RESUMO:O presente artigo tem por objetivo assegurar a isonomia sexista no nosso ordenamento jurídico e mostrar os meios legais para coibir a violência doméstica e familiar. O estudo também cuida da questão da constitucionalidade e convencionalidade da Lei Maria da Penha conforme a ratificação pelo Brasil em tratados internacionais, e também menciona a responsabilidade do Estado na manutenção da presente lei para garantir a total proteção da mulher contra a violência domestica.
Palavras-chave: Violência doméstica – Constitucionalidade – Convencionalidade – Isonomia.
Abstract:This article aims to ensure equality in our legal sexist and show the legal means to curb domestic violence. The study also addresses the issue of constitutionality and conventionality of Maria da Penha law as ratified by Brazil in international treaties, and also mentions the state's responsibility in maintaining the present law to ensure the full protection of women against domestic violence.
Keywords: Domestic violence – Constitutionality – Conventional – Isonomy.
Sumário: Introdução 1. Razão da Lei 1.1. Características. 1.2. Objetivo. 1.3. Formas de violência. 1.4. Espécies de sujeitos. 2. A Constitucionalidade da Lei nº 11.340/06. 2.1. Convencionalidade da Lei Maria da Penha. 3. Eficácia penal nos casos de violência doméstica e familiar e medidas protetivas de urgência. 3.1. Em relação ao agressor. 3.2. Em relação à vítima. 4. Algumas críticas quanto a eficácia penal da referida lei. 4.1. Inadequação quanto ao procedimento penal eficaz. 4.2. Argumento da ineficácia das respostas penais. 4.3. Responsabilidade do Estado na manutenção da Lei nº 11.340/2006. Considerações finais. Referências bibliográficas.
INTRODUÇÃO
A nossa Magna Carta garante o princípio da isonomia sexista que em seu artigo 5º, parágrafo 1º, versa o seguinte: “homens e mulheres são iguais em direitos e obrigações, nos termos desta Constituição”. O dispositivo constitucional é autoexplicativo que homens e mulheres têm os mesmo direitos e obrigações.
Entretanto, para que este dispositivo constitucional seja garantido, necessita da elaboração de lei ordinária para a total aplicação destes direitos e obrigações. E um destes direitos é a proteção do núcleo familiar, em conservação a estrutura da família, e como é inegável a existência da inferioridade biológica feminina, sendo imprescindível a existência de mecânicos jurídicos contra a violência doméstica e familiar.
Em razão da constante violência doméstica e familiar que se perpetua até os dias atuais foi criada a Lei nº. 11.340, de 7 de agosto de 2006, popularmente chamada de Lei Maria da Penha (em razão da violência que esta sofria pelo seu marido, sendo que o caso foi julgado pela Convenção Americana sobre Direitos Humanos), decorrente de um amplo debate junto a sociedade, foi criada esta lei com o intuito de garantir a tutela penal dos direitos da mulher.
O problema da violência familiar apresenta-se como um dos pontos cruciais da desestruturação familiar, comprometendo o futuro da mulher, do marido e dos filhos do casal. Isso sem considerar os reflexos negativos sobre a sociedade em geral e o estado como ente estatal que deveria ser formado apenas por famílias bem estruturadas.
A aprovação da lei representou um grande passo para a sociedade brasileira, visto que a violência doméstica e familiar infelizmente era um delito constante, que não era repreendido com os mecanismos específicos, pois, em tal delito há um maior senso de reprovabilidade, uma vez que a pessoa que comete tal crime faz parte da esfera afetiva da vítima.
A entrada em vigor da Lei nº. 11.340 foi tida como uma vitória para os direitos humanos da mulher, mas só a criação da presente lei na resulta para resolução total do problema da violência familiar, vez que a não manutenção dos dispositivos, colocará a aplicabilidade da lei está em risco.
As questões norteadoras da pesquisa serão embasadas em alguns pontos vagos sobre a referida lei deixou de apreciar, tais problemas como: afirmação da constitucionalidade e da convencionalidade, e as questões, no tocante a lesão corporal de natureza leve, se há necessidade de representação por parte da vítima.
O objetivo da pesquisa será analisar, examinar, a constitucionalidade da Lei Maria da Penha e apontar as eficácias das respostas penais à violência doméstica, bem como identificar ponto vagos na legislação para a contribuição da resposta penal eficiente para a proteção das vítimas de violência doméstica.
1. RAZÃO DA LEI
A Lei nº 11.340/2006 emerge com a finalidade de coibir a violência doméstica e familiar contra a mulher. A lei foi batizada como Lei Maria da Penha, em homenagem à dona-de-casa cearense homônima, que se tornou conhecida como símbolo da luta contra a violência familiar. Maria da Penha foi vítima de duas tentativas de homicídio, e em 1983 ficou paraplégica em virtude de um tiro de arma de fogo disparado por seu marido Marco Antônio Heredia Viveiros. O agressor só foi condenado oito anos depois, sendo que a condenação só ocorreu após o Brasil ser condenado na Comissão Interamericana de Direitos Humanos da OEA (Organização dos Estados Americanos) por violação ao direito fundamental da vítima mulher ante a ineficiência da persecução penal.
A elaboração do projeto de lei foi motivada pela constante violência ocorrida em tantos lares brasileiros, chegando algumas pessoas até propalar de que faz parte da cultura brasileira. Indubitavelmente, estamos diante de um despropósito lamentável. Chamando a atenção para o apelo do Direito Penal, pois, a positivação do tipo penal não tardam os projetos de lei que só ocupavam da descrição da conduta a ser considerada ilícito penal e a respectiva punição. A par disso, deve ser ressaltado o interesse da sociedade e do próprio estado em contar com lares onde devem reinar a paz[1].
Diante desta discussão a favor da defesa dos direitos da mulher e da condenação do Brasil na Comissão Interamericana de Direitos Humanos, foi elaborado o projeto de Lei n. 4.559/2004 que culminou na lei n. 11.340/2006, sendo popularizada como Lei Maria da Penha.
1.1. Características
A característica principal da presente lei é o tratamento diferenciado que lhe é conferido a mulher, pois, tal fundamento se embasa na inegável a existência da inferioridade biológica feminina, sendo imprescindível a existência de mecânicos jurídicos contra tal violência, uma vez que na nossa sociedade confere-se um papel de subordinação familiar, mesmo existindo a independência econômica feminina, a mulher ainda é a responsável pelas atividades de casa e criação dos filhos, nos dias atuais mesmos as mulher com independência econômica no lar, ainda são subordinadas a manutenção do lar.
Segundo Ana Cecília Parodi e Ricardo Rodrigues Gama, a elaboração da lei decorreu nas seguintes características:
“a)Direitos fundamentais: antes de assegurar a integridade física, moral e psicológica da mulher, o legislador exaltou o conjunto de direitos fundamentais da mulher como o direito à igualdade, à liberdade em diversos formatos e a integridade sob angulações diferente;
b)Integridade física, mental e patrimonial: desde o início, afasta-se a exploração, a crueldade e a opressão da mulher, que possam conduzir à lesão corporal, sofrimento prejuízo patrimonial ou emocional, ou morte;
c)Minoria: os membros mais fragilizados da sociedade recebem proteção especial do legislador assegurando os direitos básicos diante da ofensa deles com certa constância. Ao tratar da mulher, o legislador a posiciona como pólo mais fraco da maioria das relações, firmando os direitos direcionados à minoria (PARODI; GAMA, 2010, p. 17).”
Contudo, embora a lei só se dirija à mulher, não será caracterizada como competência todos os tipos de violência contra mulher, mas sim aqueles que a violência se caracterize numa situação de violência doméstica ou familiar. É importante ressaltar que a agressão de um homem contra uma mulher, e que entre eles não existam laços familiares ou de afetividade o delito assume a ilicitude a via comum, como crime tipificado no Código Penal; como Lesão Corporal, art. 129, parágrafos 1º ao 3º do Código Penal.
1.2. Objetivo
O objetivo principal da criação da lei está expressamente explícito no compromisso do Estado Brasileiro de tutelar os direitos fundamentais das mulheres, tal proteção está expressa no art. 226, parágrafo 8º, da Constituição Federal, que estabelece: “O Estado assegurará a assistência à família na pessoa de cada um dos que a integram, criando mecanismos para coibir a violência no âmbito de suas relações”.
A lei nº. 11.340/2006 ordenada em 46 artigos, sendo definidos na finalidade de prevenção, a repressão e a erradicação da violência familiar. Na prevenção a finalidade está na previsão de diversas tipos específicos de assistência a vítima, sendo tais assistências executadas pelo judiciário e também pelo executivo, contando com pessoas para o atendimento as famílias.
A repressão está presente nas sanções penais impostas pela lei, tipificando a conduta de agressão a mulher em âmbito familiar com fato de maior reprovação pelo juízo penal, firmando aqui um sentimento comum de repúdio àqueles praticam esse ilícito penal.
Na erradicação, a lei faz menção a criação de processos educativos voltados a família em seu todo, ensinando a todos acerca das consequências negativas que tais atos acarretam no ambiente familiar.
1.3. Formas de violência:
A presente Lei assegura como sendo violência familiar qualquer violência, podendo ser ela, violência física, psicológica, sexual, patrimonial, moral. Em intensidade ela poderá ser contínua, eventual ou isolada.
a) A violência é considerada contínua, no momento que a vítima sofre agressão reiteradamente. Contudo, na grande maioria dos casos quando a violência é contínua a vítima só noticia a violência tempos depois, quando não consegue mais suportar tal humilhação e maus tratos; b) A violência eventual é considerada quando ela ocorre em um espaço de tempo mais, de modo descontínuo, mais eventualmente ocorre a agressão no ambiente familiar; c) Já a violência em sua forma isolada é quando o agressor surpreende a vítima agredindo-a sem que isso nunca ocorrera antes.
1.4. Espécies de Sujeitos
Enquanto aos sujeitos, a lei os subdivide em sujeito ativo e sujeito passivo:
a) O Sujeito ativo em princípio, a pessoa íntima apresenta-se como sujeito ativo na violência domestica e familiar, devendo figurar aqui, em primeira analise, o marido, o companheiro, o filho, o pai, o sogro e outros parentes ou pessoas que viviam na mesma casa, avançando depois sobre outras possibilidades. Assim, como o legislador deixou a porta aberta para a inclusão da união homoafetiva feminina, não persiste qualquer resistência em articular em prol dela. Ao traçar a definição de família, o inc. II, do art. 5º, da Lei nº 11.340/2006, dispõe que a família consiste na “comunidade formada por indivíduos que são ou se consideram aparentados, unidos por laços naturais, por afinidade ou por vontade expressa”. (PARODI; GAMA, 2010, p. 54-55)
b) O sujeito passivo sempre será a mulher em virtude da existência da inferioridade biológica feminina, assim a mulher figurará no polo passivo quando a violência for doméstica ou de cunho familiar. Até hoje os comportamentos humanos continuam definidos em sua maior parte como o homem exercendo o poder familiar e a mulher com a obediência e a manutenção do ambiente familiar, assim a mulher por figurar na nossa sociedade como a figura mais frágil no ambiente familiar, principalmente em centros afastados das grandes cidades, cabendo assim ao ordenamento jurídico garantir sua proteção.
2. A constitucionalidade da lei nº. 11.340/2006
Com a vigência da Lei Maria da Penha, surgiram debates doutrinários acerca da sua constitucionalidade. Apesar de que pouquíssimos autores sustentam a inconstitucionalidade, estes afirmam que a lei fere o princípio da isonomia, na medida em que estabelece uma desigualdade somente em função do sexo. Contudo, a mulher vítima seria beneficiada por melhores mecanismos de proteção e de punição contra o agressor. Já o homem não disporia de tais instrumentos quando fosse vítima da violência doméstica ou familiar, nesta visão fere totalmente o principio da isonomia sexista.
Porém, a constitucionalidade da Lei nº.11.340/2006 está clara no dispositivo do art. 226, parágrafo 8º, que assim estabelece: O Estado assegurará a assistência à família na pessoa de cada um dos que a integram, criando mecanismos para coibir a violência no âmbito de suas relações.
A Constituição Federal trata de maneira expressa a preocupação com a violência ocorrida dentro do ambiente familiar, assim através desde dispositivo assegurou a criação de mecanismos para coibir a violência no âmbito de suas relações.
“Longe de contrariar o principio da isonomia, a novel Lei institui meios de proteção da mulher vítima de violência doméstica e familiar, encontrando outras formas de proteção na esfera do direito, como a persistência do crime de estupro para proteger a integridade sexual somente da mulher, a licença maternidade com prazo generoso para o enfrentamento dos desafios com a criança etc” (PARODI; GAMA, 2010, p. 55).
Contudo, “a preocupação constitucional com a violência ocorrida dentro do lar se justifica, dado que as pesquisas internacionais e nacionais apontam que a família é, dentre todas as instituições, um das mais violentas, ficando aquém, apenas, da Polícia”[2]. Pelo que se percebe, a cultura que apregoa que “o amor exige violência como estratégia pedagógica” permanece até os dias atuais em nossa sociedade.
Ademais, são diversas as justificativas para que a mulher vítima de violência doméstica seja merecedora de proteção específica assegurada pela Constituição:
a) O Estado deve buscar uma isonomia material, tratando os desiguais na medida de suas desigualdades, de forma não abusiva;
b) As mulheres formam um grupo especial (assim como as crianças e os idosos), porque, ao longo dos séculos, foram vítimas da dominação do homem sobre as mesmas e por existir uma inferioridade biológica em relação aos homens;
c) Os tratados internacionais ratificados pelo Brasil apontam a necessidade de uma maior proteção às mulheres, “como a Convenção sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação contra a Mulher (CEDAW), que impõe aos Estados-partes as obrigações de eliminar a discriminação e assegurar a igualdade; bem como em atenção à Convenção de Viena, em que a violência baseada no gênero foi reconhecida como violação aos direitos humanos”[3].
Ademais, a criação destes mecanismos jurídicos para a proteção, repressão e erradicação da violência doméstica e familiar é embasa em dados específicos. Segundo consta no Relatório Nacional Brasileiro, a cada 15 segundos uma mulher é agredida:
"Basta contar até 15 e pronto: já passaram 15 segundos. Parece ser um lapso de tempo tão insignificante, durante o qual nada acontece, tanto que o período de 24 horas contém 5.760 vezes a fração de 15 segundos. (…) isto é, a cada dia, 5.760 mulheres são espancadas no Brasil” (DIAS, 2007, p. 61).
Conforme tais estatísticas[4], pode se notar o quão assustadores são os índices de violência doméstica e familiar no Brasil. As chances de uma mulher sofrer algum tipo de agressão pelo companheiro é muito maior que, de forma ocasional, por outra pessoa fora da esfera familiar. Dessa forma, a mulher se encontra em situação de hipossuficiência e necessita de mecanismos específicos para coibir tal violência.
Diante a assertiva, a Lei Maria da Penha não é inconstitucional, pois, ela necessita ser aplicada em todos os seus termos, para a prevenção, repressão e erradicação da violência doméstica no Brasil. Há também a necessidade da criação dos Juizados de Violência Doméstica e Familiar ou de Varas especializadas, a fim de oferecer atendimento humanizado às vítimas e tratamento aos agressores, rompendo, assim, com o nefasto ciclo da violência.
2.1. Convencionalidade da Lei Maria da Penha
A Lei nº 11.340/2006, como anteriormente foi especificada é constitucional e também é convencional, ou seja, tal lei foi concebida em concordância com tratados e convenções internacionais de direitos humanos, ratificados pelo nosso Estado.
A chamada convencionalidade da lei decorre da adaptação das leis infraconstitucionais existente aos tratados e convenções internacionais a qual o Estado brasileiro se sujeita, ou seja, os tratados e convenções assinado pelo Brasil tem o status de equivalência das emendas constitucionais, pois as leis infraconstitucionais devem estar de acordo com o tratado assinado.
Assim, por não contrariar os documentos internacionais ratificados pelo Brasil, e, mais, por concretizá-los em sua inteireza, a Lei Maria da Penha é para além de constitucional, totalmente convencional, eis que de acordo com os compromissos assumidos pelo Estado brasileiro na seara da proteção internacional dos direitos humanos.
3. Eficácia penal nos casos de violência doméstica e familiar e medidas protetivas de urgência
Derradeiramente, foram criados mecanismos específicos para otimizar a eficácia penal, nos crimes de violência doméstica e familiar, sendo eles as medidas de protetivas de urgência expressas nos artigos 12, 18, 19 e 22 a 34 da referida lei. O artigo 12 da referida lei traz uma peculiaridade, no caso de registro de ocorrência de violência doméstica ou familiar contra a mulher, feito o registro da ocorrência deverá ser ouvida a ofendida e tomar representação a termo, se apresentada.
Dado este momento, a vítima formula seu requerimento em delegacia, sem necessidade de advogado, e esta deve encaminhá-lo, no prazo de 48 (quarenta e oito) horas, ao juiz com cópia do boletim de ocorrência e do depoimento da mulher. Por sua vez, caberá ao juiz decidir em um prazo de 48 (quarenta e oito) horas sobre o deferimento dos pedidos a ele encaminhado. Por este novo procedimento específico, permite que de forma ágil o juiz possa decidir quanto a situação de urgência das medidas requeridas, com a finalidade de assegurar a integridade física, psicológica e moral da vítima.
Já o artigo 22 dispõe que o juiz poderá aplicar em conjunto ou separadamente as seguintes medidas protetivas de urgência: suspensão da posse ou restrição do porte de armas, com comunicação ao órgão competente; afastamento do lar, domicílio ou local de convivência com a ofendida; proibição de determinadas condutas, entre as quais: aproximação da ofendida, de seus familiares e das testemunhas, fixando limite mínimo de distância entre estes e o agressor; contato com a ofendida, seus familiares e testemunhas por qualquer meio de comunicação; frequentação de determinados lugares a fim de preservar a integridade física e psicológica da ofendida; restrição ou suspensão de visitas aos dependentes menores, ouvida a equipe de atendimento multidisciplinar ou serviço similar; e prestação de alimentos provisionais ou provisórios, além de outras medidas previstas sempre que a segurança da ofendida exigir.
Sendo que tais medidas protetivas de urgência foram divididas em dois grandes grupos – aquelas que obrigam o agressor, e as que são deferidas em benefício pessoal da ofendida. De natureza penal, cível e/ou administrativa, as medidas serão concedidas inaudita altera pars, sob risco da efetividade da medida, revelado que todos os casos tratados pela Lei nº 11.340/2006 são de caráter excepcional.[5]
A Lei é inovadora não só no âmbito penal como no âmbito cível, pois ainda no artigo 22, inciso V, prevê a possibilidade de prestação de alimentos provisórios, sendo a única medida protetiva cível, pois a demais medidas são de natureza penal. De um modo abrangente podemos classificar as medidas protetivas de urgência da seguinte maneira:
3.1. Em relação ao agressor
a) Suspensão da posse ou restrição do porte de arma, com comunicação ao órgão competente, nos Termos da Lei 10.826, de 22 de dezembro de 2003;
b) Afastamento do lar, domicílio ou local de convivência com a ofendida;
c) Proibição de: (i) aproximação da ofendida, de seus familiares e testemunhas, fixando o limite mínimo de distância entre estes e o agressor; (ii) contato com a ofendida, seus familiares e testemunhas por qualquer meio de comunicação; (iii) de freqüentar de determinados lugares a fim de preservar a integridade física e psicológica da ofendida;
d) Restrição ou suspensão de visitas aos dependentes menores, ouvida a equipe de atendimento multidisciplinar ou serviço similar;
e) Prestação de alimentos provisionais ou provisórios.
3.2. Em relação à vítima
a) Encaminhar a ofendida e seus dependentes a programa oficial ou comunitário de proteção ou atendimento;
b) Determinar a recondução da ofendida e seus dependentes ao respectivo domicílio, após afastamento do agressor;
c) Determinar o afastamento da ofendida do lar, sem prejuízo dos direitos relativos a bens, guarda dos filhos e alimentos;
d) Determinar a separação de corpos;
e) Restituição de bens indevidamente subtraídos pelo agressor à ofendida;
f) Proibição temporária para a celebração de atos e contratos de compra, venda e locação de propriedade em comum, salvo expressa autorização judicial;
g) Suspensão das procurações conferidas pela ofendida ao agressor;
h) Prestação de caução provisória, mediante depósito judicial, por perdas e danos materiais decorrentes da prática de violência doméstica e familiar contra a ofendida.
4. Algumas críticas quanto a eficácia penal da referida lei
4.1. Inadequação quanto ao procedimento penal eficaz
Na lei nº 11.304/06 ainda vigora o instituto da ação penal condicionada à representação nos casos de agressão do marido que resulte em lesão corporal de natureza leve, ademais, na redação da presente lei no artigo 16 prevê a possibilidade de renúncia da representação. E a mesma representação se aplica para delitos muito mais graves que a lesão corporal leve, continua a exigência da representação.
Tal espécie de violência doméstica não deveria ter a ação penal condicionada à representação, devido ao fato de que a presente lei foi recebida pelo nosso ordenamento jurídico com o intuito de coibir a violência que resulta de laços familiares como (marido, noivos, namorados, etc.). No caso destas agressões a mulher tendo uma vulnerabilidade ao agressor (devido ao fato de existir laços afetivos entre a mulher e o agressor).
De modo, a vítima sente coagida psicológica pelo agressor no fato de dar prosseguimento a representação, como na maioria das vezes, a vítima depende economicamente do marido aumentando assim a sua submissão ao chefe da família, e muitas vezes renúncia a representação.
Sendo a ação penal pública condicionada, não há como deixar de reconhecer seus problemas em razão da falta de autonomia de muitas mulheres frente a seus maridos. Na realidade de nosso país muitas mulheres ainda (desgraçadamente) dependem financeiramente de seus maridos, o que incrementa a submissão e o medo vivenciado por elas dentro do próprio lar (GOMES, 2010, p. 01).
Podemos afirma que a vítima na maioria dos casos sente-se amedrontada pelo parceiro e não comunicam o caso as autoridades competentes com medo de sofrer maiores retaliações. No caso da lei nº 11.304/06 cometeu um deslize ao tratar da lesão corporal se proceder mediante representação.
A violência doméstica deveria ser coibida pelos órgãos que podem restringir tais violências sem retaliações, entende-se que ação penal deveria ser incondicionada, pois assim, a vítima ficaria isenta da pressão psicológica pela renúncia da ação.
4.2. Argumento da ineficácia das respostas penais
Na doutrina existem críticos quanto à intervenção penal, propondo que estava intervenção penal deve der reduzida, pois, segundo eles a intervenção penal não tem capacidade para a solução de conflitos de caráter social de forma eficaz. Em sentido contrário, existem movimentos doutrinários que insistem no uso do instrumento penal como meio necessário para a coibição e repressão dos problemas da violência doméstica.
É cediço, que a intervenção penal nos casos de violência doméstica deve sempre ocorrer, porém, deve ocorrer de forma eficaz, nesse sentido a ilustre doutrinadora Alice Bianchini cita duas formas quanto a resposta penal eficaz nos casos de violência doméstica:
“a) Tutela extrapenal da vítima. Uma legislação específica permite que, em caso de violência intrafamiliar, o agressor seja afastado da residência familiar por decisão judicial, sendo possível decretar sua detenção ou impor outras sanções de violação dessa ordem, acompanhando essas decisões de outras medidas cautelares (proibindo de freqüentar o lugar de trabalho da vítima, de fazer ligações telefônicas, submissão a tratamento, etc.). Exemplo deste tipo de legislação constitui a lei inglesa de 1976 Domestic Violence and Matrimonial Proccedings Act.
b) Legislação penal específica. Aqui se cria um delito específico de maus-tratos na relação de casal, violência doméstica, etc. esse delito é tipificado e sancionado de forma diferente daquela que se aplicam as condutas similares ocorridas entre estranhos. Muitas vezes se inclui na descrição legal a referencia a danos emocionais. Exemplo é a Lei 54 de Porto Rico para a prevenção e intervenção contra a violência doméstica de 15.08.1989, que influenciou a legislação de outros países da América Latina” (BIANCHINI, 2010).
Apesar da divergência entre minimalista e os que entendem que deve haver respostas penais abrangentes, o coerente é a permanência da intervenção penal, uma vez que for considerado que o direito penal escusar de tutelar os interesses da mulher maltratada por alguém do âmbito familiar, predominará o abolicionismo penal, concluindo que a intervenção penal também não poderá ser empregada para proteger os demais de agressões físicas e patrimoniais.
4.3. Responsabilidade do Estado na manutenção da Lei nº 11.340/2006
O argumento da manutenção da Lei Maria da Penha consiste na permanência dos meios eficazes e na adequação de outros meios que não se mostraram totalmente eficaz para a efetiva aplicação da lei.
É cediço afirmar que a Lei Maria da Penha nasceu de uma recomendação da Comissão Interamericana de Direitos Humanos. Como se viu, dentre as varias recomendações feitas pela Comissão Interamericana ao Estado brasileiro, destaca-se prosseguir e intensificar o processo de reforma que evite a tolerância estatal e o tratamento discriminatório com respeito à violência doméstica contra as mulheres no Brasil. Esse tipo de recomendação internacional, previsto no art. 51, nº 2, da Convenção Americana, tem caráter vinculante para o Estado, devendo ser cumprido por ele em virtude do princípio jurídico da boa-fé (BIANCHINI, 2010, p. )
O Estado brasileiro ao ser tornar signatário do presente tratado internacional, aceitou todas as recomendações e consequências advindas do tratado, é uma delas é a recomendação que o Estado deve criar medidas legislativas ou de outra natureza para a manutenção e a otimização das leis de combate a violência doméstica. Tal recomendação vai de encontro com o disposto do artigo 226, parágrafo 8º, da Constituição (já tratado anteriormente) que visa a criação de mecanismos para coibir a violência doméstica e familiar.
Ademais, esta manutenção, deve ser realizada de forma que efetive a aplicação da lei e não no sentido de enfraquecer os mecanismos já existentes, porém, existe no Congresso Brasileiro o projeto de lei n que os crimes de violência familiar sejam tratados como crimes de menor potencial ofensivo. Mudança na Lei é retrocesso em direitos humanos.
De acordo com Fernanda Marinho, titular da Promotoria de Combate à Violência Doméstica contra a Mulher na Comarca de Fortaleza, a possibilidade de mudança é "gravíssima". Isso porque os 32 artigos da norma, se o projeto for aprovado, serão copiados dentro do Código de Processo Penal, e a LMP, extinta[6].
Significa que o que hoje é tratado como crime de maior potencial ofensivo será abrandado. A punição que hoje se configura prisão, por exemplo, pode ser restrita ao pagamento de cestas básicas, à prestação de serviços comunitários. Em um ano de existência, a Promotoria da Mulher em Fortaleza aumentou de 2.800 para 6.923 processos.
Para Maria da Penha Maia Fernandes, que dá nome à lei, isso representa uma tolerância no trato da violência contra a mulher. “O Projeto de Lei é uma ameaça aos avanços conquistados pelas mulheres”[7]. Deste modo, a falta de aplicação ou a invalidação da Lei Maria da Penha é causa de responsabilidade total do nosso Estado, sendo que não se deve admitir retrocessos na lei que foi criada após uma convenção internacional que visa a erradicação de tal violência no âmbito não só nacional como internacional.
Considerações finais
Diante de todas as considerações teóricas expostas, firmam-se as seguintes conclusões:
A Lei nº 11.340/2006 é totalmente constituição, pois, tem seu fundamento elencado no artigo 226, parágrafo 8º da Constituição Federal, que determina a criação de mecanismos jurídicos para a coibição da violência familiar e doméstica, sendo que tal violência é repudiada de forma expressa na Magna Carta.
Além da Lei Maria da Penha ser constitucional, ela também é convencional, pois, a chamada convencionalidade da lei decorre da adaptação das leis infraconstitucionais existente aos tratados e convenções internacionais a qual o Estado brasileiro se sujeita, ou seja, decorrente da Convenção Interamericana dos Direitos Humanos, a qual o Brasil é signatário.
A presente lei se originou com o fundamento a garantir os direitos humanos fundamentais da mulher, sendo que a lei assegurou o direito à integridade física, psíquica, moral, patrimonial e sexual da mulher, levando se em conta a inferioridade mulher ainda existente na sociedade. Ademais, os objetivos básicos intrínsecos na lei são a proteção da mulher, a repressão do agressor e a erradicação da violência doméstica e familiar.
A Lei 11.340/2006 visa a criação de mecanismos específicos para otimizar a eficácia penal, sendo criadas medidas de protetivas de urgência, para garantir a total proteção da mulher, pois, o agressor vive na esfera familiar da vítima.
Foi analisado também o equívoco quanto ao procedimento penal, no caso específico da vítima que se sente amedrontada pelo parceiro e não comunicam o caso as autoridades competentes com medo de sofrer maiores retaliações. No caso em tela cometeu um deslize ao tratar da lesão corporal se proceder mediante representação.
E por fim, a falta de aplicação ou invalidação da Lei 11.340/2006 é causa de responsabilização do Estado brasileiro, sendo que não se deve admitir retrocessos na lei que foi criada após uma convenção internacional que visa a erradicação de tal violência no âmbito não só nacional como internacional.
Especialista em Ciências Criminais pela Universidade Anhanguera. Graduado em Direito pela Universidade São Francisco USF. Advogado
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