A tutela dos crimes contra o sistema financeiro internacional no Tribunal Penal Internacional

Resumo: Condutas e crimes financeiros previstos em precárias normas nacionais assolam a segurança jurídica internacional, destruindo a crença do povo no mercado financeiro supranacional. Considerando a supranacionalidade dos efeitos produzidos pelos crimes financeiros, para evitar minimizar ou reverter o processo das crises financeiras, seria proveitosa a inclusão destes crimes no rol de infrações julgadas pelo Tribunal Penal Internacional. Dessa forma, o presente trabalho tem por objetivo verificar as possibilidades da criminalização das condutas que assolam o sistema financeiro internacional e a inclusão dos crimes no rol das infrações julgadas pelo Tribunal Penal Internacional, construindo segurança jurídica e, visando a salvaguarda da estabilidade econômica e social das nações, evitando as crises sistêmicas, a consequente pobreza generalizada e os conflitos originários da instabilidade do mercado globalizado. O Método utilizado consistiu na análise de normas, nacionais e estrangeiras, do Tribunal Penal Internacional, bem como em literatura jurídica nacional e estrangeira. Como resultado, constataram-se as vantagens e real viabilidade da inclusão dos crimes contra o sistema financeiro internacional se houver nova ratificação dos Estados Partes do Estatuto de Roma. Sendo assim, salutar a tipificação das novas condutas contra a ordem internacional no Estatuto de Roma e a posterior ratificação.[1]

Palavras-chave: Tribunal penal internacional; crimes contra o sistema financeiro internacional; crises sistêmicas; crimes contra a humanidade; ordem econômica internacional.

Sumário: Introdução. 1. A ordem econômica internacional, o sistema financeiro internacional e o risco sistêmico. 1.1. A ordem econômica internacional. 1.1.1. O início da construção da ordem econômica internacional atual. 1.1.2. A concretização da ordem econômica internacional: cognição, normatização das relações econômicas internacionais e os questionamentos sobre sua legitimidade. 1.2. O sistema financeiro internacional: elemento da ordem econômica internacional. 1.3. O risco sistêmico, as medidas de contenção e a ausência de criminalização das condutas contra o SFI. 2. O tribunal penal internacional e sua relevância para a proteção dos direitos humanos. 2.1. O TPI, suas competências e seus procedimentos. 2.1.1. A formação do TPI e sua competência ratione materiae. 2.1.2. O procedimento de ratificação do Estatuto de Roma e as demais competências do TPI. 2.1.3. Os procedimentos inquisitorial e judicial do TPI. 2.1.4. As controvérsias acerca das prisões: A prisão perpétua e prisões cautelares. 2.1.5. A execução da pena e a matéria recursal na Corte Internacional Penal. 2.2. O tribunal penal internacional e os direitos humanos. 2.2.1. A tipificação criminosa dos crimes contra a humanidade no TPI x a ampla relevância dos direitos humanos para a comunidade internacional: o exemplo brasileiro. 3. A necessária tutela dos crimes financeiros pelo tpi: os crimes e condutas que afetam o sistema financeiro internacional e as vantagens do direito internacional penal. 3.1. Os crimes e condutas com potencialidade de produzir o risco sistêmico do SFI. 3.2. Os crimes financeiros como crimes contra a humanidade. 3.3. Atos de cooperação do direito penal internacional x atos de coação do direito internacional penal: as vantagens do TPI em face dos acordos internacionais. Considerações finais. Referências bibliográficas.

INTRODUÇÃO

Ocorre hoje, no mundo globalizado, as crises financeiras mundiais perpetradas pelas mais diversas causas, entre elas as especulações de títulos móveis sem as devidas regulações no mercado aberto, vendas de subprimes, desregulamentação dos bancos distanciando-os do controle estatal, alavancagens desproporcionais, dark pools, desproporção entre os valores dos derivativos e os produtos internos brutos (PIB’s) nacionais e por várias outras condutas, tipificadas ou não, contra a interligação econômica internacional entre os sistemas financeiros nacionais. A esta interligação, por presunção lógica, pode-se dar o nome de sistema financeiro internacional (SFI), este, presumidamente, objeto da ordem econômica internacional.

O desequilíbrio do aludido sistema financeiro internacional causa o chamado risco sistêmico, que produz, por sua vez, as crises financeiras mundiais. Por causa da forte interdependência entre bancos, empresas, Estados e indivíduos, em todos os países do mundo, uma conduta, criminosa ou não, cometida por quaisquer dos sujeitos que integram os sistemas financeiros nacionais que compõem o sistema financeiro internacional, pode causar, irremediavelmente, danos com “efeito cascata[2], atingindo outros, se não todos, atores do sistema, daí o termo “risco sistêmico”, caracterizando a ação ou a omissão, um estopim para a danificação de todo ou parte do sistema financeiro internacional. Devido à inegável interligação supranacional dos efeitos causados pelos danos ao sistema financeiro internacionalizado, questiona-se sobre a necessidade de criminalização das condutas individuais que produzem os aludidos prejuízos e a posterior tutela dos comportamentos nocivos pelo Tribunal Penal Internacional (TPI).

Todavia, a mencionada tutela de tais crimes pelo TPI poderá enfrentar diversas controvérsias. A primeira delas diz respeito à ordem econômica internacional, sendo completamente pacificado apenas em legislações nacionais (com ideologias diversas), incluindo a do Brasil, o conceito de ordem econômica nacional. O conceito de ordem econômica internacional é indiscutivelmente necessário para a análise do sistema financeiro internacional, elemento este gravitacional, ou mesmo essencialmente central daquele, configurando o produto corpóreo da ordem econômica global. Partindo dos aludidos enfrentamentos, averiguadas as características da ordem econômica internacional, e, consequentemente, do seu sistema financeiro globalizado, este último poderá tornar-se objeto dos crimes financeiros contra o sistema financeiro internacional e, por sua vez, ao que manda a boa tipificação penal, configurar-se como bem jurídico tutelado pelo Tribunal Penal Internacional, única Corte legitimada internacionalmente para julgar indivíduos.

Porém, o tribunal internacional em questão, mesmo com um procedimento extremamente eficiente diante da ineficácia das leis nacionais de cada país ratificador ao Estatuto de Roma, hoje, apenas apresenta um rol taxativo de crimes sob sua competência, quais sejam, o crime de genocídio, agressão, crimes de guerra e crimes contra a humanidade[3], restringindo sua aplicabilidade e, em tese, inviabilizando prováveis condenações de indivíduos que venham a cometer algum crime contra o sistema financeiro internacional. Mas, todavia, a vedação é apenas aparente, pois já em seu preâmbulo o Estatuto de Roma manifesta a preocupação dos Estados Partes em relação aos crimes que possuem uma maior gravidade suficiente para ameaçar a "paz, a segurança e o bem-estar da humanidade", e que "afetam a comunidade internacional no seu conjunto", conceitos perfeitamente cabíveis aos crimes financeiros tratados. Ademais, ainda se atendo a competência material do Tribunal Penal Internacional, o mesmo, adequando ainda mais as condutas danosas contra o SFI ao TPI, amplia sua tipificação dos crimes contra a humanidade quando aduz que estes podem ser entendidos como “outros atos desumanos que causem intencionalmente grande sofrimento, ou afetem gravemente a integridade física ou a saúde física ou mental”[4].

É possível ainda que os direitos humanos, lembrados e protegidos pelo TPI, devido à sua extrema gravidade e relevância para os povos, sejam capazes de destruir qualquer conflito entre o Estatuto de Roma e as normas nacionais, acobertados, desta forma, pelo princípio da fragmentariedade, fundamentado pelos princípios da lesividade, da adequação social e da intervenção mínima, configurando-se objetos de proteção pelo direito penal. Considerando ainda que o direito humanitário já é positivado por diversos outros dispositivos internacionais, os direitos humanos devem ser protegidos pelo TPI, na forma de inclusão dos crimes contra o sistema financeiro internacional no tribunal, pois a tolerância das destruições causadas pelas crises financeiras seria um ataque contra a ordem jurídica internacional. Assim a tipificação dos crimes contra o SFI no TPI construiria uma maior segurança jurídica da ordem econômica/pública internacional, estabilizando o mercado financeiro e a crença depositada pelas nações neste.

Deste modo, as diversas condutas praticadas contra o conjunto de sistemas financeiros nacionais (o que se pode chamar de sistema financeiro internacional), muitas delas de difícil constatação e investigação, podem ser enfim criminalizadas pelos signatários do Estatuto de Roma (criador e regulador do TPI) e combatidas por seus Estados membros, situação esta que poderá construir uma confiança da comunidade internacional em suas instituições públicas e privadas, trazendo segurança jurídica, preservando a ordem econômica e pública entre todas as nações, diminuindo o risco de esfacelamento da economia mundial, da pobreza causada pelas crises sistêmicas internacionais e, sobretudo, prevenindo os possíveis conflitos oriundos de tais desequilíbrios econômicos.

Diante da realidade do cenário internacional e dos problemas e questionamentos expostos, o presente trabalho tem como objetivo evidenciar os aspectos sociais e as possibilidades jurídicas de criminalização das condutas que podem, de maneira determinante, desestabilizar o sistema financeiro internacionalizado, e, considerando as características do Tribunal Penal Internacional, a inclusão dos crimes contra o SFI no rol das infrações julgadas pelo TPI, as quais estão elencadas no Art. 5º do Estatuto de Roma. Assim, desse modo, se fortaleceria a segurança jurídica internacional extremamente necessária às relações econômicas/jurídicas arraigadas nas sociedades. Para atingir tal intento, como metodologia, a perquirição se valeu de uma pesquisa bibliográfica visando a análise dos aspectos sociais sobre os comportamentos dos Estados, instituições financeiras e cidadãos, bem como o estudo de produções legislativas, nacionais e estrangeiras, do Tribunal Penal Internacional, assim como literatura jurídica nacional e estrangeira.

No primeiro momento expõe-se a formação e importância da ordem econômica internacional, do sistema financeiro internacional e os aspectos do risco sistêmico. Constata-se que a ordem econômica global é fundamentalmente de ideologia liberal, permitindo uma maior movimentação de transações financeiras e pouca regulamentação estatal em relação às mesmas. As características de tal ordem econômica proporcionaram a construção de um controle exercido essencialmente pelo setor privado (caracterizando uma terceira fonte do direito econômico internacional), o quê inviabilizou a efetividade dos diversos acordos internacionais com finalidade de regulamentação, firmados, sobretudo, na cidade de Basiléia na Suíça. É revelada ainda, principalmente, a ausência de qualquer criminalização, por parte de órgãos internacionais, das condutas individuais capazes de desestabilizar o sistema financeiro internacional.

Posteriormente, no próximo ponto, já percebida a falta de criminalização internacional, são apresentadas as vantagens do Tribunal Penal Internacional para sanar a lacuna. A corte internacional tem competência de julgar indivíduos quando os Estados, onde aqueles se encontram, não efetuam de maneira adequada a decisão judicial em relação às infrações cometidas. Para realizar os julgamentos o TPI usa o instituto da entrega, obrigando o Estado Parte que ratificou o Estatuto de Roma a enviar os cidadãos (nacionais ou não) ao TPI. Porém, o Tribunal Penal Internacional, como já exposto, mesmo apresentando ainda outras diversas vantagens, carece de tipificação expressa em relação aos crimes financeiros, o quê poderia ser remediado pela interpretação teleológica do preâmbulo do Estatuto de Roma, bem como seu Art. 7º, part. 1, k, onde é ampliada, de maneira considerável, a interpretação dos crimes contra a humanidade, incluindo os crimes contra o sistema financeiro internacional em tal definição, vista a semelhança entre os efeitos causados por ambas as infrações e, sobretudo, o entendimento pacífico internacional sobre a relevância do direito humanitário.

Por fim, no último capítulo, é vislumbrada a necessidade da tutela dos crimes financeiros no Tribunal Penal Internacional. Para constatar a necessidade, são minunciosamente elencadas algumas das condutas que podem causar danos ao Sistema Financeiro Internacional (bem como as condutas que não causam danos ao SFI, atingindo, v.g., somente os tributos estatais.), atingindo Estados, instituições e pessoas em vários países concomitantemente, sendo capazes de afastar a segurança jurídica da ordem econômica globalizada, podendo levar a sociedade à pobreza e aos conflitos por recursos. Por conseguinte, os efeitos expostos são ligados diretamente aos resultados danosos causados pelos crimes contra a humanidade. Por fim, elencada ainda a vantagem da característica de “coação” do direito internacional penal (diferente da “cooperação” do direito penal internacional), o qual cuida da repressão dos crimes internacionais e ofensas a valores basilares internacionais, diante do dinamismo e velocidade das relações econômicas mundiais.

1. A ORDEM ECONÔMICA INTERNACIONAL, O SISTEMA FINANCEIRO INTERNACIONAL E O RISCO SISTÊMICO

Para averiguar as possibilidades e fundamentos que possam justificar uma eventual inclusão dos crimes contra o sistema financeiro internacional no rol de infrações punidas pelo Tribunal Penal Internacional (TPI), é necessário primeiramente delimitar o que seria a ordem econômica internacional, o sistema financeiro internacional e os efeitos produzidos pelo risco sistêmico, para posteriormente esgotar os aspectos dos crimes que podem realmente desestabilizar ou mesmo destruir totalmente tal ordem, bem como, por fim, tratar das caraterísticas do TPI e da nova ratificação do Estatuto de Roma pelas nações.

1.1. A ordem econômica internacional

1.1.1. O início da construção da ordem econômica internacional atual

A sociedade mundial tentou ordenar a economia global em várias passagens da história, a primeira delas, e mais significativa para o cenário atual, aconteceu com o advento da Segunda Guerra Mundial, quando os interesses de todas as nações foram envolvidos em um evento único. Marcado pelo histórico conflito entre os interesses privados (princípios da livre iniciativa e livre concorrência) e os chamados princípios de integração[5], as negociações entre as nações desaguaram inevitavelmente na vitória discursiva dos ganhadores do último conflito global, com o estabelecimento da clara e forte influência capitalista liberal, pensamento que norteia toda a ordem econômica internacional hoje, processo este descrito com maestria por Leonardo César Souza Ramos e Dawisson Belém Lopes:

“Weber (1997) foi dos primeiros a atestar a racionalização das relações humanas por meio da imagem-metáfora do ‘desencantamento de mundo’. O perfil antropológico do homem racional, nos termos econômicos da expressão, data de fins do século XIX (influência direta do utilitarismo anglo-saxão). (…) Esse liberalismo manifesta-se diferentemente nas várias searas. Materializa-se nos valores da liberdade de credo e de convicção, liberdade de expressão e de imprensa, liberdade de locomoção, entre outros. Mas é na economia, principalmente, que o liberalismo aparece de forma mais palpável. Fala-se recorrentemente no mercado livre, na livre iniciativa, na livre concorrência, na livre remessa de lucros, e em outras formas de se repelir o controle social/estatal da atividade econômica. No rastro de Polanyi, John Ruggie (1983) sustentará a tese de que, desde o ocaso da Segunda Guerra, tem-se dado o fenômeno do ‘liberalismo incrustado’ (embedded liberalism). Para Ruggie, existe um substrato liberal na ordem econômica internacional, fruto de um consenso atingido entre os principais vencedores da Grande Guerra (ênfase maior nos Estados Unidos da América e na Inglaterra). Na base dessa ordem haveria uma confluência entre a estrutura material de poder (as instituições propriamente ditas, como ONU, FMI, Banco Mundial, GATT/OMC, OCDE) e um ‘propósito social legítimo’. Um pouco diferentemente da versão original, o neoliberalismo, variante contemporâneo resultante de uma mescla entre liberalismo e utilitarismo, prevê um papel de interventor pontual para o Estado, de modo tal que a economia capitalista globalizada possa atingir níveis máximos de desempenho. Exultantes durante os anos 1990, ante o esfacelamento da experiência do ‘socialismo real’ da União Soviética, autores ditos (neo) liberais chegaram a prever o ‘fim da história’ (Fukuyama, 1989) e a chegada a um consenso global acerca de como administrar a economia (Williamson; Kuczynski, 2003). Pierre Bourdieu (1998) emparelha o novo projeto liberal ao velho marxismo, no que ambos suscitam grandes utopias. Em termos práticos, Bourdieu dirá que o fundamento último desta ordem econômica (internacional) neoliberal é a violência estrutural do desemprego, da precariedade trabalhista e da ameaça embutida: a condição para o funcionamento ‘harmonioso’ do modelo microeconômico individualista é a existência de um exército de reserva de desempregados”[6].

Com o final da Segunda Guerra Mundial, os países aliados (Aliança das Nações Unidas), temendo que a crise dos anos 30 voltasse com a chegada da ausência de guerras, reuniram-se em Bretton Woods nos Estados Unidos, para sistematizar a economia mundial. Nasce assim o protótipo da Ordem Econômica Internacional com a reunião que ficou conhecida como Conferência de Bretton Woods. Meses antes dessa conferência que só durou três semanas, dois planos estavam em discussão, o Plano Keynes, do inglês John Maynard Keynes, e o Plano White (objetivando o regime cambial único), do americano Harry Dexter White. Sendo este último o plano adotado, foram instituídos o Fundo Monetário Internacional (FMI) e o Banco Mundial; o primeiro revelou-se obsoleto para países desenvolvidos (sobretudo depois dos anos 70[7]) e repudiado pelas nações em desenvolvimento, o segundo não foi muito bem recepcionado pela comunidade internacional (substituído em quase na totalidade pelo Plano Marshall em seu objetivo de reconstruir a economia europeia). Em 1973 todos os países membros abandonaram o regime cambial instituído pela conferência[8].

No ano seguinte, em 1974, a Organização das Nações Unidas (ONU), sucessora da Aliança das Nações Unidas, emitiu, por meio de sua Assembleia Geral, a Declaração de Estabelecimento de uma Nova Ordem Econômica Mundial (Resolução nº 3.201 de 1º de maio de 1974), com vistas aos problemas dos países em desenvolvimento (chamados na época de Terceiro Mundo) e a oportuna e definitiva inclusão destes no cenário econômico mundial. Do mesmo assunto trata o Plano de Ação para a Nova Ordem Econômica Mundial (Resolução nº 3.202 da mesma data), além de regular o Sistema Monetário Internacional. Para tentar positivar os princípios e regras das duas resoluções anteriores, a ONU confecciona a Carta de Direitos e Deveres Econômicos dos Estados (Resolução nº 3.281 de 12 de dezembro de 1974) com caráter evidentemente instrumental para promover a “equidade, a soberania e a interdependência dos interesses dos países desenvolvidos e dos países em desenvolvimento”[9]. Com as referidas resoluções os países expressaram a vontade internacional de uma maior cooperação entre as nações incluídas em grupos chamados na época de Primeiro, Segundo e Terceiro Mundo, e, sobretudo, o fomento de instrumentos que garantissem o exercício efetivo dos princípios de integração.

1.1.2. A concretização da ordem econômica internacional: cognição, normatização das relações econômicas internacionais e os questionamentos sobre sua legitimidade.

Analisando os mesmos aspectos históricos e ideológicos expostos no ponto anterior (1.1.1.), José Cretella Neto sintetiza o conceito de ordem econômica internacional:

“Ordem internacional econômica, em seu sentido mais amplo, é o conjunto coerente de normas jurídicas orientados em funções das finalidades do sistema (…). A ordem internacional econômica contemporânea é produto direto da história recente. Suas linhas gerais foram traçadas principalmente pelos EUA e pela Grã-Bretanha ainda bem antes do final da Segunda Guerra Mundial”[10].

Diante das várias ordens econômicas mundiais (incluindo, v.g., a do Brasil[11] e a da Suíça[12]), o mesmo autor ainda reconhece, como Weber (1.1.1.), que os EUA e Grã-Bretanha consideraram os elementos liberais na construção da Carta das Nações Unidas, bem como nos outros tantos órgãos internacionais de importância relevante ainda hoje, incluindo o FMI, Banco Mundial, GATT e OMC. A consolidação da ordem pós-guerra, sobretudo após a derrota do socialismo, elaborou um liame ideológico entre os países, principalmente os industrializados, promovendo o crescimento de investimento estrangeiro e o comércio multilateral[13].

Portanto, segundo Cretella Neto, os povos normatizaram o ordenamento internacional econômico com o entendimento da igualdade de forças, reconhecendo que “a ordem internacional econômica atual repousa sobre três pilares que constituem o multilateralismo: 1) a liberdade das trocas comerciais e dos pagamentos; 2) a igualdade de tratamento; e 3) a reciprocidade das vantagens”[14]. Mas, é de se esperar que o multilateralismo, com caráter de união e pacifismo, sem guerra cambial, se restrinja aos países centrais, sendo que hoje “todos os Estados industrializados possuem moeda convertível, como o dólar (EUA, Canadá, Austrália), o iene (Japão) e o franco (Suíça). A União Europeia, a partir de 01.01.2002, substituiu as moedas de diversos de seus Estados pelo euro, que já circula em 16 dos 27 Estados da organização. Não há nenhuma restrição à aquisição nem à circulação dessas moedas”[15].

Indo além do âmbito do “dever-ser” e da ficção jurídica, ocorre que a concorrência real entre países de diversos interesses, e ainda de diversas ideologias, fabrica um protecionismo dos mercados internos diante da desproporção entre os valores dos produtos e serviços originários de cada país. Diante dos conflitos, a flutuação das taxas de câmbio e o investimento internacional privado ainda não têm normatização jurídica, e, existe uma forte resistência das empresas transnacionais às tentativas de regulamentação[16]. E é devido a grande força das organizações supranacionais privadas, incluindo os bancos internacionais que desenvolveram “um mercado monetário e financeiro de caráter privado”, que parte da doutrina reconhece uma terceira ordem jurídica controlada por estas, apregoando-as no rol das fontes do direito internacional econômico, que incialmente abrangeria apenas as ordens jurídicas nacionais e a internacional[17]. Nota-se que a desregulação do mercado internacional, transgredindo a normatização das democracias institucionalizadas pelo voto, abala de maneira determinante a legitimidade da própria norma, que deveria ser instituída pela maioria (ainda protegendo a minoria hipossuficiente). Mas, a precariedade da normatização internacional acerca da economia mundial vai além, já que existe uma informalidade intrínseca ao próprio direito internacional econômico, diferente do direito internacional geral, em prol “da eficácia, rapidez e da tecnicidade, impostos, frequentemente, por questões de urgência a respeito das matérias envolvidas”, afastando até o conceito de “tratado” dos acordos internacionais firmados sobre os assuntos econômicos, muitas vezes não publicados na íntegra[18].

Conclui-se sobre a ordem econômica internacional que, além das fortes influências do individualismo capitalista é importante notar a presença do conflito de interesses falado anteriormente (1.1.1.). Tanto na velha ordem econômica descrita pela Conferência de Bretton Woods, quanto na nova ordem econômica internacional com as referidas resoluções da ONU, permanece a disputa dos interesses privados e coletivos. Apesar do conflito que sempre persiste, as informações expostas revelam a tentativa de criação, a existência da vontade, do animus da comunidade internacional em estabelecer de maneira definitiva a ordem econômica internacional, o que traduz de maneira irrefutável sua legitimidade de existir. Não só sua legitimidade é claramente demostrada nas relações internacionais a todo tempo, como também sua indispensabilidade é avistada por todos dada à imensidão do número de territórios e nações no planeta, todos propensos às guerras[19], daí se analisa a lógica da função das relações econômicas entre os países e seus cidadãos, e sua inafastável ordem. Porém, é necessário haver a manutenção desta ordem econômica internacional, considerando o objeto desta, o sistema financeiro internacional, pois, como as transações econômicas entre países vivem em um processo irremediável de interligação, qualquer desestabilização local pode atingir proporções globais em uma grande cadeia de pequenas crises interdependentes. Esta dinâmica é averiguada pelo risco sistêmico.

1.2. O sistema financeiro internacional: elemento da ordem econômica internacional

O sistema financeiro internacional (SFI), grupo de elementos dos sistemas financeiros nacionais que têm relevância mundial, é o conjunto de “relações de troca ou negócios entre moedas, atividades, fluxos monetários e financeiros, empréstimos, pagamentos, aplicações financeiras internacionais, entre empresas, bancos, bancos centrais, governos ou organismos internacionais”[20]. Assim, SFI é um instrumento (ou conjunto de instrumentos ou órgãos e pessoas) que movimenta a ordem econômica, sendo o aspecto corpóreo, palpável, da economia internacional. Portanto, “um sistema monetário internacional pressupõe a existência de regras e critérios de ajustes bem definidos, sendo estes, aceitos por todos os países (incluindo o Brasil[21] e outras nações com sistemas financeiros nacionais) que participam efetivamente da regulamentação deste sistema econômico”[22].

Todavia, como visto anteriormente, a força das multinacionais e bancos internacionais criaram uma terceira fonte do direito internacional econômico, retirando a hegemonia dos Estados públicos para regular a ordem econômica e, consequentemente, o sistema financeiro internacional (1.1.2.). O processo de desregulamentação começou com o fim dos modelos do padrão-ouro e do sistema de Bretton Woods (1.1.1.), culminado no cenário hodierno de expansão de fluxos de capitais e imprevisíveis taxas de câmbios flutuantes, visando todos os atores do sistema a “maximização dos ganhos com o comércio transfronteiriço e os benefícios derivados dos movimentos constantes de capital”[23]. A imprevisão das taxas cambiais e a desregulamentação “aumentou a importância dos mercados de capitais vis-à-vis o mercado de crédito bancário, aprofundando, assim, a nova lógica de investimento dos agentes econômicos, que passaram cada vez mais a adquirir um caráter especulativo”[24]. Assim, mesmo com a necessária flexibilidade normativa que a prática econômica exige (1.1.2.), a maximização da liberdade dos atos dos atores do SFI promove assimetrias no mercado internacional (sobretudo em detrimento das nações em desenvolvimento), “na formação de bolhas especulativas e posteriores colapsos de preços”[25].

Portanto, inegável a existência de um sistema financeiro supranacional e, reconhecendo seus efeitos, a comunidade internacional, verificando a interligação dos sistemas nacionais e os potenciais danos a este conjunto, analisou o risco sistêmico que poderia ocorrer a essa aglomeração e promoveu medidas de contenção. Assim, necessária a análise do risco sistêmico e das mediadas de contenção, expostos as seguir.

1.3. O risco sistêmico, as medidas de contenção e a ausência de criminalização das condutas contra o SFI

O risco sistêmico é a probabilidade de desestabilização que pode, eventualmente, desencadear uma crise em todo sistema (mercado) financeiro internacional, atacando, inevitavelmente, a ordem econômica globalizada. Por isso, o risco sistêmico, para não ser gerado, produz a necessidade de regulação, sendo que esta, por sua vez, necessita de prevenção, o que não pode se afastar da coação das condutas que produzem as crises, ou dos já tipificados crimes financeiros[26]. Mas para a configuração do risco sistêmico em uma conduta criminosa ou com potencialidade de dano, devem ser observados certos critérios ligados à relevância econômico-financeira da instituição, a qual é “vítima” (ou não) das ações danosas, são eles:

a) Too big to fail (em tradução livre, “muito grande para falir”) – Deve existir um grande número de investimentos e investidores, suficiente para ocasionar o risco de contágio do sistema, atingindo outras instituições financeiras e empresas diversas das quais dependem suas operações. A expressão surgiu em 1984, “quando o Continental Illinois National Bank and Trust Company, à época o sétimo maior banco dos Estados Unidos e o maior em número de interconexões bancárias, tornou-se insolvente”[27].

b) Too many to fail (em tradução livre, “muitos para falirem”) – Mesmo quando as instituições forem de médio porte, há uma quantidade relevante de instituições funcionando de maneira temerária ou fraudulenta. “O requisito da relevância econômico-financeira estará cumprido, em tais circunstâncias, não pela instituição separadamente considerada, mas pela soma daquelas envolvidas nas ações fraudulentas”[28].

c) Too (inter)connected to fail (em tradução livre, “muito (inter)conectadas para falirem”) – A instituição deve ter uma grande ligação com outras instituições, pessoas e empresas, configurando uma quantidade de vínculos suficiente influente no mercado financeiro, a ponto de gerar danos a este. “Enquanto a problemática envolvendo aquelas instituições que consideradas too big to fail pode ser controlada a partir da imposição de limites às suas atividades, o mesmo não é possível com aquelas too (inter)connected to fail, circunstância que apresenta desafios muito maiores[29].

Devido à importância do tema, a comunidade internacional vem há muito tempo realizando medidas de regulação para analisar, vigiar e prever as condutas locais que podem afetar todo o SFI. Para exemplificar a magnitude da gravidade dos efeitos dos danos ao sistema financeiro internacional, foi realizado em Basiléia, na Suíça, o Fórum Conjunto, publicado em agosto de 2006 (antes da crise de 2008), onde participaram o Comitê da Basiléia de Supervisão Bancária, a Organização Internacional das Comissões de Valores Mobiliários, a Associação Internacional dos Supervisores de Seguros e o Banco de Liquidações Internacionais, onde se estabeleceu os Princípios Gerais para Continuidade de Atividades[30], com o objetivo de dar prosseguimento ininterrupto às atividades bancárias exercidas tanto pelos participantes da indústria financeira, quanto pelas autoridades financeiras, no sentido de resguardar o sistema financeiro de eventuais rupturas operacionais que afetam a infraestrutura física do sistema integrado das instituições financeiras[31].

Considerando ainda que simples eventos naturais, como cortes de energia, ataques terroristas ou qualquer outra causa de interrupção passageira do mercado financeiro pode construir sérios danos a todo o sistema, a desestabilização causada por decréscimos de valores de moedas ou ações, v.g., podem afetar a vida cotidiana no mundo em graus muito mais sérios. Portanto, o Comitê para a Supervisão Bancária da Basiléia publicou em setembro de 1997 a revisão dos 25 Princípios fundamentais[32] da regulação bancária, com o objetivo de regular as condutas comissivas e omissivas que podem enfraquecer ou mesmo falir instituições financeiras, e, deste modo, abalar o sistema financeiro internacional[33]. Contudo, os 25 princípios servem de base para a regulação bancária até hoje, todavia as regulações ainda precisariam de aplicabilidade.

Após os acordos Basiléia I (1988) e Basiléia II (2004), e a ineficiência dos mesmos, foi firmado os acordos Basiléia III (2010). Sobre o primeiro conjunto de acordos de 1988, firmou-se a prevenção de futuras dificuldades enfrentadas pelas instituições financeiras, atribuindo não só aos governos a vigilância, mas também às agências de classificação e aos investidores, a observação dos atores financeiros (level playing field). Em Basiléia I foi estabelecido a “proporção de Cooke” (nome do presidente do comitê na época), onde foi fixada a exigência mínima de fundos próprios em 8% dos compromissos (contabilizados no balanço e fora dele, de difícil avaliação), focando fortemente nos riscos de créditos e ignorando os riscos das próprias instituições privadas. Os acordos Basiléia II tentaram sem sucesso reverter as contingências causadas pelas lacunas dos primeiros acordos de 1988, pois os bancos, diante do aumento do custo causado pela exigência do grande controle operacional, criaram “os modelos internos de avaliação dos riscos e as novas formas de organização da auditoria e do controle”[34].

A quase ausência absoluta de regulação depois de Basiléia II causou a crise dos subprimes (títulos de créditos duvidosos, que não fazem parte do sistema bancário, geralmente sem regulação bancária[35]), com o reconhecido (e público) começo em 8 de fevereiro de 2007 quando o Hong Kong & Shanghai Banking Corporation (HSBC) publicou uma nota anunciando o não pagamento dos créditos imobiliários de risco e a perda de US$ 10,5 bilhões no seu lucro anual, seguido de vários outros acontecimentos desestabilizadores como a falência do New Century em 2 de abril do mesmo ano, a divulgação em 24 de janeiro de 2008 dos 4,9 bilhões em prejuízos da Société Générale obtidos pelas operações inescrupulosas do operador Jérôme kerviel, a falência do banco Lehman Brothers em 15 de setembro de 2008, e, as concomitantes e posteriores compras, nacionalizações e vultosas ajudas de diversos planos de salvamento arquitetados e implementados pelos Estados (sobretudo pelos Estados Unidos da América e países da União Europeia)[36]. Para conter os sucessivos desastres entre atores e instituições, fortemente interligados em todo o SFI, os quais causaram uma crise financeira mundial desde 2007, foram firmados os acordos Basiléia III em 2010 (incluindo a adoção do método VaR[37]), todos eles com previsão de implementação a partir de 2018[38].

O exemplo europeu de implementação de medidas de contenção, mesmo insuficiente, foi ainda mais minuciosa. Em Estrasburgo, foi decretado pelo Parlamento Europeu e Conselho da União Europeia o Regulamento nº 1092 de 24 de novembro de 2010, “relativo à supervisão macroprudencial do sistema financeiro na União Europeia e que cria o Comité Europeu do Risco Sistémico”[39], tendo em vista que, segundo o próprio Parlamento e Conselho, “a estabilidade financeira é uma condição prévia para que a economia real proporcione a criação de postos de trabalho, a concessão de crédito e o crescimento. A crise econômica revelou graves lacunas em matéria de supervisão financeira, que não conseguiu prever a evolução macroprudencial adversa nem impedir a acumulação de riscos excessivos no sistema financeiro”[40].

Com fundamento no Art. 114 do Tratado Sobre o Funcionamento da União Europeia[41], com base na proposta da Comissão Europeia, em um parecer do Banco Central Europeu, e do Comitê Econômico e Social Europeu, a União Europeia, claramente tenta, não só regular os bancos, mas estabelecer uma maior cooperação com outros órgãos e entidades internacionais como o Fundo Monetário Internacional (FMI), o Conselho de Estabilidade Financeira (CEF) e o Grupo dos Vinte (G-20), para assumir “um forte compromisso a nível mundial” e “todas as responsabilidades que se impõem a nível mundial” pelo criado Comitê Europeu do Risco Sistêmico (ESRB). Reconhecendo o bloco europeu, a magnitude e interconectividade do sistema financeiro, levando em conta que toda e qualquer instituição financeira pode produzir consequências no mercado interno e na economia real (global), foi determinado o acesso do ESRB a qualquer tipo de informação relativa às ações e omissões no sistema[42]. Todavia, diante das diversas tentativas de regulação, muitas que serão implementadas a partir de 2018 (da Basiléia III), é forçosa a constatação de que, mesmo com tantos acordos e medidas, a responsabilização penal dos operadores não é sequer mencionada.

A potencialidade de uma verdadeira enumeração de condutas criminosas (ou mesmo uma codificação internacional – indo além de simples e rasas regulações) seria extremamente relevante, ou mesmo determinante, para o controle do risco sistêmico, mas, devido a vários fatores e interesses (incluindo alianças políticas[43]), não se encontra ainda palpável. As condutas atípicas são inúmeras, o que diminui em muito uma provável tipificação de condutas criminosas a nível internacional. Além disso, os entraves estatais levam os crimes contra os sistemas financeiros nacionais (internos) à prescrição, esta normalmente baseada na pena máxima, que, para os crimes financeiros é em grande parte pequena[44]. Mas, mesmo com todos os entraves, a atribuição do TPI para julgar os crimes contra o sistema financeiro internacional seria extremamente proveitosa devido a agilidade e eficácia em relação aos Estados nacionais e suas políticas internas de proteção aos bancos e seus operadores. Sendo que, nessa Corte, com clara intenção de proteger a comunidade internacional, estão previstos os crimes contra a humanidade, infrações com tipificação ampla no TPI, a ponto de englobar as condutas que causam o risco sistêmico, como é exposto a seguir.

2. O TRIBUNAL PENAL INTERNACIONAL E SUA RELEVÂNCIA PARA A PROTEÇÃO DOS DIREITOS HUMANOS

O Tribunal Penal Internacional (TPI) goza de competência jurídica, credibilidade e praticidade suficientes para punir individualmente os infratores que, em empreitadas criminosas, causem danos à sociedade global. O Estatuto de Roma, o qual deu origem ao TPI, expõe de maneira clara a intenção dos países membros (que ratificaram o Estatuto) por uma construção de proteções e garantias contra os crimes que causam danos sérios à estrutura da sociedade internacional e sua condição humana, aspectos estes que se enquadram exatamente na natureza e efeitos das condutas que hoje assolam a economia mundial, pois desta depende o “delicado mosaico” o qual se refere o próprio instrumento originário daquela Corte Internacional.

2.1. O TPI, suas competências e seus procedimentos

2.1.1. A formação do TPI e sua competência ratione materiae

Anteriormente, principalmente após a Segunda Guerra Mundial, as nações sentiram a necessidade de julgar os crimes políticos, oriundos de conflitos armados internos ou externos, e outras condutas consideradas ilícitas por vários países (principalmente os ocidentais). Em 1945, fui instituído o Tribunal de Nuremberg pelos vencedores da guerra mundial, uma corte de exceção fabricada as pressas para julgar os envolvidos em crimes cometidos nesse conflito, todos eles ligados de alguma forma ao Terceiro Reich[45]. A denominação “tribunal de exceção” atribuído ao órgão temporário revela suas irregularidades. Sua forma, o procedimento dos julgamentos, as penas, seus componentes, tudo a seu respeito é construído após os fatos que serão julgados. Tal característica vicia de maneira extremamente temerária sua imparcialidade, efetividade e, consequentemente, sua legitimidade.

Para sanar um erro tão fundamental (ausência de imparcialidade) ao que entende a maioria dos países ocidentais um ataque ao Devido Processo Legal, foi instituído o Tribunal Penal Internacional (TPI), ou Corte Penal Internacional, sendo este o primeiro órgão supranacional permanente. Um órgão que não faz parte das Nações Unidas, mas está vinculado aos seus princípios e objetivos (ou propósitos), assim sendo, ligado à manutenção da paz e segurança internacionais, à amizade e cooperação entre as nações com uma relação de igualdade, dentre outros princípios norteadores[46]. Em 17 de julho de 1998, o Estatuto de Roma, instrumento que deu origem ao Tribunal, foi ratificado por 120 países convencidos de sua necessidade após a criação dos tribunais para Ruanda e ex-Iuguslávia em 1990. Entrando em vigor em 01 de julho de 2002, ano da ratificação pelo Brasil (Decreto nº 4388/2002), um dos 60 novos países que o aderiram[47]. O Preâmbulo do Estatuto de Roma estabelece os objetivos do TPI:

“Os Estados Partes no presente Estatuto, conscientes de que todos os povos estão unidos por laços comuns e de que suas culturas foram construídas sobre uma herança que partilham, e preocupados com o fato deste delicado mosaico poder vir a quebrar-se a qualquer instante, tendo presente que, no decurso deste século, milhões de crianças, homens e mulheres têm sido vítimas de atrocidades inimagináveis que chocam profundamente a consciência da humanidade, reconhecendo que crimes de uma tal gravidade constituem uma ameaça à paz, à segurança e ao bem-estar da humanidade, afirmando que os crimes de maior gravidade, que afetam a comunidade internacional no seu conjunto, não devem ficar impunes e que a sua repressão deve ser efetivamente assegurada através da adoção de medidas em nível nacional e do reforço da cooperação internacional, decididos a por fim à impunidade dos autores desses crimes e a contribuir assim para a prevenção de tais crimes, (…) decidimos a garantir o respeito duradouro pela efetivação da justiça internacional, convieram no seguinte”[48].

 Alguns aspectos selecionados têm importância fundamental para o tema. O preâmbulo estabelece os objetivos do Estatuto e, consequentemente, do TPI, sendo o seu principal escopo a proteção da comunidade internacional e sua estabilidade duramente construída, ou seja, a segurança jurídica global e a crença nesta, com relação nevrálgica com o equilíbrio da economia mundial (o qual depende de crença). Em seguida o prelúdio define a categoria e as características dorsais dos crimes acolhidos e combatidos pelo Tribunal Penal Internacional. Alude o preâmbulo que tais crimes possuem uma maior gravidade suficiente para ameaçar a "paz, a segurança e o bem-estar da humanidade", e que estes "afetam a comunidade internacional no seu conjunto". A associação entre essas características e os danos causados pelo risco sistêmico (1.3.) é inegável e de clareza solar. Assim, apenas por esse motivo, a tutela dos crimes contra o sistema financeiro internacional pelo TPI seria perfeitamente cabível.

Mas, como manda a boa técnica penal, existe no Estatuto as tipificações criminosas[49]. Assim, em seguida, o art. 5º do diploma legal restringe o que estava estabelecido no preâmbulo a um rol taxativo de crimes, são eles o crime de genocídio, agressão, os delitos contra a humanidade e de guerra. O crime de genocídio caracteriza-se como qualquer ato que tenha o objetivo de ofender, transferir, ou eliminar, total ou parcialmente uma etnia ou grupo social. São os crimes contra a humanidade, o homicídio, extermínio, escravidão, deportação ou transferência forçada de uma população, prisão de natureza grave, tortura, agressão sexual e correlatos, perseguição de um grupo, apartheid, desaparecimento e outros atos desumanos que causem “grave sofrimento” (2.2). Por fim, é necessário explicitar que o grupo de crimes de guerra foi retirado da Convenção de Genebra de 1949, sendo que esse rol de crimes transcritos ao Art. 8º (pertencente às Convenções ou não) tem como sentido central a proteção dos indivíduos já fragilizados pelos conflitos armados e a prevenção às condutas extremadas de grupos bélicos oficiais ou paramilitares[50].

A intenção do Tribunal exposta no preâmbulo do Estatuto de Roma, bem como a natureza de todos os crimes tutelados pela Corte, considera a proteção da humanidade e a ordem internacional como a finalidade de sua existência, mas, hoje inexistem os crimes contra sistema financeiro internacional no rol do TPI. Todavia, mesmo com o entrave, a competência pode ser estabelecida a partir, primeiramente, dos objetivos principais do TPI, quais sejam a tutela da paz, da segurança e o bem-estar da humanidade, em face dos crimes que "afetam a comunidade internacional no seu conjunto”, e, também, em sua competência para julgar os crimes contra a humanidade, infrações estas que se assemelham em muito com as ações e omissões que desestabilizam o SFI, o que poderia abrir um precedente valorativo para uma futura inclusão definitiva dos crimes financeiros no TPI.

Importante lembrar que o princípio da intervenção mínima o qual molda a tipicidade penal no decorrer do tempo e inúmeras mudanças de valores sociais[51], pode fundamentar permanentemente a inclusão dos crimes contra o sistema financeiro internacional no TPI, pois é de fácil compreensão a extrema periculosidade de proporção global das referidas condutas, ou mesmo a dedução da inexistência de outra infração mais devastadora do que aquelas com potencialidade para afetar o SFI, a sociedade globalizada e, deste modo, a humanidade e seus direitos inerentes. E é no sentido de proteção da humanidade que a tipificação dos crimes arrolados no Estatuto de Roma é ampliada, abrangendo todo e qualquer ataque grave aos povos.

2.1.2. O procedimento de ratificação do Estatuto de Roma e as demais competências do TPI

Aprovadas quais as condutas ofendem o sistema financeiro internacional pelos poderes legislativos dos países e, posteriormente, convencionadas por todos os Estados-partes, parte-se para a ratificação pelos interessados. Desta forma, em relação à competência rationae temporis (em razão do tempo), apenas a partir do novo ato de ratificação[52] e da entrada em vigor do Estatuto de Roma[53], reformado com os novos crimes, os cidadãos presentes em todos os territórios se submeterão a jurisdição do TPI[54]. Daí se percebe um aspecto importante, a competência rationae personae (em razão da pessoa)[55] do Tribunal. O TPI só julga pessoas naturais e não Estados, aliás, este é um dos diferenciais da Corte em toda a ordem internacional e um motivo importante para que os juízes desta julguem os crimes em questão, já que o dinamismo do Tribunal se amolda perfeitamente a natureza dessas infrações econômicas pelas seguintes questões: primeiramente a nacionalidade do réu é irrelevante para o julgamento, apenas bastando que o cometimento do crime tenha sido no território de um dos Estados-membros ou de um país que tenha aceitado a jurisdição do TPI (ou a partir de representação do Conselho de Segurança da ONU[56]); e, outra razão que qualifica a Corte para o árduo trabalho é a possibilidade de julgar, não só autores e coautores, mas também partícipes, incluindo quem facilitou, encobriu ou contribuiu para um crime (Art. 25, par. 3, do Estatuto de Roma)[57]

Ainda a respeito da competência rationae personae, como afirma Paulo Henrique Gonçalves Portela, “a competência do TPI abrange as pessoas responsáveis pelos crimes de maior gravidade com alcance internacional”[58], requisito este que se enquadra perfeitamente à possibilidade de tornar o Tribunal oficialmente apto para proteger a ordem econômica global, pois as crises financeiras configuram uma das maiores catástrofes mundiais hoje (3.2). Já em razão do lugar, competência rationae loci, obviamente, o TPI exerce jurisdição nos territórios (incluindo navios e aeronaves) de qualquer Estado Parte que firmou o Estatuto de Roma, ou por acordo especial[59], ou “a partir de determinação do Conselho de Segurança da ONU”[60]. Restando sobre a competência do Tribunal apenas a já tratada jurisdição rationae materiae (em razão da matéria), ficam expostos no Art. 5º do Estatuto de Roma, os crimes julgados pela Corte, quais sejam, os crimes de genocídio, agressão, de guerra e crimes contra a humanidade, todos estas, infrações que causam sérios danos à ordem internacional. Sendo constatado anteriormente que todos os crimes previstos no TPI e as condutas contra o sistema financeiro internacional causam danos à humanidade e, quanto aos efeitos, guardam imensa similaridade entre si (3.2). Reconhecidos como crimes internacionais, objetos do direito internacional penal (3.3), depois de ratificadas as novas infrações financeiras, eventuais crimes contra o SFI seriam primeiramente punidos pelos Estados.

2.1.3. Os procedimentos inquisitorial e judicial do TPI

Coagidos pelos seus governos os indivíduos efetivamente punidos não poderiam ser julgados pelo TPI, pois a dupla condenação seria um evidente ferimento ao princípio do ne bis in idem[61], valor comum a vários ordenamento jurídicos, incluindo o brasileiro. Todavia, surge um dos maiores trunfos do papel da Corte na ordem internacional, mesmo depois da sentença transitada em julgado em um poder judiciário nacional, o TPI tem a competência subsidiária para julgar pessoas naturais às quais foram rés em um processo que “tenha tido por objetivo subtrair o acusado à sua responsabilidade criminal por crimes da competência do Tribunal; ou não tenha sido conduzido de forma independente ou imparcial, em conformidade com as garantias de um processo equitativo reconhecidas pelo direito internacional, ou tenha sido conduzido de uma maneira que, no caso concreto, se revele incompatível com a intenção de submeter a pessoa à ação da justiça” (Art. 20, par. 3, a e b, do Estatuto de Roma). Assim, as questões nacionais ficam mais tolhidas diante do interesse supranacional, qual seja, a proteção do sistema financeiro internacional e, consequentemente, a humanidade.

Diante da ausência de julgamento ou com a existência de uma condenação ineficiente, habilitado está o Tribunal Penal Internacional para receber os supostos fatos hipoteticamente embrenhados por condutas criminosas (observados os requisitos de admissibilidade do Art. 17)[62]. Segundo o Art. 13, a, b e c, do Estatuto de Roma, o Estado Parte ou o Conselho de Segurança da ONU, podem requerer ao procurador da Corte a abertura do inquérito com base em indícios da ocorrência dos crimes da competência do TPI, ou mesmo o próprio procurador do Tribunal pode abrir por sua iniciativa o inquérito com base em informações que indiquem vestígios dos prováveis crimes (Art. 15 do Estatuto de Roma). A independência funcional do procurador para iniciar o inquérito é fundamental para a eficácia da penalidade dos crimes financeiros, já que existem características internas das nações que constroem entraves à efetividade das punições das condutas dessa natureza (3.1). A grandiosa serventia do Tribunal é ainda mais ressaltada pela existência da possibilidade de representação pelas vítimas exclusivamente no juízo de instrução (Art. 15, par. 3, do Estatuto de Roma).

Reconhecidos os fundamentos de fato e de direito (incluindo os do Art. 17), analisando desde logo sobre a admissibilidade[63], o inquérito será aberto e conduzido obrigatoriamente pelo Procurador, a menos que esse, em seu juízo de valor (vinculado ao disposto no Estatuto), entenda que não é proveitoso o início do inquérito, seja porque não existem indícios de autoria e materialidade, ou o mesmo carece dos já mencionados requisitos de admissibilidade, ou ainda não servirá aos interesses da justiça[64] (Art. 53, par. 1, a, b e c, do Estatuto de Roma). Não iniciando o inquérito pelos motivos expostos o Procurador deverá comunicar a decisão fundamentadamente a quem o requereu (Art. 53, par. 2, c), podendo, “a todo o momento, reconsiderar a sua decisão de abrir um inquérito ou proceder criminalmente, com base em novos fatos ou novas informações” (Art. 53, par. 4). O início da fase de instrução se dará após a entrega do acusado ou de seu comparecimento voluntário, assegurando o Tribunal a duração razoável do processo do réu preso cautelarmente (Art. 60, 76, par. 2, e 81, par. 3, a e b, do Estatuto de Roma). Logo após, realiza-se a audiência de instrução (e, se necessário, audiência suplementar)[65], onde as partes apresentam todas as provas que interessem ao processo (Art. 61); e, posteriormente a realização do julgamento, que, em resumo, é similar ao processo penal brasileiro no que diz respeito aos princípios da paridade de armas, ampla defesa e contraditório (Art. 62 e ss.).

Julgado o acusado, em primeira instância, pelos crimes que causam grande prejuízo à ordem internacional, valorar-se-á e (não havendo recurso) aplicar-se-á a pena[66]. Destarte, segundo o Art. 77 do Estatuto, as penas aplicadas pelo TPI são: prisão por um número determinado de anos, até ao limite máximo de 30 anos; prisão perpétua, se o elevado grau de ilicitude do fato e as condições pessoais do condenado o justificarem; multa e perda de produtos, bens e haveres provenientes, direta ou indiretamente, do crime, sem prejuízo dos direitos de terceiros que tenham agido de boa fé. Sobre as penalidades, necessário aprofundar-se sobre as questões polêmicas das prisões.

2.1.4. As controvérsias acerca das prisões: A prisão perpétua e prisões cautelares

Acerca da prisão sem prazo, a mesma é incompatível com ordenamento jurídico brasileiro por força do Art. 5º, XLVII, b, da Constituição Federal, mesmo prevista no Estatuto de Roma ratificado pelo Brasil. Sobre a adoção, convém a interessante ciência de que a escolha da prisão perpétua foi construída pela discussão entre os Estados Unidos, que sustentavam a adoção da pena de morte (da common law) e países ibero-americanos que defendiam a pena máxima de 30 anos[67][68]   (da civil law)[69]. Curiosamente a posição sustentada pelos latino-americanos apoiava-se nos direitos humanos, objeto maior do preâmbulo da Corte[70]. Claramente, mesmo que inicialmente, há entre o ordenamento jurídico brasileiro e o Estatuto de Roma, este conflito aparente de normas. Contrário senso da própria Carta Magna, a Emenda n.º 45, que inclui o parágrafo 4º no Artigo 5º da Constituição, submetendo o Brasil à jurisdição do TPI a cuja criação tenha manifestado adesão[71]. Quanto ao conflito, tratando do instituto da extradição, existia um entendimento jurisprudencial tradicional do Supremo Tribunal Federal que apoiava a desnecessidade da comutação da pena de prisão perpétua em pena privativa de liberdade limitada ao prazo de 30 anos. Entendimento este alterado pelo julgamento de Extradição nº 855 do STF, entendendo agora pela necessidade da comutação[72].

Todavia, o TPI não trata de extradição, esta inviável contra brasileiros natos (e naturalizados exceto em alguns casos) por força do Art. 5º, LI, da Carta Magna, e sim, de entrega (Art. 102, a, do Estatuto de Roma). Sobre a diferença entre os institutos jurídicos, Eugênio Pacelli explica que, “André de Carvalho Ramos (2000, p. 270) anota, ainda, que não haveria óbice constitucional, na medida em que a extradição implica a entrega de nacionais a Estados Soberanos, enquanto a medida prevista no art. 89 do TPI determina a entrega a um organismo internacional, cuja normatização é aceita pelo país. Estamos de acordo, sobretudo em relação ao fato de se estar entregando um nacional não a outro Estado, mas a uma organização internacional, de quem se espera o efetivo cumprimento do devido processo legal (Arts. 65, 66, 67, do Estatuto de Roma). De se acentuar, mais, que, no caso da extradição, não há aceitação prévia das normas jurídicas do Estado solicitante pelo Estado concedente, em face da soberania de ambos. Na entrega, ao contrário, além de não se cuidar de outro Estado – mas de organismo internacional -, a normatividade a ser aplicada ao caso concreto há de ser previamente admitida e aceita pelo Estado que a realiza (entrega). A diferença entre as situações é sensível”[73].

Mas o problema da inconstitucionalidade continua, pois o Art. 5º, XLVII, b da Constituição é uma garantia individual, como explica o Juiz Saulo José Casali Bahia:

“E esta previsão pátria sequer pode ser alterada por emenda constitucional, ante a cláusula pétrea inserida no § 4º do artigo 60 da Carta Magna: [‘Não será objeto de deliberação a proposta de emenda tendente a abolir (…) IV- os direitos e garantias individuais.’]. E o problema pode parecer incontornável, considerando que o Tratado de Roma não admite a sua ratificação, assinatura ou adesão com reservas feitas pelos países (art. 120: ‘Não se admitirão reservas ao presente Estatuto’)”[74] .

O jurista, mesmo diante da cláusula pétrea, admite haver apenas um conflito aparente de normas, pois a Constituição reconhece a pena de morte em caso de guerra, penalidade essa mais grave que a prisão perpétua (Art. 84, XIX da CF), entendendo ainda que a guerra[75] faz parte da áurea dos crimes punidos pelo TPI, que preservam a integridade da humanidade. Importante ainda apresentar a resolução do problema pelos italianos (pais do civil law) para contornar a encruzilhada jurídica, salientando os mesmos a possibilidade de revisão da pena perpétua quando transcorridos 25 anos de clausura (Art. 110). No caso do Brasil, propõe Bahia:

“(…) poder-se-ia entender ser viável a imposição de pena perpétua, fixada ao condenado pelo Tribunal Penal Internacional, desde que deva ser cumprida no estrangeiro, por força de decisão do Tribunal internacional. Ou seja, a execução da pena perpétua eventualmente imposta seria impossibilitada tão apenas se o seu cumprimento devesse ocorrer no país, já que, nesta hipótese, o condenado deveria ser posto em liberdade tão logo ultrapassado o tempo máximo de cumprimento de pena previsto pelas leis nacionais. Desse modo, cumpriria tão somente ao Tribunal Penal Internacional, para fazer valer o seu julgado e evitar expor o Brasil ao descumprimento flagrante do Tratado de Roma, determinar que o cumprimento da pena se dê em outro país qualquer, compatibilizando-se, assim, as normas do Tratado de Roma e da Constituição Federal brasileira”[76]

Concatenado de maneira coerente, viável é o entendimento que reconhece o cumprimento da pena perpétua no estrangeiro, já que o necessário encarceramento estaria protegido pelo espírito da Constituição quando esta reconhece a possibilidade da aplicação da pena de morte em considerada situação analógica à intenção da criação do TPI, à ratificação do Estatuto de Roma e proteção dos crimes de guerra (contra a humanidade) pela Corte. Sem esgotar a questão, que ainda patrocina discussões acaloradas acerca da constitucionalidade do parágrafo 4º, do Artigo 5º da Constituição Federal, introduzido pela Emenda nº 45, o qual submete o Brasil à jurisdição do Tribunal Penal Internacional, necessário o prosseguimento do tema do presente trabalho.

Além da ausência de ilegalidades, o Tribunal Internacional ainda apresenta algumas vantagens em relação à natureza dos crimes financeiros. Primeiramente, o artigo 27 do Estatuto prevê a irrelevância da função oficial (incluindo Chefes de Estado e de Governo) para efeito de responsabilização criminal ou diminuição de pena pelo Tribunal Penal Internacional, assim, imunidades, normas especiais e foros privilegiados são desconsiderados diante da magnitude da Corte, tanto de sua importância em si, como da gravidade dos crimes punidos por ela. Dessa forma os indivíduos condenados por crimes financeiros, que em geral são pessoas poderosas, não serão protegidos pelas legislações nacionais quando estas forem ineficientes em relação à efetividade do processo.

Mais uma proveitosa característica do Tribunal Internacional diz respeito ao instituto da prisão preventiva. O Art. 59, par. 1, do Estatuto de Roma, sobre o procedimento de detenção no “Estado da detenção”, diz que “o Estado-parte que receber um pedido de prisão preventiva ou de detenção e entrega, adotará imediatamente as medidas necessárias para proceder à detenção, em conformidade com o respectivo direito interno e com o disposto na Parte IX”. Necessário ressaltar que a primeira parte do artigo não se refere ao Estado Parte o qual o acusado é nacional, mas sim onde o réu está detido preventivamente (o Estado da detenção). Medida que flexibiliza intensamente a burocracia que pode ocorrer se um nacional, necessariamente, não puder ser detido preventivamente em um país diverso do seu, caindo assim nos intermináveis meandros de negociações internacionais promovidas pelas soberanias das várias nações. Desse modo, segundo o Estatuto de Roma, v.g., um acusado italiano detido na Suécia por força de decretação de prisão preventiva[77] pelo Tribunal, ficará detido em território sueco pelo menos até o relaxamento da prisão ou da possível liberdade provisória, ou mesmo até a sua absolvição. O caso em tela obrigaria a Itália a aceitar a detenção do seu cidadão nacional na Suécia, pois a jurisdição do TPI abrange o território de todos os Estados Partes.

Ademais, a respeito da indicada Parte IX no Art. 59, par. 1, cumpre salientar as regras de cooperação internacional e auxilio judiciário. Sobre a necessária cooperação, o Art. 86 aduz que “os Estados Partes deverão, em conformidade com o disposto no presente Estatuto, cooperar plenamente com o Tribunal no inquérito e no procedimento contra crimes da competência deste”. O termo “plenamente” amplia os efeitos dos pedidos das relações internacionais durante a instrução criminal, que deverão ser efetuados por via diplomática ou por outros meios acordados desde o momento da ratificação, aceitação, aprovação ou adesão (Art. 87 do Estatuto). Há de se fazer ainda outra consideração importante sobre o mencionado termo “direito interno”, que deve ser sopesado com o disposto na Parte IX do Estatuto internacional. No caso do Brasil, a cooperação, mesmo que não fosse obrigatória, não ofenderia o direito interno, pois a legislação nacional, teoricamente, apoia a preservação da ordem econômica. Exemplos maiores são as alterações relevantes sobre o assunto das infrações financeiras no Código de Processo Penal Brasileiro, patrocinadas pela Lei 12.403 de 04 de maio de 2011: primeiramente, o Art. 312 do mesmo Código elenca a ordem econômica como um dos requisitos da prisão preventiva; em segundo lugar, o Art. 319 do mesmo diploma legal interno considera como medida cautelar (em caso de liberdade provisória) a “suspensão do exercício de função pública ou de atividade de natureza econômica ou financeira quando houver justo receio de sua utilização para a prática de infrações penais”. Ainda sobre a devida concórdia entre direito interno e a Parte IX do Estatuto, o Art. 88 do mesmo diploma internacional assevera que, desde logo “os Estados Partes deverão assegurar-se de que o seu direito interno prevê procedimentos que permitam responder a todas as formas de cooperação especificadas neste Capítulo”. Desse modo, resta tratar do fim da ritualística do procedimento, qual seja, a execução e a fase recursal da Corte.

2.1.5. A execução da pena e a matéria recursal na Corte Internacional Penal

Outrossim, a maior utilidade do Tribunal, no que diz respeito a sua real efetividade, sendo esta de letal valor para a manutenção da ordem econômica internacional, é a imutabilidade da pena executada, sendo vinculativa, em todos os termos, a todos os Estados-partes, não sendo possível, de maneira alguma, a modificação da pena decretada, indiferentemente da legislação interna dos países que ratificaram o Estatuto de Roma. Sobre a virtude da Corte, o Art. 105, par. 1, alínea a, determina que “sem prejuízo das condições que um Estado haja estabelecido nos termos do artigo 103, parágrafo 1o, alínea b, a pena privativa de liberdade é vinculativa para os Estados Partes, não podendo estes modificá-la em caso algum”. No mesmo artigo o diploma internacional ainda preleciona que “será da exclusiva competência do Tribunal pronunciar-se sobre qualquer pedido de revisão ou recurso. O Estado da execução não obstará a que o condenado apresente um tal pedido”. Necessário ressaltar ainda que a execução de qualquer pena privativa de liberdade será submetida ao controle do TPI e às regras internacionais, ficando apenas as condições das prisões reguladas pelo Estado da detenção (da execução), respeitando, é claro, as normas supranacionais (Art. 106 do Estatuto).

Atravessadas as questões das execuções das penas, chega-se aos recursos. Segundo o Art. 81, par. 1, do Estatuto, o Procurador poderá interpor recurso contra a sentença quando verificar a existência de vício processual, erro de fato ou de direito. Já o condenado ou o Procurador, atuando no interesse daquele (custos legis), poderão interpor recursos pelas mesmas questões incluindo ainda os motivos suscetíveis de afetar a equidade ou a regularidade do processo ou da sentença. Cabem também recursos contra decisões interlocutórias que se posicionam a respeito de questões preliminares como a competência e admissibilidade do caso, bem como as que denegam ou deferem prisão cautelar de pessoa natural (meio de prova de inquérito), contra a decisão do Juízo de Instrução de agir por iniciativa própria, ou mesmo contra decisão que caminha contra a equidade e celeridade razoável do processo (Art. 82, par. 1, do Estatuto).

Presentes, portanto, todos estes (e outros) requisitos atinentes ao direito material penal e processual penal nacionais, o que não levaria de forma alguma o acusado a sofrer qualquer tipo de cerceamento de defesa quando este se sujeitar ao instituto da entrega. Ficam assim expostas os principais procedimentos e vantagens da adoção do Tribunal Penal Internacional para tutelar os supostos crimes contra o sistema financeiro internacional, que afetam o valor maior da ordem econômica global. Mas, todavia, ainda resta apresentar a principal relação da natureza existencial do TPI com a tutela dos crimes contra o sistema financeiro internacional, qual seja a intenção de proteger os direitos humanos inerentes à todos os indivíduos do mundo, cidadãos ou não.

2.2. O Tribunal penal internacional e os direitos humanos

O Estatuto de Roma ainda aprofunda o tema dos direitos humanos em seu Art. 7º, que coloca em tela, pormenorizadamente, os crimes contra a humanidade. Expõe assim o relevante artigo:

“Artigo 7º.

1. Para os efeitos do presente Estatuto, entende-se por "crime contra a humanidade", qualquer um dos atos seguintes, quando cometido no quadro de um ataque, generalizado ou sistemático, contra qualquer população civil, havendo conhecimento desse ataque.”

As alíneas da parte 1, especificam ainda mais os casos considerados como crimes contra a humanidade. Mas, na última alínea (K), a carta que traduz as vontades das nações aderentes faz questão de ampliar o conceito de “crime contra a humanidade” e considera ali seus efeitos, desconsiderando a natureza restritiva das tipificações passadas, quando escreve no acordo solene o termo “outros atos desumanos de caráter semelhante”. Assim expõe, o Art. 7º, par. 1, k, do Estatuto de Roma:

“k) Outros atos desumanos de caráter semelhante, que causem intencionalmente grande sofrimento, ou afetem gravemente a integridade física ou a saúde física ou mental.”

Dada à tamanha amplitude, a única restrição do artigo em tela se revela no conceito de “ataque”. Em primeiro plano, segundo o artigo 7º um crime contra a humanidade seria, obrigatoriamente, um “ataque generalizado e sistemático”, o que pode ser interpretado não só do ponto de vista bélico, mas econômico, pois um crime financeiro não deixa de ser um ataque, generalizado (difundido, que atinge a todos, sem alvo específico) e sistemático (que se fundamenta num sistema, de forma organizada). Não bastando, posteriormente o Estatuto de Roma, com o uso do termo “outros atos desumanos de caráter semelhante”, amplia ainda mais a tipificação criminosa, abrangendo inúmeras condutas que poderiam ser aceitas como crimes contra a humanidade na perspectiva do TPI. Ocorre que, o quê em certa perspectiva pode incluir os crimes contra o SFI no conceito dos crimes contra a humanidade, de certa forma ao mesmo tempo poderia afrontar o princípio da tipicidade.

2.2.1. A tipificação criminosa dos crimes contra a humanidade no TPI x a ampla relevância dos direitos humanos para a comunidade internacional: o exemplo brasileiro

Observa-se que, para o ordenamento brasileiro, v.g., a ausência de taxatividade, restrição na tipificação criminosa, e previsão legal anterior (Art. 1º do Código Penal Brasileiro), encaminha a abstração da conduta inevitavelmente à atipicidade penal e, consequentemente à absolvição sumária (Art. 397, III do CPP)[78]. O ditame legal é confrontado pelo Art. 1º do Decreto nº 4.388/12, onde o Brasil se obriga a executar e cumprir inteiramente o Estatuto de Roma, e com o Art. 5º, § 4º da Constituição Federal.

Não é apenas a excessiva amplitude na tipificação dos crimes contra a humanidade no TPI (ferindo o princípio da tipicidade) que poderia inviabilizar a efetividade da entrega de acusados à Corte Internacional, mas também, no caso do Brasil, a ausência de tipificação dos crimes contra a humanidade na legislação penal brasileira, sendo esta previsão para o Supremo Tribunal Federal, obrigatoriamente produzida pelo Poder Legislativo[79]. Para tentar sanar o vício, tramita na Câmara dos Deputados o Projeto de Lei nº 301/2007 que “define condutas que constituem crimes de violação do direito internacional humanitário, estabelece normas para a cooperação judiciária com o Tribunal Penal Internacional e dá outras providências”[80], incluindo os crimes contra a humanidade no seu Art. 11, onde a tipificação se restringe a apenas algumas condutas, excluindo o conteúdo do item K, par. 1 do Art. 7º do Estatuto de Roma. Ficando assim construída uma maior incerteza sobre a aplicabilidade de coação às várias condutas que poderiam ser atribuídas ao rol do TPI, incluído os crimes financeiros com efeitos globais.

Todavia, o conflito entre as legislações primeiramente é confrontado pela razão do direito penal e seus princípios. O Princípio da Fragmentariedade[81], fundamentado nos princípios da lesividade, da adequação social e da já falada intervenção mínima (2.1), cuida dos valores mais importantes, amplos e frágeis, os quais devem ser tutelados pelo direito penal. Assim, o direito penal deve proteger “os bens de maior relevo que merecem a especial atenção”[82] da ultima ratio, estabelecer “quais são as condutas que não poderão sofrer os rigores da lei penal”[83], e “restringir o âmbito de abrangência do tipo penal, limitando a sua interpretação, e dele excluindo as condutas consideradas socialmente adequadas e aceitas pela sociedade”[84]. Como se percebe, os ataques contra os povos por meio do SFI não podem ser deixados à margem do direito penal, visto que diante da indiscutível gravidade dos danos causados pelas crises financeiras, as condutas e crimes financeiros se adequam perfeitamente aos princípios internacionais penais. Assim, diante de uma conjectural efetividade do TPI, sobretudo para a coação dos crimes financeiros cometidos no Brasil ou em países com carência de previsão legal, seria proveitosa a adoção subsidiária e ampla das condutas contra a humanidade (previstos no Estatuto de Roma) para incluir as condutas e crimes financeiros no rol de crimes punidos pelo Tribunal Penal Internacional.

Não só os benefícios práticos na ampliação da tipificação devem ser considerados, mas também a indubitável estima aos direitos humanos, pois, mesmo com tantos entraves legislativos, considerando a valoração moral internacional hodierna, o direito humanitário é visto, há muito, com destaque no direito internacional, constituindo até uma verdadeira limitação às soberanias nacionais. A elevação dos direitos humanos aconteceu justamente depois dos sucessivos massacres ocorridos nas grandes guerras mundiais, sobretudo após a Segunda Guerra Mundial, com o repúdio à ideologia nacional-socialista, e a criação dos órgãos internacionais, incluído a ONU (2.2)[85]. Por temor a repetição do terror vivido anteriormente pela população mundial, os direitos humanos ganharam um status superior para a comunidade internacional, “um núcleo de direitos insuscetíveis de serem derrogados em qualquer tempo, condição ou lugar”[86], elevando o homem a condição de sujeito internacional, prestígio este, segundo o sempre lógico Ministro José Celso de Mello Filho, reconhecido pelos seguintes fatores:

“A própria dignidade humana, que leva a ordem jurídica internacional a lhe reconhecer direitos fundamentais e procurar protege-los; e a própria noção de Direito, obra do homem para o homem. Em consequência, a ordem jurídica internacional vai se preocupando cada vez mais com os direitos do homem, que são quase verdadeiros direitos naturais concretos”[87].

Ainda há de se constatar que, lembrando ainda o imenso poder de influência dos sujeitos da chamada terceira ordem jurídica (fonte do direito internacional econômico) (1.1.2.), existe na prática uma prevalência dos direitos relativos ao mercado internacional, em face dos direitos humanos. Segundo Delmas-Marty, há um conflito entre direitos mercantis e direitos humanos no limitado espaço normativo mundial, e, sobretudo, os valores do mercado são mais bem trabalhados, estudados e protegidos do quê o direito humanitário (questão que, diante da “internacionalização do mercado”, “não poderia ser tratada unicamente pelo direito nacional”[88]). O sistema jurídico do mercado internacional, mesmo sem vinculação obrigacional com Estados nacionais, recebe atenção especial objetivando a manutenção da ordem econômica internacional. Assim, a doutrinadora afirma:

“Ao contrário, no espaço mundial, a forte assimetria dos processos de internacionalização parece incentivar sistematicamente os valores mercantis. De um lado, o princípio da livre circulação, imposto pelo Acordo Geral sobre as Tarifas e o Comércio (GATT), depois Organização Mundial do Comércio (OMC), sob o controle quase jurisdicional do Órgão de Regulamentação das Disputas (ORD), facilita sua difusão espacial (e a extensão de sua definição) impondo aos Estados a eliminação de barreiras comerciais (internacionalização do comércio), enquanto a emergência da lex mercatoria permite selecionar as normas jurídicas mais favoráveis ao comércio mundial. Por outro lado, a resistência dos valores não mercantis foi enfraquecida pela complexidade das interações em um espaço normativo muito mais fragmentado e pela ausência de uma Corte Mundial de Direitos Humanos. (…) Do lado do mercado – OMC e Organização Mundial da Propriedade Intelectual (OMPI) – o direito das patentes mostra a dificuldade, especialmente em campos como a biotecnologia que, evidentemente, põe em questão não apenas os valores mercantis, mas também os não mercantis. Sua aparente neutralidade – pois a patente não confere autorização, apenas o monopólio da exploração – incentivou a extensão das patentes, ao campo da biotecnologia. Admitida nacionalmente (Estados Unidos e China) e regionalmente (portaria da União Européia de 1998), esta extensão foi mundialmente consagrada pela assinatura, em 1994, do Acordo Sobre os Direitos da Propriedade Intelectual relativos ao Comércio Internacional (Adpic), que obriga os Estados a se dotarem de uma legislação para proteger as invenções "em todos os campos", sem discriminar as tecnologias utilizadas”[89].

Mesmo que o mercado mundial tenda a uma universalização, ele não favorece diretamente aos interesses coletivos e, de acordo com Delma-Marty, “em caso de conflito, os valores não mercantis, que não têm equivalente e não são substituíveis, deveriam ser superiores”. A razão da preferência pelos direitos humanos (ou a dignidade humana), em face dos mercantis, com um auxílio do pensamento kantiano[90], seria a manutenção da paz (positiva) e regulação de disputas. Porém, na prática, segundo a doutrinadora, “o futuro parece ainda mais incerto porque o espírito do mercado não só ganhou o direito das pessoas através da finalidade de indenização, mas ainda, mais profundamente, por seu próprio modo de expressão, a negociação, que parece agora atingir o núcleo duro e irredutível da pessoa através dos direitos da personalidade”[91].

Ademais, ainda que em perspectiva mais tecnicista, desconsiderando a importância dos direitos humanos, é necessário ressaltar que o Brasil já ratificou o Estatuto de Roma e suas disposições, sendo o caso de retirada (Art. 127 do Estatuto de Roma)[92] e não revogação, caso o governo brasileiro não deseje mais cumprir o quê a ele foi vinculado, seja por previsão legal interna ou interesse nacional soberano. Mas, mesmo se fosse o caso de revogação de lei internacional, a medida não seria plausível como afirma Celso D. de Alburquerque Mello, usando o exemplo de tratado:

“Parece-nos que toda esta matéria tem por base o equívoco que advém da afirmação de que o tratado tem efeito de lei. Contudo, o tratado não é uma lei, pelo contrário, ele tem uma natureza própria que o coloca acima da lei. Quando se diz que o efeito é de uma lei, quer apenas se dizer que ele é no mínimo tão obrigatório quanto uma disposição legislativa e apenas isso. Negar o primado da norma jurídica internacional perante o direito interno é negar a própria existência do DIP[93]. A jurisprudência dos tribunais internacionais é pacífica ao afirmar a não-revogação da norma internacional pelo direito interno. Seria impossível existirem, em última análise, duas ordens jurídicas contraditórias e válidas ao mesmo tempo. Seria negar a unidade do Direito”[94].

Com a afirmação de Celso de Albuquerque Mello, se constata o risco da dissolução da unidade do Direito, quando não internalizada a validade do direito internacional. A ideia de unidade de Direito é evidenciada ainda mais quando se tem a ciência que o direito internacional público e o direito penal, estão, ambos, em uma das grandes classes do Direito, o direito público (e não o privado), regendo-se pelos mesmos princípios comuns, como as relações entre Estados, e entre homens e Estados, predominando sempre o interesse coletivo[95] (considerando os direitos individuais). Assim, quando um Estado desfaz o conceito de crimes contra a humanidade, positivado anteriormente por tratado (o qual integra o Direito uno), tratando-se de direitos públicos (coletivos), a destruição da segurança jurídica fica mais evidenciada.

Com o esfacelamento da tipificação ampla dos crimes contra a humanidade, ou uma hipotética desconsideração da legitimidade da entrega, ou seu desrespeito reiterado, se tem então o risco da desvalorização da segurança jurídica internacional com a perda da unidade do direito, verdadeira catástrofe, portanto. O compromisso com o respeito às normas internacionais, e consequente garantia da existência das mesmas, é reforçado pelo Brasil e vários Estados das Américas quando os mesmos assinam a Carta da Organização dos Estados Americanos (OEA), que dispõe em seu Art. 3º, b, o seguinte princípio: “El orden internacional está esencialmente constituido por el respeto a la personalidad, soberanía e independencia de los Estados y por el fiel cumplimiento de las obligaciones emanadas de los tratados y de otras fuentes del derecho internacional”[96].

Portanto, a ampliação da tipificação dos direitos humanos deve ser aceita, não só pelo alto preço do direito humanitário, mas por respeito à ordem jurídica internacional positivada pelos instrumentos de vinculação dos Estados às obrigações convencionadas em tratados, convenções e estatutos. Diante de todo o exposto, considerando as razões da extrema importância dos direitos humanos e sua incontestável proteção, resta elencar mais profundamente a relação dos mesmos direitos com o ataque ao sistema financeiro internacional (objeto da ordem econômica global), pois, hoje as dificuldades enfrentadas pela população, incluído a miséria, fome e doenças, não mais surgem exclusivamente das grandes guerras. Atualmente os pequenos conflitos armados disputam com as crises financeiras os índices de sérios danos aos povos[97].

3. A NECESSÁRIA TUTELA DOS CRIMES FINANCEIROS PELO TPI: OS CRIMES E CONDUTAS QUE AFETAM O SISTEMA FINANCEIRO INTERNACIONAL E AS VANTAGENS DO DIREITO INTERNACIONAL PENAL

O processo de institucionalização do novo rol de crimes para conservar a ordem econômica global não seria fácil. Primeiro é preciso estabelecer os valores internos dos países para evitar futuros problemas nas novas promulgações do Estatuto de Roma. A partir do momento que se verifica os interesses políticos e o quê os países membros realmente querem proteger, apenas posteriormente parte-se para o processo interno no TPI.

3.1. Os crimes e condutas com potencialidade de produzir o risco sistêmico do SFI

Por óbvia constatação, verifica-se que as condutas que devem ser tuteladas pelo TPI são os crimes internacionais, objetos do direito internacional penal (3.2). Portanto, proveitosa a tutela dos crimes internacionais que invistam, de alguma forma, contra o sistema financeiro internacional, sendo este um conjunto de sistemas financeiros nacionais. Assim, para haver uma maior segurança jurídica nas transações financeiras internacionais, ou na própria economia globalizada (evitando o estopim do risco sistêmico), o TPI (com toda a sua reconhecida legitimidade para julgar indivíduos individualmente) poderá punir aqueles que atentarem contra o sistema financeiro internacional, garantindo, deste modo, a manutenção da ordem econômica (e social/pública) global.

Partindo dessa retrospectiva teórica, resta verificar alguns exemplos de crimes e condutas que poderiam ser tipificadas pelo Tribunal Penal Internacional. Desde logo, já se tem a ideia de que o TPI poderia punir os crimes financeiros que, não só causem um desequilíbrio ou a crise do sistema financeiro internacional (risco sistêmico), mas, dentre estes, os que causarem danos à humanidade e à ordem internacional, competência ainda mais amplificada pelo preâmbulo do Estatuto de Roma que esclarece a intenção de adotar medidas para coibir os crimes graves que ameacem a paz, a segurança e o bem-estar da humanidade, ou que afetam a comunidade internacional no seu conjunto (2.1).

Exemplo mais emblemático de crime capaz de causar uma considerável quebra de confiança no mercado financeiro internacional, construindo uma insegurança jurídica, é o caso Madoff. Restaurando o antigo esquema da “Pirâmide de Ponzi”, o ex-presidente da Nasdaq Bernard Madoff, por meio de sua empresa de investimentos Bernard L. Madoff Investment Securities, administrava recursos financeiros de terceiros sem obter lucros verdadeiros através de fundos de hegde[98]. Assim, com a crise de 2008, quando os seus clientes desejaram retirar o dinheiro investido (pedidos de sete bilhões de dólares) alguns não conseguiram, pois os investimentos novos eram usados para pagar os mais antigos. O esquema fraudulento só foi desvendado porque, acuado, o infrator confessou todo o esquema a família e esta prestou queixa às autoridades. O déficit, como afirma a ISTOÉ Dinheiro, foi de aproximadamente cinquenta bilhões de dólares perdidos por pessoas em quarenta países[99].

Nos Estados Unidos da América, Bernard Madoff foi condenado por onze crimes, incluindo lavagem de dinheiro, perjúrio e fraude. Entendendo a gravidade dos crimes para a economia, o juiz da Corte Federal de Manhattan aplicou a pena de cento e cinquenta anos, rejeitando a tentativa de redução para doze anos de prisão proposta pela defesa devido à confissão[100]. No Brasil, as condutas praticadas por Bernard Madoff estão tipificadas pela Lei nº 7.492 de 1986. A primeira é o crime de gestão fraudulenta (Art. 4º), onde o administrador ou correlato (crime próprio) gere fraudulentamente (de forma enganadora – dolosa), ou temerariamente (de forma arriscada, impensada – também dolosa) uma instituição financeira[101], o que no caso Madoff foi um fundo de hedge. É evidente o ataque ao bom funcionamento do sistema financeiro e seus elementos, como afirma Ali Mazloum sobre o objeto jurídico do crime em tela:

“O bem que se quer tutelar é o Sistema Financeiro Nacional, cuja regularidade depende da solidez de seus alicerces, quais sejam organização do mercado, segurança nos negócios e confiança, que podem ser gravemente atingidos com a violação dessa norma. Atividades fraudulentas ou temerárias de gestão de instituição financeira, tais como escritas contábeis ilusórias, operações simuladas ou demasiadamente arriscadas, omissão na tomada de decisões importantes para a salvaguarda de interesses da instituição, dentre outras diversas formas de gestão contraveniente à ordem jurídica podem, de fato, abalar os mencionados alicerces. Tratando-se de crime pluriofensivo, a proteção penal abarca, também, a higidez do patrimônio de terceiros (a própria instituição financeira, acionistas, poupadores, investidores etc.)”[102].

Interessante notar que a pena de gestão fraudulenta no Brasil é de reclusão de três a doze anos, e a pena para gestão temerária é de reclusão de dois a oito anos. Portanto Bernard Madoff, por esse crime apenas responderia, no máximo, pela pena de doze anos de reclusão[103]. Além disso, e o que mais interessa ao presente trabalho, o operador, no caso, não ataca apenas o Sistema Financeiro Nacional Norte-americano, e sim os bens, valores, segurança e confiança de pessoas e instituições em quarenta países diferentes[104], atacando vários sistemas financeiros nacionais interligados (ou o sistema financeiro internacional), portanto seria muito proveitoso que o infrator em questão respondesse pelo crime no TPI, se, por ventura não fosse condenado nos EUA, impunidade esta que mais facilmente aconteceria no Brasil devido à brandura da pena, das demais características do direito penal brasileiro.

Com os mesmos efeitos internacionais, sendo que todas as informações prestadas pelo operador eram ilusórias, com o intuito de enganar o Estado, instituições[105] e pessoas, o agente, se praticasse a conduta no Brasil, também estaria cometendo (se não configurasse crime mais grave) o crime de indução a erro (Art. 6º da Lei em tela), já que induziu (ou poderia apenas manter) em erro repartição pública e investidores, construindo uma realidade falsa[106] de que estava investindo os recursos no mercado financeiro, quando, na verdade, pagava as novas aplicações com as antigas (Pirâmide de Ponzi), atacando a crença no mercado financeiro. Devido ao caráter especial da Lei 7.2492/86, havendo conflito aparente de normas, no Brasil, para a conduta em questão, são afastados os Artigos 117, §1º, 297, §2º, 298 e 299, todos do Código Penal Brasileiro, e o Artigo 3º, X da Lei nº 1.521 de 1951, e Artigos 10 e 21 da própria Lei dos crimes contra o sistema financeiro nacional[107].

Continuando os casos exemplificativos dos crimes que podem afetar o sistema financeiro internacional, ainda usando o caso Madoff, existe ainda o crime brasileiro de fraude à fiscalização (contra o Estado – Banco Central do Brasil, Comissão de Valores Mobiliários e as Bolsas de Valores -, e investidores), tipificado no Art. 9º da mesma lei[108], dentre outras condutas não tipificadas pelo ordenamento jurídico brasileiro, como o perjúrio[109]. Importante notar, no caso, o relevante crime de lavagem de dinheiro (Lei nº 9.613 de 1998), pois o administrador do fundo de investimento, além de cometer o crime de fraude (dentre outros), ocultou a origem, localização, disposição, movimentação e propriedade de bens, direitos e valores provenientes, direta ou indiretamente, dos crimes contra o sistema financeiro nacional (crime previsto no Art. 1º, VI, da Lei nº 9.613 de 1998).

Relevante ainda constatar que o crime de lavagem de dinheiro, pode, além de ocultar o produto das infrações contra o sistema financeiro nacional e internacional, encobrir atividades de criminosos que cometem crimes de genocídio, tortura (crime contra a humanidade) ou outras condutas previstas pelo TPI (2.1). Como exemplo da hipótese, em investigação do Senado Norte-Americano, no ano de 2005, foi averiguado o montante de aproximadamente treze milhões de dólares operacionalizados pelo prestigiado Riggs Bank, oriundos de atividades praticadas pelo ditador Augusto Pinochet (incluído genocídio, torturas e desaparecimentos), reprovadas pelo TPI e outras várias convenções internacionais[110]. Fato este enraíza ainda mais de legitimidade uma possível pretensão de incluir o crime de lavagem de dinheiro, também conhecido como branqueamento de capitais, no rol do TPI. E não é só, legitima não apenas a previsão do crime de lavagem de dinheiro no Tribunal Penal Internacional, mas, sobretudo, dos crimes financeiros que acobertem, ou mesmo produzam os mesmos efeitos fabricados pelas condutas já tipificadas pela Corte, o quê, como já mencionado, é o caso de todos os crimes financeiros que afetam a ordem internacional (3.2).

Um caso particular, também de gigantesca notoriedade, revela outras questões a serem observadas, incluindo fragilidades na tipificação interna dos Estados. Em 2008 a Société Générale divulgou prejuízos de 4,9 bilhões de euros provocados pelo operador francês Jérôme Kerviel (1.3). Diante da apresentação pela Société Gérérale da queixa-crime acusando-o de “faux en écritures bancaires” (registros bancários falsos) e “intrusion informatique” (em tradução livre, acesso ilegal a computadores ou “hacking), e outra queixa-crime por um grupo de acionistas de Paris, atribuindo a ele as condutas de “escroquerie, abus de confiance et faux” (fraude, abuso de confiança e, em tradução livre, falso)[111], o operador alegou que tentou negociar para 2007 um bônus de 600 mil euros e seu chefe do banco “deu a entender” que ele não poderia esperar mais de 300 mil euros; por isso, “em sua avaliação de final de ano (momento em que os operadores recebem os bônus), o “trader, que havia especulado na Eurex, a Bolsa alemã que atua no mercado de derivativos, declarou somente 55 milhões de euros de lucro (sobre o 1,4 bilhão de euros que teoricamente fez ganhar a Société Générale, depois de fazê-la perder 1,5 bilhão seis meses atrás, e antes que a ‘descoberta’ pelo banco dessas transações ilícitas e sua liquidação resultassem em uma perda líquida de 4,9 bilhões de euros)”[112].

O jornal Le Figaro, pelo ineditismo do fato na justiça francesa, afirma que advogados, avaliando a situação fática, alegaram não haver acompanhamento jurisprudencial anterior sobre o caso Kerviel[113]. O trader foi condenado a cinco anos de prisão, dos quais três em regime fechado, além do pagamento de 4,9 bilhões de euros. Em sua primeira teoria defensiva, Kerviel aduziu que foi usado pelo banco para assumir todo o encargo da autoria pelas perdas internas na crise de 2008 (dos subprimes), numa espécie de “complô”. Em recurso, com novo advogado, a tese de defesa foi menos agressiva, afirmando que os seus superiores sabiam de sua conduta temerária, que, inclusive, é comum a vários outros operadores da instituição financeira francesa[114]. Em análise à legislação brasileira, v.g., o operador responderia apenas pelos crimes dos Art. 4º e 6º da Lei nº 7.492/86, sendo atípico no Brasil o resto das condutas previstas na França. Haveria, contudo, no caso, a possibilidade de “rebaixar” a ação do trader ao grau de simples participação, e configurar a conduta dos dirigentes da Société Générale como uma autoria de escritório, chamada por Zaffaroni e Pierangeli de uma autoria mediata que pressupõe uma verdadeira máquina de poder[115], teoria que deveria ser aceita se o comportamento de Kerviel for realmente comum a todos os operadores e /ou estimulado pela instituição financeira.

Porém, as condutas com capacidade de gerar danos podem, além de não estarem ainda tipificadas e criminalizadas, serem absolutamente permitidas pelas normas nacionais e internacionais. É o que acontece com os sistemas de negociações paralelas às bolsas regulares, como a diretiva Mercado de Instrumentos Financeiros (multilateral trade facilities – MIF), adotada em 2004 e investida de força de lei a partir de 1º de novembro de 2007 (momentos antes da crise dos subprimes).  Os MIFs são responsáveis pela criação das dark pools e crossing networks no mercado financeiro internacional, permitindo que os operadores transacionem sem revelarem a quantidade e preço do montante operacionalizado, e dando maior liberdade aos bancos para que estes possam relacionar diretamente as ordens, de compra e venda, de seus clientes. A medida diminuiu a regulamentação do mercado financeiro internacional e a frequência das transações nas bolsas regulares para menos da metade das transações do mundo[116]. Além das dark pools e crossing networks, existem muitas outras “estratégias” no mercado aberto que ainda não foram criminalizadas, mas, porém, causam claramente a maximização do risco sistêmico, como o ato doloso de fazer o mercado pensar que algumas ações têm um valor consideravelmente alto, quando, na verdade, elas são irrisórias. O procedimento e seus efeitos são descritos pelo sociólogo Paul Lagneau-Ymonet e pelo economista Angelo Riva:

“Uma das manipulações mais simples lembra a pesca de anzol com isca viva. Ao passar uma grande quantidade de ordens de compra, você ‘ativa’ o índice de mercado de um título do qual quer se desfazer. Isso atrai os compradores, e então, em frações de microssegundos, você anula as ordens de compra e vende seus títulos aos ‘trouxas’, a um preço artificialmente inflado. Além das possibilidades multiplicadas de manipulação dos preços, as transações de alta frequência aumentam o risco de crise sistêmica. Em 6 de maio de 2010, nos Estados Unidos, o índice Dow Jones caiu mais de 9% num único dia, e as ações da Procter & Gamble e da consultoria Accenture, em especial, desabaram em poucos minutos. Depois de cinco meses de investigação, os dois reguladores norte-americanos da bolsa conseguiram refazer o encadeamento dos acontecimentos. O algoritmo de um operador do Kansas gerou automaticamente 75 mil contratos futuros sobre as variações de um índice da Bolsa. Em seguida, sua execução automática, sem limites de preços, semeou o pânico entre os outros supercomputadores dos bancos e fundos de investimento: em quatorze segundos, os contratos mudaram de mãos 27 mil vezes, precipitando a queda brutal dos índices”[117].

Nessa realidade, diante do dinamismo dos crimes financeiros cometidos em regra por pessoas extremamente qualificadas, a tipificação poderia ser facilmente ultrapassada por condutas lícitas novas e mais engenhosas. O problema revela-se letal à efetividade do Tribunal sediado em Haia para julgar os novos crimes financeiros, pois todas as constantes alterações teriam que ser ratificadas e promulgadas pelos Estados-partes, como assevera o Art. 2º do Decreto nº 4.388/02[118], o que depende da vontade dos mesmos, daí a necessidade de tipificação ampla para os casos concretos. Assim, é evidente a existência de condutas que causam sérios danos à ordem econômica que ainda não foram tipificadas, e, devido a seu dinamismo, teriam um acolhimento difícil no TPI, pois, antes, devem ser reconhecidas pelos poderes legislativos nacionais para só depois serem ratificadas pela Corte Internacional.

Mas, por outro lado, mesmo sendo comum nos crimes contra o SFI o ataque à ordem internacional, existem alguns crimes previstos na Lei nº 7.492/86 que, claramente, não fomentam prejuízos relevantes ao sistema financeiro internacional, apenas restringindo seus efeitos aos limites do País. É o caso do crime de evasão de divisas, previsto no Art. 22 da citada lei, que atribui a pena de reclusão de dois a seis anos, e multa, contra os indivíduos que efetuem operação de câmbio não autorizada (pelo Banco Central do Brasil), com o fim de promover evasão de divisas do país. A não adequação ao possível rol de crimes contra o sistema financeiro internacional, punidos pelo TPI, acontece porque o objeto jurídico da evasão de divisas ataca diretamente a estabilidade da moeda nacional e o bom funcionamento das reservas cambiais internas[119], o quê, obviamente, não atingiria as reservas cambiais estrangeiras, muito pelo contrário. A mencionada perda de interesse é comum aos crimes contra a ordem tributária. Para esclarecer a questão, salutar a lição de Aurora Tomazini de Carvalho:

“Considerando sob o prisma constitucional, o bem jurídico tutelado pelas normas penais tributárias seria o ‘bem-estar social’ (…). Mas esse é um direito subjetivo muito amplo, que caracteriza a própria finalidade buscada com a constituição do mundo jurídico. Assim vamos pensar constitucionalmente, mas especificadamente no direito protegido pelas normas penais tributárias. O sistema tributário é constituído para que toda a sociedade contribua, arrecadando receitas, cuja finalidade é o financiamento de atividades sociais do Estado. O descumprimento de certas condutas prescritas pela ordem tributária contribui para a diminuição da arrecadação de receitas e, consequentemente, prejudica a finalidade para as quais foram instituídos os tributos, qual seja, o financiamento das atividades do Estado”[120].

Como visto, é extremamente forte nos crimes contra a ordem tributária, a intenção de proteger a economia interna do Estado (brasileiro), já que o que é tutelado é uma ordem sempre interna, sustentada por tributos, que, não pagos, não ofendem a ordem tributária de outros países, nem mesmo a ordem econômica interna ou externa. Fatos que diferem do que se constata na maioria dos crimes contra o sistema financeiro nacional, onde o mencionado sistema, quando atacado, causa efeitos na ordem econômica, que é, por sua vez, internacionalizada (ordem internacional) (3.2). Cristalino, desse modo, o possível rol de condutas que poderia ser incluído no artigo de crimes do Tribunal Penal Internacional, qual seja, um novo conjunto de comportamentos que causem verdadeiramente danos a suposta ordem econômica global, sendo crimes contra o sistema financeiro ou não, ou tipificados pelos Estados-membros ou não.

3.2. A conduta contra o SFI como crime contra a humanidade

Considerando os danos causados à população mundial, aqueles “que causem intencionalmente grande sofrimento, ou afetem gravemente a integridade física ou a saúde física ou mental”[121], existe uma imensa similaridade entre os efeitos produzidos pelos crimes financeiros (e demais condutas não criminalizadas) e os crimes contra a humanidade (no sentido amplo da tipificação no TPI), aproximando os objetos de ambos os conjuntos de condutas.

Como afirmado em algumas passagens anteriores (1.1.1.), a economia mundial é um conjunto de instituições, Estados, pessoas físicas e jurídicas, consumidores e produtores, fortemente interligados entre si, a ponto de sofrerem todos por um único ato contra esta aglomeração. Portanto, configura-se a economia mundial um sistema, o sistema financeiro internacional, conjunto este que pode sofrer crises generalizadas. As analogias entre corpo e sistema, crise e doença, são aplicadas pelo filósofo Bento Itamar Borges:

“A especificidade da crise econômica não apaga do termo crise as acepções mais primitivas, inclusive aquelas da dramaturgia grega, de onde o termo herda etimologia. Mais próximas do senso-comum são as aplicações do termo crise a estágios patológicos, seja, por exemplo, como sinônimo de colapso de funções orgânicas ou comportamentos, seja como equivalente ao ‘ponto crítico’ de, por exemplo, um processo infeccioso, quando o ciclo virótico atinge um turning point e, em seguida, a doença se resolve, com o restabelecimento da saúde ou com a morte. A metáfora é inevitável e revela simetrias entre sistemas, como, no caso, o organismo animal e o sistema capitalista”[122].

A característica de unidade corporal atribui ao sistema financeiro uma ideia de que o mesmo pode sofrer danos à sua integridade, podendo os ataques causar prejuízos ao seu funcionamento normal levando-o à crise ou ao seu colapso (gerados pelo risco sistêmico).  Os ataques (incluído os crimes) para danificarem o sistema, bastam destruir um elemento que o sustenta: a confiança, a crença no mercado, nas instituições financeiras, no Estado, nos pagamentos, nos gastos, e na saúde financeira geral e individual, e, consequentemente, na integridade de todos (ou do todo, de todo o sistema). Para exemplificar o objeto jurídico tutelado pelos crimes contra o sistema financeiro, é imperioso o resgate do bem protegido pela Lei nº 7.492 de 1986 (Lei dos crimes contra o sistema financeiro nacional), qual seja o próprio sistema financeiro (e a ordem econômica), descrito de forma magistral por Ali Mazloum:

“Tendo em vista a análise empreendida, pode-se afirmar que os vários aspectos do Sistema Financeiro Nacional, organização do mercado, regularidade de seus instrumentos, confiança e segurança nos negócios, entrelaçam-se e formam um todo harmônico, de modo que, atingindo-se um ou mais dos precitados aspectos, afeta-se o Sistema Financeiro Nacional, bem jurídico tutelado pela Lei. A confiança, no entanto, é o aspecto mais frágil e de maior relevo, porquanto sua existência depende da normalidade dos demais. Assim, não se poderá falar em confiança em um mercado que não esteja devidamente organizado. A confiança depende da regularidade dos instrumentos de mercado”[123].

Sem os elementos do sistema financeiro, que devem estar presentes concomitantemente, se têm as grandes crises econômicas, e como qualquer outro fato que produz colossal desordem, constroem um cenário de insatisfação geral, podendo levar os homens a considerarem a hipótese da guerra para disputar os recursos naturais ou o controle, que quase sempre se perde na desordem causada pela crise. Portanto, os crimes contra o sistema financeiro nacional (e internacional) afetam a ordem econômica, sendo que desestabilizada esta pela conduta criminosa, se prejudica a ordem social, a paz, e por fim, diretamente, a integridade física dos homens, pois, por vezes, em desordem social, o homem enfrenta sempre a própria espécie. Assim, os bens atacados, não só pelas infrações contra o sistema financeiro, mas também por todos os crimes econômicos, abrangem todo o conjunto de coisas, pessoas, valores e princípios que participam da economia, e, é claro, a toda sociedade. Neste sentido de abrangência, afirma Andrei Zenkner Schmidt:

“O art. 168 do Código Penal é um crime contra o patrimônio, fazendo parte do direito penal primário e de sua sistemática própria; o art. 5º da Lei n. 7.492/86, pelo contrário, por ser um crime contra o Sistema Financeiro Nacional, se submete a um exame de ofensividade que lhe é peculiar. O exame desta peculiaridade é que nos interessa, dentro de um rigor metodológico arbitrariamente posto, porém racionalmente controlável. O objeto do DPE[124], nesse sentido é a ordem econômica enquanto planificação estatal de ordenação econômica da vida social. Escapam de seu alcance – pelo menos enquanto proteção jurídica direta – todos direitos públicos subjetivos, ‘econômicos’ ou sociais, porque já tutelados através de outras áreas especificas da parte especial do direito penal”[125].

Diante dos vários conceitos, é vista com clareza a grande vastidão do sistema financeiro, abrangendo toda a sociedade e seu funcionamento, dependente da existência da ordem econômica. Pois bem. É, justamente, para a proteção da ordem que todas as convenções e tratados internacionais acolhem a proteção aos direitos humanos, pois, como visto, o homem precisa de equilíbrio para estabelecer-se em sociedade ordenada. Segundo Sidney Guerra “o mais fundamental dos direitos da humanidade” é a ordem internacional, elencada na Declaração Universal dos Direitos Humanos, em seu Art. 28, onde o mesmo determina “que todo homem tem direito a uma ordem social e internacional, em que os direitos e liberdades estabelecidos na presente Declaração possam ser plenamente realizados”[126]. Afirma ainda Guerra que a partir daí os direitos humanos deixam de ser objeto de interesse nacional, passando a ser um direito internacional[127].

Portanto, em resumida constatação lógica, quando se protege toda a ordem econômica mundial, se está tutelando ao mesmo tempo a ordem pública (ou social) mundial, já que, como demonstrado, uma depende da outra. Por conseguinte, considerando que a ordem econômica mundial se sustenta em um bom funcionamento do sistema financeiro globalizado, se está tutelando, com o combate aos crimes financeiros internacionais (e ao risco sistêmico), a própria existência da ordem econômica/pública internacional e do próprio direito internacional (e sua unidade).  Desse modo, com a desestabilização do direito internacional, ataca-se, por fim, a ordem global e os direitos humanos, pois, como afirmado por Sidney Guerra, a ordem internacional é um direito humano per si. No mesmo sentido, mesmo existindo uma prevalência da prevenção das guerras quando o direito internacional aduz sobre os crimes contra a humanidade (em interpretação restritiva), as leis internacionais que tentam proteger os homens dos futuros conflitos devem caminhar também para a proteção da ordem econômica global, pois a destruição desta pode levar a sociedade à guerra. Deste modo, a legitimidade do Tribunal Penal Internacional de cuidar dos crimes financeiros internacionais pode ser indiscutivelmente aceita. Restando, depois de verificada a possível legitimidade, as probabilidades de futuras tipificações de crimes internacionais contra a ordem econômica internacional.

3.3. Atos de cooperação do direito penal internacional x Atos de coação do direito internacional penal: as vantagens do TPI em face dos acordos internacionais

Constatando que as condutas que causam danos ao sistema financeiro nacional poderiam ser tuteladas pelo TPI, pergunta-se: diante de uma interligação entre países por meio de um grande número de acordos internacionais, por que a tipificação dos crimes contra o sistema financeiro internacional no Tribunal Penal Internacional se faz realmente necessária? Andrei Zenkner Schmidt, aduzindo sobre a mitigação do princípio da legalidade nos assuntos relativos à ordem econômica, sem pretensão acaba por explicar a razão máxima da transferência de titularidade diante de uma possível ineficiência nas punições dos crimes em questão, submetendo-se assim os Estados aos hipotéticos ditames do Tribunal Penal Internacional:

“O peculiar da ordem econômica é que, num Estado que tenha a função constitucional de conjugar liberdade de mercado com prestatividade social, incumbe ao Poder Legislativo a programação genérica e, ao Executivo, a tomada de posição específica acerca dos rumos das políticas econômica e social. A velocidade e a volatilidade de uma economia inserida no mercado globalizado, assim como as constantes mudanças por prestatividade social, exigem respostas rápidas capazes de prevenir/superar crises econômicas e de adequar as contingencias da situação às possiblidades de atuação positiva do Estado. Consequentemente, o processo legislativo revelar-se-ia demasiadamente moroso para tanto, além de, com frequência, sobrepor interesses políticos nacionais e efêmeros às diretrizes globais do desenvolvimento econômico”[128].

Diante de tantas negociações, as protelações e o descompromisso (para com a ordem econômica global) causados pelas autoridades dos Estados, evidentemente, desaguariam isoladamente em um eventual risco sistêmico. Mas não são apenas os legisladores as autoridades que se amoldam aos interesses políticos, sendo também os administradores públicos, mesmo com seus atos mais rápidos (às vezes discricionários), culturalmente dependentes de vários fatores nacionais em desconformidade com a sustentação da economia globalizada.

Outra plausível razão para o uso do TPI com a finalidade de proteger o sistema financeiro internacional é a ineficiência das simples cooperações internacionais para esse fim. O direito penal internacional visa “promover a cooperação internacional contra a criminalidade”, com tratados bilaterais e multilaterais, construindo um corpo de Estados combatendo os crimes (nacionais) que os atingem de alguma forma[129]. Portanto, o direito penal internacional trata sempre de cooperação entre Estados, muito diferente do direito internacional penal, que se ocupa dos “crimes internacionais”, “ofensas a valores basilares da convivência internacional”[130], sendo estes os tutelados pelo TPI. Observa-se que os crimes sob a guarda da Corte internacional em questão, não são objeto de cooperação e sim puro combate a crimes reconhecidos pela comunidade internacional como crimes internacionais. Em constatação lógica, o instituto da entrega não é uma simples cooperação, e sim um combate, sendo este já positivado, com esperada segurança jurídica.

Assim sendo, instituto do direito penal internacional, a cooperação internacional em matéria penal surge com tratados firmados entre Estados, à exemplo da Convenção das Nações Unidas contra o Crime Organizado Transnacional Relativo à Prevenção e Punição do Tráfico de Pessoas, em especial Mulheres e Crianças; a Convenção das Nações Unidas contra a Corrupção (Convenção de Mérida); o Protocolo de Medidas Cautelares do Mercosul; o Protocolo de Assistência Jurídica Mútua em Assuntos Penais do Mercosul; a Convenção das Nações Unidas contra o Crime Organizado Transnacional (Convenção de Palermo); Convenção contra o Tráfico Ilícito de Entorpecentes e Substâncias Psicotrópicas; Protocolo contra a Fabricação e Tráfico Ilícito de Armas de Fogo, suas Peças, Componentes e Munições; e a Convenção sobre o Combate da Corrupção de Funcionários Públicos Estrangeiros em Transações Comerciais Internacionais; todos em vigor no Brasil[131].

A ineficácia dos atos de cooperação surge diante dos preceitos legais particulares a cada Estado, e do exercício da soberania de cada um deles. Preocupando-se com a adequação do devido processo legal aos inesgotáveis casos internacionais de cooperação, Carolina Yumi de Souza foca o tema do devido processo legal na cooperação, na lei aplicável a cada país e o fenômeno da dupla-incriminação[132]. Quanto à lei aplicável, a jurista expõe os difíceis meandros da lex diligentiae[133],  onde para a elaboração do pedido do Estado requerido, deve ser seguida minunciosamente a lei deste, considerando-se, desde logo, todos os requisitos do Estado requerido. Os mencionados requisitos, os quais dependem as cartas rogatórias, são submetidos às decisões judiciais internas (exequatur concedido pelo STJ, v.g.), que os analisam e verificam a conformidade legal entre os dois ordenamentos, do país requerente e requerido[134]. O mesmo ocorre com a problematização do item da dupla-incriminação, quando, sem qualquer acordo anterior (diferente dos casos do TPI), o fato[135] (e não a tipificação) imputado ao extraditando é considerado como crime nas legislações dos países requerente e requerido[136]. O caso da dupla-incriminação, do mesmo modo do problema da lei aplicável, esbarra na minimização da probabilidade de haver possibilidades concretas de ocorrências de conformidade entre legislações estrangeiras, até porque os interesses são diversos nos territórios e mudam em conformidade com o rápido dinamismo da economia. Em resumo, a cooperação não é por si ineficaz, mas, diante da grande rapidez que os assuntos da economia globalizada exigem e das características dos crimes financeiros (3.1), a fugacidade do instituto da entrega torna-se muito mais adequada ao caso.

Como é conhecido, o mencionado problema da consonância legislativa se ausenta no Tribunal Penal Internacional, onde a soberania é exercida no momento da ratificação do Estatuto de Roma. Assim, verificada um das vantagens do TPI e do direito internacional penal (2.2.1.), ainda diante da diversidade de condutas que causam danos ao sistema financeiro internacional, incluindo as não tipificadas pelos Estados, o primeiro obstáculo que a Corte enfrentaria na adoção da tutela dos crimes contra o sistema financeiro internacional seria a escolha das infrações que seriam puníveis pela mesma. Valorados os comportamentos que atacam o sistema financeiro internacional e, posteriormente, criminalizadas estas condutas, os Estados-membros deveriam convencionar os novos crimes e ratifica-los, o que tipificaria automaticamente as novas infrações nos ordenamentos jurídicos internos, pois como exposto anteriormente, é coerente que ratificado o disposto por norma internacional o firmado não pode ser revogado, por força da proteção da própria unidade do Direito (2.2.2.).

Assim, depois de convencionado o que é a ordem econômica global, o sistema financeiro internacional, verificada a extrema importância dos direitos humanos sustentados pela pacificidade entre os povos, e, por fim, quais crimes podem efetivamente colocar em risco estes, o Estados-partes devem ratificar os novos conceitos e condutas criminalizadas. Reside aí, nesse momento, o exercício da soberania dos Estados, quando esses se posicionam sobre os novos efeitos das mudanças e, sobretudo, a aplicação das penas impostas pelo Tribunal Penal Internacional aos cidadãos dos países que ratificarão novamente o estatuto.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Constata-se que a ordem econômica internacional, construída com a clara intenção de manter a paz entre os povos após as grandes guerras mundiais e, baseada nas ideias liberais dos vencedores dos aludidos conflitos (os quais fundaram a ONU, FMI, Banco Mundial, GATT/OMC, OCDE), é um conjunto de regras jurídicas com o evidente intuito de manter o fluxo de produtos e serviços entre as nações (defendendo a liberdade das trocas comerciais, a igualdade de tratamento e a reciprocidade das vantagens).  Considerando ainda que o direito internacional econômico é composto não só pela ordem jurídica internacional e as evidentes ordens jurídicas nacionais, mas por uma terceira ordem sem regulação estatal que comporta um mercado monetário e financeiro de organizações supranacionais privadas, incluindo bancos internacionais.

Ao conjunto corpóreo da ordem econômica internacional, configurando aquele todas as relações de troca ou negócios entre moedas, atividades, fluxos monetários e financeiros, empréstimos, pagamentos, aplicações financeiras internacionais, entre empresas, bancos, bancos centrais, governos ou organismos internacionais, dar-se o nome de sistema financeiro internacional (SFI), o qual, segundo o Regulamento nº 1092/2010 da UE, se desestabilizado ou destruído pode causar danos irreparáveis à estabilidade financeira mundial, sendo esta “uma condição prévia para que a economia real proporcione a criação de postos de trabalho, a concessão de crédito e o crescimento”. Devido à constatação tardia da extrema gravidade das crises financeiras causadas pelo descontrole do risco sistêmico, o qual é a probabilidade de desencadeamento de uma crise em todo sistema (mercado) financeiro internacional, foram firmados inicialmente os acordos Basiléia I (1988) e Basiléia II (2004), que, por sua ineficácia, permitiram a crise de subprimes de 2008 e as sucessivas falências de instituições financeiras, compras, nacionalizações e vultosas ajudas de diversos planos estatais de salvamento. Acontecimentos que levaram as nações a firmarem o acordo Basiléia III (2010) com aplicação a partir de 2018, mas sem previsão de criminalização dos operadores ou quaisquer sujeitos envolvidos nas futuras crises sistêmicas.

Constatando as mazelas internacionais e a ausência de previsões sobre eficientes punições dos indivíduos que operam no mercado financeiro internacional, é vislumbrada a criminalização das condutas que causam danos ao sistema financeiro internacional pelo Tribunal Penal Internacional, o qual, hoje, não possui previsões expressamente tipificadas a respeito das aludidas infrações. A corte carrega a reconhecida legitimidade internacional para receber (via entrega) cidadãos sujeitos à sua jurisdição, oriundos dos países que ratificaram o Estatuto de Roma, julga-los e puni-los, segundo os procedimentos previstos em seu dispositivo legal, sendo, inclusive, irrelevante qualquer função oficial dos investigados para as suas condenações. Porém a falta de tipificação criminosa das condutas que lesionam o SFI poderia afrontar em tese o princípio da tipicidade penal. Além disso, podem existir desacordos entre o Estatuto de Roma e as legislações nacionais. Sobre este último aparente percalço, tem-se o exemplo da pena de prisão perpétua no estrangeiro, sem previsão legal no ordenamento brasileiro, contudo. Todavia, segundo a doutrina, o encarceramento sem prazo estaria de acordo com o espírito da Carta Magna já que esta prevê medidas graves quando estão ameaçados direitos relevantes, como o exemplo da previsão de pena de morte nos casos de guerra, situação fática esta que são violados os direitos humanitários.

Mas, construindo um possível e maior entrave à criminalização das condutas em questão, a ausência de taxatividade dos crimes contra o sistema financeiro internacional, segundo a legislação brasileira, poderia ferir a restrição na tipificação criminosa e previsão legal anterior, levando os crimes e as condutas lesivas à abstração e consequente absolvição sumária dos indivíduos. Contudo, os ditames legais brasileiros, como de outros países, são confrontados pelos atos de vinculação dos Estados ao Estatuto de Roma, sendo a ratificação do dispositivo legal, no caso do Brasil, concretizada pelo Decreto nº 4.388/12, onde o país se obriga a executar e cumprir inteiramente o Estatuto do TPI, e pelo Art. 5º, § 4º da Constituição Federal. Ademais, a intenção exposta no preâmbulo do Estatuto de preservar a paz, a harmonia entre os povos e a integridade física das pessoas, bem como o repúdio aos positivados crimes contra a humanidade, os quais tem tipificação extremamente ampla no TPI, revelam um inegável propósito das nações de afastar as graves crises financeiras que assolam a comunidade internacional em sua interligação concretizada no mercado financeiro supranacional. Dessa forma, a criminalização das condutas que desestabilizam o SFI, causando o risco sistêmico, está perfeitamente condizente com o princípio da fragmentariedade, o qual assevera que o direito penal não deve fugir da tutela dos valores mais importantes, amplos e sensíveis para a sociedade.

Diante de todo o exposto, considerando que o sistema financeiro hoje, já não é mais nacional, e sim internacionalizado, com transações econômicas diversas entre países, feitas por Estados, instituições financeiras ou mesmo por particulares, é indispensável que o perigo do risco sistêmico não seja ignorado, pois as crises financeiras causam danos generalizados em vários territórios nacionais, concomitantemente, em um determinado espaço de tempo. Deste modo tem-se necessária a coação dos indivíduos que agem de maneira irresponsável diante dos potenciais danos que as condutas contra o inegável sistema financeiro internacional podem causar ao referido conjunto sistemático, à humanidade, e, por fim, ainda, em concatenação lógica, à ordem internacional. Diante do internacionalismo na natureza das infrações contra o sistema financeiro globalizado, é vislumbrada a possibilidade da tutela das mesmas pelo Tribunal Penal Internacional. Por sua vez, para a referida tutela dos crimes contra o sistema financeiro internacional pelo TPI, caso não se entendesse a amplitude da tipificação criminal na referida Corte, considerando o entendimento implícito internacional acerca da importância dos direitos humanos, seria necessária uma nova ratificação do Estatuto de Roma pelos Estados Partes e outras nações que queiram, por ventura, assinar e ratificar o dispositivo legal.

 

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Notas:
[1] Trabalho orientado pela Profa. Dra. Alessandra Rapassi Mascarenhas Prado. Mestre e Doutora em direito pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo – PUC/SP. Professora de Direito Penal, e coorientado pela Profa. Dra. Juliette Robichez. Mestre e doutora em direito pela Université Paris I – Panthéon Sorbonne (França). Professora de Direito Internacional
[2] Quando um acontecimento é capaz de influenciar outro, e este, outro após outro, e assim por diante. O efeito foi constatado na Teoria do caos, o qual constrói a ideia de que “a maioria dos fenômenos que observamos na natureza e no comportamento humano tem, de um lado, características de ordem e estabilidade, e, de outro, de desordem e irregularidade – mudanças abruptas no clima, reações bioquímicas complexas, movimentos irregulares no preço das ações e nas taxas de câmbio”.  E que “o caos não significa desordem absoluta ou perda completa de forma. Ele significa que sistemas guiados por certos tipos de leis perfeitamente ordenadas são capazes de se comportar de uma maneira aleatória e, de forma, completamente imprevisível no longo prazo, e um nível específico. Por outro lado este comportamento aleatório também apresenta um padrão ou desordem ‘escondida’ em um nível mais geral”. PAIVA, Wagner Peixoto de. Teoria do caos e as organizações. Caderno de pesquisas em administração, São Paulo, v. 08, nº 2, abril/junho, 2001. Disponível em: http://www.ead.fea.usp.br/cad-pesq/arquivos/v08-2art07.pdf. Acesso em: 06 de novembro de 2013.
[3] Art. 5º do Estatuto de Roma.
[4] Art. 7º, part. 1, k, do Estatuto de Roma.
[5] “Juntamos aqui considerações sobre a defesa do consumidor, a defesa do meio ambiente, a redução das desigualdades regionais e sociais e a busca do pleno emprego. Chamamo-los de princípios de integração, porque todos estão dirigidos a resolver os problemas da marginalização regional e social”. DA SILVA, José Afonso. Curso de direito constitucional positivo. 19º ed. São Paulo: Malheiros Editores, 2001, p. 774.
[6] LOPES, Dawisson Belem; RAMOS, Leonardo César Souza. Existe uma ordem econômica internacional? A problematização de uma premissa. Revista de economia política. São Paulo, vol. 29, Abr/Jun, 2009. Disponível em: http://www.scielo.br/scielo.php?pid=S0101-31572009000200006&script=sci_arttext. Acesso em: 05 de julho de 2013.
[7] Quando o FMI torna-se, quase exclusivamente, credor de países em desenvolvimento. Passando a adotar as “condicionalidades estruturais” para tratar melhor os empréstimos a países em desenvolvimento com problemas monetários crônicos (e inflações), e não de curto prazo, como as nações desenvolvidas.
[8] DE CARVALHO. Fernando J. Cardim. Bretton Woods aos 60 anos. Disponível em: http://www.ie.ufrj.br/moeda/pdfs/bretton_woods_aos_60_anos.pdf. Acesso em: 20 de dezembro de 2012.
[9] KINOSHITA, Fernando; FERNANDES, Joel Aló. O direito ao desenvolvimento como um direito humano e prerrogativa dos estados nas relações internacionais do século XXI. Âmbito Jurídico. Disponível em: https://www.ambito-juridico.com.br/site/?n_link=revista_artigos_leitura&artigo_id=5912. Acesso em: 22 de dezembro de 2012.
[10] CRETELLA NETO, José. Curso de direito internacional econômico. São Paulo: Saraiva, 2012, p. 142.
[11] Analisando de forma restritiva, considerando a forma como foi ordenada a Constituição Federal (interpretação autêntica), o Titulo VII da Carta Magna o qual estabelece a Ordem Econômica e Financeira determina que esta é composta por Política Urbana, Agrícola e Fundiária, Reforma Agrária, e  Sistema Financeiro Nacional. Esta parte da Carta Magna que trata da economia brasileira, chamada de Constituição Econômica Formal, foi inicialmente confeccionada motivadamente por um movimento mundial de positivação dos fatos econômicos, sobretudo influenciada pela Constituição Mexicana de 1917 e a Constituição de Weimar da Alemanha, e é fundamentada por princípios constitucionais elencados no Art. 170 da Constituição Federal, são eles a soberania nacional, a propriedade privada, a função social da propriedade, a livre concorrência, a defesa do consumidor, a defesa do meio ambiente, a redução das desigualdades regionais e sociais, a busca do pleno emprego e o tratamento favorecido para empresas nacionais de pequeno porte. DA SILVA, pp. 764 – 769.
[12] A Suíça, considerando sua cultura social e economia fortemente ligada ao sistema financeiro globalizado por meio de instituições financeiras, estabelece uma ordem econômica ainda mais liberal, determinando uma proteção maior à liberdade das relações econômicas privadas, entendendo estas como prioridade da nação, como elenca o Art. 94 da Constituição Federal da Confederação Suíça.  LES AUTORITÉS FÉDÉRALES DE LA CONFÉDÉRATION SUISSE. Constitution fédérale de la Confédération suisse. Disponível em: http://www.admin.ch/ch/f//rs/101/a94.html. Acesso em: 08 de julho de 2013.
[13] CRETELLA NETO. Idem. pp. 143-145.
[14] Idem. pp. 144-145.
[15] Idem. p. 145.
[16] Idem. p. 146.
[17] Idem. pp. 152-153.
[18] Idem. p. 153.
[19] “Cada sociedade particular vem a sentir sua própria força; e isto produz um Estado de Guerra de nação a nação. Os particulares, em cada sociedade, começam também a sentir sua própria força; procuram atrair em seu proveito as principais vantagens dessa sociedade – e esse fato estabelece entre os mesmos um estado de guerra. Estas duas espécies de estado de guerra fazem com que se estabeleçam as leis entre os homens. Considerados como os habitantes de um planeta grande, que é necessário que nele existam diferentes povos, eles possuem leis atinentes às relações que esses mantêm uns para com os outros: – é o que se chama DIREITO DAS GENTES. (…) O direito das gentes é naturalmente fundado sobre o princípio de que as nações devem fazer uma às outras, reciprocamente, na paz, a maior soma de bem possível, e também na guerra, a menor soma de mal possível; e isto, sem prejudicar, entretanto, os seus verdadeiros interesses”. MONTESQUIEU, Charles de Secondat, Barão de. Do espírito das leis: vl. 1. Tradução de Gabriela de Andrade Dias Barbosa. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, p. 30, 2012.
[20] CORAZZA, Gentil. Moeda e sistemas financeiros. BEM, 2007. Disponível em: http://www.ufrgs.br/ppge/disciplinas/mbe-moeda/aula10.pdf. Acesso em: 28 de setembro de 2013.
[21] O sistema financeiro nacional está incluído no Título VII da Constituição Federal e regulado pela Lei n. 4.595 de dezembro de 1964. Necessário ressaltar que a definição do Sistema Financeiro Nacional no Art. 192 da Carta Magna, foi alterada pela Emenda Constitucional nº. 40, de 29 de maio de 2003, originada da Proposta de Emenda Constitucional n.º 53, de agosto de 1999, pelo então Senador José Serra, e assim é exposta hoje na Constituição Federal: “Art. 192. O sistema financeiro nacional, estruturado de forma a promover o desenvolvimento equilibrado do País e a servir aos interesses da coletividade, em todas as partes que o compõem, abrangendo as cooperativas de crédito, será regulado por leis complementares que disporão, inclusive, sobre a participação do capital estrangeiro nas instituições que o integram”. O artigo elencado deu maior dinamismo ao sistema financeiro nacional, e, ao mesmo tempo menor controle a este, sendo em todas as questões relativas ao sistema financeiro, regulado por lei complementar. Os incisos e parágrafos foram todos totalmente suprimidos, incluindo o paragrafo 3º o qual regulava a taxa de juros, impondo um limite de 12% ao ano para seu aumento. Diante da extrema abrangência e imprecisão do Art. 192 da CF, foi recepcionada pela Constituição a Lei n. 4.595 de dezembro de 1964 que no seu Art. 1º diz que o mencionado sistema financeiro será estruturado e regulado pelo Conselho Monetário Nacional, Banco Central do Brasil (BACEN), o Banco do Brasil (sociedade anônima), o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDS), e as demais instituições financeiras públicas e privadas. Definidos assim os agentes do sistema financeiro.
[22] FERREIRA, Vanessa Capistrano. Sistema financeiro internacional: fracasso e necessidade de reestruturação macroeconômica. Aurora Marilia, v.5, n.1, jan.-jun., 2012, p. 157-168. Disponível: http://www2.marilia.unesp.br/revistas/index.php/aurora/article/viewFile/2356/1917. Acesso em: 28 de setembro de 2013.
[23] Idem.
[24] Idem.
[25] Idem.
[26] DATZ, Marcelo Davi Xavier da Silva. Risco sistêmico e regulação bancária no Brasil. Rio de Janeiro, 2002. Disponível em: http://www.race.nuca.ie.ufrj.br/teses/fgv/Datz,M.pdf. Acesso em: 05 de julho de 2013.
[27]   FELDENS, Luciano. Gestão fraudulenta e temerária de instituição financeira: contornos identificados do tipo. Direito Penal Econômico: Crimes Financeiros e Correlatos. São Paulo: Saraiva, 2011, p.94-95.
[28] Idem, p. 96.
[29] Idem.
[30] Os princípios gerais para a continuidade de atividades são: Princípio 1: Responsabilidades da diretoria e da administração sênior: (…) A diretoria e a administração sênior são coletivamente responsáveis pela continuidade de atividades da organização; Princípio 2: Grandes rupturas operacionais: (…) Os participantes da indústria financeira e as autoridades financeiras devem incluir o risco de uma grande ruptura operacional; Princípio 3: Objetivos de recuperação: Os participantes da indústria financeira devem desenvolver objetivos de recuperação que espelhem o risco que eles representam para o funcionamento do sistema financeiro; Princípio 4: Comunicações: Os participantes da indústria financeira e as autoridades financeiras devem incluir (…) procedimentos para manter a comunicação dentro de suas organizações; Princípio 5: Comunicações com outros países; Princípio 6: Realização de testes; Princípio 7: Exame, pelas autoridades financeiras, do gerenciamento de continuidade de atividades. BANK FOR INTERNATIONAL SETTLEMENTS. Princípios gerais para continuidades de atividades. Tradução de Luciano Andrade Frois. A publicação original, High-level principles for business continuity (disponível em www.bis.org), 2006, pp. 11-16. Disponível em: http://www.bcb.gov.br/htms/spb/Principios_gerais_continuidade_atividades.pdf. Acesso em: 05 de julho de 2013.
[31] Idem.
[32] Dentre as determinações mais importantes está o Princípio 8 relativo ao Risco de Crédito que expõe que “os supervisores precisam se assegurar de que os bancos possuem processos de gerenciamento de risco de crédito que levam em consideração o perfil de risco da instituição, com políticas prudentes e procedimentos para identificar, medir, monitorar e controlar o risco de crédito (incluindo o risco de contraparte)”. A mesma prevenção deve ser assegurada aos demais princípios em relação a diferentes riscos, como: Princípio 9: Ativos problemáticos, provisões e reservas; Princípio 12: Riscos país e de transferência; Princípio 13: Riscos de Mercado; Princípio 14: Risco de Liquidez; Princípio 15: Risco operacional; Princípio 16: Risco de taxa de juros no banking book. BANCO CENTRAL DO BRASIL. Princípios fundamentais para uma supervisão bancária efetiva. Título original: CORE PRINCIPLES FOR EFFECTIVE BANKING SUPERVISION. Tradução de Thais Scattolini Lorena Lungov, baseada em tradução anterior dos 25 Princípios (1997) efetuada pelo servidor Jorge R. Carvalheira, ambos analistas do Banco Central do Brasil. 2006. Disponível em: http://www.bcb.gov.br/fis/supervisao/docs/CorePrinciplesTraducao2006.pdf. Acesso em: 06 de julho de 2013.
[33] Idem.
[34] PLIHOM, Dominique. Descontrole: pobres normas internacionais. Dossiê Le Monde Diplomatique Brasil: n. 08, ano, nov/dez, 2011,  pp. 30-31.
[35] Glossário. Dossiê Le Monde Diplomatique Brasil: n. 08, ano, nov/dez, 2011. pp. 89.
[36] Cronologia. Dossiê Le Monde Diplomatique Brasil: n. 08, ano, nov/dez, 2011. pp. 91.
[37] “Para avaliar o nível de risco, utiliza-se o método Value at Risk – VaR – Valor em Risco, que estabelece um valor de perda mínima aceitável dentro de um prazo predeterminado e com uma probabilidade de ocorrência definida (nível de confiança). Os dados para cálculo do VaR são obtidos através de uma média móvel ponderada ajustada exponencialmente de 150 dias, em que as últimas aplicações pesam proporcionalmente mais do que as mais antigas. A avaliação é diária. Se a instituição estoura as metas, terá de ser enquadrada de imediato, seja aumentando o seu capital seja estimulando seus clientes a tomarem posições na ponta contrária, de forma a diluir os riscos assumidos”. FORTUNA, Eduardo. Mercado financeiro: produtos e serviços. 18º ed. Rio de Janeiro: Qualitymark, 2011, p. 791.
[38] Dentre os acordos mais importantes se apresentam: 1. Risco de mercado: Interação entre risco de crédito e de mercado com a criação da medida de risco através do valor de risco (VaR), considerando o risco de mercado da carteira de negociação (trading book), incluído neste , o risco default, e de migração; 2. Os multiplicadores do VaR para fixação de capital regulatório serão determinados pelos reguladores, com valor mínimo de 3 VaR “normal”; risco geral de mercado VaR “estressado”; risco específico de mercado; 3. Exigência de diligência própria da instituição na compra de papéis securitizados, e, na sua ausência, dedução do valor do capital como punição; (…) 6. Risco de contraparte: exigências adicionais em estudo: Estudos sobre risco da contraparte não poder oferecer a proteção contratada exatamente no momento em que esta se faz necessária; (…) 8. Aquisição de derivativos: incentivo ao uso de câmaras de compensação que preencham os requisitos fixados pelo Comitê de Sistemas de Liquidação e Pagamento (BIS) e pela Organização Internacional de Comissões de Valores (Iosco); (…) 10. Amortecedor de conservação: definido como um adicional de capital regulatório sobre capital mínimo. Sua redução (aproximação do capital mínimo) traria como punição restrições à distribuição de bônus para executivos e pagamento de dividendos; (…) 12. Taxa de alavancagem de 3%: patrimônio líquido tangível sobre o total dos ativos totais (inclusive off-balance sheet): De acordo com o Comitê, com o objetivo de “por um piso sob o crescimento da alavancagem no setor bancário, ajudando assim a mitigar o risco de processos desestabilizadores de desalavancagem que podem danificar o sistema financeiro e a economia; 13. Medidas de acompanhamento de liquidez: Incluindo a taxa de cobertura de liquidez (ativos líquidos que permitam manter saídas de caixa por 30 dias), taxa de financiamento líquido estável (medida de descasamento de maturidades entre ativos e passivos). ANBIMA. Basiléia III: novos desafios para a adequação da regulamentação bancária. 2010. Disponível em: http://portal.anbima.com.br/informacoes-tecnicas/estudos/perspectivas/Documents/Perspectivas%20ANBIMA%20Basileia%20III.pdf. Acesso em: 06 de julho de 2013. 2010.
[39] JORNAL OFICIAL DA UNIÃO EUROPEIA. Regulamento nº 1094/2010 do Parlamento Europeu e Conselho. 24 nov. 2010, publicado em 15 de dezembro de 2010. Disponível em: http://eur-lex.europa.eu/LexUriServ/LexUriServ.do?uri=OJ:L:2010:331:0001:0011:PT:PDF. Acesso em: 06 de julho de 2013.
[40] Idem.
[41] “Salvo disposição em contrário dos Tratados, aplicam-se as disposições seguintes à realização dos objectivos enunciados no artigo 26. o . O Parlamento Europeu e o Conselho, deliberando de acordo com o processo legislativo ordinário, e após consulta do Comité Económico e Social, adoptam as medidas relativas à aproximação das disposições legislativas, regulamentares e administrativas dos Estados-Membros, que tenham por objecto o estabelecimento e o funcionamento do mercado interno” (dentre outras disposições). JORNAL OFICIAL DA UNIÃO EUROPEIA. Versão Consolidada do Tratado Sobre o Funcionamento da União Europeia. Publicado em 30 de março de 2010. Disponível em: http://eur-lex.europa.eu/LexUriServ/LexUriServ.do?uri=OJ:C:2010:083:0047:0200:pt:PDF. Acesso em: 06 de julho de 2013.
[42] Idem. Regulamento nº 1094/2010 do Parlamento Europeu e Conselho.
[43]HALIMI, Serge. Naufrágio da democracia: as marionetes políticas e seus benfeitores. Dossiê Le Monde Diplomatique Brasil: n. 08, ano, nov/dez, 2011, pp. 77-81.
[44] Ver Lei n. 7.492/86.
[45] PORTELA, Paulo Henrique Gonçalves. Direito internacional público e privado. 4º ed. Salvador. Editora Jus Podium, 2012, p. 507-509.
[46] ONU. Carta das Nações Unidas e Estatuto da Corte Internacional de Justiça. Disponível em: http://unicrio.org.br/img/CartadaONU_VersoInternet.pdf. Acesso em: 04 de outubro de 2012.
[47] CPI. À Propos de la Cour. Disponível em: http://www.icc-cpi.int/Menus/ICC/About+the+Court/. Acesso em: 04 de outubro de 2012.
[48] PLANALTO. Decreto n° 4.388, de 25 de setembro de 2002. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto/2002/D4388.htm. Acesso em: 04 de outubro de 2012.
[49] “Por imposição do princípio do nullum crimen sine lege, o legislador, quando quer impor ou proibir condutas sob a ameaça de sanção, deve, obrigatoriamente, valer-se de uma lei. Quando a lei em sentido estrito descreve a conduta (comissiva ou omissiva) com o fim de proteger determinado bem cuja tutela mostrou-se insuficiente pelos demais ramos do direito, surge o chamado tipo penal”.  GRECO, Rogério. Curso de direito penal: Parte Geral. 11º ed. Rio de Janeiro: Impetus, 2009, p. 157.
[50] PLANALTO. Idem.
[51] “As vertentes do princípio da intervenção mínima são, portanto, como que duas faces de uma mesma moeda. De um lado, orientando o legislador na seleção dos bens mais importantes e necessários ao convívio em sociedade; de outro, também servindo de norte ao legislador para retirar a proteção do Direito Penal sobre aqueles bens que, no passado, gozavam de especial importância, mas que hoje, com a evolução da sociedade, já podem ser satisfatoriamente protegidos pelos demais ramos do ordenamento jurídico”.  GRECO, p. 51.
[52] O Art. 125 do Estatuto de Roma aduz que: par. 1 – “o presente Estatuto estará aberto à assinatura de todos os Estados na sede da Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura, em Roma, a 17 de Julho de 1998, continuando aberto à assinatura no Ministério dos Negócios Estrangeiros de Itália, em Roma, até 17 de Outubro de 1998. Após esta data, o Estatuto continuará aberto na sede da Organização das Nações Unidas, em Nova Iorque, até 31 de Dezembro de 2000; par. 2 – O presente Estatuto ficará sujeito a ratificação, aceitação ou aprovação dos Estados signatários. Os instrumentos de ratificação, aceitação ou aprovação serão depositados junto do Secretário-Geral da Organização das Nações Unidas; par. 3 – O presente Estatuto ficará aberto à adesão de qualquer Estado. Os instrumentos de adesão serão depositados junto do Secretário-Geral da Organização das Nações Unidas”.
[53] Art. 11 do Estatuto de Roma. Decreto-Lei nº 4388 de 25 de setembro de 2012.
[54] PORTELA, pp. 520-521.
[55] O Art. 24, par. 1, do Estatuto de Roma trata da não retroatividade, afirmando que a pessoa natural não poderá ser condenada “por uma conduta anterior à entrada em vigor” do Estatuto.
[56] O Art. 13, b, do Estatuto de Roma afirma que “o Tribunal poderá exercer a sua jurisdição em relação a qualquer um dos crimes a que se refere o artigo 5o, de acordo com o disposto” no Estatuto, se “o Conselho de Segurança, agindo nos termos do Capítulo VII da Carta das Nações Unidas, denunciar ao Procurador qualquer situação em que haja indícios de ter ocorrido a prática de um ou vários desses crimes”.
[57] PORTELA, pp. 520-521.
[58] Idem, p.521.
[59] O Art. 12, par. 3, do Estatuto de Roma expõe que: “Se a aceitação da competência do Tribunal por um Estado que não seja Parte no presente Estatuto for necessária nos termos do parágrafo 2o, pode o referido Estado, mediante declaração depositada junto do Secretário, consentir em que o Tribunal exerça a sua competência em relação ao crime em questão. O Estado que tiver aceito a competência do Tribunal colaborará com este, sem qualquer demora ou exceção, de acordo com o disposto no Capítulo IX”.
[60] PORTELA, p. 521.
[61] O Art. 20, par. 1 e 2, do Estatuto de Roma, assevera que “salvo disposição contrária do presente Estatuto, nenhuma pessoa poderá ser julgada pelo Tribunal por atos constitutivos de crimes pelos quais este já a tenha condenado ou absolvido” e, “nenhuma pessoa poderá ser julgada por outro tribunal por um crime mencionado no artigo 5°, relativamente ao qual já tenha sido condenada ou absolvida pelo Tribunal”.
[62]   Aduz o Art. 17, par. 1, a, b, c, e d, do Estatuto de Roma, que, “tendo em consideração o décimo parágrafo do preâmbulo e o artigo 1º, o Tribunal decidirá sobre a não admissibilidade de um caso se: o caso for objeto de inquérito ou de procedimento criminal por parte de um Estado que tenha jurisdição sobre o mesmo, salvo se este não tiver vontade de levar a cabo o inquérito ou o procedimento ou, não tenha capacidade para o fazer; o caso tiver sido objeto de inquérito por um Estado com jurisdição sobre ele e tal Estado tenha decidido não dar seguimento ao procedimento criminal contra a pessoa em causa, a menos que esta decisão resulte do fato de esse Estado não ter vontade de proceder criminalmente ou da sua incapacidade real para o fazer; a pessoa em causa já tiver sido julgada pela conduta a que se refere a denúncia, e não puder ser julgada pelo Tribunal em virtude do disposto no parágrafo 3o do artigo 20; o caso não for suficientemente grave para justificar a ulterior intervenção do Tribunal”.
[63] O Art. 18, par. 1, do Estatuto de Roma, sobre as decisões preliminares sobre admissibilidade, aduz que “se uma situação for denunciada ao Tribunal nos termos do artigo 13, parágrafo a (a requerimento do Estado-parte), e o Procurador determinar que existem fundamentos para abrir um inquérito ou der início a um inquérito de acordo com os artigos 13, parágrafo c (por iniciativa do procurador) e 15 (idem), deverá notificar todos os Estados Partes e os Estados que, de acordo com a informação disponível, teriam jurisdição sobre esses crimes. O Procurador poderá proceder à notificação a título confidencial e, sempre que o considere necessário com vista a proteger pessoas, impedir a destruição de provas ou a fuga de pessoas, poderá limitar o âmbito da informação a transmitir aos Estados”.
[64] Art. 53, par. 1, c, do Estatuto de Roma, diz que, “na sua decisão, o Procurador terá em conta se tendo em consideração a gravidade do crime e os interesses das vítimas, não existirão, contudo, razões substanciais para crer que o inquérito não serve os interesses da justiça”.
[65] Art. 65 do Estatuto de Roma.
[66] Art. 76, par. 1, do Estatuto de Roma.
[67] Previsto no Art. 75 do Código Penal Brasileiro, o limite de 30 anos para as penas privativas de liberdade, mesmo que as penas de vários crimes as quais o acusado é condenado superar o limite máximo imposto.
[68] “A Constituição da República Portuguesa de 1982, em seu art. 30, dispõe que (…) não pode haver penas nem medidas de segurança, privativas ou restritivas de liberdade com caráter perpétuo, ou de duração ilimitada ou indefinida. Nota-se que a Constituição lusitana não só proíbe penas de caráter perpétuo, como também as ilimitadas e as indefinidas. A vigente Constituição da Costa Rica prescreve em seu art. 40 que (…) ninguém será submetido a tratamentos cruéis ou degradantes, nem a penas perpétuas, nem a pena de confisco. Toda a declaração obtida por meio de violência será nula. A Constituição da Nicarágua de 1987 – elaborada, pois, quando no poder os sandinistas – ordena em seu art. 37 que (…) as penas não transcendem da pessoa do condenado. Não se imporá pena ou penas que, isoladamente ou em conjunto, durem mais de 30 anos. A Constituição da Venezuela de 1961 – que está por ser substituída por novo texto em elaboração por uma Assembleia Constituinte – prevê em seu art. 65 que Ninguém poderá ser condenado a penas perpétuas ou infamantes. As penas restritivas da liberdade não poderão exceder dos 30 anos”. LUISI, Luiz Benito Viggiano. Tribunal penal internacional: pena de prisão perpétua. Revista CEJ, V. 4, n. 11 mai./ago. 2000. Disponível em: http://www2.cjf.jus.br/ojs2/index.php/revcej/article/viewArticle/346/548. Acesso em: 27 de julho de 2013.
[69]   MENEZES, Fabio Victor de Aguiar. A pena de prisão perpétua e o tribunal penal internacional: aspectos constitucionais. Revista Âmbito Jurídico. Disponível em: https://www.ambito-juridico.com.br/site/?n_link=revista_artigos_leitura&artigo_id=6758&revista_caderno=3. Acesso em: 27 de julho de 2013.
[70] Menezes apud Souza. SOUZA, Artur de Brito Gueiros Souza. O tribunal penal internacional e a proteção aos direitos humanos. Disponível em: http://www.esmpu.gov.br/boletins/boletim_12/Boletim_12_artigo_01.pdf. Acesso em: 02 de março de 2006.
[71] Assevera o parágrafo 4º do Artigo 5º da Constituição Federal que, “o Brasil se submete à jurisdição de Tribunal Penal Internacional a cuja criação tenha manifestado adesão”.
[72] MACEDO, Tatiana Bandeira de Camargo. Prisão perpétua e pena de morte: limites ao processo extradicional. Jus Navigandi, Teresina, ano 17, n. 3250, 25 de maio de 2012. Disponível em: <http://jus.com.br/artigos/21871>. Acesso em: 27 jul. 2013.
[73] PACELLI, Eugênio. Curso de processo penal. 16º ed. São Paulo: Editora Atlas, 2012, p. 22.
[74] BAHIA, Saulo José Casali. O tribunal penal internacional e a Constituição Brasileira. Disponível em: http://www.direitoufba.net/mensagem/saulocasali/tribunalinternacional.doc;http://webcache.googleusercontent.com/search?q=cache:_zgoMtJL2IsJ:www.direitoufba.net/mensagem/saulocasali/tribunalinternacional.doc+constitui%C3%A7%C3%A3o+federal+pris%C3%A3o+perpetua+entrega&cd=10&hl=pt-BR&ct=clnk&gl=br. Acesso em: 27 de julho de 2013.
[75] Os crimes de guerra são expressamente expostos no Art. 5º, par. 1, c, do Estatuto de Roma.
[76] BAHIA, Op cit.
[77] Art. 91 do Estatuto de Roma.
[78] Acrescentado no Código de Processo Penal pela Lei nº 11.719 de 20 de junho de 2008.
[79] PORTELA, p. 526.
[80] CÂMARA DOS DEPUTADOS. Projeto de Lei nº301/2007. Disponível em: http://www.camara.gov.br/proposicoesWeb/prop_mostrarintegra;jsessionid=8B95C2D53FB5172EB87EEB5B258C1167.node2?codteor=439581&filename=PL+301/2007. Acesso em: 09 de julho de 2013.
[81] GRECO, p. 61.
[82] Idem, p. 49.
[83] Idem, p. 53.
[84] Idem, p. 57-58.
[85] GUERRA, Sidney. Direito internacional dos direitos humanos. 1º ed. São Paulo: Saraiva, 2011, p. 78.
[86] Idem, p. 89.
[87] Idem.
[88] DELMAS-MARTY, Mireille. Por um direito comum. São Paulo: Martins Fontes, 2004, p. 234.
[89] DELMAS-MARTY, Mireille. Ordem jurídica mundial e paz positiva. Le monde diplomatique Brasil. Biblioteca virtual, Paris, julho, 2003. Disponível em: http://www.diplomatique.org.br/acervo.php?id=969. Acesso em: 09 de novembro de 2013.
[90] “A famosa distinção proposta pelo filósofo alemão Emmanuel Kant fornece um fio condutor: ‘No reino dos fins, tudo tem um preço e uma dignidade. O que tem um preço pode ser substituído por outra coisa qualquer, a título de equivalente; entretanto, o que é superior a qualquer preço, e, por conseguinte não admite equivalente, é uma dignidade.’ A hierarquia parece clara: em caso de conflito, os valores não mercantis, que não têm equivalente e não são substituíveis, deveriam ser superiores. (…) Porém, esse fio condutor foi proposto por Kant em 1785. Ora, ele parece ter se desgastado uma vez que o filósofo, atento à Revolução Francesa e à sucessão de violência e de guerras, expressa uma preocupação crescente com a paz, que remete mais à idéia de uma paz negativa (no sentido de segurança coletiva: mecanismos de manutenção da paz e da regulamentação das disputas) do que à busca de um ideal de justiça social que poderia anunciar a construção de uma paz positiva, ou seja, a prevenção das guerras e dos conflitos pela justiça”. DELMAS-MARTY, Mireille. Ordem jurídica mundial e paz positiva. Le monde diplomatique Brasil. Biblioteca virtual, Paris, julho, 2003. Disponível em: http://www.diplomatique.org.br/acervo.php?id=969. Acesso em: 09 de novembro de 2013.
[91] DELMAS-MARTY, Mireille. Por um direito comum. São Paulo: Martins Fontes, 2004, p. 229.
[92] O Art. 127 do Estatuto de Roma dispõe em seu item 2 que “a retirada não isentará o Estado das obrigações que lhe incumbem em virtude do presente Estatuto enquanto Parte do mesmo, incluindo as obrigações financeiras que tiver assumido, não afetando também a cooperação com o Tribunal no âmbito de inquéritos e de procedimentos criminais relativamente aos quais o Estado tinha o dever de cooperar e que se iniciaram antes da data em que a retirada começou a produzir efeitos; a retirada em nada afetará a prossecução da apreciação das causas que o Tribunal já tivesse começado a apreciar antes da data em que a retirada começou a produzir efeitos”.
[93] Leia-se “direito internacional público”.
[94] CASELLA, Paulo Borba. Dimensão internacional do direito. 1º ed. São Paulo: LTR, 2000, p. 298.
[95] “A grande dicotomia direito público e privado remonta ao Direito Romano. Sua base é um famoso trecho de Ulpiano: ‘Publicum jus est quod ad statum rei romanae spectat, privatum, quod ad singulorum utilitatem’. (O direito público diz respeito ao estado da coisa romana, à polis ou civitas, o privado à utilidade dos particulares). FERRAZ JUNIOR, Tercio Sampaio. Introdução ao estudo do direito: técnica, decisão, dominação. 7º ed. São Paulo: Atlas, p. 105, 2013.
[96] “A ordem internacional é constituída essencialmente pelo respeito à personalidade, soberania e independência dos Estados e pelo cumprimento fiel das obrigações decorrentes de tratados e de outras fontes do direito internacional”. DEPARTAMENTO DE DERECHO INTERNACIONAL: ORGANIZACIÓN DE LOS ESTADOS AMERICANOS. Carta de La Organización de Los Estados Americanos (Carta da Organização dos Estados Americanos). Disponível em: http://www.oas.org/dil/esp/tratados_A-41_Carta_de_la_Organizacion_de_los_Estados_Americanos.htm#ch1. Acesso em: 11 de julho de 2013.
[97] GUILLÉN, Raúl. Em Madrid, Vidas hipotecadas. Dossiê Le Monde Diplomatique Brasil: n. 08, ano, nov/dez, 2011, pp. 46-50.
[98] “Nos Estados Unidos, onde não há regulamentação alguma para eles, esses hegde funds não são registrados na Securities and Excharge Comission –SEC -, a CVM americana, e podem investir em qualquer ativo. O tipo mais popular hedge fund é o long/short equity hedge. No Brasil, em tese, esses fundos são regulamentados pela CVM e classificados como multimercado. Mas, com a regulamentação ampla, muitos acabam não sendo, na realidade fundos de hedge. Para sê-lo o Fundo precisaria ter pouca restrição de investimento e baixa correlação com os mercados – ou seja, não deveria acompanhar os seus movimentos de alta e baixa. Para tal, deve recorrer às mais diversas estratégias e instrumentos, aproveitando as diferenças de preços entre ações, debentures, moedas ou títulos de renda fixa. A ideia do Fundo de hedge é ser semelhante ao seguro de um ativo, ou seja, quando ocorre um sinistro com o ativo segurado, outro ativo, no caso o valor da indenização do seguro, compensa a perda. É essa a proposta do Fundo de hedge, ou seja, hedge funds are supposed to hedge”. FORTUNA, p. 592.
[99] GAMES, Milton; SEGALLA, Amauri. Uma fraude chamada Madoff: a incrível história do homem que enganou milionários de todo o Mundo, abalou a indústria de fundos e espalhou prejuízos de U$ 50 bilhões por 40 países, inclusive o Brasil. Istoé Dinheiro, ed. 586, dez, 2008. Disponível em: http://www.istoedinheiro.com.br/noticias/2108_UMA+FRAUDE+CHAMADA+MADOFF. Acesso em: 09 de outubro de 2012
[100] Sem autor. Condenação centenária: Madoff pega pena máxima nos EUA por fraude”. Revista Consultor jurídico. 29 de jun, 2009. Disponível em: http://www.conjur.com.br/2009-jun-29/madoff-pega-pena-maxima-eua-fraude-financeira-us-63-bilhoes. Acesso em: 19 de julho de 2013.
[101] MAZLOUM, Ali. Dos crimes contra o sistema financeiro nacional: comentários à Lei 7.492/86, doutrina e jurisprudência. 1º ed. São Paulo: Célebre Editora, 2007, pp. 84-85.
[102] Idem. p. 86.
[103] Doze anos é a pena máxima da Lei dos crimes contra o Sistema Financeiro Nacional, sendo aplicada unicamente para o crime de gestão fraudulenta. É comum a incidência da pena máxima de seis anos para as condutas descritas, sendo oito o número de vezes que aparece no texto legal. Em segundo lugar a pena máxima de quatro anos, aparecendo seis vezes, e logo depois a pena máxima de oito anos, em cinco descrições de condutas criminosas. Idem.
[104] “Bancos europeus e americanos, empresários, atletas e celebridades estão na lista de potenciais vítimas da fraude. Aparecem na relação várias sociedades financeiras, principalmente europeias e americanas, grandes e pequenas, que asseguram ter investido na estrutura piramidal organizada por Madoff. Entre elas há fundos através dos quais investiram bancos como o BBVA, Bank of America, UBS, BNP Paribas, Bank of New York Mellon e Credit Suisse”. Sem autor. Condenação centenária: Madoff pega pena máxima nos EUA por fraude. Revista Consultor jurídico. 29 de jun, 2009. Disponível em: http://www.conjur.com.br/2009-jun-29/madoff-pega-pena-maxima-eua-fraude-financeira-us-63-bilhoes. Acesso em: 19 de julho de 2013.
[105] As instituições financeiras não figuram como sujeitos passivos do crime.  MAZLOUM, pp. 118.
[106] Idem. p. 117-120.
[107] Idem. p. 122.
[108] Idem. p. 153-154.
[109] O acusado não comete crime de falso testemunho, por serem sujeitos ativos dessa infração apenas testemunhas, peritos e correlatos (Art.342 do Código Penal Brasileiro) e, sobretudo por força do Art. 197 e ss., do Código de Processo Penal Brasileiro.
[110] ASTAUD, Alain. Pinochet e Washington: riggs, máquina de lavar dinheiro para ditadores. Dossiê Le Monde Diplomatique Brasil: n. 08, ano, nov/dez, 2011, pp. 39-40.
[111] A. B., S. L.-D. e M. D. Un extraordinaire talent de dissimulation. Le Figaro.fr. Publicado em 25/01/2008 às 12:25. Disponível em: http://www.lefigaro.fr/societes-francaises/2008/01/25/04010-20080125ARTFIG00261-un-extraordinaire-talent-de-dissimulation-.php. Acesso em: 20 de julho de 2013.
[112] WARDE, Ibrahim. Ganhar ou ganhar. prêmios e castigos dos negociadores do mercado financeiro. Dossiê Le Monde Diplomatique Brasil: n. 08, ano, nov/dez, 2011, p. 63.
[113] A. B., S. L.-D. e M. D., Op cit.
[114] RÁDIO FRANCESA INTERNACIONAL. Justiça francesa confirma condenação de ex-trader a reembolsar € 5 bilhões. Publicado em 24 de Outubro de 2012. Disponível em: http://www.portugues.rfi.fr/franca/20121024-justica-francesa-confirma-condenacao-de-ex-trader-reembolsar-5-bilhoes. Acesso em: 20 de julho de 2013.
[115] GRECO, p.450-451.
[116] LAGNEAU-YMONET, Paul; RIVA, Angelo. Bolsas de valores: por alguns bilhões a mais. Dossiê Le Monde Diplomatique Brasil: n. 08, ano, nov/dez, 2011, pp. 24-26.
[117] Idem, p. 27.
[118] Art. 2º.  São sujeitos à aprovação do Congresso Nacional quaisquer atos que possam resultar em revisão do referido Acordo, assim como quaisquer ajustes complementares que, nos termos do art. 49, inciso I, da Constituição, acarretem encargos ou compromissos gravosos ao patrimônio nacional.
[119] MAZLOUM, pp. 263-266.
[120] CARVALHO, Aurora Tomazini de. Direito penal tributário (Uma análise lógica, semântica e jurisprudencial). 1º ed., São Paulo: Quartier Latin, 2009, p. 146.
[121] Art. 7º, part. 1, k, do Estatuto de Roma. Definição dos danos causados à humanidade.
[122] BORGES, Itamar Bento. Crítica e teoria da crise. 1º ed. Porto Alegre: EDIPUCRS, 2004, p. 77.
[123] MAZLOUM, p. 48.
[124] Leia-se “direito penal econômico”.
[125] SCHMIDT, Andrei Zenkner. A delimitação do direito penal econômico a partir do objeto ilícito. Direito penal econômico: crimes financeiros e correlatos. São Paulo: Saraiva, 2011, p. 41.
[126] GUERRA, Sidney, p. 84.
[127] Idem.
[128] SCHMIDT, Andrei Zenkner. A delimitação do direito penal econômico a partir do objeto ilícito. Direito penal econômico: crimes financeiros e correlatos. São Paulo: Saraiva, 2011, p. 40.
[129] PORTELA, p. 528.
[130] Idem, pp. 507-509.
[131] PORTELA, pp. 528-533.
[132] SOUZA, Carolina Yumi de. Cooperação jurídica internacional: medidas assecuratórias e devido processo legal. Direito penal econômico: crimes financeiros e correlatos. São Paulo: Saraiva, 2011, pp. 229-231.
[133] Diferente de lex fori, que diz respeito à lei do Estado com jurisdição sobre o processo, a lex diligentiae “refere-se aos atos que devem ser praticados em jurisdição diversa daquela em que o processo se desenvolve”. Idem, p.238.
[134] SOUZA, pp. 239-241.
[135] Excluídos os fatos que concretizam os tipos dos crimes políticos e de opinião, por força do Art. 5º, LII, da Carta Magna.
[136] SOUZA, p. 256.

Informações Sobre o Autor

Lucas Maia Carvalho Muniz

Graduado em Direito pela Faculdade Ruy Barbosa. Graduando em Filosofia pela Universidade Federal da Bahia. Pós-graduando em Ciências Criminais pela Faculdade Baiana de Direito


Equipe Âmbito Jurídico

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