Resumo: O direito a acessibilidade é um meio de garantir que as pessoas com deficiências ou com mobilidade reduzida possam desfrutar do direito de circularem e se utilizarem dos espaços de forma plena e livre de barreiras. O direito de acesso, sobretudo para as pessoas com deficiência foi assegurado na Constituição Federal brasileira e em diversas normas infraconstitucionais, todavia, o que se constata ainda, é a existência de ambientes construídos e adaptados sem a observância do desenho universal.
Palavras-chave: Acessibilidade, Convenção Sobre os Direitos das Pessoas com Deficiências e seu Protocolo Facultativo, inclusão social, desenho universal.
Abstract: The right to accessibility is a way to assure that disabled people or reduced mobility can enjoy the right to move and use the space fully and free of barriers. The right of access, especially for disabled people was provided in the Brazilian Federal Constitution and various provisions infra, however, it is still observed, the existence of built environments and adapted without the observance of universal design.
Keywords: Accessibility, Convention on the Rights of Persons with Disabilities and its Optional Protocol, social inclusion and universal design.
Sumário: 1- Introdução; 2 – Breves apontamentos sobre a normatização da acessibilidade no Brasil; 3- Desenho Universal; Conclusão; Bibliografia.
1. Introdução
A Humanidade sempre conviveu com a existência de pessoas com limitações de toda a natureza, nem sempre as tratando de forma adequada.[1]A preocupação da sociedade para com as pessoas que ostentam alguma forma deficiência não vem de hoje. Mas, sem dúvida, não deixa de ser relativamente recente a melhor conscientização social e jurídica do problema que enfrentam essas pessoas.
Afinal,
“a sobrevivência das pessoas com deficiência em todo o mundo e em todas as épocas, na grande maioria dos casos, tem sido uma verdadeira epopeia, que nunca deixou de ser uma luta quase que totalmente ignorada pela sociedade e pelos governos como um todo – uma verdadeira saga melancólica – em todas as culturas, pelos muitos séculos da existência do homem. Uma epopeia ignorada, não por desconhecimento acidental ou por falta de informações, mas por não se desejar dela tomar conhecimento”.[2]
Após a II Grande Guerra Mundial, começa haver uma conscientização da sociedade, principalmente, com relação às pessoas com deficiência, ocasionando uma mudança de postura. Tanto que, a Organização das Nações Unidas (ONU) esboça uma sensibilização e uma conscientização positiva para a reabilitação não apenas de militares, mas também, para as vítimas civis que retornavam doentes ou mutiladas dos conflitos da guerra.
Com essa atitude, a questão da inclusão das minorias étnicas, culturais, de gênero toma relevo e passa a ser reconhecida em documentos nacionais e internacionais. Esse novo paradigma social traz como princípios a celebração da valorização da diversidade humana, solidariedade humanitária, igual importância a esses grupos vulneráveis e cidadania com qualidade de vida.
Dentro dessa perspectiva, a Constituição Federal de 1988 inaugura uma nova fisionomia ao Estado brasileiro, vez que não somente o consagrou democrático, mas também, ressaltou o seu caráter essencialmente social, ao fundá-lo em valores como a dignidade humana e a cidadania, que repercutem sobre o ordenamento como um todo e ao mesmo tempo serve de norte para toda e qualquer iniciativa privada e pública.[3]
Ademais, o Brasil, na busca pela implementação dos direitos das pessoas com deficiência, assina no dia 30 de março de 2007, a Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência e seu Protocolo Facultativo, promulgados pela Organização das Nações Unidas.[4] Após a promulgação do Decreto Legislativo n° 186 pelo Congresso Nacional, o Presidente da República, no uso das atribuições que lhe conferem o artigo 84, inciso VI, ratificou a referida Convenção através do Decreto n° 6.949, em 25 de agosto de 2009.[5]
A Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência insere-se com o propósito de proteger e assegurar condições de igualdade de direitos humanos e liberdades fundamentais para todas as pessoas com deficiências.[6]
A presente Convenção não teve a preocupação de instituir novos direitos humanos e liberdades fundamentais para as pessoas com deficiência, mas em garantir que essas pessoas possam vir a usufruí-los. Para que isso ocorra, adotou a Convenção como parâmetro condições de igualdade, tanto que, ao desdobrar o artigo 1°, reforçou a ideia de que as barreiras[7], e em nosso trabalho, as barreiras físicas, impedirão a participação dessas pessoas de usufruírem de seus direitos em condições de igualdade.
A principal contribuição deste tratado internacional é a positivação da mudança de paradigma da visão da deficiência no mundo, que passa do modelo médico e assistencialista, predominante por muitos anos na história da humanidade, como exposto quando abordamos o conceito de pessoa com deficiência, para o modelo social dos direitos humanos.
A Convenção, ao ter reconhecido o modelo social como o mais novo paradigma para conceituar as pessoas com deficiência, embasou também a consolidação da acessibilidade positivada como princípio fundamental para que esse segmento concretize seus direitos fundamentais em todos os aspectos de suas vidas. Nesse sentido, assevera Laís Vanessa Carvalho de Figueirêdo Lopes, que a acessibilidade como direito natural, inato ao ser humano, poderia ser eventualmente concedida se pleiteada por uma pessoa com deficiência, mas não havia dispositivo de texto legal internacional que garantisse o seu provimento universal. “Com o novo tratado de direitos humanos que promoveu o seu reconhecimento global e positivo, assegura-se legitimidade e a implantação da acessibilidade como princípio norteador dos sistemas jurídicos e como um direito fundamental”. Portanto, conclui a mesma autora, a acessibilidade surge no cenário global como um direito forte, suportado por tratado internacional, reconhecida com um duplo caráter: constituindo tanto como princípio norteador, quanto como um direito. E como princípio-direito obriga os Estados à sua implementação como garantia fundamental, extremamente relevante para a concretização dos direitos humanos das pessoas com deficiência. [8]
Na Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência, em seu Preâmbulo, foi expressamente reconhecida à importância da acessibilidade aos meios físico, social, econômico e cultural, à saúde, à educação, e à informação e comunicação, para possibilitar às pessoas com deficiência o pleno gozo de todos os direitos humanos e liberdades fundamentais. E seu artigo 3°, juntamente com o respeito à dignidade, a autonomia individual, aliada a liberdade de fazer suas próprias escolhas, a independência, a não-discriminação, a plena e efetiva participação e inclusão, o respeito à diferença, a igualdade de oportunidades, a acessibilidade foi elencada como um dos princípios gerais que deverão nortear a vida das pessoas com deficiências. [9]
Para que a pessoa com deficiência exerça de forma efetiva o direito à acessibilidade, a Convenção determinou também em seu artigo 9°, que os Estados estarão obrigados a tomar medidas apropriadas para assegurar a sua efetivação, em igualdade de oportunidades com as demais pessoas, ao meio físico, ao transporte, à informação e comunicação, bem como a outros serviços e instalações abertos ao público ou de uso público, tanto na zona urbana como na rural.
Dentre as suas definições, trouxe também o termo adaptação razoável. Um termo novo entre nós, que precisa ser muito bem interpretado para não correr o risco de entendimentos no sentido de que, se não for possível o ajuste necessário, admite-se a negação ao exercício de tal direito. Nesse sentido assevera Eugenia Augusta Fávero Gonzaga.que
“tal interpretação seria totalmente equivocada, pois representaria a negação de todo o contexto em que foi traçada a Convenção, ou seja, da insistente proclamação do direito a igualdade e à não-discriminação no acesso aos mesmos bens da vida visados pelos seres humanos em geral.”[10]
A Convenção define em seu artigo 2º adaptação razoável como
“as modificações e ajustes necessários e adequados que não acarretem ônus desproporcional ou indevido, quando requeridos em cada caso, a fim de assegurar que as pessoas com deficiência possam gozar ou exercer, em igualdade de oportunidades com as demais pessoas, todos os direitos humanos e liberdades fundamentais”.
O propósito dessa definição, segundo esclarece Laís Vanessa Carvalho de Figueirêdo Lopes, é ter um conceito de equilíbrio em relação ao custo de adaptação para acessibilizar um ambiente para uma pessoa com deficiência:
“A interpretação mais benéfica que se pode ter, a partir da gramática dos direitos humanos, é que, para cada pessoa, a adaptação realizada para possibilitar o pleno gozo e exercício de seus direitos deve ser razoável, tanto do ponto de vista do mínimo necessário para garantir algum grau de autonomia e segurança, quanto, se observada a questão sob o prisma econômico, para que a acessibilidade não seja considerada um custo inviável, o que poderia ensejar o seu descumprimento.”[11]
Para que seja uma realidade a efetivação do direito à acessibilidade, prossegue a Convenção determinando que os obstáculos e barreiras existentes em edifícios, rodovias, meios de transporte e outras instalações internas e externas, inclusive escolas, residências, instalações médicas e locais de trabalho, bem como, informações, comunicações e outros serviços, inclusive serviços eletrônicos e de emergência, deverão ser identificados e eliminados.
Assim, a acessibilidade é uma condição de aproximação, com segurança e autonomia, a determinados espaços, objetos e elementos diversos, possibilitando a utilização de todas as atividades inerentes e usos específicos que eles possam oferecer.
Como se percebe a pessoa com deficiência só conseguirá usufruir de seus direitos se tiver uma cidade que esteja acessível, isto é, uma cidade em que a pessoa com deficiência consiga se locomover, se deslocar livremente pelos seus espaços. Sair de sua residência, encontrar pelo seu caminho uma calçada que esteja com o piso adequado; as esquinas com rampas; transporte adaptado etc.
Portanto, para que haja uma sociedade verdadeiramente democrática, isto é, aquela que concretize o direito de todos e não apenas da maioria, temos que concretizar com eficiência a tal almejada inclusão social[12]. Não é uma tarefa fácil entender o seu real significado, pois um de seus princípios, segundo preceitua Romeu Kazumi Sasssaki é a rejeição zero, também conhecida como exclusão zero[13]. Isto quer dizer que, ou se adere totalmente aos seus princípios, ou não se fala em inclusão.
Assim, para concretizar a inclusão social das pessoas com deficiência é imprescindível cumprir as normas que asseguram a acessibilidade.
2 – Breves apontamentos sobre a normatização da acessibilidade no Brasil
A questão da acessibilidade não é um tema tão recente. Tal como acontece em muitos países, no Brasil teve início em 1981, quando foi declarado o Ano Internacional dos Portadores de Deficiência pelas Nações Unidas. No ano de 1982, a mesma Organização aprovou o Programa de Ação Mundial para Pessoas com Deficiência, ressaltando o direito dessas pessoas com deficiência a terem às mesmas oportunidades que os demais cidadãos e a desfrutarem, em condições de igualdade, de melhorias nas condições de vida resultantes do desenvolvimento econômico e social.
Dentro desse contexto, o Brasil publica a primeira norma técnica sobre o tema – a NBR 9050¤1985[14] – Adequação das Edificações e do Mobiliário Urbano à Pessoa Deficiente, elaborada pela comissão de estudos do Comitê Brasileiro da Construção Civil, da Associação Brasileira de Normas Técnicas.[15]
Após três anos, é promulgada a Constituição Federal de 1988, que disciplina a acessibilidade quando assegura no artigo 227, § 2°, que a Lei disporá sobre normas de construção dos logradouros e dos edifícios de uso público e de fabricação de veículos de transporte coletivo, a fim de garantir o acesso adequado às pessoas com deficiência, e, no artigo 244 complementa a citada norma, acrescentando que a lei disporá sobre a adaptação dos logradouros, dos edifícios de uso público e dos veículos de transporte coletivo atualmente existentes, a fim de garantir acesso adequado às pessoas portadoras de deficiência, conforme o disposto no artigo 227, § 2°.”
Atendendo a tal comando, foi editada a Lei n° 7.853¤89, que dispõe sobre o apoio às pessoas portadoras de deficiência, sua integração social, sobre a Coordenadoria Nacional para Integração da Pessoa Portadora de Deficiência – CORDE institui a tutela jurisdicional de interesses coletivos ou difusos dessas pessoas, disciplina a atuação do Ministério Público, define crimes, e dá outras providências. Em seu artigo 2° já assegurava que os órgãos e entidades da Administração direta e indireta devem dispensar tratamento prioritário e adequado às pessoas com deficiência, determinando, na área das edificações, a adoção e a efetiva execução de normas que garantam a funcionalidade das edificações e vias públicas, que evitem ou removam os óbices às pessoas com deficiência, permitindo o acesso destas a edifícios, a logradouros e a meios de transportes.
O Decreto n° 3.298¤99 que regulamentou a Lei n° 7.853¤89 trouxe como um dos objetivos da Política Nacional para Integração da Pessoa Portadora de Deficiência o acesso, o ingresso e a permanência delas em todos os serviços oferecidos à comunidade, estabelecendo em seu artigo 2°, parágrafo único, que os órgãos e entidades da administração direta e indireta devem dispensar tratamento prioritário e adequado para viabilizar medidas em diversas áreas, dentre as quais, a adoção e execução de normas que garantam a funcionalidade das edificações e vias públicas, que evitem ou removam os óbices às pessoas portadoras de deficiência e que permitam o acesso destas a edifícios, logradouros e meios de transporte.
A acessibilidade foi novamente tratada pela Lei n° 10.048/00 que assegura tratamento prioritário às pessoas com deficiência, idosos, às gestantes, às lactantes e às pessoas acompanhadas por crianças de colo. Essa lei obriga as repartições públicas, empresas concessionárias de serviço público e instituições financeiras a dispensar tratamento prioritário, por meio de serviços individualizados a essas pessoas, bem como sejam reservados assentos nos transportes coletivos; orienta ainda que compete às autoridades adotarem normas de construção e licenciamento para garantir acessibilidade em logradouros e sanitários públicos, bem como em edifícios de uso público e também, a acessibilidade nos meios de transportes.
A Lei n° 10.098/00 estabelece normas gerais e critérios básicos para promoção da acessibilidade das pessoas com deficiência ou com mobilidade reduzida, nas edificações públicas ou privadas, no espaço público, logradouros e seu mobiliário, nas comunicações e sinalização entre outros. O objetivo desta lei será alcançado quando forem suprimidas as barreiras e obstáculos nas vias e espaços públicos, no mobiliário urbano, na construção e reforma de edifícios e nos meios de transporte e de comunicação. Para os fins da lei são estabelecidas várias definições em seu capítulo primeiro, dentre as quais, o que é acessibilidade, barreiras, elementos de urbanização, mobiliário urbano, ajuda técnica e, de forma simplificada, a definição de pessoa portadora de deficiência.
Além da acessibilidade ao meio físico, a lei aborda também a acessibilidade nos sistemas de comunicação e sinalização garantindo o direito de acesso à informação, à comunicação, ao trabalho, à educação, ao transporte, à cultura, ao esporte e ao lazer.
Dispõe sobre ajudas técnicas, que são equipamentos que servirão para promover a supressão de barreiras urbanísticas, arquitetônicas, de transporte e de comunicação.
Para implementação das medidas de fomento e eliminação das barreiras, define que cabe ao Ministério da Justiça a aplicação do Programa Nacional de Acessibilidade com dotação orçamentária específica.
Em suas disposições finais estabelece que o Poder Público promova campanhas informativas e educativas dirigidas à população em geral, com a finalidade de conscientização e sensibilização quanto à acessibilidade e integração social da pessoa portadora de deficiência ou com mobilidade reduzida. E ainda, determina que esta lei também se aplica aos edifícios ou imóveis declarados bens de interesse cultural ou de valor histórico-artístico e, finaliza informando que “as organizações representativas de pessoas portadoras de deficiência terão legitimidade para acompanhar o cumprimento dos requisitos de acessibilidade estabelecidos nesta lei”. (grifo nosso)
Passaram-se quatro anos e é publicado o Decreto n° 5.296, de 02 de dezembro de 2004 que regulamenta as Leis n° 10.048¤00, que dá prioridade de atendimento às pessoas que especifica e, a de n° 10.098¤00, que estabelece normas gerais e critérios básicos para a promoção de acessibilidade das pessoas portadoras de deficiência ou com mobilidade reduzida. Ficam sujeitos ao cumprimento deste Decreto, a aprovação de projeto de natureza arquitetônica e urbanística, de comunicação e informação, de transporte coletivo e a execução de qualquer tipo de obra, de destinação pública ou coletiva; a outorga de permissão, autorização ou habilitação de qualquer natureza; a aprovação de financiamento de projetos com a utilização de recursos públicos, por meio de convênio, acordo, ajuste, contrato ou similar; e a concessão de aval da União na obtenção de empréstimos e financiamentos internacionais por entes públicos ou privados.
Este Decreto, esclarece Adriana de Almeida Prado, só não se aplica dentro de uma casa ou de uma unidade autônoma, quando se tratar de condomínios; no restante das edificações de uso público ou privado ou de uso coletivo, devem ser construídas acessíveis.[16]
Para que isso ocorra, o Decreto estabelece normas gerais e critérios básicos para a promoção da acessibilidade das pessoas com deficiência ou com mobilidade reduzida nas edificações públicas ou privadas de uso coletivo ou multifamiliar, no espaço público, logradouros e seu mobiliário, nas comunicações e sinalizações, entre outros. Definiu prazos para a acessibilidade ser aplicada nas edificações públicas ou de uso público, em Junho de 2007 e as de uso privado, em Dezembro de 2008.
Tamanha é a importância do meio em que se vive, que a Convenção Internacional dos Direitos das Pessoas com Deficiência, como mencionamos anteriormente, positivou a mudança do paradigma que adotava o modelo médico ou assistencial de deficiência para o modelo social, que vê a deficiência como resultante da equação de interação da limitação funcional com o meio. Devido a essa mudança de paradigma, cabe aos envolvidos na construção e adaptações dos espaços o dever de planejá-los de forma que as pessoas consigam circular por eles de forma plena e segura, uma vez que, um espaço acessível para todos é um fator positivo de inclusão social e equiparação de oportunidades, ocasionando sua falta, a exclusão do indivíduo da sociedade e, notadamente, de sua cidade.
Por ter sido a Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência, ratificada pelo Brasil com status de emenda constitucional, a acessibilidade passa a ter extrema relevância para a concretização dos direitos das pessoas com deficiência.
Segundo aduz José Antonio Lanchotti, hoje se tem quatro peças de suma importância na produção da cidade acessível: as duas leis federais n° 10.048¤00 e n° 10.098¤00, a NBR 9050¤2004 e o Decreto Federal que regulamenta as leis mencionadas e o adota os conceitos técnicos expostos na referida NBR. Embora tenham sido destacadas as quatro peças acima, existe um conjunto de outras Leis, Decretos, Portarias, Declarações e Normas que contribuem para a produção da acessibilidade.[17]
Assim sendo, O Brasil conta hoje com uma das mais avançadas legislações que contemplam a acessibilidade de maneira ampla. Com a assinatura do Decreto n° 5.296¤2004 urbanistas, arquitetos e engenheiros terão possibilidade de efetivarem a acessibilidade nas construções e adaptações dos ambientes.
Porém, o que se pode constatar é que, apesar do numeroso conjunto jurídico e técnico, a maioria das pessoas envolvidas na construção e adaptações de ambientes, ainda não vem cumprindo as exigências dispostas nas normas de acessibilidade.
As pessoas com deficiência, ao se deslocarem pelos espaços ainda se deparam com vários entraves e obstáculos que dificultam e as impedem de utilizarem e de se locomoverem. É fundamental que elas consigam utilizar todos os espaços com autonomia e segurança.
Afinal, afirma Maria Isabel Lopes, não basta fazer “rampinhas”.[18] Não podem ser considerados acessíveis os locais em que as exigências legais referentes à acessibilidade foram projetadas e executadas de modo parcial. Quando isso ocorre, o dinheiro aplicado é desperdiçado. Completando, assevera Rebecca Monte Bezerra que “não existe a meia-acessibilidade. Um espaço é ou não é acessível”. [19]
A primeira preocupação que surge com todos os envolvidos com a execução de um projeto que contemple acessibilidade é o acréscimo que isto trará a obra em termos financeiros. Há grande equívoco de que a eliminação de barreiras e obstáculos pelos espaços da cidade causaria grandes custos.
Edward Steinfeld, da Universidade Estadual de Nova Iorque, em 1979, desenvolveu um estudo onde comparou os acréscimos nos custos de uma obra quando projetada e edificada de forma acessível com o conceito do desenho universal e os custos para a adaptação com o desenho universal para uma situação já existente. No primeiro caso, se uma estrutura tivesse sido desenhada sem barreiras desde o início, no caso de shoppping center, o acréscimo de custo seria 0,006% e, no caso de salas de aula, seria de até 0,13%. No segundo caso, que o autor nomeia de “retroadaptação” a situação de ter que adaptar uma situação existente (reforma), o acréscimo comparado ao custo original da obra variou de 0,12% até 0,5%.
Em 1980, outro estudo foi realizado pelo departamento de reforma urbana de Singapura, onde simulou o custo da acessibilidade de um grande centro de escritórios com estacionamento, um restaurante, um mercado, e constatou um acréscimo de 0,11% sobre o valor total da obra.
Outra pesquisa, sobre domicílios unifamiliares realizada em Ottawa, no Canadá, mostrou que de um projeto de 54 casas, sendo nove unidades desenhadas e construídas acessíveis, custava 8 a 10% a mais, o que representou um acréscimo de apenas 0,5% aos custos totais do projeto global.
Segundo o Conselho Sueco de Pesquisa sobre a Construção, os custos adicionais para uma construção acessível ficam entre 0,5% e 1% acima dos custos totais de construção. E, outra conclusão importante foi o estudo feito por Edward Steinfeld, que, ao comparar os custos da reforma com essas características livres de barreiras, com o que teria custado desenhar esses prédios desde o início sem elas, nesses casos seria entre 4 a 35% vezes mais caro renovar ou reformar os prédios do que construí-los acessíveis desde o início, ou seja, custa 4 a 35 vezes mais do que construí-los com acessibilidade desde o princípio.
Cabe esclarecer que todos estes estudos e pesquisas foram apresentados durante o VI Seminário Sobre Acessibilidade ao Meio Físico, realizado no Rio de Janeiro em 1994.[20]
Se a acessibilidade exige custos, que como constatamos são bem ínfimos, trará muito mais benefícios. Nesse sentido, esclarece Marcelo Guimarães que, ao remover as barreiras, a pessoa com deficiência passa a investir em si mesma. Ela segue vivendo de modo pleno, ao invés de perpetuar uma vida vegetativa, sob noções de despesas públicas a fundos sociais sem retorno, desperdício, o beneficiário, retorna o investimento em termos quantitativos, aferidos pela produtividade industrial, por exemplo, e qualitativos, aferidos pelo ambiente de vida participativa que passa a motivar. Aduz ainda esse autor que a acessibilidade deve estar presente em todos os lugares. Quando a acessibilidade é ampla e bem formulada, não há dinheiro jogado fora. O que se observa é justamente o contrário: ao invés do inviável, do grotesco, do absurdo, obtém-se o funcional, o seguro, o conveniente, o agradável, o desejável.[21]
Depois de anos de o Brasil ter ratificado a Convenção Internacional sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência, o governo federal sinaliza que inclusão e respeito às pessoas com deficiência devem ser para valer. Para tanto, o governo prepara um programa, com investimentos que pode chegar a R$ 10 bilhões até 2014 para esse grupo de pessoas. O plano traz projetos de saúde, educação, inclusão ao mercado de trabalho e, especificamente acessibilidade. No tocante a acessibilidade, o governo irá implantar as chamadas “casas inclusivas”, residenciais especializadas para jovens e adultos com deficiência. O projeto é a nova “menina dos olhos” da Presidenta Dilma e da ministra Gleisi Hoffman (Casa Civil).[22]
Assim, segundo a arquiteta Adriana Romeiro de Almeida Prado, da Fundação Prefeito Faria Lima – CEPAM, um projeto que nasce acessível, ou seja, aquele que é concebido considerando os princípios do desenho universal, seu custo não passará de 1% sobre o custo total da obra, mas quando se tratar de adequação dos projetos já construídos, esses valores podem atingir cifras bem altas.[23]
Portanto, é inconcebível, nos dias atuais, que obras continuem sendo construídas ou reformadas sem contemplar os princípios da acessibilidade e do desenho universal.
Mas o que se entende por desenho universal?
3- Desenho Universal
As ações destruidoras ocasionadas após a Segunda Grande Guerra Mundial atraíram a atenção pública para o antigo problema das pessoas com deficiências locomotoras e sensoriais, originadas ou não em conflitos armados, que necessitavam não só dos cuidados que as instituições especiais pudessem lhes prover, mas também, que os ambientes em que exerceriam suas atividades fossem espaços acessíveis e, por conseguinte, livres de barreiras.
Isto resultou, no ano de 1963, em Washington, Estados Unidos, na criação de uma comissão cuja visão inicial era a produção de um projeto de equipamentos, edifícios e áreas urbanas sem barreiras, motivo pelo qual era chamado Desenho livre de barreiras. Este conceito de um desenho livre de barreiras acabou evoluindo para um desenho universal.
Esse conceito inseriu-se de forma bem incipiente no Brasil, nos anos 90, pelas mãos de profissionais e acadêmicos envolvidos nas questões sobre acessibilidade e na luta pelos direitos das pessoas com deficiência. E, foi incorporado ao texto da NBR 9050¤1994 quando o arquiteto americano Edward Steinfeld apresentou seu conceito no VI Seminário Ibero-Americano de Acessibilidade ao Meio Físico, em junho de 1994, na cidade do Rio de Janeiro.[24]
Segundo esse arquiteto, desenho acessível é diferente de desenho universal. O primeiro trata de produtos e edifícios acessíveis para pessoas com deficiência, enquanto o segundo pretende atender a todos, abarcando de forma inclusiva a população com limitações para o desempenho de tarefas e uso dos espaços. [25]
A expressão desenho universal ou universal designer foi cunhada pelo arquiteto Ron Mace, que articulou e influenciou uma mudança nos paradigmas dos projetos de arquitetura e design.[26] Segundo ele, o desenho universal é utilizado para descrever o conceito de projetar e construir produtos ou ambientes para ser utilizável, na maior medida possível, por todos.[27]
O objetivo principal dessa nova concepção, segundo assevera José Antonio Lanchotti é o de “simplificar as ações do dia-a-dia de todas as pessoas, produzindo ambientes, objetos e comunicações que possam ser utilizados por todas as pessoas sem precisar de custos extras com adaptações ou adequações, beneficiando usuários de várias idades e habilidades”.[28]
Encontramos a definição de Desenho Universal na nova NBR 9050¤2004 da ABNT como sendo “aquele que visa atender a maior gama de variações possíveis das características antropométricas e sensoriais da população”. E, também no inciso IX, do artigo 8° do Decreto n° 5.296¤2004 define como a concepção de espaços, artefatos e produtos que visam atender simultaneamente todas as pessoas, com diferentes características antropométricas e sensoriais, de forma autônoma, segura e confortável, constituindo-se nos elementos ou soluções que compõem a acessibilidade.
É importante observar que, ao se aplicar o conceito do Desenho Universal, possibilitará que diversas pessoas ingressem, circulem e utilizem todos os espaços da cidade e não apenas parte deles. Isso porque, esclarece Lanchotti, que a essência do Desenho Universal está na busca de implantar uma justa concepção de projetos que atendam as funções e necessidades de todas as pessoas. [29]
Assim, o desenho universal só atingirá esse objetivo quando for aplicado em todas as funções urbanas – moradia, trabalho, lazer e, especificamente em nosso estudo, na livre circulação das pessoas com deficiência pelos espaços de nossas cidades. Somente por meio da inclusão será possível obter progressos significativos na remoção das barreiras que impedem que os cidadãos com algum tipo de deficiência ou mobilidade reduzida venham a participar de forma equitativa, como aqueles que não são deficientes.[30]
Para a difusão dos conceitos do Desenho Universal, em dezembro de 2004, na cidade do Rio de Janeiro, aconteceu a Conferência Internacional sobre Desenho Universal, denominada Projetando para o Século XXI. Nesta ocasião, foi criado o Fórum de Planejamento Estratégico para a América Latina, contando com apoio da Prefeitura Municipal da Cidade do Rio de Janeiro, do Centro de Vida Independente do Rio de Janeiro – CVI – Rio, do Adaptive Environments de Boston e do Programa Global das Nações Unidas para Portadores de Deficiência. [31]
Deste Fórum resultou a assinatura da denominada Carta do Rio: Desenho Universal para um Desenvolvimento Inclusivo e Sustentável. Esta Carta reforça que o Desenho Universal tem como principal propósito atender às necessidades e viabilizar a participação social e o acesso aos bens e serviços à maior gama possível de usuários, contribuindo para a inclusão das pessoas que estão impedidas de interagir na sociedade e contribuir para o seu desenvolvimento. O que se observa é que, na procura de atender as necessidades da maior gama possível de usuários, a Carta inclui, além das pessoas com diferentes tipos de deficiência, as pessoas pobres, as marginalizadas por sua condição cultural, racial, étnica; as pessoas obesas; mulheres grávidas, meninos e meninas; pessoas muito baixas ou muito altas e tantas outras que, por diferentes razões, também são excluídas de participarem da vida social.[32]
A Carta reconhece que o Desenho Universal é conceito emergente no Desenvolvimento Inclusivo e deve ter a virtude de conceber os ambientes, serviços, programas e tecnologias em virtude de sete princípios básicos como sustentação.[33] Estes princípios já haviam sido desenvolvidos nos Estados Unidos pelo Center for Universal Design, com sede na Escola de Design da Universidade da Carolina do Norte. Estes princípios, segundo esclarece Silvana Cambiaghi, devem ser aplicados para avaliar os projetos existentes, orientar os novos e para serem adotados como literatura para o ensino e capacitação de futuros arquitetos, designer e pessoas ligadas à área de construção civil e desenvolvimento de produtos[34].
Nesse mesmo sentido assevera José Antonio Lanchotti que são sete os princípios do desenho universal, descritos a seguir:
1- Uso equiparável – os projetos devem buscar atender a equiparação de oportunidades entre os usuários, respeitando a diversidade nas habilidades das pessoas; devem atender a maior variação antropométrica possível, ou seja, acomodar dentro desta lógica, o maior número de pessoas com diferentes características físicas – altos, baixos, gordos, pessoas em pé, pessoas sentadas, idosos, gestantes.
2- Uso flexível – o projeto deve atender uma larga escala de preferências e habilidades individuais.
3- Simplicidade e intuição – o desenho do projeto deve ser de fácil compreensão para seu uso, não dependendo da experiência do usuário, nem de seu conhecimento intelectual, habilidades com a língua ou do seu nível de concentração; deve-se impor aos elementos e ambientes produzidos maior compreensão de suas partes componentes e de seu todo, de forma que possibilitem uma rápida identificação de suas funções e de seus limites – muitas vezes a complexidade de determinados espaços ou elementos limita sua utilização, seja por capacidade motora ou identificação intelectual.
4- Informação perceptível: o projeto deve garantir informações eficazes ao usuário para sua utilização, não dependendo de circunstâncias ambientais ou de habilidades sensoriais dos usuários; produzir espaços, objetos e produtos como sistemas integrados, permitindo a existência de determinados elementos ou pecas intercambiáveis, que possibilitem acrescentar características próprias que facilitem a identificação, o uso ou manuseio por parte de pessoas com limitações na mobilidade sem, contudo, produzir novos obstáculos a outros indivíduos;
5– Tolerância de erro: o projeto deve minimizar os perigos e as conseqüências indesejáveis provocadas por ações acidentais ou involuntárias;
6- Com pouca exigência de esforço físico: o projeto pode ser usado eficiente e confortavelmente com um mínimo de fadiga; deve-se buscar a redução da energia necessária para utilizar os espaços ambientais e produtos gerados com este conceito, interagindo com as soluções apresentadas – evitar ou reduzir grandes esforços que necessitem de habilidade e resistência física e a busca de altura através da extensão de membros limitam as pessoas idosas, as crianças, as gestantes, os usuários de cadeira de rodas e,
7- Tamanho e espaço para o acesso e o uso: o tamanho e o espaço para a aproximação, o alcance, a manipulação e o uso devem ser apropriados e adequados, independente do tamanho do corpo do usuário, sua postura ou mobilidade. [35]
O documento considera ainda ser inaceitável que recursos públicos continuem a ser utilizados para construção de qualquer obra que não contemple os princípios do desenho universal acima elencados.[36] Tal consideração vai ao encontro do princípio da eficiência que impõe como dever ao administrador público evitar o desperdício, a falha e má utilização do recurso público.
Assim sendo, a Carta defende que, para que o desenho universal se transforme num instrumento a serviço do desenvolvimento inclusivo, há necessidade de que o setor privado, sociedade civil, ONGs, Universidades, profissionais, organismos internacionais e os Estados e governos desempenhem cada um seus papéis, tal como descrito nas seguintes linhas de ação:
“Que os governos envidem esforços para conseguir instrumentos jurídicos que façam com que o desenho universal seja aplicado permanentemente e que este seja um componente transversal nos planos nacionais de desenvolvimento e nas políticas públicas.
Que o setor privado seja atraído para a aplicação do desenho universal no projeto de produtos e serviços, que este tema se transforme num assunto de interesse publico.
Que as universidades promovam o desenho universal na formação das profissões relacionadas ou afins com esse conceito e incentivem a pesquisa que permita a expansão, a aplicação e o desenvolvimento do desenho universal.
Que os profissionais diretamente relacionados com o desenho universal forneçam orientação técnica para conseguir sua aplicação mais eficaz e eficiente, voltada para o desenvolvimento e a inclusão social.
Que as organizações no momento mais conscientes da necessidade do desenho universal contribuam para disseminar o conceito em outros setores da sociedade civil e exerçam um papel ativo de vigilância social para que se avance permanentemente na acessibilidade e inclusão social por meio de sua aplicação efetiva.
Que os organismos internacionais e regionais avancem no instrumental jurídico e normas técnicas que promovam a aplicação permanente do desenho universal a serviço do desenvolvimento inclusivo.
Que os organismos multilaterais de credito transformem o desenho universal num tema do desenvolvimento, promovam seu avanço, sua aplicação pratica, pesquisa e difusão com recursos econômicos e o coloquem como uma salvaguarda para a elaboração de projetos e requisito para aprovação de empréstimos aos países.”[37]
No tocante a adoção pelos profissionais diretamente relacionados, as razões são várias para incentivar e aplicar o desenho universal. Primeiramente, a sociedade estará mais inclusiva, afinal estará se cumprindo o conceito de igualdade de oportunidades aprovado pela ONU, pois ao adotar e incentivar a aplicação do desenho universal, todas as pessoas, sem distinção de sexo, idade, capacidades, etnia ou crença estarão utilizando, em situação de igualdade, todos os serviços públicos que deverão estar aptos a esse uso. Do ponto de vista da sustentabilidade, a aplicação de desenho universal implica a satisfação do usuário durante mais tempo, o que ampliará a vida útil do produto e do ambiente construído e reduzirá custo, energia, produção e desperdícios.
Assim, para obter o êxito almejado na aplicação do conceito do Desenho Universal há a necessidade de se trabalhar três áreas distintas do conhecimento, a saber:
“1- a formação do profissional universitário, do profissional técnico, do executor e do fiscal dos projetos e obras; está nesta formação técnica o conhecimento necessário de quem elaborará os projetos e de quem os colocará à disposição de toda a população; há também a capacitação dos técnicos que fiscalização o que realmente foi executado;
2- a norma técnica que fornecerá o respaldo técnico e conceitual necessários para assegurarem o cumprimento das soluções, de maneira universal, com critérios baseados no consenso; são posturas estudadas e traçadas por especialistas em áreas específicas do conhecimento técnico e que devem ser seguidas de forma a se ter um padrão nas soluções e alternativas; e,
3- a regulamentação e a gestão, pois sem vontade política e sem autoridade pública não há como se estabelecer parâmetros que obriguem o cumprimento do que foi determinado, e assim, a teoria não se transforma em prática; é preciso estar bem clara a postura do órgão gestor que administrará as ações a serem implantadas e que estas estejam regulamentadas de forma a serem perseguidas mesmo com a mudança política da administração.”[38]
Sendo assim, é inconcebível, nos dias atuais, que projetos e obras continuem sendo construídas ou reformadas sem contemplar os princípios do desenho universal. Afinal, conforme constatamos, a essência do desenho universal é promover a qualidade de vida a todos os cidadãos e para que isso ocorra, é preciso que haja uma mudança de atitude de todos os agentes envolvidos, principalmente dos profissionais envolvidos na construção e adaptações dos espaços.
Dentro desse contexto, afirma José Antônio Junca Ubierna estar convencido de que, além de concreto e estrutura metálicas, as cidades são feitas de pessoas e sentimentos. Portanto, o objetivo da acessibilidade e do desenho universal é obter autonomia pessoal e mobilidade, dando efetividade aos direitos humanos. “Uma coisa é fazer declarações de direitos e outra é implementá-los na prática.“ [39]
Conclusão
Considerando que, segundo dados estatísticos do Censo do IBGE de 2000, 14,5% da população brasileira possuem algum tipo de deficiência, totalizando aproximadamente 24,6 milhões de pessoas, todavia, circular de forma livre e com autonomia continua sendo um grande transtorno e também um grande desafio para a pessoa com deficiência que, ao se movimentar pelos espaços depara-se, principalmente, com incontáveis obstáculos físicos, que as impedem de exercer seus direitos em igualdade de condições com as demais pessoas.
A necessidade de circular está ligada ao desejo de realização das atividades sociais, culturais, políticas e econômicas necessárias na sociedade. As pessoas com deficiência e mobilidade reduzida deveriam conseguir se movimentar pelos seus espaços com autonomia, segurança e conforto. Sair de sua residência, conseguir chegar até o seu local de trabalho, buscar algum lazer ou ir a seu trabalho.
A acessibilidade aos edifícios e logradouros públicos, no transporte coletivo e nas suas mútuas interações é regra mínima e básica de cidadania, tanto que, o constituinte materializou-a no artigo 227, § 2° e no artigo 244. Para dar eficácia a esses dispositivos constitucionais, foram editadas, dentre outras, a Lei 7.853¤89, o Decreto n° 3.298¤99, as Leis n° 10.048¤00 e n° 10.098¤00 e o Decreto n° 5.296¤04. De uma maneira geral, toda essa legislação visa garantir a pessoa com eficiência a plena integração social, com a garantia da acessibilidade aos espaços.
A Constituição, ao ter ratificado a Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência e seu Protocolo Facultativo, determinou que o Estado deverá empreender todos os seus esforços para garantir a acessibilidade, para que se promova a igualdade de todos, em cumprimento aos fundamentos da República, de cidadania e dignidade da pessoa humana, o que se realizará pela definição de meios para que eles sejam atingidos.
Como mencionamos anteriormente o governo federal sinaliza para a inclusão e o respeito às pessoas com deficiência. Para tanto, prepara um programa com investimentos que pode chegar a R$ 10 bilhões até 2014. Será que realmente esse programa saíra do papel?!? Vamos aguardar e torcer por sua concretização.
Afinal, o direito à acessibilidade é uma exigência constitucional que surge, atualmente, como um direito fundamental, sobretudo, para a pessoa com deficiência. Para que elas possam realizar de modo pleno e irrestrito esse direito fundamental, é essencial que lhes assegure a capacidade de circular pelos espaços de forma livre e com autonomia.
Doutora em Direito pela Pontifícia Universidade Católica – PUC – São Paulo/SP, Mestre em Direito pela Instituição Toledo de Ensino – ITE – Bauru /SP, Pós graduada em Gerente de Cidades pela Fundação Armando Álvares Penteado – FAAP – São Paulo – SP, Graduada em Direito pela Instituição Toledo de Ensino – ITE – Bauru /SP. Professora nas disciplinas de Direito Administrativo, Direito Constitucional e Direito Tributário nos cursos de Direito das seguintes instituições educacionais: Complexo Educacional das Faculdades Metropolitanas Unidas – FMU, Universidade de Mogi das Cruzes – UMC – Campus Villa Lobos Universidade Paulista – UNIP – Campus Paraíso – São Paulo – SP; e, Universidade Paulista – UNIP, todas em São Paulo – SP.
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