A responsabilidade penal das pessoas jurídicas e a Lei dos Crimes Ambientais

I
– Breve histórico

Se entende que desde os tempos
mais remotos, quando os grupos primitivos se reuniam em pequenas comunidades,
já existia um sistema de leis, principalmente penais. Nestes
tempos, primitivos e obscuros, a responsabilidade penal, conforme leciona
Walter Claudius Rothemburg1 “era
atribuída inclusive a coisas e freqüentemente a grupos comunitários – que além
de tudo, não tinham a organização necessária para o reconhecimento da
personalidade jurídica.”


na  Idade Média, passou-se a considerar a
responsabilidade das organizações por delitos, as quais eram punidas pela
Igreja, bem como, pelos reis e imperadores da época.

A
Revolução Francesa vem por fim a este tipo de sistema punitivo, pondo fim a
responsabilização criminal de entes coletivos, consagrando a responsabilização
do indivíduo somente.

Nos
tempos modernos, com a complexa organização social, bem como, com a necessidade
de se tutelar interesses de toda a coletividade, interesses maiores em
detrimento do interesse individual, viu-se o Direito na imperatividade
de se reconhecer a responsabilidade dos entes coletivos. O interesse maior da
coletividade passou a se sobrepor ao interesse deste entes
coletivos, os quais, com suas condutas danosas passaram a colocar em perigo
interesses sociais básicos, tais como o meio ambiente. Daí a importância de se
tutelar penalmente a conduta destes entes.

É
neste contexto que surge as questões referentes à
responsabilidade penal das pessoas jurídicas.

II –
Conceito e natureza da pessoa jurídica

Pelo
fato do ser humano ser uma criatura social, viu-se o mesmo na necessidade de se
associar e unir-se a outros com o fim de atingir seus objetivos e prosperar.
Daí o surgimento de grupos de indivíduos, com finalidades diversas, tais como:
comércio, indústria, e outras não econômicas, tais como associações e
sociedades beneficentes, bem como aquelas mantidas pelo Estado e seus entes
federados.

Da
necessidade de se reconhecer estas entidades na ordem jurídica,
é que viu-se o Direito obrigado e lhes legitimar,
conferindo a estes entes personalidade jurídica e tornando-os sujeitos de
direitos e obrigações. Surgem assim as chamadas pessoas jurídicas.

Um
bom conceito de pessoa jurídica, é aquele nos dado por
Maria Helena Diniz2, qual
seja, o de “unidade de pessoas naturais ou de patrimônio, que visa a consecução
de certos fins, reconhecida pela ordem jurídica como  sujeito de direitos
e obrigações.”

Quanto
a natureza jurídica, várias teorias foram elaboradas
no intento de justificar e esclarecer sua existência, bem como a razão de sua
capacidade de direito. Apesar de não haver um consenso é possível agrupá-las em
quatro categorias: 1) Teoria da ficção legal; 2) Teoria da equiparação;
3)  Teoria orgânica; 4)  Teoria da realidade das instituições
jurídicas.

A
teoria da ficção  predominou durante um certo
período, defendendo a idéia de que os entes coletivos não corresponderiam a
algo de existência real, e serviriam apenas como uma construção artificial para
fins de mera atribuição patrimonial.

A
teoria da equiparação entende que a pessoa jurídica é um patrimônio equiparado
no seu tratamento jurídico às pessoas naturais. É inaceitável porque eleva os
bens à categoria de direitos e obrigações, confundindo pessoas com coisas.


a teoria da realidade objetiva ou orgânica prega que  junto a pessoas
naturais, que são realidades físicas, existem os organismos sociais,
constituídos pelas pessoas jurídicas, as quais têm existência e vontade
próprias, distintas da de seus membros, tendo por finalidade a realização de
seus objetivos sociais.

A
teoria da realidade das instituições jurídicas se baseia no fato de que, como a
personalidade  humana deriva do Direito, da mesma forma este pode
concedê-la a grupamentos de pessoas ou de bens que tenham por finalidade a
realização e consecução de interesses humanos.

Por
esta teoria a personalidade jurídica é um atributo que a ordem jurídica estatal
outorga a entes coletivos. Logo, essa teoria é a que melhor atende a essência
da pessoa jurídica, por estabelecer, com propriedade, que a pessoa jurídica é
uma realidade jurídica.

No
ordenamento jurídico Pátrio, o conceito e estrutura das pessoas jurídicas é encontrado em suas bases no Código Civil, o qual as divide
em Pessoas
Jurídicas de Direito Público e Pessoas Jurídicas de Direito
Privado.

III
– A constituição de 1988 e a responsabilização penal da pessoa jurídica

A
Constituição de 1988 diferentemente das anteriores, passou a disciplinar
expressamente a responsabilização das pessoas jurídicas.

Vejamos:

“A
Lei, sem prejuízo da responsabilidade individual dos dirigentes da pessoa
jurídica, estabelecerá a responsabilidade desta, sujeitando-a às punições compatíveis com sua natureza, nos atos
praticados contra a ordem econômica e financeira e contra a economia popular.”
(Art. 173 § 5º)

“As
condutas e atividades consideradas lesivas ao meio ambiente sujeitarão os
infratores, pessoas físicas ou jurídicas, a sanções penais e administrativas,
independentemente da obrigação de reparar os danos causados.” (Art. 225, § 3º)

A
par da polêmica existente, a Constituição de 1988 veio sedimentar a idéia da
responsabilização penal da pessoa jurídica no Direito Pátrio, opinião esta também,
de eminentes juristas tais como Celso Ribeiro Bastos e Ives Gandra
Martins, citados por Sérgio Salomão Shecaira3, para
os quais, “a atual Constituição rompeu  com um dos princípios que vigorava
plenamente no nosso sistema jurídico, o de que a pessoa jurídica, a sociedade,
enfim, não é passível de responsabilização penal.”

Prevê
expressamente a Constituição da República a responsabilização penal das pessoas
jurídicas, nos casos de atos praticados contra a ordem econômica e financeira,
bem como contra a economia popular e o Meio ambiente. Entretanto, tais
dispositivos constitucionais não são auto aplicáveis. Se tratam de normas programáticas, as quais carecem de uma
lei regulamentando especificamente a matéria.

A
chamada “Lei dos Crimes Ambientais” veio regulamentar estes dispositivos
constitucionais, nos casos de infrações contra o Meio Ambiente, a qual , estudaremos mais detalhadamente adiante.

IV – A
Lei dos Crimes Ambientais

Nas
últimas décadas o clamor popular, movido pela desenfreada agressão ao meio
ambiente, levou as nações do globo a criarem diversas normas de proteção e
preservação do meio ambiente, ou seja, dos recursos naturais indispensáveis à
vida na terra. Cada nação, levando em conta suas peculiaridades,
criou normas de proteção ao meio ambiente..

Como
bem nos lembra Luís Paulo Sirvinskas4, “não
há dúvidas que este fim de século será lembrado pelas futuras gerações como
sendo o mais importante para o meio ambiente. Se fez mais pelo meio ambiente
nessas últimas décadas do que em todo o século.”

Em
nosso país, as legislações penais relativas ao meio ambiente já existiam
anteriormente  à promulgação da Constituição de 1988. O Código Penal de
1940, já traz  em seu bojo dispositivos, que de
certa forma, tutelam a proteção jurídica ao meio ambiente. Como exemplo podemos citar os arts. 166
(alteração de local protegido), 250 ,§ 1º,II, h
(incêndio em mata ou floresta) e tantos outros.

Posteriormente,
várias outras leis vieram a tutelar penalmente o meio ambiente, dentre elas
podemos citar a Lei 4.771/65 (Código Florestal) e a Lei 5.197 (Código de Caça)
e várias outras.

Com
a promulgação da Constituição de 1988, bem como em razão das dificuldades
encontradas em se aplicar tão esparsa legislação, viu-se o legislador na
contingência  de  se ordenar, em um único diploma legal,  todas
as condutas criminosas relacionadas ao meio ambiente.

Neste
contexto é que surge a Lei 9.605/98, diploma legal ansiosamente aguardado pela
sociedade brasileira, mas que, passados quase dois anos de sua entrada em
vigor, tem despertado inúmeras críticas no meio jurídico nacional.

A
Lei 9.605/98 (Lei dos Crimes Ambientais) contém 82 artigos, divididos em oito
capítulos. As condutas típicas, vêm previstas no
capítulo V, assim dividias: a seção I, cuida dos crimes contra a fauna; II dos
crimes contra a flora; III da poluição e outros crimes ambientais; IV dos
crimes contra o ordenamento urbano e o patrimônio cultural, e, finalmente, a
seção V cuida dos crimes contra a administração ambiental. Entretanto, não é
objetivo do presente trabalho  analisar as condutas típicas
detalhadamente.

Um
dos pontos mais polêmicos da chamada “Lei dos Crimes Ambientais” é a
responsabilização penal da pessoa jurídica, a qual
abordaremos detalhadamente no capítulo seguinte.

V
– A responsabilização penal das pessoas jurídicas na Lei dos Crimes Ambientais

Conforme
dito anteriormente, a Constituição de 1988 trouxe, taxativamente
para o Direito Brasileiro a previsão da responsabilização penal da pessoa
jurídica. Entretanto, como os dispositivos constitucionais em questão se tratam
de norma programáticas, ficaram a depender de lei regulamentadora.

No
que pertine ao meio ambiente, tal regulamentação se
deu com a edição da Lei 9.605/98, que, seguindo o disposto na norma
constitucional, regulamentou a responsabilização penal da pessoa jurídica.

O
Art. 3º da citada lei, dispõe:

“Art.
3º – As pessoas jurídicas serão responsabilizadas
administrativa, civil e PENALMENTE (grifo nosso) conforme o disposto
nesta Lei, nos casos em que a infração seja cometida por decisão de seu
representante legal ou contratual, ou de seu órgão colegiado, no interesse ou
benefício de sua entidade.

Parágrafo único – A responsabilidade das pessoas
jurídicas não exclui a das pessoas físicas autoras, co-autoras ou partícipes do
mesmo fato.”

Quanto
a responsabilidade civil e administrativa das pessoas
jurídicas, não resta qualquer tipo de dúvida de que as mesmas há muito já eram
previstas legalmente , o que é lógico, face serem as mesmas passíveis de
direitos e obrigações na ordem civil.


a responsabilidade penal é fato novo em nosso ordenamento jurídico, como dito
anteriormente. Tem como regra à sua caracterização, nos casos de crimes
ambientais, o disposto no art. 3º da Lei 9.605/98 acima
transcrito, o qual delineia os contornos para caracterização da mesma,
quais sejam:

I)
– A infração ser cometida por decisão do representante legal ou contratual, ou de
seu órgão colegiado – Toda pessoa jurídica tem um representante legal, ou seja,
aquele designado em seu contrato social  ou estatuto, que responde perante
terceiros por ela. Ora, nada mais correto do que se prever a punição somente
nos casos em que a infração se der por decisão dos legítimos e legais
representantes da pessoa jurídica, pois, entende-se que os mesmos representam a vontade da mesma;

II)
– A infração ser cometida no interesse ou benefício da entidade – Em princípio,
as infrações de natureza ambiental na maioria das vezes são cometidas em
proveito dos infratores, no caso em benefício dos interesses da pessoa
jurídica.

Analisando
conjuntamente o  dispositivo legal em questão, temos que para a
caracterização da responsabilidade penal, tal como previsto na Lei de Crimes
Ambientais, torna-se necessário a conjugação dos dois
elementos acima apontados, quais sejam, a decisão do ato infracional
ser tomada pelo ou pelos legítimos representantes da pessoa jurídica em
questão, e Ter sido, o ato criminoso, praticado em benefício ou interesse da
pessoa jurídica, a qual, com o ato, direta ou indiretamente se beneficiará.

Embora
prevista de forma clara e expressa na Lei, alguns autores ainda critica a
responsabilização penal da pessoa jurídica, conforme nos mostra Ivan Lira de
Carvalho5:
“Por maior que seja nossa defesa da tese da inadequação da teoria da
culpabilidade às pessoas coletivas, não nos é dado o direito de negar que a
ordem constitucional tuteladora do meio ambiente, na
norma de conteúdo penal estampada no art. 225, § 3º, da carta política, optou
pela aplicação  de sanções administrativas e penais às pessoas jurídicas.
Demais disso, a Lei 9.605 de 12-2-98, espanca qualquer dúvida quanto a essa
opção do legislador.”

Vê-se
que com os contornos dados pela Lei 9.605/98, se encontra definitivamente
consagrada no Direito Brasileiro a responsabilidade penal das pessoas jurídicas
quanto a crimes de natureza ambiental.

VI
– As penas aplicáveis à pessoa jurídica na Lei dos Crimes Ambientais

Não
só dispôs a Lei 9.605/98 sobre a responsabilidade
penal das pessoas jurídicas,  bem como, sobre a tipificação dos crimes por
elas passíveis de serem praticados, com também, veio regular os tipos de penas
a serem aplicados as mesmas.

Dispõe
o art. 21 da Lei:

“Art.
21 – As penas aplicáveis isolada, cumulativa ou alternativamente às pessoas
jurídicas, de acordo com o disposto no art. 3º são: I – multa; II – restritivas
de direitos; III – prestação de serviços à comunidade.”

Quanto
a pena de multa, não nos traz maiores dúvidas a
aplicação da mesma, devendo, seguramente, ser a de maior e mais fácil
aplicação, principalmente às grandes corporações industriais. Entretanto,
ousamos questionar sua eficácia. Vemos grandes restrições na aplicação da mesma a grandes grupos industriais, pessoas jurídicas com
enormes possibilidades financeiras, para as quais uma mera multa não viria a
significar punição alguma.


as penas restritivas de direitos previstas no inciso II merecem um estudo algo
mais detalhado face a sua maior complexidade. Razão pela qual, a própria Lei as
detalhou no art. 22:

“Art. 22
– As penas restritivas de direito da pessoa jurídica são: I – suspensão parcial
ou total das atividades; II – interdição temporária de estabelecimento, obra ou
atividade; III – proibição de contratar com o Poder Público, bem como dele
obter subsídios, subvenções ou doações.

§
1º – A suspensão da atividades será aplicada quando
estas não estiverem obedecendo as disposições legais ou regulamentares,
relativas à proteção ao meio ambiente.

§
2º – A interdição será aplicada quando o estabelecimento, obra ou atividade
estiver funcionando sem a devida autorização, ou em desacordo com a concedida,
ou com violação de disposição legal ou regulamentar
.

§
3º – A proibição de contratar com o Poder Público e dele
obter subsídios, subvenções ou doações não poderá exceder o prazo de dez anos”

A
primeira pena restritiva de direitos, ou seja, a suspensão parcial ou total de
atividades, merece sérias reflexões. A atividade
principal de uma pessoa jurídica , na maioria das
vezes tem natureza econômica. Neste caso, quando suspensa parcial ou totalmente
pode colocar em risco a própria sobrevivência da pessoa jurídica. Ademais,
segundo se depreende do § 1º, as disposições legais e regulamentares relativas
à proteção do meio ambiente, se encontram espalhadas em variada e esparsa
legislação, de complexa e difícil aplicação, principalmente por pequenas
empresas.


a pena da interdição  de estabelecimento, obra ou atividade vem de
encontro a necessidade de se fazer cessar prontamente
a agressão ambiental, quando o estabelecimento, obra ou atividade da pessoa
jurídica estiver funcionando de forma irregular, causando o dano ambiental
tipificado na Lei.

A
proibição de contratar com o Poder Público ou dele receber subsídios e doações,
ao invés de se encarada como pena, deveria ser praxe em toda a Administração
Pública. É inadmissível que o Poder Público contrate, subsidie ou faça doações
a pessoas jurídicas que agridam o meio ambiente, ou, pratiquem crimes
ambientais tipificados na Lei. O objetivo maior desta pena, além é claro de
desestimular a prática do crime, é impedir que o Poder Público, com todas as
falhas existentes em sua administração, contrate ou subsidie de alguma forma
pessoas jurídicas criminosas. Também, sabendo que o Poder Público oferece
grandes contratos a empresas ou pessoas jurídicas de outras naturezas, razão
pela qual, também, a pena visa a desestimular a prática do crime.

A
prestação de serviços à comunidade também é detalhadamente regulada pela lei em
seu art. 23, e consistirá: I) custeio de programas e projetos ambientais; II)
execução de obras de recuperação de áreas degradadas; III) manutenção de
espaços públicos; IV) contribuições a entidades ambientais ou culturais
públicas.

Analisando
o espírito da Lei, qual seja, o de proteção e
preservação do meio ambiente e dos recursos naturais indispensáveis à vida na
terra, cremos, firmemente, que as penas elencadas 
no art. 23 da Lei são as que vão diretamente ao encontro do espírito legal. Há
que se levar em conta também, que no Direito Penal Moderno é consenso que não
basta somente punir, mas principalmente reeducar.

Nos
casos das pessoas jurídicas infratoras, na maioria grandes empresas e complexos
industriais,  os melhores tipos de punição criminal, são os elencados no  art. 23. Pode-se aplicar uma multa a uma
grande empresa, que esta seguramente pagaria, mas é o meio ambiente degradado,
como ficaria? A comunidade seria obrigada a arcar com o dano? Daí a importância
deste tipo de punição, tão em voga no Direito Penal atual, visto serem penas de
maior eficácia, pois além de punir reparam o dano.

Resta,
finalmente, analisar o art. 24 da Lei, o qual dispõe:

“Art.
24 – A pessoa jurídica constituída ou utilizada preponderantemente, com o fim
de permitir, facilitar ou ocultar a prática de crime definido nesta lei terá
decretada sua liquidação forçada, seu patrimônio será considerado instrumento
do crime e como tal perdido em favor do Fundo Penitenciário Nacional.”

Tal
dispositivo analisa a conduta daquelas pessoas jurídicas criadas e constituídas
com a finalidade maior de permitir, facilitar ou ocultar a prática de crimes
tipificados na Lei 9.605/98.

Caso
se comprove, através do devido processo legal,  a conduta criminosa, a
única pena aplicável, segundo se depreende do dispositivo legal em questão é a
completa liquidação da pessoa jurídica, ou seja sua
extinção. Portanto, não resta dúvidas, de que, quanto
a crimes ambientais, as pessoas jurídicas podem sofre a pena de morte, pois sua
liquidação forçada se equivale a esta.

Em
síntese, estas são as penas com as quais podem ser apenadas as pessoas
jurídicas.

VII –
Conclusões

Com
o desenvolvimento industrial, notadamente após a Revolução Industrial, os recursos
naturais da Terra começaram a se deteriorar de forma assustadora e rápida. Nas
últimas décadas, em todo o mundo, começaram a surgir movimentos de
conscientização e preservação dos mesmos. Movimentos estes que se tornaram em uma verdadeira consciência ecológica de toda a
sociedade mundial.

Várias
nações, umas realmente preocupadas com o meio ambiente, outras nem tanto,
criaram diversas legislações de proteção ambiental. No Brasil, país de inúmeros
recursos ambientais, não foi diferente.

Mesmo
anteriormente a Lei 9.605/98, já existiam leis
protetoras do meio ambiente, notadamente na esfera administrativa. Um país com
inúmeros recursos naturais não podia se dar ao luxo de desprezar os mesmos,
negando proteção legal a este tesouro ambiental.

Entretanto,
a maioria das legislações anteriores se mostravam em
certos aspectos ineficientes, pois a grande maioria dos agressores ao meio
ambiente eram pessoas jurídicas, principalmente grandes empresas e grupos
industrias, os quais, a par das singelas punições administrativas, ficavam
impunes por seus atos praticados contra o meio ambiente.

Com
esta preocupação, o Legislador Constituinte de 1988 introduziu no Direito
Pátrio a responsabilidade penal das pessoas jurídicas. Entretanto, tal
dispositivo ficou longo tempo a carecer de regulamentação, a qual só veio, em
relação aos crimes ambientais, com a Lei 9.605/98.

Não
resta a menor dúvida, como ficou demonstrado no nosso
trabalho, que a responsabilidade criminal das pessoas jurídicas se encontra
definitivamente consagrada no Direito Brasileiro. Entretanto, inúmeras
questões doutrinárias têm surgido.

A
Lei 9.605/98 é um diploma legal de incontestável necessidade, face a grande
importância do bem jurídico que tutela, qual seja, o
meio ambiente. Entretanto, imprecisões técnicas, bem como a dificuldade de se
adequar legalmente a responsabilização penal da pessoa jurídica tem levado a sérias dificuldades na aplicação da Lei.

A
responsabilização penal de pessoas jurídicas é fato novo no Direito em todo o
mundo, sendo um tabu que se vai quebrando aos poucos. É enorme a dificuldade de
caracterização da mesma, bem como, são enormes os questionamentos da doutrina,
os quais, em sua maioria, se encontram sem resposta concreta.

O
primeiro argumento contrário a responsabilização penal
das pessoas jurídicas, o qual é apontado na maioria da doutrina existente, é o
de que não existe responsabilidade sem culpa. Ora, se a pessoa jurídica é
desprovida de vontade  e inteligência próprias, sendo gerida pela vontade
de seus membros, não seriam estes os culpados pelo crime, visto que a intenção
(dolo) do crime partiu de sua vontade?

Outra
questão, para qual, infelizmente não encontramos respostas concretas, diz
respeito ao princípio consagrado no Direito Penal, qual seja o da personalidade
das penas. Caso venha a  se condenar uma pessoa jurídica a pena de
liquidação forçada, não se estaria  também atingindo a terceiros
inocentes, ou seja, os funcionários que dependiam da mesma para sobreviver? Ou
terceiros que contrataram com as mesmas e contra elas tinham créditos a
receber?

Outra
questão apontada é o da inaplicabilidade às pessoas jurídicas de penas
privativas de liberdade. Entretanto, ousamos afirmar que a pena privativa de
liberdade não é a única existente, como querem fazer crer alguns legisladores
nacionais. A pena deve se adequar a pessoa do criminoso, e ,
no caso das pessoas jurídicas, deve se levar em conta a natureza destas. Na
aplicação da pena se deve levar em conta em primeiro lugar a
reprimenda pelo mal praticado e depois o desestímulo a pratica de novas
infrações, e, a pena privativa de liberdade não é a única  que atende a
estes objetivos, sendo que no caso das pessoas jurídicas, a Lei 9.605/98
prevê  uma série de outras reprimendas.

Mais
uma crítica que é feita pela doutrina, é a da impossibilidade da pessoa
jurídica se  arrepender ou se intimidar. Bem, no plano psicológico é
realmente impossível. Mas devemos também levar em conta que quem gere as
pessoas jurídicas são pessoas, seres humanos como qualquer outro, estes sim, passíveis
de se arrependerem e se intimidarem com a aplicação da pena. De certa forma, a
intimidação da Lei é sentida na pessoa jurídica, pela influência que exerce
sobre seus dirigentes, seres humanos como qualquer outro.

Como
estas questões apontadas acima, várias outras tem surgido, o que é
compreensível, face a novidade do tema. Cabe ao
Direito, ciência em constante evolução encontrar os contornos definitivos da
responsabilização penal das pessoas jurídicas, o que, com certeza, será feito
com o tempo.

Quanto
a Lei dos Crimes Ambientais, sua aplicação com certeza tem gerado, e gerará
inúmeras controvérsias no que pertine a
responsabilização penal das pessoas jurídicas. Com certeza precisa ser
reformulada em vários pontos, principalmente no que pertine
as penas aplicadas.

Levando-se
em conta a natureza das pessoas jurídicas infratoras, se pequenas e micro
empresas, se associações ou sociedades, e se grandes empresas, é que deveriam
ser aplicadas as penas. Uma multa a um grande conglomerado industrial não
geraria efeito prático algum, enquanto a uma pequena empresa poderia significar
sua morte.

O
principal ponto, é que  as penas deveriam ser aplicadas levando-se em
conta a recuperação do dano ambiental. Se uma pessoa jurídica tem condições e
suportes materiais para causar o dano, seguramente terá para o
reparar. Nas questões ambientais a finalidade maior da pena haverá de
ser não só a punição e intimidação do infrator, mas, principalmente, a
reparação do dano causado.

Várias
questões ainda precisam ser analisadas e discutidas, mas o principal é que a
responsabilização penal das pessoas jurídicas quanto a crimes ambientais está
definitivamente consagrada no Brasil sendo que só o tempo, bem como os estudo e a efetiva aplicação da Lei, gerando
jurisprudência é que poderão  solucionar todas estas questões polêmicas.

 

Bibliografia:

SHECAIRA,
Sérgio Salomão. A Responsabilidade Penal das Pessoas   
Jurídicas e o Direito Ambiental.
Direito Ambiental. Ed. Del Rey. Belo Horizonte. 1º Ed.

DAHER,
Marlusse Pestana. Pessoa Jurídica Criminosa. Artigo
retirado na Internet

ROTHEMBURG, Walter Claudius.
Pessoa Jurídica Criminosa.
Revista dos Tribunais n. 717.
P. 359

CARVALHO,
Ivan Lira de. A Empresa e o Meio Ambiente. Revista do Instituto de
Pesquisas e Estudos – Divisão Jurídica. EDITE – Editora da Instituição Toledo
de Ensino – Bauru – SP – p.37

SIRVINSKAS,
Luís Paulo. Tutela Penal do Meio Ambiente: Crimes Contra o Meio Ambiente
previstos na Lei 9.605, de 12 de Fevereiro de 1998.
Revista do Instituto de
Pesquisas e Estudos – Divisão Jurídica. EDITE – Editora da Instituição Toledo
de Ensino. Bauru – SP. P.193

DINIZ,
Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro. Vol.
I. Ed. Saraiva. São Paulo – SP.

 

Notas:

1. ROTHEMBUR, Walter Claudius, A
Pessoa Jurídica Criminosa.
RT 717, p. 359.

2. DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro. Vol. I, p. 116.

3. SHECAIRA, Sérgio Salomão. A Responsabilidade Penal das
Pessoas Jurídicas e o Direito Ambiental.
P. 125.

4. SIRVINSKAS, Luís Paulo. Tutela Penal do Meio Ambiente: Crimes
contra o Meio Ambiente previstos na Lei n. 9.605, de 12 de Fevereiro de 1998.
Revista
do Instituto de Pesquisas e Estudos – Divisão Jurídica. N. 26. P. 194.

5. CARVALHO, Ivan Lira. A Empresa e o Meio Ambiente. Revista
do Instituto de Pesquisas e Estudos – Divisão Jurídica. N. 25. P.55.


Informações Sobre o Autor

Rômulo Resende Reis

Advogado militante no Estado de Minas Gerais, Pós-graduado em Direito Processual Civil pelo CAD/UGF
Santo Antônio do Amparo(MG)


Equipe Âmbito Jurídico

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