear dívidas provindas do sustento familiar e conservação do bem. Entretanto, o Estado Juiz pode intervir no que concerne à extinção e alienação do bem, uma vez que as classes menos favorecidas é que sofrem mais com esse tipo de situação.

Reiterando estas ideias, Hora Neto leciona:

“É constituído por ato de vontade do instituidor (se cônjuges, por escritura pública ou testamento, se terceiros, por testamento ou doação); os seus efeitos só nascem com o registro da escritura pública no Cartório de Registro de Imóveis ou quando da abertura e cumprimento do testamento; o valor do bem não pode exceder a um terço do patrimônio líquido existente ao tempo da instituição, razão pela qual o instituidor deve possuir mais de um imóvel, o que, sem dúvida, favorece mais a classe abastada, já que a pessoa que possui apenas um imóvel não pode se valer dessa espécie de bem de família; o seu objeto é mais amplo, pois além do imóvel residencial (urbano ou rural), com todas as suas pertenças e acessórios, permite-se a instituição de valores mobiliários cuja renda destinar-se-á à conservação do bem e sobrevivência da família; em caso de extinção, alienação ou sub-rogação, é imperiosa a interferência do Estado-Juiz, uma vez que o bem de família é impenhorável e inalienável, gerando verdadeira imobilidade patrimonial, com consequências nefastas para as classes menos favorecidas, que têm no imóvel residencial o único bem economicamente relevante”. (HORA NETO, 2007, p. 06).

b)  Bem de família legal: este instituto fora criado pelo Estado, através de Lei e votado pelos nossos legisladores que asseguram a pessoa possuidora de bem de família a total segurança no que diz respeito à impenhorabilidade e alienação, pois tal dispositivo é um direito de todos sem que precise da devida instituição, por que é automático, digo, quem se instala no único bem residencial está resguardado pelo Estado, porém não há limite para o valor do bem, salvo se o indivíduo possuir vários imóveis, então o bem de menor valor será resguardado como bem de família involuntário, contudo, nesse tipo de dispositivo engloba o terreno com a construção, plantações, benfeitorias, equipamento de uso profissional, pessoal e móveis que guarnecem a residência. Porém, devem estar quitados.

Não esquecendo, que o bem de família involuntário, pode ser extinto ou alienado a gosto do proprietário, pois a Lei assegura a impenhorabilidade e deixa a critério do instituidor podendo a qualquer tempo alienar o bem em que mora.

Em excelente análise da situação conflituosa, Hora Neto aponta:

“É constituído por ato do Estado, via Lei nº 8.009/90, independente da iniciativa do proprietário do imóvel; os seus efeitos operam-se de imediato, de logo, ope legis, bastando apenas que o imóvel sirva de residência para a família, ou seja, que a família ali esteja morando; não há limite para o valor do bem, salvo em face da multiplicidade de bens imóveis (pluralidade de domicílios), quanto, então, somente o de menor valor será tido como de bem de família legal; a impenhorabilidade do bem se estende ao terreno com a construção, plantações, benfeitorias de qualquer natureza e todos os equipamentos, inclusive de uso profissional ou móveis que guarneçam a casa, desde que quitados; em caso de extinção ou alienação do bem de família legal é bastante o ato de vontade do proprietário, sem a interveniência do Judiciário, uma vez que a Lei nº 8.009/90 previu apenas a impenhorabilidade e não a inalienabilidade — segundo uma parcela considerável da doutrina — razão pela qual favorece principalmente as classes menos favorecidas, que têm no imóvel residencial o único bem de valor econômico expressivo, para fins de alienação”. (HORA NETO, 2007, p. 06). 

3.5  DA LEGITIMIDADE PARA INSTITUIÇÃO DO BEM DE FAMÍLIA

O Código Civil de 1916 dava pleno direito para que o chefe de família tomasse conta, mandasse e desmandasse, dando poderes para os quais estes tinham domínio do bem de família, porém, com a devida autorização judicial. Contudo, na época, o chefe consistia somente do homem (artigo 233 do Código Civil de 1916). Com o passar dos anos muito se cobravam dos doutrinadores e estes conseguiram incluir com a Constituição Federal de 1988, que trazia em seu bojo não mais esse entendimento doutrinário, fora entendido que na falta do marido a esposa era a responsável.

Na origem do Código Civil, as pessoas que fossem solteiras, por consequência, teriam seu direito suprimido, ainda que por escolha pessoal tivesse uma vida total com amantes, concubinas ou similar, não poderia de fato e de direito adquirir tal prerrogativa de instituir o bem de família, consequentemente por não possuir tal direito, os curadores o faziam. Nos dias atuais, não é o que se vê. Hoje, contudo, há famílias constituídas apenas por um pai ou uma mãe ou até por falta de um destes com os filhos e também pessoas solteiras, separadas e viúvas de acordo com a Súmula nº 364 do STJ, podem constituir o bem de família, com o devido respaldo legal.

Assim reitera Venosa:

“O artigo 70 do Código Civil de 1916 permite que os chefes de família instituíssem o bem. De acordo com o artigo 233, chefe de família era o marido. A constituição Federal de 1988 já não permitia mais esse entendimento. Na falta deste, embora a Lei não o diga, a prerrogativa passa para a mulher. É esse o espírito da Lei, pelo que se inferia dos artigos 251, 380 e 466. Também era preciso admitir titularidade à mulher no caso de ausência do marido. A mulher, ao assumir a direção do lar, deveria ter o poder de instituir o bem, pois, de acordo com artigo 251, IV, podia até alienar os imóveis do casal, com autorização judicial. No entanto, perante a igualdade de direitos dos cônjuges atribuída pela constituição havia, destarte, que se atribuir legitimidade a ambos os cônjuges para a instituição. Esse é o sentido deste código também.

Na origem do código antigo, as pessoas solteiras, por conseguinte, ainda que vivessem em concubinato duradouro, não podiam constituir bem de família, assim como não tinham esse direito os tutores e curadores em benefício dos pupilos. Modernamente, há que se admitir que a instituição do bem de família dirigir-se à entidade familiar, ainda que monoparental, como garante a constituição”. (VENOSA, 2010, pp.1555, 1556).

3.6  O POSICIONAMENTO DE DOUTRINADORES

Logo da entrada em vigor da Lei nº 8.009/90, que aclamou críticas de doutrinadores e de pessoas ligadas ao mercado de imóveis a respeito da queda da procura por aluguel, o mercado de locação começou a se retrair, pois o fiador só seria aceito se o mesmo obtivesse dois ou mais imóveis, isso por que um era para moradia da família e o outro poderia ser objeto de penhora. Caso o devedor principal não cumprisse com as obrigações, ficaria uma parte da população restringida a locar e/ou ser fiador.

Como explana Hora Neto:

“Malgrado algumas críticas levantadas sobre a constitucionalidade da Lei nº  8.009/90, o fato é que a doutrina quase unânime entende ser a mesma constitucional, por se tratar de uma Lei de emergência, de manifesto interesse público, pois visa à proteção da residência da família e os móveis nela guarnecidos, e, por via reflexa, objetiva a proteção da própria família, sendo assim uma exceção legal ao princípio universal de que o patrimônio do devedor responde perante seus credores, podendo estes, portanto, constranger outros bens do devedor, afora o bem de família.

[…] até a vigência da Lei nº 8.009/90, em 30 de março de 1990, o mercado de locação de imóveis fluía normalmente, afora, é claro, os percalços já conhecidos provocados pela política habitacional governamental. O fato concreto é que o mercado seguia seu curso normal, servindo como fiador mesmo aquele que tivesse um único imóvel, ainda que residisse com sua família, pois que esse imóvel era sim penhorável na hipótese de inadimplemento por parte do locatário.

Contudo, com a edição da Lei, que, em última análise, previa ser impenhorável o bem de família também do fiador locatício, o mercado retraiu-se largamente, passando a aceitar como fiador somente aquele que fosse proprietário de mais de um imóvel, uma vez que um dos imóveis era bem de família legal e o outro serviria, em tese, para satisfazer o crédito do credor, ou seja, do locador, acaso o afiançado não pagasse os aluguéis.

Ocorre que, como notório, o mercado imobiliário em geral incomodou-se com tal situação, na medida em que a Lei nº 8.009/90 restringiu e limitou as locações em geral, devido a dificuldade para encontrar-se fiador proprietário de mais um imóvel, razão pela qual o legislador foi "pressionado", e, por conseguinte, eliminado foi o embaraço com o advento da Lei do Inquilinato(Lei nº 8.245/91), que acrescentou o inciso VII ao artigo 3º da Lei  nº 8.009/90, ou seja, ampliou o rol de exceções à impenhorabilidade do imóvel residencial do casal ou entidade familiar – tornando assim penhorável o imóvel residencial do fiador.” (HORA NETO, 2007, p.07).

Dando ênfase ao fato discorrido, pode-se dizer que com a criação dessa Lei os calotes foram diminuindo gradativamente em relação ao fiador, pois este quando solicitado por alguém para ser fiador locatício, o mesmo não se opunha, por que este bem era instituído pelo proprietário com bem de família, logo, seria impenhorável. Essa prática perdurou por muito tempo até a abordagem do tema por nossos legisladores, e assim o fizeram.

3.7  EXTENSÃO DO BEM VOLUNTÁRIO E INVOLUNTÁRIO

a) Bem de família voluntário: O novo Código Civil de 2002, em seu texto, discorre em seu artigo 1.711, que para se instituir o bem de família voluntário este poderia instituir até um terço do seu bem, ao contrário do bem de família involuntário que deixa a critério do proprietário não distinguindo pessoas ricas ou pobres, porém, a nova redação do Código Civil de 2002, não supre as necessidades da população, cuja maioria não tem o que comer muito menos um teto.

Como explana Santiago:

“Enfim, a Lei nº 8.009/90, ao regulamentar o bem de família sem qualquer restrição em relação ao seu valor ou extensão revogou todas essas normas. Ficava sendo uma questão pessoal do instituidor a escolha do imóvel, cabendo o direito desde ao mais pobre ao mais abastado. O que importa é a publicidade, o que impede a presunção de ignorância dos terceiros.

O novo Código Civil, entretanto, na contramão dessa evolução legislativa, determinou, em seu art. 1.711, que o patrimônio destinado ao bem de família não deve ultrapassar 1/3 do patrimônio líquido total do instituidor ao tempo da instituição.

Essa regra do novo Código Civil não coaduna com a realidade social do nosso país, em que a maioria das pessoas não é sequer proprietária de imóveis, quanto mais ter um patrimônio em que o imóvel corresponda a pelo menos um terço do total líquido. De qualquer forma, essa restrição não vale para o bem de família involuntário, que continua vigorando normalmente sem limitação de valor”. (SANTIAGO, 2004, p.7).

b)   Bem de família involuntário: Com a criação da Lei nº 8.009/90, ficou mais fácil para o proprietário de bem que queira instituir sua moradia como sendo bem de família, entretanto, diferentemente do voluntário que taxou um valor máximo, neste não há alguma limitação, nem no valor nem extensão, observadas as disposições da referida Lei especial.

É o que nos ensina Santiago:

“Na Lei nº 8.009/90 não há qualquer limitação em relação ao valor ou extensão do bem de família involuntário. Desde que haja a moradia da família, há a isenção por execução de dívidas sobre o imóvel e os móveis que guarnecem a habitação.

Não vale, nesse caso, a limitação do CC/2002 de que o valor do bem não pode ultrapassar um terço do patrimônio líquido total do proprietário para que possa se transformar em bem de família. Essa pode ser considerada uma quarta distinção entre bem de família voluntário e involuntário.” (SANTIAGO, 2004, p.10).

3.8  EXCEÇÕES À IMPENHORABILIDADE

O entendimento do STJ[4] é que a televisão, linha telefônica, eletrodomésticos dentre outros mais que por ventura forem de grande importância e necessidade para o convívio da família, também são impenhoráveis devido a sua grande utilização e fazerem parte da casa de acordo com o bem estar familiar.

Mariana Ribeiro Santiago ensina que a impenhorabilidade que diz respeito ao bem de família involuntário tem suas exceções e é visível que este tem mais que a do instituto do bem de família voluntário, porém a exclusão da impenhorabilidade sobre os automóveis tem certo tipo de condição no que diz respeito ao seu uso, isto é, a sua utilidade está associada à essência no âmbito do sustento da entidade familiar. Se a família possui automóvel que desse necessite para o sustento familiar e até mesmo pra suprir as necessidades de uma família, entende-se que este será impenhorável.

Como elucida Santiago:

“Entretanto, a impenhorabilidade que recai sobre o bem de família involuntário também não é absoluta. Pelo contrário, nesse caso a impenhorabilidade sofre mais exceções do que no caso de bem de família voluntário[…].
Quanto à definição do que sejam adornos suntuosos, temos que nos recorrer à jurisprudência. O STJ tem considerado que as linhas telefônicas e aparelhos eletrodomésticos que não tenham caráter de ostentação, inclusive televisão, conservam a impenhorabilidade, pois fazem parte da normalidade da residência, estando presente num número imenso de lares.

O art 3º também estabelece, em seus sete incisos, outras exceções à impenhorabilidade. Comentadas a seguir.

O inc. I exclui a impenhorabilidade se a dívida provir de créditos de trabalhadores da própria residência e respectivas contribuições previdenciárias. Considera-se como trabalhador da própria residência não apenas a empregada doméstica, mas pedreiro, eletricista e etc.

O inc. II trata da hipótese de crédito decorrente do financiamento destinado à construção ou aquisição do imóvel, nos limites do contrato. Desconstitui-se a impenhorabilidade no caso para evitar o enriquecimento sem causa. Já o inc. III cita o crédito de pensão alimentícia também como exceção, pelo caráter existencial da pensão.

O inc. IV dispõe como exceção o crédito de impostos, taxas e contribuições devidas em função do imóvel. Aí se incluem as despesas de condomínio. Há a exclusão em virtude de se tratar de obrigações geradas pela própria existência da coisa, propter rem, pelas quais o próprio imóvel deve "responder".

O inc. V permite a desconstituição do bem de família para execução de hipoteca sobre o imóvel oferecido como garantia real pelo casal ou entidade familiar. Essa exceção se fundamenta no fato de que a instituição de bem de família legal não retira a alienabilidade do bem, sendo que, se o proprietário pode aliená-lo ou gravá-lo com ônus real livremente, não seria justo que o bem não fosse entregue em cumprimento da dívida com essa natureza.

O inc. VI permite a penhora do bem de família se o imóvel foi adquirido com produto de crime ou para execução de sentença penal condenatória a ressarcimento, indenização ou perdimento de bens, estabelecendo uma ligação entre direito penal e direito civil, para ressarcimento da vítima.

Mais polêmica é a exceção do inc. VII, que permite a penhora do bem de família para a satisfação de crédito decorrente de fiança concedida em contrato de locação. Aparentemente trata-se de uma incongruência, pois a fiança é, em regra, uma garantia pessoal, fidejussória, que não vincula bem específico do fiador. Mesmo a simples exibição de documentos que provem a propriedade de bens visando atestar a solvabilidade do fiador não vincula esses bens, pois para que isso seja possível deve haver toda uma formalidade específica.

Mas o que ocorre na fiança locatícia é diferente, apresenta natureza jurídica diversa, pois a Lei do inquilinato (Lei nº 8.245/91) permite nesse caso que se estabeleça a vinculação de um bem especifico imóvel, que fica gravado como verdadeira hipoteca na matrícula desse imóvel. Há toda uma formalidade e a concordância do fiador com a vinculação do bem específico. Adquire, assim, natureza de direito real, equiparando-se ao caso da hipoteca.

O que parece mais injusto nesse caso é que, ao perder, o fiador, o seu bem de família e exercitar o seu direito de regresso contra o afiançado, este pode opor ao fiador a exceção de impenhorabilidade do bem de família. Isso é possível porque o afiançado não vincula o bem específico, de maneira solene, ao pagamento da dívida, não recaindo sobre o mesmo o gravame de natureza real”. (SANTIAGO, 2004, pp.10, 11).

3.9  BENEFÍCIOS DA AUSÊNCIA DA INALIENABILIDADE

a) Bem de família voluntário: Em se tratando de bem de família voluntário, a alienação é relativa, pois para se alienar tal bem, deve-se ter o consentimento dos interessados, pois estamos falando de interesse comum, entretanto, se o representante legal for menor, lhe é concedido um curador com a participação do ministério público, para não haver nenhum conflito de interesses.

É o que explana Santiago:

“A inalienabilidade que recai sobre o bem de família voluntário também é relativa, pois o art. 72, do CC[5]/16, e o art. 1.717, do CC/2002, preveem uma possibilidade de alienação ao estabelecem que o imóvel não poderá ser alienado sem o consentimento dos interessados e seus representantes legais.

Interessados, no caso, são o cônjuge, o companheiro e os filhos menores, que são os beneficiados pelo bem de família, de acordo com o art. 70, p.u[6], do CC/16, e art. 1.716, do CC/2002.

Ocorre que, nesse caso, o menor deverá ser representado por curador especial designado pelo juiz e deve haver a participação do Ministério Público, de acordo com o art. 387, do CC/16, e art. 1.692, do CC/2002, pois pode haver colisão entre os interesses de pais e filhos menores, ou seja, representantes e representados”. (SANTIAGO, 2004, p.8).

b)  Bem de família involuntário: os benefícios em que a Lei elucida são a respeito da alienabilidade, isto por que durante muito tempo as pessoas que possuíam imóveis, quando precisavam de algum dinheiro, recorriam aos bancos e alienavam o seu bem em troca de dinheiro. Com o final do pagamento, o instituidor ficaria com o mesmo bem alienado. Ocorre que com essa nova Lei do bem de família, surgiram boatos que o bem de família a partir da entrada em vigor da Lei nº 8.009/90 seria inalienável, porém esta Lei veio a melhorar a vida de muitas pessoas.

Como esclarece Santiago:

“Não há na Lei nº 8.009/90 qualquer dispositivo determinando direta ou indiretamente a inalienabilidade do bem de família involuntário ou restringindo a possibilidade de alienação. Assim, conclui-se que o bem não fica excluído da livre disposição do proprietário, podendo este negociá-lo livremente. Pode, inclusive, o proprietário vender seu imóvel e morar de aluguel se entender que é melhor para a segurança da família, abdicando do benefício concedido pela Lei.

Essa foi uma grande inovação trazida pela Lei nº 8.009/90, constituindo-se numa sexta distinção entre bem de família voluntário e involuntário. Dessa forma, o proprietário não terá o seu crédito prejudicado no mercado em virtude de ter o imóvel excluído do patrimônio que responde por suas dívidas.” (SANTIAGO, 2004, p.11).

4  O ART. 82 DA LEI Nº 8.245/91 E OS EFEITOS NA FIANÇA

Com a criação da Lei nº 8.245/91[7], mais precisamente o artigo 82, ficou garantido ao locador e ao mercado de imóveis a segurança no adimplemento dos débitos provindos do bem, afastando do fiador a impenhorabilidade do imóvel, isto é, não adquire o benefício da impenhorabilidade do imóvel onde reside com sua família, na hipótese de processo de execução relativo à fiança que prestou como garantia de um pacto locatício.

Como explana Hora Neto:

“De sorte que, a partir da alteração já referida, assim vinha se dando a casuística, de forma recorrente: acaso o afiançado (o devedor principal, o inquilino ou locatário) não pagasse os aluguéis e, em tendo havido a renúncia ao benefício de ordem (como de costume assim ocorre, na esteira do artigo 828 inciso I do CC), o fiador teria sim seu imóvel residencial penhorado, por força da exceção capitulada no artigo 3º inciso VII da Lei nº  8.009/90, não mais podendo arguir a exceção da impenhorabilidade; em sequencia, e, por conseguinte, uma vez satisfeito o crédito do credor locador, o fiador, agora na condição de terceiro interessado se sub-rogaria nos direitos do locador (art. 346 inciso III c/c art. 831 1ª parte do CC) e, em seguida, faria uma ação regressiva em face do afiançado para ressarcir-se (art. 285), sendo essa regressiva, contudo, geralmente infrutífera, haja vista que o afiançado defendia-se arguindo a exceção da impenhorabilidade do seu único imóvel residencial”. (HORA NETO, 2007, p.08).

4.1  A EMENDA CONSTITUCIONAL Nº 26/2000

Com a criação da emenda constitucional nº 26/2000, muito se perguntou se esta iria revogar a Lei nº 8.009/90, pois esta deixa claro que em assunto de penhorar o único bem de família do fiador, este será penhorado. O entendimento do STF, é que pode penhorar o bem de família do fiador, mesmo que este possua um único bem que é sua residência, entretanto, o que a emenda constitucional nº 26/2000, que entrou em vigor após a Lei nº 8.009/90, quer introduzir é que todos nós temos direito à moradia sem distinção alguma.

Vejamos a referida emenda constitucional:

“Art. 1º. O art. 6º da Constituição Federal passa a vigorar com a seguinte redação:

“Art. 6º. São direitos sociais a educação, a saúde, o trabalho, a moradia, o lazer, a segurança, a previdência social, à proteção à maternidade e à infância, a assistência aos desamparados, na forma desta Constituição.”

Art. 2º. Esta Emenda Constitucional entra em vigor na data da sua publicação”.

Notem que os legisladores acrescentaram a moradia como direito social para todos os fins legais vigentes. Contudo, deixa claro que é direito do Estado conceder às pessoas direito a moradia. Vale salientar que a Lei nº 8.009/90 continua valendo para todos os efeitos, até porque assegura um direito adquirido.

Destacamos aqui um assunto polêmico, pois com a emenda constitucional nº 26/2000 que inclui como direito social a moradia, se partimos da premissa que a Constituição Federal está acima de qualquer outra Lei, julga-se, então, que o artigo 3º, inciso VII da Lei nº 8.009/90 estaria revogado, porém há de se observar alguns critérios importantes, como o direito à moradia. Sendo citado na aludida emenda, é um direito social por excelência, mas também o que se aponta é que essa mesma, também é de eficácia limitada, isso porque, o constituinte esbarra em uma redação concisa, não prevendo um plano mais esclarecedor em relação à emenda, digo, é um direito social à moradia, mas não aponta como vai fazer tal indagação.  Por esse motivo, essa emenda é limitada. O objetivo do inciso VII da Lei nº 8.009/90 é excitar o mercado imobiliário e facilitar a vida de muita gente necessitada de moradia que não tem acesso a outros meios de aquisição a uma residência e a um fiador que possua mais de um imóvel.

Vejamos o que explica Hora Neto:

“Basicamente, a vexatio quaestio cinge-se em dirimir se o direito à moradia, introduzido pela Emenda Constitucional nº 26/2000, é ou não uma norma constitucional de eficácia plena ou de eficácia limitada (ou programática), sendo essa a questão de fundo relevante.

Na hipótese de considerar-se uma norma constitucional de eficácia plena, logicamente e por imperativo hierárquico, a exceção prevista no inciso VII do art. 3º da Lei nº 8.009/90, que dispõe sobre a penhorabilidade do bem de família do fiador locatício, estaria de plano revogada, implicando na sua não recepção pela Carta Magna.

De outro modo, na hipótese de considerar-se uma norma constitucional de eficácia limitada ou programática, a exceção do artigo 3º inciso VII da Lei nº 8.009/90 permaneceria em plena vigência e, portanto, plenamente recepcionada pela Constituição Federal”. (HORA NETO, 2007, p.9).

Se, por ventura, fosse inconstitucional o inciso VII da Lei nº 8.009/90, as outras também seriam, pois ferem os princípios constitucionais. Com isso, teríamos como inconstitucionais o devedor de créditos trabalhistas da própria residência (artigo 3º, I, da aludia Lei); o bem de família do devedor da hipoteca (artigo 3º, V da Lei nº 8.009/90) e também não estaria correto penhorar o devedor de pensão alimentícia (artigo 3º, III da citada Lei), dentre outros.

Destacamos também que o dispositivo não fere o princípio da isonomia (artigo 5º da Constituição Federal de 1988), contudo, ao decidir alugar um imóvel o locador fica obrigado a cumprir as regras contidas no contrato ora assinado, por outro lado, o fiador se compromete única e exclusivamente em garantir que aquele ato será cumprido, garantindo que o valor será pago, entretanto, pode-se concluir que são plenamente distintos.

4.2.  DA SOLVABLIDADE DO DEVEDOR

a) Bem de família involuntário: Ao instituir bem de família involuntário, o interessando não precisa dirige-se ao cartório de registro de imóveis para lavrar a escritura, pois este é automático. Contudo, se por acaso este bem é alvo de penhora anterior ao fato almejado, a Lei deixa bem claro, em seus artigos, que a penhora estará valendo-se para execução mesmo quando do decorrer da promulgação, contudo, se houvesse algum débito anterior à Lei, essa também seria incluída na impenhorabilidade, então, o que é de fato aceito é que seria penhorado outro bem que não fosse bem de família.

Como elucida Santiago:

“Na instituição do bem de família voluntário se exige a solvabilidade para evitar que ao constituir o bem de família o devedor venha a fraudar seus credores. Como o bem de família involuntário foi estabelecido por Lei, no primeiro momento da vigência da Lei não se configura, em tese, a fraude aos credores, sendo que a própria Lei determina que a regra se aplique inclusive às penhoras em curso quando da promulgação da Lei (art. 6º).

O art. 6º usa uma terminologia imprópria porque emprega a expressão "cancelamento da execução", mas nem esta, nem o débito em si, podem ser cancelados. O que, de fato, pode ser cancelada é a penhora, para que sejam penhorados outros bens do devedor que não o que a Lei passou a considerar bem de família.

Obviamente, as penhoras que existiam àquela época eram provenientes de cobranças de débitos anteriores à Lei. Assim, beneficiaram-se as dívidas anteriores à instituição, que ocorreu no momento do início da vigência da Lei. A questão da solvabilidade em relação às dívidas anteriores à instituição não é, dessa forma, requisito essencial para a constituição do bem de família involuntário, o que representa uma terceira distinção em relação ao bem de família voluntário.

Grande polêmica se gerou em torno desse dispositivo porque alguns autores consideram a penhora ato jurídico perfeito e o art. 5º, XXXVI, da CF/88, proíbe a retroatividade da Lei em prejuízo do ato jurídico perfeito.

Houve uma divisão da doutrina e da jurisprudência. A controvérsia está dirimida perante o STJ, o que resultou na Súmula nº 205, que permitiu a aplicação da Lei para o cancelamento das penhoras em curso quando do início da vigência da Lei. Prevaleceu, então, o entendimento que priorizava a finalidade social da norma e reconhecia a penhora como ato preparatório, não autônomo, ato-meio de outro ato complexo que é a expropriação do bem, este sendo o ato-fim.

Isso não quer dizer que a Lei nº 8.009/90 não tenha meios de coibir a má-fé e a fraude a credores. A regra do art. 4º, caput e § 1º, pune os casos de aquisição de imóvel residencial mais valioso de má-fé, usando a Lei para fraudar credores. Nesses casos, se o primeiro imóvel, menos valioso, ainda se encontrar em propriedade do devedor, a impenhorabilidade recairá sobre ele; mas se o primeiro imóvel foi alienado, desconstitui-se o ato para que a impenhorabilidade recaia sobre ele.” (SANTIAGO, 2004, p. 9).

O que se quer esclarecer neste sentido é que se o instituidor tem ou não débitos anteriores à criação da Lei nº 8.009/90 não é requisto para se incluir no dispositivo legal, ato esse que difere da instituição do bem de família voluntário, em que sua instituição é contrária a do involuntário.

b) Bem de família voluntário: Para constituir o bem de família voluntário é necessário a solvabilidade de instituidor no momento em que este assim quiser deixá-lo livre de penhora por parte de credores, salvo os excludentes contidos em Lei, entretanto, a partir desse momento é que se tem na íntegra a impenhorabilidade, porém, pode existir débitos anteriores, contudo deve o instituidor, possuir outros bens para que possa quitar a dívida ao tempo da devida instituição, por outro lado, se o proprietário não garantir a total solvência, este não poderá instituir como bem de família para efeitos de impenhorabilidade.

Reiterando estas ideias, Santiago afirma:

“O que os dispositivos legais exigem em relação às dívidas anteriores à instituição é a solvabilidade, ou seja, podem existir dívidas anteriores desde que o instituidor tenha patrimônio suficiente para saldar essas dívidas ao tempo da constituição. O que a Lei visa coibir é a fraude contra credores, por isso não se justifica negar constituição de bem de família a proprietário solvente.

Ficando caracterizada a insolvência do proprietário em relação às dívidas anteriores ao bem de família voluntário, não valerá o ato de instituição, devendo ser anulada, e a execução da dívida poderá atingir o imóvel livremente.

De acordo com esse raciocínio, nada impede se a instituição do bem de família sobre imóvel hipotecado, pois neste caso há uma dívida anterior à instituição, só que garantida pela hipoteca, e, caso comprovada a insolvabilidade do instituidor ao tempo da instituição do bem de família, o imóvel será atingido igualmente pela execução.” (SANTIAGO, 2004, p.6).

4.3 A RECENTE DECISÃO DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL

Diante de todo o embate doutrinário, o STF julgou Recurso Extraordinário decidindo que o único bem de família do fiador é penhorável. Houve um entendimento de sete dos votos que o fiador decide se avaliza ou não um contrato de aluguel e, se escolher fazer, assumirá o risco de arcar com os riscos que a condição de fiador implica.

Segue a decisão:

“Recentemente, precisamente em 08 de fevereiro do ano presente (2006), o Supremo Tribunal Federal (STF), em sede de Recurso Extraordinário nº 407688, da Relatoria do Ministro Cezar Peluso, por maioria de votos (7 votos a 3), negou provimento ao Recurso Extraordinário e, por conseguinte, manteve a decisão do Tribunal de Alçada de São Paulo, que determinou a penhora do bem de família do fiador.

Em síntese, o Supremo Tribunal Federal decidiu que o único imóvel (bem de família) de uma pessoa que assume a condição de fiador em contrato de locação pode ser penhorado, em caso de inadimplência do inquilino.

Na casuística, a tese do recorrente (o fiador) era de que a exceção do artigo 3º inciso VII da Lei nº 8.009/90 ofendia o artigo 6º da Carta Magna, alterado pela Emenda Constitucional nº 26/2000, que incluiu a moradia no rol dos direitos sociais constitucionalmente amparados.

Conforme extrato de notícia produzida pela Seção de Pesquisa de Jurisprudência do Supremo Tribunal Federal (STF), "durante o julgamento pelo plenário do STF, os ministros debateram duas questões: se deve prevalecer a liberdade individual e constitucional de alguém ser ou não fiador, e arcar com essa respectiva responsabilidade, ou se o direito social à moradia, previsto na Constituição, deve ter prevalência.

Isso implicaria dizer se o artigo 3º, inciso VII da Lei nº 8.009/90 estaria ou não em confronto com o texto constitucional, ao permitir a penhora do bem de família do fiador, para o pagamento de dívidas decorrentes de aluguel.

O relator da matéria, ministro Cezar Peluso, entendeu que a Lei nº8.009/90 é clara ao tratar como exceção à impenhorabilidade o bem de família de fiador. Segundo o ministro Peluzo, o cidadão tem a liberdade de escolher se deve ou não avalizar um contrato de aluguel e, nessa situação, o de arcar com os riscos que a condição de fiador implica.

O ministro Peluzo não vê incompatibilidade entre o dispositivo da Lei e a Emenda Constitucional nº 26/2000 que trata do direito social à moradia, ao alterar o artigo 6º da Constituição Federal, sendo acompanhado por seis outros ministros.

Contrariamente, o ministro Eros Grau divergiu do relator, no sentido de afastar a possibilidade de penhora do bem de família do fiador, citando como precedentes dois Recursos Extraordinários (RE 352940 e 449657), relatados pelo ministro Carlos Velloso (aposentado) e decididos a fim de impedir a penhora do único imóvel do fiador. Nesses dois recursos entendeu-se que o dispositivo da Lei ao excluir o fiador da proteção contra a penhora de seu imóvel feriu o princípio constitucional da isonomia.

O voto divergente do ministro Eros Grau foi acompanhado pelos ministros Carlos Ayres Britto e Celso de Mello, sob o argumento de que a Constituição ampara a família e a sua moradia, nos termos do artigo 6º da Carta Magna, de forma que o direito à moradia seria um direito fundamental de 2ª geração, que tornaria indisponível o bem de família para a penhora.

Ao fim, prevaleceu o entendimento do Relator, por 7 votos a 3, que negou provimento ao RE, mantendo a decisão do Tribunal de Alçada de São Paulo, que determinou a penhora do bem de família do fiador”.

4.4  POSICIONAMENTO DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR

Costumeiramente, vêem-se muitas pessoas aderindo a contratos de locação, digo, inquilino com o devido fiador, porém muitas das vezes sem se quer ler o que a imobiliária escreveu para o fiador assinar, pois no caso é o de maior potencial contratante. Mas, o fiador não imagina que esses tipos de contratos constam de cláusulas abusivas e obscuras, como por exemplo: renúncia ao benefício de ordem, isto é, se o inquilino por qualquer que seja o motivo, não adimplir com o acordado, presume-se inadimplente, porém se o mesmo insiste em não pagar, o locador tem o total direito de acionar a justiça. Esta, por sua vez, acatará o pedido, podendo penhorar o único bem do fiador para pagar uma dívida que não fora por ele contraída.

Vejamos o que o Código de Defesa do Consumidor previne em seu artigo 6º:

“Art. 6º São direitos básicos do consumidor:

I – a proteção da vida, saúde e segurança contra os riscos provocados por práticas no fornecimento de produtos e serviços considerados perigosos ou nocivos;

II – a educação e divulgação sobre o consumo adequado dos produtos e serviços, asseguradas a liberdade de escolha e a igualdade nas contratações;

III – a informação adequada e clara sobre os diferentes produtos e serviços, com especificação correta de quantidade, características, composição, qualidade e preço, bem como sobre os riscos que apresentem;

IV – a proteção contra a publicidade enganosa e abusiva, métodos comerciais coercitivos ou desleais, bem como contra práticas e cláusulas abusivas ou impostas no fornecimento de produtos e serviços;

V – a modificação das cláusulas contratuais que estabeleçam prestações desproporcionais ou sua revisão em razão de fatos supervenientes que as tornem excessivamente onerosas;

VI – a efetiva prevenção e reparação de danos patrimoniais e morais, individuais, coletivos e difusos;

VII – o acesso aos órgãos judiciários e administrativos com vistas à prevenção ou reparação de danos patrimoniais e morais, individuais, coletivos ou difusos, assegurada a proteção Jurídica, administrativa e técnica aos necessitados;

VIII – a facilitação da defesa de seus direitos, inclusive com a inversão do ônus da prova, a seu favor, no processo civil, quando, a critério do juiz, for verossímil a alegação ou quando for ele hipossuficiente, segundo as regras ordinárias de experiências;

IX – (Vetado);

X – a adequada e eficaz prestação dos serviços públicos em geral.”

Do exposto acima, podemos extrair que o inciso IV esclarece sobre cláusulas abusivas, ficando óbvio o descumprimento dos direitos do consumidor, pois o inquilino e o fiador são consumidores e são vítimas de métodos comerciais desleais e práticas abusivas, pois, as letras são muito pequenas e de difícil interpretação por parte dos fiadores, que são muitas vezes analfabetos.

Como ilustra Hora Neto:

“De tal sorte, quando celebram o instrumento – contratam e se vinculam nos moldes do pacta sunt servanda – aderindo às cláusulas no mais das vezes abusivas, obscuras, ambíguas, sem que o contratante mais forte lhes advirta previamente, elucidando, por exemplo, sobre o real significado da renúncia ao benefício de ordem, em sede de fiança, e perante o atual posicionamento jurisprudencial dominante, qual seja: que se o inquilino não adimplir com sua obrigação (pagar os aluguéis), o locador executará o fiador (devedor solidário, em face da renúncia ao benefício de ordem), e o fiador perderá seu único imóvel residencial(bem de família), para quitar uma dívida que não lhe pertence, sendo que o fiador, depois, ao fazer a ação regressiva contra o inquilino, este nada pagará, posto que sua casa de morar acha-se protegida pelo manto da impenhorabilidade. E é essa advertência, que, sem dúvida, deveria está inscrita com letras garrafais nos contratos de locação – mas que, na prática, nada disso acontece, vez que as cláusulas são redigidas de forma pouco clara, obscura, levando ao fiador a assinar o instrumento por mera amizade ou movido por relação de parentesco com o locatário, até porque a fiança, em regra, é um contrato benéfico.

Convencido estou, pois, que o contrato de locação residencial é um contrato de adesão por excelência, em sua larguíssima incidência cotidiana, além do que é um contrato de consumo, devendo assim ser regido pelo Código de Defesa do Consumidor.

De fato, entendo que o locatário e respectivo fiador são eminentemente consumidores, precisamente porque contratam via administradoras de imóveis ou empresas imobiliárias, e se utilizam de um produto (imóvel), por determinado período, como destinatário final, mediante a contrapartida de uma remuneração (aluguel) paga ao fornecedor do produto, o locador (proprietário do produto), ou seja, do imóvel.” (HORA NETO, 2007, p.12).

4.5. O PROJETO DE LEI Nº 6.413/2009 E A IMPENHORABILIDADE DO IMÓVEL

Roque e Junqueira (2010) nos esclarecem que tramita na Câmara dos Deputados o Projeto de Lei nº 6.413/2009 que visa exclusivamente proibir a penhora do bem da família do fiador para pagamento de débitos locatícios. Ressalte-se que já houve outras tentativas de alterar a Lei sobre a impenhorabilidade do bem de família, como os Projetos de Lei n° 3452/04 e n° 4728/98, sem, contudo, terem sido aprovados em definitivo.

No mercado de locações em que vivemos existe uma variedade de garantias no ato da locação, não se restringindo o locador, pois este poderá escolher qual melhor se adéqua, porém, a figura do fiador é a mais utilizada pelo locatário, pois este é mais aceito no mercado e menos onerosa.

Como nos ensina Roque e Junqueira:

“Pelo artigo 37, da Lei do Inquilinato, o locador pode determinar que o locatário ofereça uma das quatro modalidades de garantia locatícia: caução, fiança, seguro de fiança locatícia ou cessão fiduciária de quotas de fundos de investimento.  Com exceção da locação por temporada, nas demais espécies de locação a fiança é certamente a modalidade mais utilizada, especialmente porque, dentre as opções facultadas pela Lei, a fiança é a garantia mais acessível e menos onerosa para o locatário.” (ROQUE; JUNQUEIRA, 2010, p.5).

Existe um leque de opções que leva o locatário a escolher, porém, é fundamental a inclusão de um dispositivo que garanta que as dívidas oriundas do bem locado sejam sanadas. Contudo, se excluir do fiador a penhora dos bem de família, consequentemente iria ficar sem perspectiva nenhuma no adimplemento.

Reiterando estas ideias, Roque e Junqueira afirmam:

“A garantia nos contratos de locação é fundamental para assegurar ao locador o cumprimento do que foi avençado, e, se a Lei furtar do locador a possibilidade de executar o imóvel do fiador, seja em uma locação residencial ou não, acabará resultando em insegurança, pois, certamente, a fiança, que é a modalidade mais tradicional e acessível aos locatários, ficará fragilizada.
A possibilidade de alcançar o imóvel do fiador, prevista no art. 3º, VII, da Lei nº 8.009/90, visa facilitar a concretização das locações, vez que dá também oportunidade aos proprietários de um único imóvel de serem aceitos como fiadores. Portanto, alterar a Lei para que o imóvel destinado à família do fiador não possa ser penhorado judicialmente a fim de honrar os encargos da locação, importaria em inviabilizar a fiança, fato que não é condizente com o próprio espírito da Lei que visa facilitar e não impedir locações
.” (ROQUE; JUNQUEIRA, 2010, p.5).

Com base nas palavras dos ilustres doutrinadores, verificamos a importância de ser viável, que a figura do fiador permaneça, pois é essa garantia que se faz necessária para que o mercado evolua, mas também dá o privilégio da pessoa que tem um só imóvel ter aceitação como fiador.

5  CONCLUSÕES

Esta monografia buscou identificar as divergências trazidas com a vigência da Lei  nº 8.009/90, que traz em seu bojo a polêmica da penhorabilidade do bem de família do fiador, trazendo inúmeras indagações contrárias a respeito do direito à moradia.

Sem dúvidas, a evolução no Brasil foi adequada, no que diz respeito à proteção da família, elucidada no artigo 1.711 a 1.722 do Código Civil de 2002, mas era pouco evidenciado no Código de 1916. Porém, com a Lei ora citada no parágrafo anterior, é que se conquistou uma abrangência maior para pessoas em todo o país, no que diz respeito à moradia, e a uma vida mais digna.

Pode-se dizer que faz jus a esse dispositivo deixar a salvo o bem de família que não é só a residência, mas também plantações, terreno, dentre outros constantes em Lei. Contudo existem pessoas que possuem mais de um imóvel e este não será protegido, pois será alvo de penhorar o segundo. Outra vantagem que tal Lei trouxe de benefício foi a total faculdade que o possuidor tem de, a qualquer hora, poder extinguir.

Destacou-se a ressalva do fiador, pois a prática comum era que o fiador concordava em assinar um contrato de fiança se valendo que o seu imóvel ou bem de família não seria de jeito nenhum tomado para pagar a dívida que o devedor principal havia deixado. Com a nova Lei, isso perdeu força, pois o bem de família do fiador, que dá garantia de cumprimento do dever, poderá ser penhorado.

Os artigos 1.711 e 1.712 do Código Civil de 2002 trazem em sua redação que pode o instituidor nomear uma residência para que esta fique protegida de penhora, porém, só poderá se não ultrapassar um terço do patrimônio do mesmo. Aqui se destaca que esse dispositivo contempla as pessoas de maior nível financeiro, pois como uma pessoa que tem apenas uma casinha vai se valer desses requisitos? Contudo, esse meio de instituir fica mais vantajoso para as classes ricas.

O Supremo Tribunal Federal percebe que a partir do momento em que o fiador assume o risco que o devedor irá pagar, ele também terá que cumprir com sua palavra, então, entende-se que tal posição é eficaz, se não o fosse o locador ou credor perderia tudo que lhe era devido.

Compreende-se, desse modo, que seria mais humano levantar todos os bens do devedor principal e penhorá-lo. Só após esse ato, é que se penhorariam os bens do fiador, porém a Constituição Federal assegura o direito à moradia, mas só não faz o mesmo com o fiador, pois a única garantia que o credor tem é esta.

 

Referências
BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988.
BRASIL. Emenda Constitucional nº 26, de 14 de fevereiro de 2000. Altera a redação do art. 6o da Constituição Federal.
BRASIL. Lei nº 8.009 de 29 de março de 1990. Dispõe sobre a impenhorabilidade do bem de família.
BRASIL. Lei nº 8.245 de 18 de Outubro de 1991. Dispõe sobre as locações dos imóveis urbanos e os procedimentos a elas pertinentes.
BRASIL. STF – Supremo Tribunal Federal. Recurso Extraordinário nº. 407688 de 08/02/2006. Relator: Ministro Cezar Peluso.
DINIZ, Maria Helena. Curso de direito Civil Brasileiro, vol. 5: direito de família. 22º ed. São Paulo: Saraiva, 2007.
GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito Civil Brasileiro, vol. 6: direito de família. 7º ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2010.
HORA NETO, João. O bem de família, a fiança locatícia e o direito à moradia. Jus Navigandi, Teresina, ano 12, n. 1476, 17 jul. 2007. Disponível em: http://jus.com.br/revista/texto/10149/o-bem-de-familia-a-fianca-locaticia-e-o-direito-a-moradia/print . Acesso em: 15 maio 2012.
ROQUE, Caroline Meireles; JUNQUEIRA, André Luiz. Da possibilidade de penhora do bem de família do fiador. Críticas ao Projeto de Lei nº 6.413, de 2009. Jus Navigandi, Teresina, ano 15, n. 2508, 14 maio 2010. Disponível em: http://jus.com.br/revista/texto/14853/da-possibilidade-de-penhora-do-bem-de-familia-do-fiador/print . Acesso em: 10 maio. 2012.
SANTIAGO, Mariana Ribeiro. Bem de família. Jus Navigandi, Teresina, ano 9, n. 369, 11 jul. 2004. Disponível em: http://jus.com.br/revista/texto/5428/bem-de-familia/print. Acesso em: 15 maio 2012.
VENOSA, Sílvio de Salvo. Código Civil Interpretado, São Paulo: Atlas, 2010.
Notas:
[1] Monografia apresentado à disciplina de Metodologia de Pesquisa em Direito do Curso de Graduação em Direito da Faculdade Maurício de Nassau – Unidade João Pessoa, como requisito parcial para obtenção do título de bacharel em Direito, sob a orientação do Prof. Ms. Fábio Firmino Araújo.
[2] STF – Supremo Tribunal Federal
[3] Clóvis Beviláqua – Jurista Cearense, autor do projeto do código civil de 1916.
[4] STJ – Superior Tribunal de Justiça
[5] CC – Código Civil
[6] p.u. – Parágrafo Único
[7] Lei 8.245/91 ou Lei do Inquilinato

Informações Sobre o Autor

Luzivan Paulino Gomes

Bacharel em Direito, Formado pela Faculdade Maurício de Nassau. Pós-graduando em Direito Civil.


Equipe Âmbito Jurídico

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