A redução da maioridade penal sob foco sociológico

Resumo: O presente artigo tem como escopo versar sobre questionamentos abordados por diversas entidades no que concerne a diminuição da maioridade penal como forma de atenuar os índices de violência no Brasil. Tende-se a enfatizar a visão sociológica para chegar-se a uma solução que não venha a ser de encontro com o interesse comum a todos, qual seja, a instauração de um estado de bem estar social que garanta a população marginalizada seus direitos e os eduque para cumprir com seus deveres. Além de discutir sobre a necessidade de políticas públicas que venham a inserir o individuo no meio social como real solução para a onda de violência, mostrando que ineficaz é o Estado que pune de forma repressora os menores por atos infracionais aos quais o próprio Estado o condenou através de sua ineficiência em garantir-lhe uma vida digna. Logo, não é a solução mais adequada, a diminuição da maioridade penal, mas a instauração de políticas sociais ativas. Este artigo foi orientado pelo Prof. Wank Remy de Sena Medrado.


Palavras-chave: Imputabilidade penal, Direitos sociais, infração


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Abstract: This article is scoped deals with questions raised by various entities regarding the reduction of legal age in order to mitigate the rate of violence in Brazil. Tends to emphasize the sociological view to arrive at a solution that will not be meeting with the common interest to all, namely the establishment of a welfare state that guarantees the marginalized and their rights educates him to fulfill his duties. Besides discussing the need for public policies that may enter the individual in the social environment as a real solution to the violence, showing that the state is ineffective so repressive that punishes the smallest infractions for which the state itself condemned through its ineffectiveness in guaranteeing a decent life. Therefore it is not the most appropriate solution, the reduction of legal age, but the introduction of active social policies


Keywords: criminal responsibility, social rights, infringement
Sumário: 1. Fatores preponderantes à marginalização. 2. O menor infrator e a imputabilidade penal. 3. Políticas públicas de combate à violência: educar não é punir. 4. Reflexões finais. Referências bibliográficas.


1. Fatores preponderantes à marginalização


Os direitos e os deveres que permitem ao individuo participar ativamente das decisões governamentais e aos quais os mesmos estão sujeito a sociedade é tido como cidadania. O direito de cidadania, é construído da formação de conceitos e princípios de nossa nação e conquistada a partir da nossa capacidade de organização, participação e intervenção social. Quem não tem cidadania está excluso da vida social e das decisões de seu governo, conseqüentemente, é inferiorizado em relação aos demais grupos sociais, tratando-se do que chamamos de exclusão social.Bem explica Aldaísa Sposatti, Assistente Social, Secretária de Bem Estar Social da Prefeitura de São Paulo em 1996 à respeito do deveras significa exclusão social e seus aspectos:


“… uma impossibilidade de poder partilhar, o que leva à vivência da privação, da recusa, do abandono e da expulsão, inclusive, com violência, de um conjunto significativo da população – por isso, uma exclusão social e não pessoal. Não se trata de um processo individual, embora atinja pessoas, mas de uma lógica que está presente nas várias formas de relações econômicas, sociais, culturais e políticas da sociedade brasileira. Esta situação de privação coletiva é que se está entendo por exclusão social. Ela inclui pobreza, discriminação, subalternidade, não equidade, não acessibilidade, não representação pública…”


Todos os aspectos da exclusão social levam ao processo de marginalização do individuo. Marginalização significa dizer, que o individuo está “à margem”, foi excluído do seio social.


Na América Latina, o conceito da marginalização surgiu nos anos de 1950 para indicar os habitantes concentrados nas favelas, nas colônias e nos pequenos ranchos, resultantes das migrações massivas, em direção às grandes cidades e em busca de melhores condições de vida. Estes grupos, não são “marginais” por opção, ou por terem cometido algum tipo de crime, dado que constituem uma maioria crescente da população, nem participaram na economia central e formal, nem sequer existem muitas esperanças relativamente à sua possível inserção em curto prazo nas condutas culturais, sociais e econômicas dominantes. Eles surgiram a partir do descaso do Poder Público que não lhes confere sequer seus direitos sociais,definido pelo art. 6º da Constituição Federal:


“São direitos sociais a educação, a saúde, o trabalho, a moradia, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à infância, a assistência aos desamparados, na forma desta Constituição.” 


A maioria marginalizada é o alvo da política de redução da maioridade penal, característica de um Estado que abandona para em seguida cobrar e punir.


2. O menor infrator e a imputabilidade penal


Um dos grupos mais prejudicados pela desigualdade social, estados de miséria e pobreza, são os chamados menores infratores. Freqüentemente é tema de discussão na mídia, crimes praticados por estes, e alarmantes o número de jovens menores de 18 anos que buscam no crime um meio de ter melhores condições de vida. Diante desse quadro, a sociedade quer atribuir-lhe uma imputabilidade penal.


 Logo, é necessária uma reflexão se tais indivíduos, os quais o governo e a sociedade, em seu processo de desenvolvimento não lhes aferiram uma vida digna, direito a própria educação, dentre outros preceitos garantidos pela Constituição, e que são alvos de um estado de injustiça social crônico podem ser responsabilizados penalmente como um adulto pela prática de atos infracionais.


Pelo art. 228 da Constituição Federal: “São penalmente inimputáveis os menores de dezoito anos, sujeitos às normas da legislação especial.”


Essa “legislação especial” está contida no Estatuto da Criança e do Adolescente (Lei nº 8.069/90), dispondo o seu artigo 121, § 5º que, verificada a prática de ato infracional o Juiz de Menores poderá aplicar ao adolescente (entre 12 e 18 anos de idade) internação em estabelecimento educacional, porém com liberação compulsória aos 21 anos de idade. Logo, um menor infrator não pode ficar mais de três anos internado em instituição de reeducação, como a Febem.


Sendo, pois, biológico, o critério para atribuir inimputabilidade penal, explicando GUILHERME DE SOUZA NUCCI que:


 “A lei penal criou uma presunção absoluta de que o menor de 18 anos, em face do desenvolvimento mental incompleto, não tem condições de compreender o caráter ilícito do que faz ou capacidade de determinar-se de acordo com esse entendimento” (Código Penal Anotado, art. 27).


Como visto, pela legislação brasileira, crianças de até 12 anos são inimputáveis, e de 12 a 17 anos, o jovem infrator será levado a julgamento numa Vara da Infância e da Juventude e poderá receber punições como advertência, obrigação de reparar o dano, prestação de serviços à comunidade, liberdade assistida, inserção em regime de semiliberdade ou internação em estabelecimento educacional. Não poderia ser encaminhado ao sistema penitenciário, como efetivamente seria, caso obtivesse 18 anos ou mais. Afastar-se-á então, a idéia tendenciosa de que menores infratores não são punidos por seus atos, porque a imputação existe, apenas gerando aspectos diferentes quanto à conseqüência jurídica: a pena como conseqüência para quem pratica crime, e medidas sócio-educativas para quem comete ato infracional. O Estatuto da Criança e do Adolescente quer assim proteger a criança excluída socialmente como já foi visto, da realidade do sistema prisional brasileiro, onde se constata a sua ineficiência para a clientela que possui oxalá para atender os adolescentes. Além disso, há uma impossibilidade da recepção de mais presos no atual sistema prisional, característico de sua superlotação e dos diversos tratamentos desumanos a que estão sujeitos os presidiários, é visível o não cumprimento de seu papel ressocializador, porquanto se tornaram centros de depósitos humanos antiquados e aumentam mais a revolta da população encarcerada.


Outra característica das entidades que proclamam a redução da maioridade penal é valer-se do fato de que os traficantes tendo conhecimento da lei aliciam jovens por saberem como é regulada a proteção aos menores infratores, porém não é benéfico à redução como solução para esse problema, pois seriam cada vez mais jovens os aliciados. Nessa questão, torna-se válida as palavras de Túlio Kahn, doutor em ciência política pela USP e coordenador de pesquisa do Ilanud – Instituto Latino Americano das Nações Unidas para a Prevenção do Delito e o Tratamento do Delinqüente:


“Rebaixar a idade penal para que os indivíduos com menos de 18 não sejam utilizados pelo crime organizado equivale a jogar no mundo do crime jovens cada vez menores: adote-se o critério de 16 e os traficantes recrutarão os de 15, reduza-se para 11 e na manhã seguinte os de 10 serão aliciados como soldados do tráfico.”


3. Políticas públicas de combate à violência: educar não é punir


Sob a óptica de aspectos sociológicos, pode-se afirmar que o menor é vitima de uma sociedade de consumo que o exclui por não ter padrões pré estabelecidos por esta, porém é invisível que sequer as suas necessidades básicas e de sua família foram supridas,  influenciando diretamente na sua educação e ao interagir no meio social.Há portanto, uma necessidade de que este individuo seja amparado por políticas públicas de eficácia plena,que lhe assegurem uma vida digna, sendo educado para o convívio em sociedade e aprendendo a ter consciência de seu papel como cidadão. Karl Marx bem descreve a coletividade como fator educador do individuo, o seu ser social como determinador da consciência humana:


“Não é a consciência do homem que lhe determina o ser, mas, ao contrário, o seu ser social que lhe determina a consciência.”


Assim percebe-se que a sociedade que não educa o menor é também aquela que quer puní-lo do ponto de vista penal. Essa idéia associada a ingenuidade da população em seu modo diferido do que é justiça, e os vários recursos midiáticos sensacionalistas que procuram resolver a problemática no calor do momento, sem que haja uma discussão realmente séria e embasada numa consciência sociológica, somente resultam em soluções equivocadas, como a idéia de que a redução da maioridade penal subtrairia os índices de violência no Brasil.Em muito tal “solução” resultaria no recrudescimento da delinqüência, e a implantação de um estado  onde a violência seria fator preponderante e freqüente.


Como conseqüência tería-se um grande número de adolescentes num sistema carcerário falido. Em nenhuma hipótese, isso seria um progresso. Até mesmo a própria palavra “ressocializador” ao qual define a verdadeira função do sistema prisional, é equivocada, pois, como ressocializar um indivíduo que sequer foi socializado.


4. Reflexões finais


Primariamente deve – se haver um investimento nos meios socializadores, dentre muitos a educação, dar-se o que a Constituição brasileira designa ao ser para uma vida digna, fatores visivelmente negados a população marginalizada. Afinal quantos idosos, filhos e mães morrem em hospitais por falta de atendimento médico, crescem o número de favelas onde são construídos casebres sem qualquer tipo de segurança ou mesmo de saneamento básico, onde a influência do tráfico é grande e recai principalmente nas crianças. Pois, se o Poder Público se omite em dar ao individuo melhores condições de sobrevivência, e a criminalidade oferta-o o que necessita, logicamente este procurará primariamente a sua sobrevivência por meio do crime, do ato infracional.


É exatamente nesse contexto, onde assenta a falta do compromisso público com os que dele necessitam, e quando estes procuram por meios arbitrários suprir tais necessidades, vêm o poder público com um sistema repressor punitivo.


Logo a violência não se dá por falta de medidas repressoras ou pela sua ineficácia em “reprimir”, mas sim por faltas de políticas públicas de inserção e eficácia desse processo de socialização do individuo, é preciso ter consciência de que quem pratica ato infracional é tão vítima quanto o próprio lesado, pois este é vítima da sua condição social.


Referências bibliográficas:

Aldaíza Sposatti, Mapa da Exclusão/Inclusão na cidade de São Paulo. EDUC, São Paulo, 1996.

FOUCAULT, Michel. Vigiar e Punir: Nascimento da prisão (em portugues). 36ª ed. Petrópolis, RJ: Vozes, 2009

www.planalto.gov.br/

www.conjunturacriminal.com.br

BRASIL. Estatuto da Criança e do Adolescente. 2001

BRASIL. Constituição Federa de 1988.

BRASIL. Código Penal. 2002

ster Vaisman. Marx e a Filosofia: elementos para a discussão ainda necessária, Nova Economia, vol. 16 (2), 2006.

GRECO, Rogério. Curso de direito penal: parte geral. V.1; Rio de Janeiro: Impetus, 2005.

Informações Sobre o Autor

Anna Claudya de Sá Pimentel

Acadêmica da Faculdade de Ciências Aplicadas de Petrolina – FACAPE /AEVSF


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Equipe Âmbito Jurídico

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