Resumo: Análise da nova modalidade de interdição temporária de direitos criada pela Lei n. 12.550, de 15 de dezembro de 2011.
A Lei n. 12.550, de 15 de dezembro de 2011, publicada em 16 de dezembro de 2011 no Diário Oficial da União, entre outras inovações legislativas, criou uma nova modalidade de interdição temporária de direitos, qual seja, a “proibição de inscrever-se em concurso, avaliação ou exame públicos”, prevista no inciso V do artigo 47, do Decreto-Lei no 2.848, de 7 de dezembro de 1940 – Código Penal.
A teor do disposto no artigo 37, inciso I, da Constituição da República Federativa do Brasil, o princípio da acessibilidade aos cargos públicos poderá ser condicionado “na forma da lei”. Assim sendo, a predita pena restritiva de direitos, se revela uma norma de inquestionável constitucionalidade, uma vez que o Poder Constituinte Originário confiou ao legislador ordinário a tarefa de estabelecer certas restrições à acessibilidade aos cargos públicos, que não podem validamente colidir com o princípio da isonomia, o que não parece ser o caso.
Esta nova espécie de interdição temporária de direitos possui a natureza juídica de pena restritiva de direitos (artigo 44, do Código Penal), e diz respeito à proibição ao ato de inscrição em concurso, avaliação ou exame públicos, i.e., a pena impõe um dever negativo, um non facere, uma obrigatoriedade de que o apenado se abstenha de efetuar sua inscrição em certames de interesse público.
Por concurso público, entende-se aquele procedimento administrativo que visa selecionar candidatos para o provimento de cargos ou empregos públicos. Já a avaliação ou o exame públicos são procedimentos dotados de conotação mais ampla, pelo que podem ser promovidos tanto por pessoas jurídicas de direito público como pelas de direito privado, e que visa tornar possível ao pretendente a realização de certa atividade ou serviço.
Confrontando a pena restritiva de direitos em exame com redação típica do artigo 311-A, que prevê o crime de “fraudes em certames de interesse público”, se nota que o legislador penal foi menos restritivo, ao cunhar a norma elencada no inciso V do artigo 47, do Código Penal, uma vez que neste dispositivo não foi mencionada a proibição de inscrever-se a “processo seletivo para ingresso no ensino superior”, ou de inscrever-se em “exame ou processo seletivo previstos em lei”. Portanto, nada impede que o condenado a pena retritiva de direitos consistente na “proibição de inscrever-se em concurso, avaliação ou exame públicos”, se inscreva, por exemplo, em exame vestibular para o ingresso em instituição de ensino superior.
Como as demais penas restritivas de direito elencadas no artigo 47, do Código Penal, a “proibição de inscrever-se em concurso, avaliação ou exame públicos” é pena autônoma e substitui a pena privativa de liberdade se atendidas as condições de substituição previstas no artigo 44, do mesmo diploma legal.
A nova interdição temporária de direitos não deve ser confundida com aquelas previstas nos incisos I (“proibição do exercício de cargo, função ou atividade pública, bem como de madato eletivo”) e II (“proibição do exercício de profissão, atividade ou ofício que dependam de habilitação especial, de licença ou autorização do poder público”), do artigo 47, do Código Penal, uma vez que estas interdições visam impor restrições para aqueles condenados que já se encontram no pleno exercício das atribuições ou atividades mencionadas.
Além disso, as interdições previstas nos incisos I e II, do artigo 47, do Código Penal, são conhecidas como penas restritivas de direitos específicas, uma vez que, de acordo com o artigo 56, do Código Penal, estas sanções penais somente têm lugar se houver “violação dos deveres que lhes são inerentes”. Por outro lado, a exemplo da pena restritiva de direitos prevista no inciso IV, do mesmo dispositivo, a interdição temporária em estudo é genérica, ou seja, preenchidos os requisitos legais para a substituição, pode ser aplicada a qualquer espécie de crime.
Ademais, igualmente, a mencionada interdição temporária de direitos não deve ser confundida com a “perda de cargo, função pública ou mandato eletivo”, prevista no artigo 92, inciso I, do Código Penal, que é um dos efeitos específicos, e não-automáticos, da condenação penal transitada em julgado.
Consoante o disposto no artigo 55, do Código Penal, em regra, a interdição de direitos em exame terá a mesma duração da pena privativa de liberdade substituída. No caso da pena privativa de liberdade substituída pela presente interdição temporária de direitos for superior a um ano, o condenado poderá cumprir a pena em menor tempo (artigo 46, parágrafo único, do Código Penal).
Outrossim, esta pena restritiva de direitos poderá ser convertida em pena privativa de liberdade no caso de descumprimento da restrição imposta (“proibição de inscrever-se em concurso, avaliação ou exame públicos”), i.e., caso o condenado efetivamente se inscreva em algum certame público após a imposição desta sanção penal.
No caso de o condenado já estar previamente inscrito em um certame público, e sobrevir a sanção penal que substitui a pena privativa de liberdade pela “proibição de inscrever-se em concurso, avaliação ou exame públicos”, entendemos que a sua participação neste certame pretérito não será atingida pelos efeitos desta interdição de direitos, vez que como se trata de norma de natureza penal deve ser interpretada de maneira mais restrita possível.
Por derradeiro, a nova interdição de direitos não poderá ser aplicada para fatos anteriores a sua vigência, seguindo assim, o princípio da anterioridade ou da irretroatividade da lei penal mais severa (artigos 5º, inciso XXXIX, da Constituição da República Federativa do Brasil, e 1º do Código Penal).
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