Opções e possibilidades a disposição dos operadores do direito para juntar vídeos, áudios e outros arquivos digitais em processos, considerando as restrições impostas pela pandemia em curso.
No atual mundo digitalizado é muito comum que as provas a serem utilizadas em processos judiciais se encontrem em formato eletrônico (áudios, vídeos, imagens, planilhas, bases de dados, programas, e-mails etc.) ou que, originalmente no formato físico, tenham que ser digitalizadas.
Apesar de frequentemente desconsiderados, existem aspectos fundamentais relacionados a formação e ao uso de provas em formato digital. Entre estes os que deveriam ser objeto de cuidados especiais são aqueles relacionados a garantia de origem, integridade e apropriada custódia de tais provas.
Em tempos normais, na maioria dos casos, a juntada era realizada através do acautelamento de uma mídia física (contendo o arquivo de interesse), junto à serventia competente mediante termo de acautelamento. Este procedimento, mesmo que comum, abria espaço para potenciais problemas em força do fato que, normalmente, não eram tomados cuidados quanto a identificação correta e exaustiva do arquivo juntado (por exemplo através de geração de hash codes) o que, sobretudo na esfera penal, podia vir a gerar contestações posteriores em relação a origem, integridade e custódia do dito arquivo.
Alguns dos sistemas utilizados para gestão do processo eletrônico, a exemplo do PJe, permitem, em tese, a juntada de arquivos eletrônicos, mas, normalmente, existem diversos problemas e limitações a tais sistemas:
Com tudo isso, como abordar o problema da juntada de arquivos digitais (o que inclui sustentações gravadas, para se adaptar a impossibilidade de ter encontros presenciais com os julgadores) em tempos de pandemia, com a maioria das serventias fechadas ou com severas restrições de atendimento?
No caso de áudios e vídeo é comum ver a juntada ser realizada através do envio de um link (ou QR Code, que, na prática, representa o link) ao Youtube. Neste caso, o procedimento realizado pela parte que estiver juntando o arquivo de vídeo ou áudio é o de criar uma conta de usuários (preferencialmente reservada), carregar o arquivo de interesse no sistema e depois utilizar o link fornecido para disponibilizar ao Juízo e demais partes. Este procedimento, mesmo sendo gratuito, de realização muito simples e permitindo a visualização imediata do arquivo, apresenta sérios problemas e limitações que são resumidas a seguir:
Uma alternativa é disponibilizar o arquivo através de sistemas de armazenamento remoto (em nuvem) como o Google Drive, Dropbox, One Drive e similares. Alguns de tais sistemas apresentam melhores condições de uso em relação ao Youtube, mas para um uso mais efetivo requerem o pagamento de assinaturas (normalmente com valores relativamente modestos).
Neles é possível disponibilizar arquivos de qualquer tipo, e não somente áudios ou vídeos. Ademais existem sistemas (por exemplo o Dropbox) que permitem que os arquivos armazenados sejam criptografados e, ainda, que alguns tipos de arquivos de vídeos e áudio, mesmo com limitações (de duração e tipo), sejam visualizados diretamente online.
Existem também alguns mecanismos para verificação de integridade do arquivo, através de hash codes que podem ser manejados pelas partes, mesmo sendo mecanismos trabalhosos e pouco práticos, além de não padronizados.
Ainda assim existem problemas ao utilizar esta modalidade:
Adicionalmente caberá à parte que quiser utilizar este sistema, tanto preparar e estruturar em seu espaço “online” as pastas e arquivos eletrônicos a serem disponibilizados em diversos processos, quanto providenciar todas as informações para acessar cada arquivo, assim como realizar manualmente os procedimentos necessários para identificar o mesmo de forma segura, permitido uma posterior validação e garantindo assim integridade e custódia.
Uma terceira solução é a de utilizar sistemas criados ad hoc para permitir a disponibilização de arquivos digitais em processos judiciais (e afins), a exemplo da plataforma E-Juntada (ejuntada.com.br).
Tais sistemas não são gratuitos, o que representa uma primeira diferença, apesar de, normalmente, cobrarem valores modestos e comparáveis (ou até inferiores) aos custos que existiriam para juntar mídias físicas. Ao mesmo tempo, costumam dispor de ferramentas para individualizar as utilizações e, por conseguinte, viabilizar o repasse de despesas aos constituintes.
Por serem estudados especificamente para o uso em processos judiciais, preveem todas as funcionalidades e atendem todos os requisitos que possam ser necessários para esta finalidade:
A aceitação deste tipo de juntada virtual (seja através de Youtube, de sistemas de armazenamento em nuvem ou de sistemas específicos para juntada eletrônica), ainda não prevista especificamente em lei (mas também não proibida), por enquanto está sujeita a aceitação de cada Juiz ou órgão julgador. Neste período de pandemia, em consideração de todas as patentes restrições, tem se observado uma boa disposição em aceitar tais disponibilizações de arquivos digitais.
Espera-se que haja algum tipo de institucionalização deste modus operandi e, ainda mais, que na ótica da simplificação e agilidade dos processos (conceito que está na base da lei 11.419/06 e que norteia o direito em geral) passe a ser reconhecido como modo preferencial para juntar arquivos eletrônicos aos processos.
Lorenzo Parodi é perito judicial e assistente técnico em casos envolvendo falsificações, fraudes e forense digital/computacional, autor de livros, pesquisador e palestrante.
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