A imunidade tributária como instrumento de alcance às finalidades do Estado: análise teleológica do instituto à luz da doutrina e jurisprudência

Resumo: A não cobrança de tributos por meio imunidade tributária, embora seja iniciativa indubitavelmente negativa: “non facere”, quando observada em face de suas finalidades e conseqüências, revela-se dotada de plena positividade, oriunda de propósitos prestigiados pela Constituição Federal. Nesse trabalho será explorado o conceito de imunidades tributárias, sua expressividade constitucional e de que forma podem ser vistas como ações comissivas em prol dos objetivos e fundamentos do Estado Brasileiro.


Palavras-chave: Imunidades Tributárias. Interpretação. Objetivos do Estado.


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Abstract: The non-charging of taxes through tax immunity, although initiative is undoubtedly negative, “non facere,” when observed in the face of its purposes and consequences, it is provided with full positivity, coming from prestigious purposes the Federal Constitution. In this work will be explored the concept of tax immunity, their constitutional expressiveness and how they can be seen as commissive actions in furthering the aims and principles of the Brazilian State.


Keywords: Tax immunity. Interpretation. Objectives of the State.


Sumário: I. Apresentação do trabalho. II. Breve apanhado histórico das Imunidades. II.1 Brasil. III. Concepções acerca da matéria. III.1 – Conceito. III.2 Aspectos de validade da norma imunizante. III.3 Classificação Doutrinária. III.3.a. Quanto à amplitude: Imunidades genéricas e específicas. III.3.b. Quanto ao modo de incidência: subjetivas, objetivas e mistas. III.3.c. Quanto à explicitude: implícitas e explícitas. IV. Finalidades do Estado – objetivos e fundamentos trazidos pela Constituição. Inciso I – Soberania. Inciso II – Cidadania. Inciso III – Dignidade da pessoa humana. Inciso III – Dignidade da pessoa humana. V – As imunidades tributárias em face das finalidades do Estado Brasileiro. V.1 Imunidades Genéricas. a)Imunidade recíproca as pessoas políticas; b) Templos de qualquer culto; c) Imunidade dos Partidos Políticos; d) Entidades Sindicais de Trabalhadores; e) Instituições de Educação e Assistência Social; e.1 – Instituições de Educação; f) Entidades de Assistência Social; g) Imunidade dos jornais, livros, periódicos e o papel destinado a sua impressão; V.2 Imunidades Específicas – breves considerações; a) ITR e a dignidade da pessoa humana; b) ITBI e livre Iniciativa; c) Imunidade de taxas e cidadania; d) As exportações e o desenvolvimento nacional; e) Demais imunidades; VI. Conclusões. Referências bibliográficas.


I. Apresentação do trabalho


A acepção do termo “imunidade” sugere uma posição de isenção a um determinado fator, de modo que opera sempre em face de algo, ao qual não se submete ou não se confronta. Logo, não se concebe a imunidade por si só, sem expressa menção a quê se é imune.


O presente trabalho pauta sobre a imunidade na mesma concepção, sendo esta em face da atividade estatal de cobrar tributos.


Com o intuito de explicá-la e situá-la no arcabouço da disciplina tributária, foram criadas pela doutrina definições como “desoneração”, “hipótese de não incidência de tributos”, “exclusão da competência tributária”, enfim, terminologias distintas, contendo cada uma delas vasta carga semântica e axiológica embasada no direito.


Sem adentrar no mérito da discussão, que não é o mister desse trabalho, é possível falar, de uma forma geral, que a imunidade se revela uma limitação ao poder de tributar[1], usando-se os próprios termos da Constituição.


Tal limitação obsta não somente a incidência de tributo ou a constituição da obrigação tributária, mas o próprio exercício da competência tributária, de modo que inadmissível a própria ocorrência do fato gerador, já que o tributo nem chega a existir no mundo jurídico.


Por isso, à primeira face, fica bastante claro que a imunidade opera sempre negativamente frente à tributação, sendo uma forma de coagir o Estado a se omitir de cobrar o tributo, não em uma omissão opcional, mas constitucionalmente obrigatória.


O presente trabalho, resgatando o sentido teleológico do instituto, buscará demonstrar que a imunidade opera não só negativamente, mas em ato comissivo no seio social, econômico e político, superando o teor abstencionista sugerido pela terminologia e se revelando uma verdadeira atitude em prol dos valores consagrados na Carta Magna.


II. Breve apanhado histórico das Imunidades


Ao longo da história a imunidade tributária surgiu como um privilégio. Primeiro aos nobres, depois aos clérigos, as castas ditas superiores foram se eximindo do pagamento de tributos restando para os pobres tal sofrível incumbência.


Assim foi com os escravos, os derrotados em guerras, os vassalos feudais, até que, pouco a pouco, com o surgimento e consolidação do liberalismo, houve uma verdadeira democratização das imunidades[2].


Nota-se, desta feita, mais que exceção: a imunidade a tributos consistia em verdadeiro privilégio odioso, que desrespeitava princípios hoje consagrados pelos estudiosos, como a isonomia, capacidade contributiva, dentre outros.


Por outro lado, um caráter distinto, que a vislumbraria como socialmente aceita, já existia em outros estados, em menor escala, como na Índia, oferecida aos anciãos, paralíticos ou cegos[3], ou na própria Roma, a “imunittas” incidente sobre os bens públicos. A força dessa modalidade de imunidade, todavia, somente ganhou força após o advento do iluminismo, que antes mesmo de discutir sobre a carga tributária, solidificou a base de direitos fundamentais e liberdades individuais, estes, intangíveis pelo Estado.


Foi a partir de então que em face de garantias constitucionalmente estabelecidas a favor dos cidadãos, o Estado cedeu à quase expropriação outrora empreendida para então vislumbrar um possível caráter social do tributo, admitindo que este deveria respeitar alguns valores vitais e intransponíveis ao confisco estatal.


II.1 Brasil


O Direito positivo brasileiro passou a prever tal forma de desoneração constitucionalmente definida a partir da Constituição do Império de 1824. Com a Constituição de 1891, no entanto, passou a haver expressa previsão da imunidade recíproca entre o Governo Central e os Estados.


Posteriormente, nos textos constitucionais de 1934, 1937 e 1945, 1946 e 1967, o referido fenômeno de não incidência foi sendo alterado, ora abrangendo diferentes situações, ora sendo restringido. E os diversos Textos Constitucionais, como era de se esperar, foram tratando a imunidade de acordo com as convicções políticas e econômicas de suas épocas.


Com o desenvolvimento histórico do constitucionalismo brasileiro, viu-se a necessidade de garantir o afastamento tributário de algumas atividades e de alguns bens e serviços. Passaram estes, pois, a ter uma proteção constitucional contra a tributação.


Hoje, a dita constituição cidadã prevê dezenas de casos de imunidades, sendo o ápice do instituto em comparação às cartas anteriores.


III. Concepções acerca da matéria


III.1 – Conceito


A forma de vislumbrar o conceito de imunidades tributárias deve partir da sua natureza jurídica, de como foram estabelecidas pelo ordenamento jurídico e sua importância dentro do arcabouço normativo em que se inserem.


Ricardo Lobo Torres, com a clareza que lhe é peculiar, leciona que a imunidade tributária:


“é uma relação jurídica que instrumentaliza os direitos fundamentais, ou uma qualidade da pessoa que lhe embasa o direito público à não incidência tributária ou uma exteriorização dos direitos da liberdade que provoca a incompetência tributária do ente público.”[4]


Em outro aspecto, atestando a natureza negatória e abstencionista do instituto, Souto Maior disciplina:


“É a imunidade uma limitação constitucional ao poder de tributar. Mais precisamente ainda: a eficácia específica do preceito imunitório consiste em delimitar a competência tributária aos entes públicos. Porquanto consiste numa limitação constitucional, a imunidade é uma vedação, uma negativa, uma inibição para o exercício da competência tributária. A imunidade é um princípio constitucional de exclusão da competência tributária.”[5](grifos acrescidos)


Conforme já dito supra, a imunidade em sua própria etimologia sugere tal negação, que, embora acertada, não pode ultimar a hermenêutica do instituto, pois quando levada ao sentido teleológico – como se demonstrará adiante – supera esta característica, invertendo-a.


Perceba ainda, do conceito de Souto Maior, a sugestão de que seria a imunidade um princípio constitucional, posição hoje minoritária da doutrina, e contraposta por Regina Helena Costa, ao afirmar ser a imunidade tributária:


“exoneração, fixada constitucionalmente, traduzida em norma expressa impeditiva da atribuição de competência tributária ou extraível, necessariamente, de um ou mais princípios constitucionais, que confere direito público subjetivo a certas pessoas, nos termos por ela delimitados, de não se sujeitarem à tributação[6].


Como já salientado, entendemos que as imunidades tributárias não constituem princípios, mas sim aplicações de um princípio, o qual denominamos princípio da não-obstância do exercício de direitos fundamentais por via da tributação[7]”.


Parece acertada tal posição, admitindo ainda que tal “aplicação de princípio” possa alcançar, algumas vezes, a própria substância do princípio, conforme já demonstrado Humberto Ávila, que a distinção entre princípio e regra não é radical, pois se deve optar pelo caráter pluridimensional dos enunciados normativos, que podem “experimentar uma dimensão imediatamente comportamental(regra), finalística (princípio) e/ou metódica(postulado)[8].


Resta, portanto, a conclusão de que a norma jurídica imunizante abrange tanto o caráter principiológico, como nos casos das imunidades recíproca, dos templos e ao tráfego de bens, por exemplo, ou mesmo de regra, quando exige o cumprimento de requisitos peremptórios para seu exercício, em verdadeiras hipóteses do ‘tudo ou nada’.


Em arremate, sugere-se como um primeiro conceito de imunidade a hipótese de não incidência tributária[9], constitucionalmente definida, cujo conteúdo enseja caráter ora de princípio, ora de regra, a vedar o exercício da competência tributária.


III.2 Aspectos de validade da norma imunizante


Miguel Reale, ao tratar dos aspectos de validade das normas jurídicas, sugere a seguinte classificação: em validade formal ou técnico-jurídica(vigência); validade social(eficácia ou efetividade); e validade ética (fundamento)[10].


Nesse sentido, aduz-se que as imunidades, quanto à vigência, são irrevogáveis, porquanto direito fundamental; em relação à eficácia, são normas declaratórias, já que, pelo mesmo motivo, preexistem a qualquer dispositivo que as autorizem[11] (o caráter constitutivo também é admitido pela doutrina, em sua corrente positivista[12]); operam erga omnes, e possuem fundamento na liberdade do indivíduo frente ao império estatal.


III.3 Classificação Doutrinária


A doutrina, com interesse didático, estabelece alguns critérios de diferenciação dos diferentes tipos de imunidade tributária. As diferentes classificações serão rapidamente explanadas para que, nas subseqüentes menções, seja oferecida a respectiva remissão aos seus conteúdos.


III.3.a. Quanto à amplitude: Imunidades genéricas e específicas


Expressas nas alíneas do Art. 150, VI, da Constituição Federal, as imunidades genéricas vedam todas as pessoas políticas a cobrarem os impostos sobre patrimônio, renda ou serviços das entidades ali mencionadas. As específicas ou tópicas, são restritas a um único e singular tributo e dirigidas a uma única pessoa política.


III.3.b. Quanto ao modo de incidência: subjetivas, objetivas e mistas


As imunidades subjetivas são outorgadas a determinadas pessoas: recaem sobre sujeitos; as objetivas, pelo próprio nome, recaem sobre fatos, bens ou situações: coisas, e as mistas, compõem ambos os elementos: indicam o ente beneficiado pela exoneração constitucional atrelando um parâmetro específico próprio, v.g. Art. 153, §4º, CF.


III.3.c. Quanto à explicitude: implícitas e explícitas


As imunidades explícitas são aquelas hospedadas em normas expressas e, de modo analítico, existem unicamente por causa desta previsão, como a imunidade dos templos e dos livros.


Já as imunidades implícitas são extraíveis de princípios constitucionais e existiriam mesmo se não houvesse menção destas na Carta, como a imunidade recíproca, dada a ausência de capacidade contributiva das pessoas políticas, a força do princípio federativo e da autonomia dos municípios, por exemplo.


IV. Finalidades do Estado – objetivos e fundamentos trazidos pela Constituição


A Carta de 1988, em seu Art. 1º, preleciona:


“Art. 1º A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos:


I – a soberania;


II – a cidadania;


III – a dignidade da pessoa humana;


IV – os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa;


V – o pluralismo político.”


O preceptivo indica, de forma clara, o perfil do Estado Brasileiro e a importância que este oferece à sua Constituição. Nesse simples artigo, pode-se vislumbrar, por exemplo, aspectos desde a forma de Estado, de Governo até o sistema econômico adotado.


No intuito de embasar a construção deste tópico, serão traçadas linhas sobre cada um dos incisos, em análise conjunta – quando cabível – com os fundamentos do da República, insculpidos no Art. 3º da Letra Máxima[13].


Inciso I – Soberania


Exauriente a conceituação trazida por Marcelo Caetano:


“um poder político supremo e independente, entendendo-se por supremo aquele que não está limitado por nenhum outro na ordem interna e por poder independente aquele que, na sociedade internacional, não tem de acatar regras que não sejam voluntariamente aceites e está em pé de igualdade com os poderes supremos dos outros povos”[14]


Ora, a soberania é o poder mais elevado dentro do Estado e garante, fora dele, condições iguais de diálogo com outros pares. Demonstra a solidez e independência do país, seja perante seus súditos, seja na sua autodeterminação entre os povos.


Inciso II – Cidadania


Trata-se do reconhecimento estatal do cidadão como indivíduo de direitos frente ao Estado, integrante e indissociável da sociedade. É aos cidadãos que se dirigem os objetivos do Estado, já que, se este existe, na teoria do Contrato Social, é por deliberação daqueles, no exercício da respectiva cidadania.


A construção da sociedade justa, livre e solidária, assim como a não-discriminação, são objetivos visando à cidadania em seu sentido social, muito além da simples cidadania política, de nacional no gozo de direitos políticos.


Inciso III – Dignidade da pessoa humana


Ensina com maestria Dirley da Cunha Júnior:


“A dignidade da pessoa humana assume relevo como valor supremo de toda sociedade para o qual se reconduzem todos os direitos fundamentais da pessoa humana.[15]


A dignidade revela-se valor moral, ético e espiritual inerente à pessoa, impondo o respeito dentre outros indivíduos e perante o Estado, que não pode transpor este mínimo invulnerável[16] que todo estatuto jurídico deve assegurar. A pessoa é, nesta perspectiva, o valor último[17], o valor supremo da democracia, que a dimensiona e humaniza[18].


Os objetivos do Estado têm como pressuposto fundamental a dignidade de seus cidadãos, já que esse é o básico, o elementar que deve ser garantido, sendo, assim, o parâmetro mor para toda e qualquer implantação de políticas públicas.


Inciso IV – os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa


O crescimento de todo e qualquer país advém da força motriz do seu proletariado. O trabalho é fator de crescimento, condição de sustento e veículo para alcance da dignidade, sendo, por isso, valorado pela Constituição Federal em diversas passagens, como os Arts. 6º, 7º, 8º e seus diversos incisos.


Quanto à livre iniciativa, esta consta dentre os fundamentos da ordem econômica(Art. 170, caput), esclarecendo que cabe aos particulares a exploração de atividades econômicas, nos moldes do sistema capitalista, qual seja o adotado pelo Brasil.


Esclarece José Afonso da Silva, por fim, a amplitude que o termo designa, pois “liberdade de iniciativa envolve a liberdade de indústria e comércio ou liberdade de empresa e a liberdade de contrato”[19].


Inciso Vo pluralismo político.


Quanto a tal fundamento, ensina a Doutrina:


“É fundamento que assegura a realização dos postulados democráticos, garantindo a multiplicidade de opiniões, de crenças, de convicções e de ideias, que se manifestam normalmente por instituições como as associações, as entidades sindicais e, em especial, os partidos políticos”[20].


Tal inciso revela a preocupação do legislador em garantir a liberdade de convicção filosófica e política, essenciais ao exercício da democracia[21], aos seus cidadãos, autorizando a livre organização e participação em partidos políticos.


V – As imunidades tributárias em face das finalidades do Estado Brasileiro


No Brasil, listam-se 7 hipóteses de imunidades genéricas e 26 de imunidades específicas. Aqui serão analisadas com mais profundidade as primeiras, dado seu quilate de afastamento dos impostos em geral, e, em breve exposição, as segundas, priorizando aquelas que consubstanciem a tese defendida.


V.1 Imunidades Genéricas


a)Imunidade recíproca as pessoas políticas:


 As pessoas políticas não podem se tributar reciprocamente por meio de impostos, assim prevê a Carta:


 “Sem prejuízo de outras garantias ao contribuinte, é vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios instituir imposto sobre patrimônio renda e serviços uns dos outros” (art. 150, VI, “a” da CF).


Tal espécie decorre do Princípio Federativo, que fundamenta a forma de Estado assumida pelo Brasil, sendo cláusula pétrea insculpida no Art. 60, § 4º, I, da Carta Magna. Nas classificações doutrinárias, prevê-se como genérica, subjetiva e implícita.


O primeiro aspecto que se vislumbra é a falta de capacidade contributiva dos entes federativos. Tais pessoas não a possuem porque seus recursos destinam-se à prestação dos serviços públicos que lhes incumbem[22], por isso, não podem ser tributadas. Denote-se que é vedada a exploração de atividades econômicas pelo Estado, sendo circunstância excepcionalmente autorizada e, caso o seja, resta enquadrada sob o regime de Direito Privado.


Em segundo lugar, demonstrando o aspecto ativo/positivo do instituto, buscou o constituinte esclarecer a ausência de supremacia ou superioridade de um ente federativo sobre outro. Os Estados-membros, a União e os Municípios convivem em pé de igualdade, tanto o é que somente tributos contraprestacionais têm a cobrança autorizada, como a taxa e contribuição de melhoria.


Desta feita, constatado o nivelamento entre os entes, buscou-se impedir relações de ‘superioridade’ injustas entre os entes, em casos de perseguição política entre chefes do Executivo ou, no mesmo sentido, favorecimentos e apadrinhamentos[23], os denominados privilégios odiosos.


Então, partindo com o intuito de proteger a solidez da federação e evitar iniqüidades, o constituinte criou uma forma impositiva de respeito mútuo entre os entes, impossibilitando que um tribute o outro, na medida de suas esferas.


Em terceiro lugar, demonstrando que a iniciativa é de proteção à substância da federação, não abrangeu as pessoas políticas exploradoras de atividade econômica regidas pelo direito privado[24] (art. 150, VI, §3º da CF) mas tão somente autarquias e fundações, dentro da esfera de suas finalidades.


b) Templos de qualquer culto


Trazida desde a Carta de 1891, esta modalidade de imunidade tributária(genérica, subjetiva e explícita) remete-se a longas datas, quando da relação institucional entre Estado e igreja.


Os conflitos religiosos permeiam a história da humanidade em trágicos e longos episódios. Guerra dos Trinta Anos, Cruzadas, as famigeradas Jihad e Inquisição, enfim, são fartos os exemplos de litígios motivados pela divergência nas convicções religiosas.


O Brasil, que assumiu a laicidade na Constituição de 1988, ofereceu aos seus cidadãos a opção de escolher a que ou a quem cultuar, sem discriminações nem obrigatoriedades, tanto o é que estabelece:


“Art. 19. É vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios:


I – estabelecer cultos religiosos ou igrejas, subvencioná-los, embaraçar-lhes o funcionamento ou manter com eles ou seus representantes relações de dependência ou aliança, ressalvada, na forma da lei, a colaboração de interesse público;”


Logo, com o intuito de proteger o direito à liberdade religiosa, trazido no rol de direitos fundamentais[25], foi estabelecida norma imunizante de impostos não somente aos templos em si, na sua acepção espacial, mas às atividades inerentes às finalidades daqueles(inclusive sobre a renda auferida por meio de oferendas ou sobre a propriedade do imóvel locado[26]).


Dessa maneira, o constituinte buscou empreender a isenção do Estado em face da liberdade religiosa, impondo-lhe respeito e abstinência a qualquer sorte de interferência – incluindo-se a tributária – no âmbito de atividades religiosas.


c) Imunidade dos Partidos Políticos


Os partidos políticos, no mister de veículos do exercício da democracia[27], simbolizam a liberdade de escolha oferecida aos cidadãos para elegerem seus dirigentes e representantes, apresentando nítido caráter público.


É sabido e comprovado que toda sorte de empecilho ou obstáculo impingido à liberdade de pensamento, cidadania ou consciência política gera trincas hábeis a ruir qualquer forma de democracia. Nesse sentido, há várias disposições constitucionais, envolvendo mais que a liberdade de votar, mas a própria liberdade de opinião(Art. 14, caput, Art. 5º, IV,IX)[28].


A Constituição Federal, que fora elaborada e outorgada justamente por estes representantes do povo, filiados a seus respectivos partidos políticos, recebeu a preocupação de dizimar a hipótese de interferência estatal por meio de eventual política tributária, mais precisamente do Chefe do Executivo sobre os partidos rivais ao seu.


Perceba-se que, novamente, a Constituição retoma a iniciativa de impedir a incidência de sanções políticas por via da tributação, sendo esta iniciativa igualmente rechaçada pelos tribunais superiores, como se aduz do teor das ADIn’s 173 e 394 julgadas há pouco pelo STF, editor das súmulas 323, 547 e 70, todas no mesmo teor.


Restou vedada, portanto, a incidência de impostos sobre os Partidos Políticos e suas fundações, sendo caso de imunidade genérica, explícita e, logicamente, subjetiva.


d) Entidades Sindicais de Trabalhadores


Sob a mesma classificação da anterior, a imunidade das entidades sindicais dos trabalhadores encontra guarida no Art. 150, VI, “c” da Carta Magna.


Conforme já mencionado alhures, os valores do trabalho e emprego são mencionados sucessivas vezes na Constituição Federal, mostrando a preocupação desta com a disciplina laboral e seus desdobramentos.


O caput do Art. 8º expressa ser livre a associação profissional ou sindical, vedando, em seu inciso I, eventual necessidade de autorização por parte do Poder Público para tal agremiação.


Ora, novamente lembrando a máxima de que o direito de tributar envolve o direito de destruir, qualquer presidente, imbuído da idéia de governar sem opositores, poderia facilmente vetar a criação de novos sindicatos ou buscar, por vias oblíquas, a extinção dos já existentes.


Assim fez Vargas em seu segundo governo, quando interveio nos sindicatos dirigidos por comunistas, sob a afirmação: “Os trabalhadores terão o direito de escolher seus dirigentes sindicais contanto que não sejam comunistas” [29].


Logo, conhecendo a história, o constituinte buscou evitar que tais manobras voltassem a ocorrer, principalmente pela via da tributação, que é dotada de presunção de legalidade e dificilmente conseguiria ser abolida pela simples iniciativa popular.


Portanto, a imunidade tributária nesse caso se promove como o sinal verde aos trabalhadores para se organizarem na luta por melhores condições de trabalho, direito que lhes é assegurado como fundamental, sem que sejam oprimidos por impostos, por exemplo, sobre a suada renda auferida pouco a pouco pela contribuição individual de cada um.


e) Instituições de Educação e Assistência Social 


Desde a crise do Wellfare State(Estado do bem estar social), os Estados reconheceram sua incapacidade de subsidiar com exclusividade os serviços essenciais à sua população, mudando a postura centralizadora e transferindo encargos a terceiros.


Note-se que a atual Constituição, apelidada de Cidadã, trouxe a previsão de vários direitos sociais e garantias aos cidadãos sem, entretanto, estipular dotações orçamentárias plausíveis a financiar tais instrumentos, o que foi objeto de críticas por vários estudiosos.


Frente a esse inconveniente, foi aberta uma possibilidade de cooperação por parte da iniciativa privada(filantrópica), que, embora não tivesse que pagar impostos, dada sua imunidade tributária, desincumbiria o Estado do ônus de promover financeiramente os mesmos serviços.


e.1 – Instituições de Educação


Nos dizeres do Art. 205 da CF, a educação é direito de todos e dever do Estado e da família e será promovida e incentivada com a colaboração da sociedade.


Suficiente tal assertiva para demonstrar que a parceria entre o Estado e os particulares na promoção da instrução e desenvolvimento intelectual dos cidadãos é mais que importante, é orgânica. Perceba-se, ainda, que a educação é contemplada em todos os objetivos do estado, pois pressuposto para uma existência digna e para promoção do desenvolvimento.


Assim, veda-se a cobrança de tributos sobre as entidades educacionais sem fins lucrativos, como uma forma de fomento a tão importante iniciativa, que diminui o ônus estatal de promover o progresso sócio-cultural de seu povo.


Quanto à classificação de subjetiva e genérica, não pairam dúvidas, mas suscitam alguns doutrinadores[30] a natureza de imunidade implícita desta modalidade, pelo fato de não possuírem tais instituições capacidade contributiva, pois seriam seus recursos consumidos integralmente na realização de suas atividades institucionais.


Permissa venia, ousamos discordar de tal opinião.


É que caso não fosse prevista na Constituição, seria improvável, talvez impossível, aduzir tal premissa, já que há incontáveis formas de atividades econômicas no âmbito educacional, sendo muito complicado delimitar onde começa e onde termina a capacidade contributiva de cada entidade que, possui, vale salientar, incontestável capacidade econômica[31].


Impõe-se, a essa altura, o alerta de Ricardo Lobo Torres:


“O fundamento da imunidade das instituições de educação e de assistência social é a proteção da liberdade. Pouco tem que ver com a capacidade contributiva, que é princípio de justiça. De feito, a imunidade visa a proteger os direitos da liberdade compreendidos no mínimo existencial, nas condições iniciais para a garantia da igualdade de chance”[32].


Perceba-se que hoje, mesmo com a presença de requisitos legais para aduzir as condições passíveis a autorizar a imunidade (art. 146, II “a” da CF e 14 do CTN) surgem incontáveis polêmicas, quiçá nem se previsse a previsão de exoneração tributária! A própria existência de receita positiva, remuneração dos dirigentes, o gasto com atividades afins, representam fatores que evidenciam a exploração de atividade econômica dessas instituições, o que por si só demonstraria capacidade contributiva das mesmas.


O fato é que o constituinte, agindo positivamente, buscou fomentar tais atividades, desonerando-as tributariamente no exercício um mister que, a princípio, seria do Estado. Não foi o reconhecimento de incapacidade contributiva que inspirou tal preceptivo, mas o incentivo às entidades filantrópicas de promover a educação.


Assim, concordamos com a lição de Pitanga Seixas, que esclarece:


“as atividades das entidades educacionais e assistenciais não são, por definição e por sua própria natureza, desprovidas de interesse econômico e capacidade contributiva, necessitando, consequentemente, de uma determinação legal mais precisa ou restrita de quais são aquelas que não devem ser tributadas[33].”


Dessa maneira, aduz-se que foi a ação do constituinte em incentivo à educação que deliberou tal imunidade que, hoje, por exemplo, agracia centenas de instituições de ensino superior, facilitando o seu acesso aos cidadãos que não foram contemplados pelas universidades públicas.


f) Entidades de Assistência Social


Aplica-se a esta imunidade as mesmas premissas da anterior, já que, como a educação, é dever do estado a promoção da assistência social, nos dizeres da Constituição:


“Art. 203. A assistência social será prestada a quem dela necessitar, independentemente de contribuição à seguridade social, e tem por objetivos:


I – a proteção à família, à maternidade, à infância, à adolescência e à velhice;


II – o amparo às crianças e adolescentes carentes;


III – a promoção da integração ao mercado de trabalho;


IV – a habilitação e reabilitação das pessoas portadoras de deficiência e a promoção de sua integração à vida comunitária;


V – a garantia de um salário mínimo de benefício mensal à pessoa portadora de deficiência e ao idoso que comprovem não possuir meios de prover à própria manutenção ou de tê-la provida por sua família, conforme dispuser a lei.”


Ora, se determinado ente privado se oferece a ajudar filantropicamente o cumprimento deste dever estatal, o mínimo que o Estado poderia fazer seria não cobrar impostos sobre aquele, pois se são os impostos a receita a ser aplicada nessa mesma incumbência, não faria sentido sua incidência.


Assim, novamente aduz-se o interesse proativo do Estado na consecução dos fins sociais e alcance dos seus objetivos, instituindo a desoneração de encargos tributários aos interessados em ajudar, desde que sem interesse lucrativo e cumpridos os requisitos do Art. 14 do CTN[34].


g) Imunidade dos jornais, livros, periódicos e o papel destinado a sua impressão.


Em simples palavras, determina a Constituição ser vedado às pessoas políticas instituírem impostos sobre livros, jornais, periódicos e o papel[35] destinado a sua impressão (art. 150, VI “d” da CF).


Qualquer forma de desestímulo, seja pela tributação em si ou pelo encarecimento dos produtos ao consumidor final, à liberdade de comunicação, de pensamento, à expressão artística, cultural e científica, ao acesso à informação e a difusão da cultura e educação, seria reprovável.


 Foi assim que, para estimular os agentes econômicos na difusão de informação e conhecimento, o constituinte os privilegiou da desoneração tributária incidente sobre os próprios bens(por isso objetiva) ou o papel destinado à sua impressão, diminuindo o preço final e abrindo às mais diversas classes o acesso a seus conteúdos.


Observe-se que, além de genérica, é explícita tal imunidade, pois estabelece situação excepcional frente a outras atividades similares que são tributadas, sendo, portanto, imprescindível sua expressa menção na Carta para que tenha validade.


V.2 Imunidades Específicas – breves considerações


a) ITR e a dignidade da pessoa humana


Importante imunidade sobre o Imposto Territorial Rural – ITR exime sua incidência sobre glebas rurais que se configurem como único imóvel dos seus proprietários.


Ora, trata-se de iniciativa estatal a garantir a dignidade do homem do campo, que, ao pagar tal tributo, diminuiria ainda mais os parcos recursos auferidos para sua subsistência e de sua família. Aqui denota-se ainda o respeito ao mínimo existencial, intangível pelo tributo, sob pena de confisco.


b) ITBI e livre Iniciativa


A constituição garante, nos princípios da ordem econômica e nos fundamentos da República, a livre iniciativa aos seus cidadãos. Tal alusão vinculou institutos como o Código Civil ou o estatuto da Microempresa, por exemplo, que se preocuparam em facilitar a inserção no mercado, assim como a manutenção neste.


No Art. 156, §2º, I da CF, prevê-se que não incidirá ITBI sobre a transmissão de bens ou direitos incorporados ao patrimônio de pessoa jurídica em realização de capital, nem sobre a transmissão de bens ou direitos decorrente de fusão, incorporação, cisão ou extinção de pessoa jurídica, salvo se, nesses casos, a atividade preponderante do adquirente for a compra e venda desses bens ou direitos, locação de bens imóveis ou arrendamento mercantil.


A finalidade desta imunidade é facilitar a entrada de pessoas físicas ou jurídicas no mercado de trabalho, já que a integralização do capital pode ser realizada mediante transmissão de bens imóveis, ou a continuidade neste, pois o dinamismo das relações societárias não deve encontrar obstáculos pelo Estado, que depende desse mesmo mercado para arrecadar outras sortes de tributos.


c) Imunidade de taxas e cidadania


Prevista fora do título VI – Da tributação e Orçamento, tal imunidade vem insculpida nas linhas do Art. 5º, rol dos direitos fundamentais, aduzindo:


“XXXIV – são a todos assegurados, independentemente do pagamento de taxas:


a) o direito de petição aos Poderes Públicos em defesa de direitos ou contra ilegalidade ou abuso de poder;


b) a obtenção de certidões em repartições públicas, para defesa de direitos e esclarecimento de situações de interesse pessoal;”


O direito de petição representa garantia destinada a reivindicar dos poderes públicos a proteção do patrimônio jurídico de cada cidadão, impedindo não somente a exigência tributária, mas até mesmo de depósito prévio ou preparos, nos dizeres da Súmula Vinculante nº 21, editada pelo STF: “É inconstitucional a exigência de depósito ou arrolamento prévios de dinheiro ou bens para admissibilidade de recurso administrativo”.


No mesmo sentido, é inconstitucional qualquer exação imposta ao contribuinte para poder ter acesso a certidões que lhe apetecem[36], já que tal ato administrativo possui natureza meramente declaratória, e não pode ser negado sequer obstado por exigência tributária.


Assim, a referida imunidade promove a garantia constitucional do cidadão contra eventual arbitrariedade ou abuso de poder por parte do Estado, em impor exigência tributária contra o exercício de direito fundamental do cidadão, numa forma de embaraçar ou impedir seu exercício.


d) As exportações e o desenvolvimento nacional


É antiga a máxima de que “o país não deve exportar tributos”, mas sim produtos e estes devem chegar ao mercado internacional com condições de competitividade.


Nesse sentido, a Constituição instituiu estímulo às exportações, concedendo imunidade sobre impostos incidentes na circulação de bens e mercadorias como o IPI(Art. 153, §3º), ICMS(Art. 155, §2º, X, a) e ISS (Art. 156, §3º), assim como CIDE nas exportações(Art. 149, § 2º, I).


e) Demais imunidades


Há, além das expostas, muitas outras imunidades específicas, localizadas em diferentes locais da Carta Magna.


Aplicando-se o caráter teleológico utilizado na presente tese, fácil perceber que todas elas, sem exceção, visam a prestigiar determinado direito fundamental e/ou alcançar os objetivos do Estado.


Assim ocorre com a não incidência de Impostos municipais, estaduais e federais nas operações de transferência de imóveis desapropriados para fins de reforma agrária (Art. 184, §5º) – Objetivo constitucional de erradicação da pobreza e da marginalização, e redução das desigualdades sociais e regionais; imunidade de contribuições para a seguridade social às entidades beneficentes de assistência social que atendam às exigências estabelecidas em lei (Art. 195, §7 º) – Prestação da assistência social a quem dela necessitar(Art. 203), dentre outras.


VI. Conclusões


Pelo exposto, é possível concluir o presente estudo através das seguintes ponderações:


1.As imunidades surgiram como um privilégio às camadas estratificadas mais abastadas, só apresentando conteúdo socialmente aceito após o advento do iluminismo, com a solidificação dos direitos fundamentais do homem;


2.No Brasil, as Cartas ampliaram pouco a pouco as normas imunizantes, chegando ao ápice na Constituição de 1988, com 33 hipóteses de não incidência tributária;


3.Quanto à natureza do instituto, enseja caráter ora de princípio, ora de regra e, quanto à validade, são irrevogáveis, normas declaratórias, operam erga omnes e possuem fundamento na liberdade do indivíduo frente ao império estatal;


4. Com interesse didático, costumam ser classificadas pela doutrina quanto à amplitude: genéricas e específicas, quanto ao modo de incidência: subjetivas, objetivas e mistas e quanto à explicitude: implícitas e explícitas;


5. O Estado, de acordo com as previsões constitucionais, possui objetivos e fundamentos pré-estabelecidos, aduzindo, dentre eles, a promoção do bem de todos, garantia à cidadania e dignidade dos seus cidadãos e a construção de uma sociedade livre, justa e solidária.


6.  Dentre os fundamentos, expõem-se a soberania, cidadania, dignidade da pessoa humana, os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa, assim como o pluralismo político, sendo tais valores pressupostos à própria substância do Estado e subsistência da democracia;


7. Adentrando no mérito das imunidades, tem-se na hipóteses do art. 150, VI, “a” da CF, a determinação de que as pessoas políticas não podem se tributar reciprocamente por meio de impostos, atuando como forma impositiva de respeito mútuo entre os entes e de garantia à solidez da federação;


8. A imunidade dos Templos, por sua vez, empreende a isenção do Estado em face da liberdade religiosa, inclusive na esfera tributária, evitando discriminações de qualquer sorte;


9.  A desoneração tributária dos Partidos Políticos garante o livre exercício da democracia, na pessoa dos representantes do povo, afinal de contas, é dele que todo o poder deve emanar (Art. 1º, parágrafo único);


10.  Nos aportes do Art. 150, VI, “c”, da Carta, a tributação não alcançará o direito de organização na luta por melhores condições de trabalho, reconhecendo os valores do trabalho e emprego como fundamento do Estado Brasileiro;


11.  As instituições de educação sem fins lucrativos encontram na imunidade tributária um incentivo do Estado, para que contribuam na promoção da instrução e desenvolvimento intelectual dos cidadãos. No mesmo sentido, as Entidades de Assistência Social, na busca de alcançar os objetivos afiançados no Art. 203 da Constituição.


12.  Com a finalidade de estimular os veículos de informação e conhecimento, desoneraram-se de impostos os livros, jornais e periódicos, assim como os papéis destinados a sua produção.


13.  Dentre as imunidades específicas destacam-se aquelas de garantia à dignidade da pessoa humana(Art. 153, §4 º, II); promoção à livre iniciativa(156, §2º, I); ao exercício da cidadania(Art. 5º XXXIV); ao desenvolvimento nacional pela via das exportações(Art. 153, §3º; Art. 155, §2º, X, “a” Art. 156, §3º e Art. 149, § 2º, I), dentre outras;


14.  Assim, frente a todo o exposto, pode-se concluir que a imunidade tributária consubstancia-se em hipótese de não incidência tributária, constitucionalmente definida, cujo conteúdo enseja caráter ora de princípio, ora de regra, a vedar o exercício da competência tributária, com a finalidade de promover o alcance às finalidades do Estado e garantir o livre exercício de direitos fundamentais.


 


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Notas:

[1] “A imunidade tributária tem sido definida como uma limitação constitucional ao poder de tributar. (…) Embora corrente, a definição não diz muito. O tema da imunidade tem dado margem a muitos debates, embasados em duas vertentes, cada uma delas fundada num pressuposto específico (…).Cf. Alcides Jorge Costa. ICMS – Imunidade – Direito ao Crédito – Insumos. In: Revista de Estudos Tributários n. 13. Maio/Junho de 2000, p. 20.

[2] Ricardo Lobo Torres, “Os Direitos Humanos e a Tributação – Imunidades e Isonomia, p. 27.

[3] J. M. Othon Sidou, A natureza social do tributo, 2ª Edição, pp. 18-19.

[4] Tratado de direito constitucional financeiro e tributário – os direitos humanos e a tributação: imunidades e isonomia. 3. Ed. Rio de Janeiro: Renovar, 2005. p 44/45.

[5] Cf. BORGES, José Souto Maior. Isenções tributárias. São Paulo: Sugestões Literárias, 1969, p. 207.

[6] Imunidades Tributárias.  Teoria e Análise da Jurisprudência do STF. 1ª Ed. São Paulo: Malheiros, 2006. p. 52

[7] Op. Cit. p. 82.

[8] Teoria dos Princípios. Da Definição à Aplicação dos Princípios Jurídicos. 3ª Ed. São Paulo: Malheiros, 2004, p. 60.

[9] José Souto Maior Borges. Teoria Geral da Isenção Tributária. 3ª Ed. São Paulo: Malheiros, 2001, p. 217-218.

[10] Lições Preliminares de Direito. São Paulo: Saraiva, 1987, p. 105.

[11] DURIG, Gunter. In: MAUNZ, _., HERZOG & SCHOLZ. Grundgesets. Kommentar. Munique: C.H. Beck, 1993, art. 1.

[12] Cf. Claude-Albert Colliard, Libertes Publiques. Paris: Dalloz, 1982, p. 23.

[13] Art. 3º Constituem objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil: II – garantir o desenvolvimento nacional;  III – erradicar a pobreza e a marginalização e reduzir as desigualdades sociais e regionais; IV – promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação.

[14] Marcelo Caetano. Direito Constitucional. 2. Ed. Rio de Janeiro: Forense, 1987. p. 169

[15] Curso de Direito Constitucional. Salvador: Jus Podium, 2008, p. 507.

[16] Alexandre de Moraes. Direito Constitucional. 21. Ed. São Paulo: Atlas, 2007, p. 16.

[17] Hoje, infelizmente, o que se percebe é a banalização deste conceito. Em face de situações irrisórias, surgem discursos retóricos aclamando gravíssimas violações à dignidade, em fenômenos grotescos como a famosa ‘indústria milionária dos danos morais’. Ainda bem que a postura dos tribunais, vituperando vil iniciativa(Vide RESP 200600946957,Min Luis Felipe Salomão, STJ, 4ª Turma, 02/09/2010) reconhece o instituto em sua real vitalidade, não o desmerecendo nem sublevando.

[18] Anais da XV Conferência Nacional da OAB, ética, democracia e justiça, Foz do Iguaçu, 4 a 8 de setembro de 1994, p. 549.

[19] José Afonso da Silva. 17ª Edição, São Paulo, Melhoramentos, p. 767.

[20] Dirley da Cunha Junior. Op . Cit. p. 508.

[21] “Só haverá democracia real onde houver liberdade de expressão, pluralismo político, acesso à informação, à educação, inviolabilidade da intimidade, o respeito às minorias e às idéias minoritárias etc. Tais valores não podem ser malferidos, ainda que seja a vontade da maioria. Caso contrário, se estará usando da “democracia” para extinguir a Democracia”. (RESP 201000486284, Min. Humberto Martins, STJ – 2ª Turma, 29/04/2010)

[22] Regina Helena Costa. Princípio da Capacidade Contributiva, 3. Ed. São Paulo; Malheiros Editores, 2003 p. 75

[23] Note-se que tal circunstância se demonstra na leitura da máxima norte-americana de que “o poder de tributar envolve o poder de destruir” (“the power to tax involves the power to destroy – Chief Justice JOHN MARSHALL, julgamento em 1819 do célebre caso “McCulloch v. Maryland” (RF 145/164 – RDA 34/132), de modo que a tributação de um ente sobre outro poderia causar-lhe a ruína.

[24] “A extensão das imunidades recíprocas estaria a merecer uma revisão, uma vez que a presença do Poder Público, sobretudo a União, no domínio econômico tem crescido muito e apenas a exclusão das empresas públicas que exercem atividades não monopolizadas parece insuficiente para evitar certos efeitos perversos da imunidade recíproca” In. Algumas Idéias sobre uma Reforma no Sistema Tributário Brasileiro, Direito Tributário Atual 7/8:1733-1770, 1987/88p. 1744. No mesmo sentido: Flávio Bauer Novelli, Norma Constitucional Inconstitucional?, A propósito do Art. 2º, § 2º, da Emenda Constitucional  nº 3/93. Revista da Faculdade de Direito da UERJ 2: 11-53, 1994. p. 32.

[25] Art. 5º, VI – é inviolável a liberdade de consciência e de crença, sendo assegurado o livre exercício dos cultos religiosos e garantida, na forma da lei, a proteção aos locais de culto e a suas liturgias.

[26] Súmula 724/STF: “ainda quando alugado a terceiros, permanece imune ao IPTU o imóvel pertencente a qualquer das entidades referidas pelo art. 150, vi, “c”, da constituição, desde que o valor dos aluguéis seja aplicado nas atividades essenciais de tais entidades”.

[27] “A essencialidade dos partidos políticos, no Estado de Direito, tanto mais se acentua quando se tem em consideração que representam eles um instrumento decisivo na concretização do princípio democrático e exprimem, na perspectiva do contexto histórico que conduziu à sua formação e institucionalização, um dos meios fundamentais no processo de legitimação do poder estatal, na exata medida em que o Povo – fonte de que emana a soberania nacional – tem, nessas agremiações, o veículo necessário ao desempenho das funções de regência política do Estado”. (MS 26603, DJE 19/12/2008, Min. Celso de Melo, STF)

[28] Seriam tais previsões, talvez, uma rocha de precaução sobre a nuvem negra que, durante muitos anos, encobriu os céus da pátria: a horrenda ditadura militar, realidade conhecida e evitada pelo Constituinte.

[29] Maria Celina S. D’Araújo. O Segundo Governo Vargas (1951-1954), São Paulo: Ática, 1992, p. 198.

[30] Vide Roque Carraza, Regina Helena Costa e Mizabel Derzi.

[31] “De regra, pode-se entender que inexiste capacidade contributiva enquanto a entidade imune e sem fins lucrativos exerce atividades fora do Domínio Econômico, já que, atuando no campo destinado aos “serviços públicos” em sentido estrito, não revelam as entidades qualquer disponibilidade para contribuir com os gastos comuns da coletividade (seus recursos não estão disponíveis); ingressando no Domínio Econômico, nasce a suspeita de que as entidades já passam a revelar capacidade contributiva e, portanto, podem ser contribuintes. Fecha-se, desse modo, o círculo entre imunidade, capacidade contributiva e Domínio Econômico”. SCHOUERI, Luís Eduardo. Notas acerca da Imunidade Tributária: Limites a uma Limitação ao Poder de Tributar. In: Tributação, Justiça e Liberdade – Estudos em Homenagem a Ives Gandra da Silva Martins. Vários autores. Coordenadores: Marcelo Magalhães Peixoto e Cristiano Carvalho. Curitiba: Juruá/APET, 2004. p. 191.

[32] Op. Cit. P. 267.

[33] A imunidade tributária e a não-sujeição constitucional ao dever tributário, in Silva Martins (coord.), Imunidades Tributárias, p. 725.

[34] Art. 14. O disposto na alínea c do inciso IV do artigo 9º é subordinado à observância dos seguintes requisitos pelas entidades nele referidas: I – não distribuírem qualquer parcela de seu patrimônio ou de suas rendas, a qualquer título;  II – aplicarem integralmente, no País, os seus recursos na manutenção dos seus objetivos institucionais; III – manterem escrituração de suas receitas e despesas em livros revestidos de formalidades capazes de assegurar sua exatidão.

[35] O STF promoveu ampliação à referida imunidade, no enunciado da Súmula 657: “A imunidade prevista no art. 150, VI, “d”, da Constituição Federal abrange os filmes e papéis fotográficos necessários à publicação de jornais e periódicos”.

[36] Por vislumbrar violação ao art. 5º, XXXIV, b, da CF, que assegura a todos, independentemente do pagamento de taxas, a obtenção de certidões em repartições públicas, para defesa de direitos e esclarecimento de situações de interesse pessoal, o Tribunal julgou procedente pedido formulado em ação direta ajuizada pelo Procurador-Geral da República para declarar a inconstitucionalidade do art. 178 da Lei Complementar 19/97, do Estado do Amazonas, que prevê a cobrança da taxa de segurança pública para fornecimento de certidões. Asseverou-se que o dispositivo impugnado, apesar do nomen iuris, não estaria a tratar de serviços de segurança pública, os quais só poderiam ser custeados por meio de impostos. ADI 2969/AM, rel. Min. Carlos Britto, 29.3.2007. (INFORMATIVO 461, de abril de 2007)

Informações Sobre o Autor

Fernando Lucena Pereira dos Santos Junior

Mestrando em Direito Constitucional pela Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Advogado.


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Equipe Âmbito Jurídico

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