A inversão do ônus da prova nas ações previdenciárias x teoria da distribuição dinâmica do ônus da prova

Resumo: Pretende analisar o quão essencial é a inversão do ônus da prova, nas Ações Especiais Previdenciárias. Também demonstra que a aplicação da Teoria da distribuição dinâmica do ônus da prova é injusta se for aplicada nas Ações previdenciárias, pretende comprovar ainda o motivo pelo qual deve ser aplicada a Inversão do ônus.


Palavras-Chave: Direito Previdenciário, Inversão do ônus da prova, ônus da prova, Teoria da Distribuição Dinâmica do ônus da Prova, Direito Administrativo, RGPS, INSS, Ações Previdenciárias, Seguro Social, Estatuto do Idoso.


1. Introdução


Questionamento: A inversão do ônus da prova nas Ações Especiais Previdenciárias seria Complementar ou Condição sine qua non para um julgamento de mérito realmente justo?


Se elemento essencial para o resultado pretendido(descobrir a verdade), estaria essa Inversão do ônus da prova sendo observada no curso do processo para enfim uma Decisão terminativa?


Ou a Previdência Social do Governo estaria sendo protegida diante desta situação, é o que pretende discutir e demonstrar o presente artigo.


Primeiramente se observa que não estaria regulamentando esta situação apenas o RGPS – Regime Geral da Previdência Social (Lei 8.213/91), mas também o Código de Defesa do Consumidor (lei 8.078/90) com sua aplicabilidade ao caso pré questionada, uma vez que fica a dúvida da equiparação do Seguro Social do Governo aos Seguros comuns, é uma briga injusta que envolve um ramo do direito bastante exclusivista como o Direito Administrativo, que acaba por triturar os direitos dos mais fracos – Os aposentados, Pensionistas e Segurados do INSS.


2. A Inversão do ônus da Prova e sua explicação na Defesa do Consumidor


A inversão do ônus da Prova como já foi abordado, é prevista na Lei 8.078/1990 que é o Código de Defesa do Consumidor – a luta contra este direito está por todos os lados, quando as Pessoas jurídicas de maneira cínica e inescrupulosa, dão verdadeiros ‘pulos de gato’ na tentativa de evitar o cumprimento da Lei, ainda antes deste dispositivo a situação era mais crítica, pois havia um buraco no Ordenamento que era exatamente a lacuna a ser preenchida por esse dispositivo que veio oferecer Direitos e deveres aos Consumidores, que em sua maioria já eram previstos de alguma forma em outras Leis ou Constituição, por outro lado de maneira indireta e sem oferecer deveres aos Fornecedores de Serviços e Produtos, deveres estes que vieram a ser definitivamente consolidados pela Lei 8.078/90, como os deveres de indenizar, de ressarcir, de reduzir os preços proporcionalmente, etc.


Também foi consolidada a Inversão do dever de comprovar os fatos alegados, é que em todas as relações de consumo, em especial aquelas que têm modalidades de contrato que são injustas, como os contratos de adesão, muitos documentos ficam arquivados com aqueles que usualmente são os Réus na Ação, ou seja, as Pessoas Jurídicas, o que obsta a entrega de documentos aos consumidores, por exemplo, que comprovem o que estão alegando, e ainda por cima impede que sejam indenizados, além disto, o poder aquisitivo do consumidor é bem mais baixo do que o de qualquer Pessoa Jurídica, pois mesmo que sejam de pequeno porte, possuem investimento usualmente mais alto que os ganhos anuais de alguns.


Distante desta questão de entrega de documentos que comprovem o alegado, deferir a inversão do ônus da prova é preliminarmente decretar que seja feita a Justiça ou ao menos oferecer elementos para que a verdade apareça ao Processo.


Tornando a questão de provas, adentra-se inclusive no direito à informação, e até na busca da verdade no Processo, sendo assim a Inversão é elemento principal para a verdade, não considerar a verdade no processo, dá razão a desconfiar das decisões prolatadas por um juízo.


3. O Fundamento da Inversão do ônus da Prova nas Ações Previdenciárias


Materialmente a comprovação do dever de inverter o ônus de provar pelo Juiz, é da fraqueza que se encontra a Pessoa Física qualquer que seja, diante de qualquer Pessoa jurídica, inicialmente assim.


Tecnicamente, a inversão do ônus da prova está presente em cada dispositivo a seguir, e posso demonstrar comentando cada um deles:


“Art. 6º São direitos básicos do consumidor: (…)


VIII – a facilitação da defesa de seus direitos, inclusive com a inversão do ônus da prova, a seu favor, no processo civil, quando, a critério do juiz, for verossímil a alegação ou quando for ele hipossuficiente, segundo as regras ordinárias de experiências;”


O dispositivo acima, diz que deve ser facilitada a defesa através da inversão, mas o legislador se põe omisso quando o assunto é ser objetivo e dizer de pronto a quem cabe, coloca a responsabilidade nas mãos do Magistrado e posteriormente reivindica a situação descrita para àqueles que a lei julgar hipossuficiente – Pergunta-se quem não seria hipossuficiente diante de tamanho poder econômico das Pessoas Jurídicas, sem falar na má distribuição de renda do país que ainda é uma realidade, e claro, na distribuição Educacional ,que apesar de grandes avanços nesta primeira década do Século XXI não fez com que as pessoas ficassem totalmente esclarecidas de seus direitos, abrindo espaço para práticas corrosivas dos direitos dos consumidores que são de responsabilidade das Empresas, sejam Públicas ou Privadas.


O mesmo Artigo acaba por determinar em seu inciso posterior, válido:


X – a adequada e eficaz prestação dos serviços públicos em geral.”


Dentre outras garantias desta mesma lei, a pergunta é por que o INSS não se sujeita a estes dispositivos se apenas vêm consolidar direitos que são raízes de uma árvore chamada Estado Democrático, assim a própria Lei 8.213/91, o RGPS:


“Art. 2º A Previdência Social rege-se pelos seguintes princípios e objetivos: (…)


VIII – caráter democrático e descentralizado da gestão administrativa, com a participação do governo e da comunidade, em especial de trabalhadores em atividade, empregadores e aposentados”.


Será mesmo este órgão tão democrático quanto diz ser?


O curioso é a maneira como a Lei 8.213/91, obriga os outros órgãos a cooperar com o CNPS – Conselho Nacional de Previdência Social, para fins orçamentários da União e também da Previdência Social, mas não dispõe sobre obrigatoriedade de cooperação dos seus servidores ou do órgão para com os Segurados e Beneficiários:


“Art. 5º Compete aos órgãos governamentais:


I – prestar toda e qualquer informação necessária ao adequado cumprimento das competências do CNPS, fornecendo inclusive estudos técnicos;”


Não há nenhum artigo ou inciso no RGPS que determine a obrigação da Previdência de fornecer documentos ou meios necessários para que o Segurado se defenda nas ações previdenciárias ou até mesmo as proponha, seria então uma indicativa de que a Administração Pública Federal, e em especial no âmbito da Previdência Social não tem o interesse de que os seus Segurados desfaçam qualquer injustiça a respeito de suas contribuições, benefícios etc.


Ainda na Lei 9.876/99 não há nada que possa ajuda neste sentido quem busca qualquer dispositivo que ajude o segurado, tampouco na Lei 9.032/95 que também alterou dispositivos das Leis 8.212 e 8.213, já omissas sobre o assunto.


Um dos instrumentos processuais mais modernos, que determina quem vai comprovar o alegado, não pode ser utilizado para a defesa da pessoa que promove Ação Especial Previdenciária por uma omissão gravíssima e proposital do Legislador – Por outro lado, há dispositivos no Código de Processo Civil que podem ajudar os Segurados em dados momentos das demandas previdenciárias:


“TRF3 – AGRAVO DE INSTRUMENTO – 139291: AG 29499 SP 2001.03.00.029499-0


Resumo: Agravo de Instrumento – Previdenciário – Ação Revisional – Litispendência – Inversão do Ônus da Prova – Inadmissibilidade – Recurso Provido.


Relator(a): JUIZ ROBERTO HADDAD


Julgamento: 16/04/2002


Publicação: DJU DATA:11/06/2002 PÁGINA: 393


Ementa


AGRAVO DE INSTRUMENTO – PREVIDENCIÁRIO – AÇÃO REVISIONAL – LITISPENDÊNCIA – INVERSÃO DO ÔNUS DA PROVA – INADMISSIBILIDADE – RECURSO PROVIDO. -Havendo dúvida acerca da ocorrência de litispendência, compete ao réu a eventual comprovação, a teor do artigo 333, inciso II, do CPC. –Incabível a inversão do ônus da prova. -Agravo provido, para determinar o normal prosseguimento do feito.”


No caso em tela, podemos observar que a o Instituto alegou haver caso que fosse modificativo ou impeditivo de direito do Autor, se encaixando na situação prevista pelo Art. 333 do CPC, isto ajudou que o ônus de comprovar ficou com o Réu, toda via isto não possibilita que desde o princípio da demanda o ônus permaneça com o Réu, apenas, porém em dados momentos.


4. O que diz o Código de Processo Civil e Lei 10.259/01 – Teoria da Distribuição Dinâmica do Ônus da Prova x Inversão do ônus da Prova


Sobre a Comprovação nas demandas, o Código de Processo Civil, já reconhecidamente obsoleto para a atualidade, define assim a Teoria da Distribuição Dinâmica do ônus da Prova:


“Art. 333 – O ônus da prova incumbe:


I – ao autor, quanto ao fato constitutivo do seu direito;


II – ao réu, quanto à existência de fato impeditivo, modificativo ou extintivo do direito do autor.


Parágrafo único – É nula a convenção que distribui de maneira diversa o ônus da prova quando:


I – recair sobre direito indisponível da parte;


II – tornar excessivamente difícil a uma parte o exercício do direito.


Art. 334 – Não dependem de prova os fatos:


I – notórios;


II – afirmados por uma parte e confessados pela parte contrária;


III – admitidos, no processo, como incontroversos;


IV – em cujo favor milita presunção legal de existência ou de veracidade.”


Assim fica dependendo da matéria especificamente para que seja ou não concedida à inversão do ônus da prova, ainda continua injusta.


A exemplo disto temos o seguinte caso: J.S, 60 anos, tenta ver reconhecido judicialmente o Tempo que trabalhou em condições especiais, na qualidade de Pescador e Motorista de Barco, ambas condições insalubres e que são consideradas por Decreto Federal, ao menos a de Motorista separadamente a de Pescador Separadamente também, como condições de trabalho especial, portanto o Tempo de trabalho para fins previdenciários, devem ser contados de maneira especial, havendo um acréscimo quando da aposentadoria, é o que determina Lei, por outro lado, a magistrada entendeu neste caso que o Autor deveria aos 60 anos comprovar documentalmente com documentos que ressalte-se são de posse da Previdência Social o alegado – Ora, não seria mais justo, ou melhor dizendo mais célere, ou talvez mais inteligente apenas determinar de Ofício que a Previdência Social exiba o documento?


Há ainda no Ordenamento Jurídico brasileiro um Dispositivo Legal mais moderno e que dispõe dos Juizados Especiais Federais, justo o juizado em que geralmente são propostas as Ações Previdenciárias, salvo quando são propostas na própria Seção Judiciária local da Justiça Federal, Lei 10.259, in verbis:


“Art. 11. A entidade pública ré deverá fornecer ao Juizado a documentação de que disponha para o esclarecimento da causa, apresentando-a até a instalação da audiência de conciliação.”


É a clara comprovação de que o Legislador contemporâneo não só entende necessária a Inversão do ônus da Prova, ou ao menos o fornecimento de condições para que a demanda continue e assim possam ser garantidos milhares de outros direitos das pessoas de que dispõe a Constituição Federal – Na prática, porém, apesar de preliminarmente solicitarem aos Magistrados, não há o devido cumprimento deste Art. 11 da Lei 10.259/01


5. (SEGURADORA) FORNECEDOR X CONSUMIDOR (SEGURADO)


O que é afinal o Seguro Social, se não apenas um seguro – e é assim que responde nas demandas, salvo quanto à produção de provas que ainda os Magistrados se esquecem que apesar de Autarquia Federal, apesar de por trás existir a União Federal, existe sua condição de Segurador Social, aquele que deve prover em situação de emergência ou de dano toda e qualquer assistência ao Segurado, também consumidor do serviço que é fornecido pelo INSS.


Então o INSS é um Fornecedor de Serviços? Entendo que sim. Pois fornece a Segurança Social ao individuo, fornece a garantia de que em caso de certas dificuldades previstas no RGPS – Regime Geral da Previdência Social, o segurado será beneficiado, assim passando ao status de Beneficiário e continuando no status de segurado conforme RGPS.


E onde estaria o contrato de Prestação de Serviços? Não necessariamente o contrato precisa ser na sua forma escrita, pois o mero acerto de palavras pode assim ser considerado, porém por uma questão de regimento e não de garantias somente, pode se dizer que o RGPS regula esta situação, mas é a classificação como Seguro que justifica o caráter classificatório secundário de Fornecedor e Consumidor.


Analisando criteriosamente e analogamente, temos Empresas públicas e Órgãos públicos aos milhares que dividem sua competência com o setor privado, a exemplo dos Bancos Públicos como Banco do Brasil e Caixa Econômica Federal e os demais Bancos privados, onde sabe-se que há uma relação de prestação de serviços também regida pelo CDC como Legislação Especial e CC/02 como Legislação Generalista, aliás, os mesmos Bancos dispõe de Serviço de Previdência Privada.


Assim, reafirmo que existe Relação de Consumo entre o Segurado do INSS que paga mensalmente um Seguro na esperança de obter Benefício futuro e na Segurança de estar coberto para milhares de situações que possam ocorrer conforme o RGPS.


6. Conclusão


 Diante da omissão do Poder Legislativo quanto à inversão do ônus da Prova resta prejudicado, por exemplo, o Direito de idosos e segurados da Previdência Social a uma prioridade processual e celeridade processual respectivamente.


É que uma vez que a discussão no Processo toma longas distâncias e instâncias, enquanto isto perece o Direito da parte Segurada e mais ainda pelo pouco tempo de vida que estas pessoas usualmente têm.


Fica evidenciada a necessidade da inversão do ônus da prova para o cumprimento da Lei aplicada ao caso de uma forma mais justa, também para que apareça não somente a verdade, mas toda a verdade, pois são pequenos detalhes de uma história de vida que acabam por definir aqueles inconclusivos, intermináveis e cansados discursos sobre a vida daqueles que tem canais sensoriais fadigados de já terem sido vítimas de tanta injustiça.


A respeito da obrigação da inversão do ônus da prova, sem qualquer apelo, pode-se dizer que foi comprovado no elemento 5 (cinco) deste estudo, que demonstra que o INSS, nada mais é do que um Seguro, e que esta equiparação é que faz com que o Segurado seja compreendido juridicamente como um Consumidor deste Serviço, fazendo jus ao que determina o Art. 6º da Lei 8.078 (CDC), bem como dos demais dispositivos desta Lei que possa favorecer o Segurado e também da aplicação do Art. 11 da Lei 10.259/01 que se contrapõe a injusta Teoria da Distribuição Dinâmica do Ônus da Prova.


O Receio de determinar preliminarmente a Inversão do ônus da prova deve ser espancado pela coragem daqueles que viveram tanto tempo para verem seus direitos abatidos ao longo de décadas – caso contrário, fica evidenciado que será modificado justamente este modo de ver conforme decorra o tempo e aumente a idade.


Tempus Est Optimus Judex Rerum Ominium.


Informações Sobre o Autor

Clóvis Correia de Albuquerque Neto

Bacharelando em Direito, Advogado Estagiário militante na área Previdenciária e Tributária.


Equipe Âmbito Jurídico

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