Acesso à Justiça: A institucionalização do juiz leigo na Justiça do Trabalho

Resenha: O presente trabalho trata de um assunto quase não abordado dentro do direito do trabalho, que é a institucionalização do Juiz Leigo na Justiça do Trabalho, como forma de evitar o retardo da Justiça e a morosidade processual, com o fim de promover a celeridade e o efetivo acesso a justiça.


Sumário: 1. Introdução; 2. Os juízes leigos no direito positivo brasileiro; 3. Do procedimento sumaríssimo na Justiça do Trabalho; 4. Da figura do Juiz Leigo na Justiça do Trabalho; 5. Conclusão; 6. Referências bibliográficas.


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1. Introdução:


A observação inicial, que deve ser feita, é que acesso à Justiça é direito fundamental, estando expresso no artigo 5º, inciso XXXV, da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988:


“a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito”.


Insta trazer a colação o artigo 25, da Convenção Americana sobre os Direitos Humanos dispõe:


“Art. 25. Toda pessoa tem direito a um recurso simples e rápido ou a qualquer outro recurso efetivo, perante os juízes ou tribunais competentes, que a proteja contra atos que violem seus direitos fundamentais reconhecidos pela Constituição, pela lei ou pela presente Convenção, mesmo quando tal violação seja cometida por pessoas que estejam atuando no exercício de suas funções oficiais”.


Entretanto, parte dos juristas brasileiro entendem que o acesso a justiça não vem sendo concedido em sua plenitude, diante da falta de qualidade institucional de nosso Poder Legislativo e o agigantamento do Poder Executivo, que ao poucos se tornou uma figura muito próxima ao Poder Moderador do Brasil Imperial, passou a absorver por meio de lei e decretos os tratados internacionais, tendo até sofrido nossa Constituição alteração para passar a adotar as normas internacionais com normais constitucionais internas, com força de Emenda Constitucional.


Vejamos o que ensina Flávia C. Piovesan:


“Ao acolher o aparato internacional de proteção, bem como as obrigações internacionais dele decorrentes, o Estado passa a aceitar o monitoramento internacional no que se refere ao modo pelo qual os direitos fundamentais são respeitados em seu território. O Estado passa, assim, a consentir no controle e na fiscalização da comunidade internacional quando, em casos de violação a direitos fundamentais, a resposta das instituições nacionais se mostra insuficiente e falha, ou, por vezes, inexistentes. Enfatize-se, contudo, que a ação internacional é sempre uma ação suplementar, constituindo uma garantia adicional de proteção dos direitos humanos”.


Não se pode conceber um Estado Democrático de Direito sem tutela efetiva de direitos fundamentais, tendo esse como fundamentos entre outros, a cidadania e a dignidade da pessoa humana, sendo um de seus objetivos fundamentais, como exposa o artigo 3º, inciso I, de nossa Constituição, ao invocar a construção de uma sociedade livre, justa e solidária, e, também, porque o artigo 4º, inciso II, estabelece que “A República Federativa do Brasil rege-se nas suas relações internacionais, pela prevalência dos direitos humanos”, incluído o acesso a justiça.


Mesmo diante desse quadro, numa leitura aprofundado do artigo 5º, inciso XXXV, acesso à justiça é acesso à justiça material, efetiva, concreta, porque também, na interpretação principiológica da Constituição, é a realização do objetivo principal do Estado Democrático de Direito: a concretude dos direitos fundamentais, a garantia dos direitos dos governados, que vem sendo mais fortalecido.


Como a justiça tardia, é rematada como injustiça, ou seja inacesso à justiça, a Justiça considerada ideal deve ser a justiça rápida.


Mas não poder haver justiça rápida para uns e justiça lenta, para outros, o que se torna a mais pura e cruel injustiça, pois vilipendia a Constituição, eis que todos são iguais perante a lei, o que muitas das vezes não ocorre, e sim, a semeadura e o fomento a discriminação e a desigualdade.


O retardo nos julgamentos dos processos nos três segmentos do Poder Judiciário, causa a injustiça, o que o legislador tenta coibir e acabar com isso.


Uma das soluções encontradas pelo legislador, que a nosso ver é a mais viável, seria a institucionalização da figura do Juiz Leigo, que aos poucos vem ganhando forte adesão dentro do meio jurídico e no direito pátrio, como forma de solucionar os litígios de forma celere.


2. Os juízes leigos no direito positivo brasileiro:


A Lei nº 9.099/95 disciplina, na Justiça comum, o procedimento especial para pequenas causas. A motivação da norma foi a de reduzir o tempo e o custo dos processos de pouca complexidade, ante a percepção de que muitas vezes o processamento de tais demandas oferecia maiores dificuldades que a resolução da lide.


Essa agilização não é uma proposta ligada meramente à idéia de eficiência, mas sim ao próprio acesso à Justiça. Como se tornou comum advertir, uma Justiça onerosa e tardia pouco se diferencia da injustiça.


Assim, desenvolveram-se diversos mecanismos destinados a:


a) facilitar o acesso ao juízo, permitindo o ajuizamento de demandas diretamente pelas partes, tal qual ocorre nas small claim courts, do direito americano;


b) prestigiar os princípios da oralidade e da concentração dos atos processuais, buscando uma resposta rápida às demandas;


c) adotar um modelo participativo de prestação jurisdicional, aproximando as partes do processo e conferindo maior importância à conciliação.


Por serem demandas de menor complexidade, considerou-se que a participação direta do magistrado em todas as fases do processo seria dispensável. Adotou-se, então, um modelo diferenciado, permitindo-se, por exemplo, a nomeação de um terceiro para realizar a audiência de conciliação, como se fosse um árbitro, mas judicializado.


A Lei nº 9.099/95 foi além e criou, em seu art. 7º, a figura do juiz leigo, que é designado não apenas para presidir a audiência de conciliação, mas para dirigir toda a fase instrutória e, ao final, redigir uma proposta de sentença, posteriormente submetida à apreciação do magistrado.


A nossa Constituição da República, no seu artigo 98, inciso I dispõe que, após criados os Juizados Especiais, serão promovidos por “Juízes Togados, ou Togados e Leigos …”. Se tentarmos entender o que o legislador quis dizer, os Juizados Especiais serão dirigidos, promovidos, por Juízes de carreira – togados – ou por estes e mais outros componentes que fizessem o papel de Juiz, sem precisar ser de carreira, mas investido na função e sem o cargo, enfim, um Juiz LEIGO.


Isso significa que as causas de pequena complexidade e com valor de causa inferior a 40 (quarenta) salários-mínimos, poderão ser conduzidas pelo Juiz Leigo.


A figura do Juiz Leigo que foi institucionalizada na Seção II – “Do Juiz, Dos Conciliadores e Dos Juízes leigos”, artigos 5; 6; 7 e parágrafo único e na Seção VIII – “Da conciliação e Do juízo arbitral” , da Lei Federal nº 9.099, de 1995.


Para ser o Juiz leigo tem que ser advogado e com mais de cinco anos de experiência, sua função é conciliar, tentando evitar o litígio; caso este ocorra, o Juiz Leigo se investido nas funções de Julgador, presidirá a Audiência de Instrução e Julgamento, colhendo as provas e designará a data para a audiência de leitura de sentença, visto que a Projeto de Sentença cabe ao Juiz togado homologar. Logo, pode extrair que o processo será conduzido em toda a fase instrutória pelo Juiz leigo, que possui competência em decorrência da lei.


Neste sentido, colhe-se um precedente das Turmas Recursais de Florianópolis-SC:


“Juiz leigo, necessariamente advogado com cinco anos de experiência forense, concilia, dirige a instrução e profere decisão, a qual depende de ratificação judicial. …” (Apelação Cível nº 1780, de Criciúma, rel. Juiz Hélio do Valle Pereira, j. 23.5.2002)


O juiz leigo, no desempenho de suas atribuições, deve obedecer ao mesmo padrão de comportamento que se exige do magistrado, aplicando-se lhes analogicamente o art. 35 da LOMAN, com as devidas adequações.


A LOMAN, ao impor deveres de conduta aos componentes da magistratura nacional, criou uma garantia de respeito e bom atendimento aos jurisdicionados, que não pode ser excetuada por meio da atuação do juiz leigo ou tampouco do conciliador.


É também uma garantia do jurisdicionado que a causa seja avaliada por um juiz imparcial, motivo por que tem o juiz leigo o dever de se declarar suspeito ou impedido, tal qual ocorreria se fosse o magistrado a julgar a causa, aplicando-se analogicamente os artigos 134 e 135 do Código de Processo Civil.


Por derradeiro, em atenção ao disposto no art. 28, IV, do Estatuto da Ordem dos Advogados do Brasil, conforme a interpretação hoje pacificada, é forçoso que o juiz leigo abstenha-se de advogar perante o mesmo Juizado Especial em que atua como auxiliar da Justiça.


3. Do procedimento sumaríssimo na Justiça do Trabalho:


A Justiça do Trabalho tem sofrido severas críticas quanto a sua morosidade, havendo processos que se arrastam há vários anos, sem se ter a efetiva e profícua prestação jurisdicional.


A Lei nº 9.957, de 12 de janeiro de 2000, trouxe uma série de alterações no texto da Consolidação das Leis do Trabalho, com a inserção dos seguintes artigos: 852-A a 852-I, 895, § 1º, I e II e § 2º, 896, § 6º, 897-A.


O legislador, ao estabelecer o critério do procedimento sumaríssimo, possui como escopo a celeridade e economia processual, procurando otimizar as regras processuais, dando-se um prazo para a solução da demanda: mínimo de 15 dias e no máximo de 30.


Dúvidas não há de o espírito da lei é de grande alcance social, representando uma forma de resgatar a dignidade do Judiciário Trabalhista, colocando nos espíritos dos trabalhadores um pouco de confiança e de respeito.


É costume, se ouvir que Justiça tardia não é Justiça, o que há de se concordar, respeitamos a intenção do legislador. Contudo é importante dizer que não há condições plenas, diante do quadro atual das Varas do Trabalho, mesmo após a modernização da mesma e a modificação de sua competência a partir da Emenda Constitucional nº 45, de 2004, da plena adoção de todas as regras quanto ao procedimento sumaríssimo, precipuamente, o cumprimento dos prazos estabelecidos para a elaboração da sentença.


O caput do artigo 852-A, da CLT, estatui que: “Os dissídios individuais cujo valor não exceda a quarenta vezes o salário mínimo vigente na data do ajuizamento da reclamação ficam submetidos ao procedimento sumaríssimo”.


Um ponto a ser observado e merece destaque especial, independente do valor da causa, as demandas em que é parte a Administração Pública Direta, as Autárquica e as Fundacional não se sujeitam ao procedimento sumaríssimo, conforme o parágrafo único do artigo 852-A, da CLT.


As demandas que se enquadram no procedimento sumaríssimo devem observar as seguintes regras: a) o pedido deverá ser certo ou determinado e indicará o valor correspondente; b) não se fará citação por edital, incumbindo ao autor a correta indicação e endereço do reclamado (art. 852-B, I e II, CLT).


A não observância destes requisitos implicará ao reclamante o arquivamento da reclamação e conseqüente condenação ao pagamento das custas, as quais serão arbitradas sobre o valor da causa, como determina o artigo. 852-B, § 1º, da CLT.


O referido pergaminho legal, em seu artigo 840, § 1º dispõe que: “Sendo escrita, a reclamação deverá conter a designação do presidente da Junta, ou do juiz de direito, a quem for dirigida, a qualificação do reclamante e do reclamado, uma breve exposição dos fatos de que resulte o dissídio, o pedido, a data e assinatura do reclamante ou de seu representante”.


As demandas sujeitas a rito sumaríssimo serão instruídas e julgadas em audiência única, sob a direção de juiz presidente ou substituto, que poderá ser convocado para atuar simultaneamente com o titular, como disciplina o artigo 852-C, da CLT.


O rito previsto na CLT também adota a intitulada audiência una, como se depreende da leitura do art. 849, que assim enuncia: “A audiência de julgamento será contínua; mas se não for possível, por motivo de força maior, concluí-la no mesmo dia, o juiz ou presidente marcará a sua continuação para a primeira desimpedida, independentemente de nova intimação”.


O ideal da Lei nº 9.957/2000 é a celeridade na prestação jurisdicional, impondo-se a realização da audiência única a ser observada pelo Juiz Titular da Vara do Trabalho.


Entretanto, a realidade demonstra outra situação, a qual, infelizmente, demonstra ser inaplicável aos juízes titulares das Varas do Trabalho a adoção da audiência única, inclusive, observando-se o prazo de quinze dias para a sentença, coisa humanamente quase que impossível, apesar dos esforços.


O juiz, como sujeito da relação jurídica processual, se coloca acima e entre as partes. Deve preservar a imparcialidade e a igualdade no tratamento das partes, observando-se o contraditório, durante todo o transcorrer do procedimento, como forma de resguardar a dignidade de sua posição e do próprio Poder Judiciário.


Como dirigente do processo, de acordo com o artigo 852-D, da CLT, possui os seguintes poderes: a) a liberdade quanto às provas a serem produzidas, observando-se o ônus probatório das partes (art. 818 da CLT e art. 333, I e II do CPC); b) a limitação quanto as provas, podendo limitar ou excluir as excessivas, impertinentes ou protelatórias; c) a liberdade na apreciação das provas, dando-se especial valor às regras de experiência comum ou técnica.


4. Da figura do Juiz Leigo na Justiça do Trabalho:


A realidade demonstra outra situação, a qual, infelizmente, demonstra ser inaplicável aos juízes titulares das Varas do Trabalho a adoção da audiência única, inclusive, observando-se o prazo de quinze dias para a sentença, coisa humanamente quase que impossível, apesar dos esforços.


As comissões de conciliação que deveriam ser uma saída, se redundam hoje a um órgão morto, pois os sindicatos não possuem aparato técnico, instrumento e jurídico para realizar as conciliações.


Sabe-se que os sindicatos em sua grande maioria, que deveriam possuir tais órgãos, na verdade são autenticas fábricas de formação político-ideológica, e não defendem os direitos do trabalhador, apenas interesses individuais e próprios.


Ante esse cenário desolador, agravado mais ainda com a reformulação e modernização da Justiça do Trabalho, primeiramente em decorrência da mudança de competência das varas de trabalho, que absorveram o legado das responsabilidades civis trabalhistas e, das modificações introduzidas pelos Conselhos da Justiça do Trabalho e o Nacional de Justiça, a morosidade processual se tornou mais latente.


Por se encontrarem as Comissões de Conciliação mortas e os Juízes Trabalhistas togados com excesso de serviço, sem condições de julgarem as causas sumaríssimas no prazo máximo de 30 dias, uma saída para reduzir a morosidade seria a adoção do Juiz Leigo na Justiça do Trabalho.


Sem que seja necessária a modificação da CLT mediante Lei Ordinária ou no mais extremo, Emenda Constitucional ou até Lei Complementar, e tendo em vista a criação por lei das comissões de conciliação, que até o momento não emplacou, exercendo os mesmos poderes do Juiz Togado, observado as restrições legais, e seguindo o modelo da Lei nº 9099, de 1995, poder-se-ia adotar a figura do Juiz Leigo, que seria uma auxiliar da Justiça.


Os procedimentos sumaríssimos seriam julgados em menos espaço de tempo e os projetos de lei seriam homologados pelo Juiz Trabalhista togado, como ocorre nos Juizados Especiais Estaduais.


Como o ideal da Lei nº 9.957/2000 é a celeridade na prestação jurisdicional, impondo-se a realização da audiência única, assim como previsto na CLT, que também a adota, poderá ser realizada as audiências dos processos de rito sumaríssimo pelo Juiz Leigo, ou caso contrário, ser feita a conciliação com o Juiz Leigo e convolada para o mesmo dia, mas em outro horário ou outro dia, sendo necessária a designada a leitura de sentença.


No caso, aplicar-se-ia a regra do artigo 852-C da CLT, bem como as do artigo 852-D do mesmo diploma, pois o Juiz Leigo possui os mesmo poderes, mesmo que com limitações, que as do Juiz Togado como dirigente do processo.


As demandas sujeitas a rito sumaríssimo serão instruídas e julgadas em audiência única, sob a direção de juiz presidente ou substituto, que poderá ser convocado para atuar simultaneamente com o titular (art. 852-C, CLT).


5. Conclusão:


A introdução da figura do Juiz Leigo na Justiça do Trabalho reduziria a morosidade processual e o volume excessivo de processo na Justiça do Trabalho, reduzindo assim a excessiva atuação do Juiz Trabalhista togado, que ficaria encarregado dos processos de rito sumário e ordinário, bem como as execuções.


 


Referências bibliográficas:

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Informações Sobre o Autor

Márcio Antonio Alves

Advogado, professor universitário licenciado, palestrante, articulista, especialista em Direitos Civil – Processo Civil e Penal – Processo Penal, Mestre em Direito e Doutorando em Direito


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