Alguns Apontamentos sobre a Tutela Jurisdicional Previdenciária

I – Introdução

A aplicação do Direito Previdenciário assistiu, ao longo dos anos, a uma drástica alteração no que concerne a sua própria hermenêutica jurídica. No entanto, tal evolução não vem sendo suficiente para tornar efetiva a tutela jurisdicional previdenciária, mormente pela adoção de políticas públicas incompatíveis com o grau de precarização das relações de trabalho, responsável direto pelo aumento no número de situações de incapacidade laboral.

A drasticidade do quadro econômico brasileiro, onde bilhões são repassados à credores externos em detrimento da injeção de recursos em Políticas Públicas Sociais, cada vez mais carentes, revela a incapacidade de se gerir o sistema de Previdência Social. Na esteira de ideologias que apregoam o “Estado Mínimo” pretende-se, indubitavelmente, privatizar  o sistema previdenciário, restando a adoção de políticas públicas focalizadas, desprezando-se a universalidade que deve permear a atuação estatal.

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Nestas poucas linhas pretende-se trazer a tona, longe de se esgotar a discussão, algumas questões pontuais acerca da Tutela Jurisdicional Previdenciária.

II – O Direito Previdenciário como Direito Social

O pressuposto fundamental que deve nortear a análise de qualquer norma legal encontra-se na idéia de justiça.  Obviamente que o sistema jurídico, donde se insere a norma legal, é o reflexo do acatamento de certos valores, e nesse sentido tanto o sentido da lei como a construção do direito podem ser influenciados pela noção de justiça que imperar no senso comum de uma dada sociedade.1

Mostra-se relevante, pois, que a idéia de justiça possa ser apreendida não como fórmula para se tratar os iguais de maneira igual, mas sim apresentando-se como meio para igualar os desiguais, na medida em que se desigualam.2 Através da justiça, pois,  reserva-se a tarefa de  diminuir a desigualdade social. Se pensarmos numa sociedade que encontre-se organizada de tal modo que só promova o bem de uma parte de seus integrantes, é sinal de que está mal organizada e afastada dos objetivos que justificam sua própria existência.

A própria Constituição enuncia como um dos objetivos fundamentais da República a construção de uma sociedade solidária, livre e justa (art. 3º, I, da Carta Política).  E é à partir dos postulados de justiça tal como conceituados acima, enunciados direta (através da lei em sentido objetivo, concreto) ou indiretamente (como os princípios e as normas programáticas), que a Constituição Federal trata dos chamados “Direitos Sociais”, cujo rol encontra-se previsto no artigo 6º.

José Afonso da Silva, em seu Curso de Direito Constitucional Positivo, afirma serem os direitos sociais “dimensões dos direitos fundamentais dos homens, prestações positivas proporcionadas pelo Estado direta ou indiretamente, enunciadas em normas constitucionais que possibilitam melhores condições de vida aos mais fracos, direitos que tendem a realizar a igualização de situações sociais desiguais”.3

No campo da Previdência Social, donde se inserem a seguridade e a assistência social, o Poder Público – através do papel do Estado – é o responsável por políticas que garantam renda aos cidadãos em períodos de inatividade. É ele que, na exata necessidade de igualar os desiguais, obriga-se a promover a justiça social.

Mas qual o motivo de se tecerem tais considerações?

O motivo dominante repousa na assertiva comum de que o Poder Público, influenciado pela ideologia neoliberal, simplesmente não cumpre  a missão a si delegada. Pior. Intenta safar-se de suas próprias obrigações. Adota novos conceitos doutrinários, sobretudo em países ditos “atrasados”, onde o chamado “Estado de Bem Estar Social” nem de longe aportou, consubstanciando-se num sonho distante para as massas de pobres e excluídos. Ali reina absoluta, ainda,  a ideologia da globalização.

No Brasil ocorre exatamente isso.

Gaba-se o Brasil de ter sido o precursor de um dos maiores programas de distribuição de renda mundial.4 Trata-se do benefício de prestação continuada ou de amparo assistencial, previsto de forma genérica na Constituição Federal e drasticamente limitado quando de sua regulamentação pela via ordinária.  Ainda assim, milhares de trabalhadores tem conseguido o direito a tal benefício graças a interferência direta do Poder Judiciário, que sensível aos comandos e princípios constitucionais tem alargado o rol de hipóteses para o acesso ao mesmo.5

E o Judiciário assim o faz por se tratar de autêntico direito social.

Resta nítida, portanto,  a necessidade de se conferir ao direito previdenciário o seu caráter de autêntico direito social, blindando-o contra ideologias conceituais privatistas, servíveis unicamente ao intuito de alargar as bases materiais de penetração da atividade capitalista privada a cada crise que o sistema apresenta.

Não o fazendo, corre-se o risco de relegar o ideal de justiça social a segundo plano, permitindo-se que ideologias nefastas acabem com o arcabouço constitucional que até o momento não pôde ser efetivamente colocado à serviço das camadas mais necessitadas.

III – Mitos e lendas a legitimar a precarização do sistema

Arraigou-se o hábito de criticar o sistema previdenciário brasileiro utilizando duas premissas: a primeira delas repousa em critérios objetivamente atuariais.  Deriva da suposta existência de um déficit nas contas da previdência social capaz de tornar o sistema, público e universal, inviabilizado num curto espaço de tempo.

Segundo dados do Ministério da Previdência em 2004 esse “déficit” teria sido de R$ 32 bilhões, resultante do conceito simplista (considera-se apenas as contribuições sobre a folha) e isolado (fora do sistema de Seguridade Social) de arrecadação líquida previdenciária menos benefícios urbanos e rurais, inclusive não considerando a parcela correspondente da receita da CPMF vinculada ao custeio da Previdência Social (alíquota de 0,10%).6

Todavia, há evidencias no sentido de que, ao contrário do que diz o governo, a previdência social é superavitária, assistindo, inclusive, à invejáveis crescimento no nível de arrecadação.  Cresceu, em termos nominais, 16% em relação a 2003, passando de R$ 80,73 bilhões para R$ 93,77 bilhões.  As fontes oficiais omitem para a sociedade que os repasses constitucionais das fontes exclusivas de recursos que deveriam ser alocados nos programas fins de saúde, previdência e assistência social, são, na execução, realocados para cobertura de gastos fiscais e obtenção de superávit primário. É o que diz estudo feito pela Associação Nacional dos Auditores da Previdência (ANFIP), cujos resultados encontram-se abaixo:

 

 

Para a entidade, mesmo incluindo-se recursos da DRU (Desvinculação da Receita da União),  a Seguridade Social em 2004 obteve uma receita recorde, composta de mais de R$ 220 bilhões. Por outro lado, o total de gastos, no mesmo ano, chegou a pouco mais de R$ 177 bilhões, conforme indicam as tabelas abaixo:

 

 

 

O segundo fator reside na hipótese de ocorrência de um grande número de benefícios por meio de fraudes, o que seria responsável pela elevação do déficit da Previdência Social.  Em relação a tais fraudes é comum que se assista a discursos exaltados e adoção de práticas que, na verdade, acabam por dificultar ainda mais o acesso das pessoas que necessitam  dos benefícios.

Através do relatório intitulado “Porque Reformar a Previdência”, realizado ainda no governo FHC, em 1997, diagnosticaram-se, naquele ano, 186 servidores demitidos  por fraudes, irregularidades, erros, falhas, indisciplina, furto de material, acidente com viatura e não assiduidade habitual. Até julho de 1997, existiam 647 processos administrativos, entre inquéritos e sindicâncias, contra servidores. Deste total 287 estavam instaurados, 360 por instaurar. A maioria deles, por irregularidades na concessão de benefícios.  A Inspetoria Geral da Previdência Social teria analisado 2.183.805 benefícios, sendo 124.796 na área judicial de acidente de trabalho e 485.909 perícias médicas. O resultado foi a descoberta e o cancelamento de 146.018 benefícios fraudados ou irregulares, o que gerou uma economia de R$ 3,81 bilhões, segundo o governo.

Também no Governo Lula o então Ministro da Previdência, Ricardo Berzoini, assumiu o posto com idêntico discurso em relação ao governo anterior7, verbis:

“As acusações de fraudes na concessão de benefícios ou na arrecadação não ficarão sem resposta. É obrigação nossa combatê-las de modo incansável. Para isso, vamos reforçar a fiscalização e ampliar as parcerias com o Ministério Público e com a Polícia Federal. Além disso, a sonegação será tratada com rigor. O sonegador, além de descumprir obrigações, pratica concorrência desleal com os contribuintes corretos. A fragilidade tecnológica do sistema de concessão de benefícios e da cobrança de contribuições também precisa ser superada. Anos de omissão prejudicaram a Dataprev, reduzindo sua capacidade de prevenir riscos e fraudes sofisticadas.”

Idêntico, também,  foi o discurso8 do atual Ministro, Almir Lando, galgado ao posto na malsinada reforma ministerial decretada pelo Governo como forma de dar resposta à grave crise política que recentemente se instalou no país, verbis:

Nós estamos combatendo as fraudes. As forças-tarefas previdenciárias estão atuando em todo o Brasil. Vamos atuar muito mais. Vamos modernizar a gestão da previdência social para diminuir, ainda mais, os desperdícios e as fraudes e, com a nova secretaria, reduzir a sonegação. Nós vamos fazer muito mais. Vamos prestar um serviço de qualidade.

O resultado em termos práticos, ainda que se reconheça ter havido expressiva redução de gastos, foi o aumento das dificuldades para se conseguir um benefício previdenciário na seara administrativa.

Como consequência, houve, também, expressivo aumento das demandas judiciais em desfavor do INSS, que somente atendendo às requisições de pequeno valor exaradas pelos Juizados Especiais Federais, gastou aproximadamente R$ 2,6 bilhões no ano de 2004.9

Vê-se, portanto, que os argumentos utilizados para tentar justificar a necessidade de mudanças na Previdência Social decorrem da lógica neoliberal, mesmo porque facilmente contrastados com o quadro fático que indica uma situação completamente diferenciada.  Há que se reformar sim, mas de modo a permitir que um número bem maior de pessoas possam ser beneficiadas pela Previdência Social.

IV – A Lide Previdenciária – Aspectos práticos

Em se tratando de direito previdenciário há necessidade de que os magistrados tenham presente as regras de hermenêutica próprias, principalmente quando se está diante de tutelas de urgência, como liminares e antecipações de tutela.

É que, via de regra, o segurado que se encontra incapacitado não pode aguardar o desfecho de uma ação previdenciária, cuja delonga é por demais conhecida. Assim fazendo, estará ele colocando em risco sua própria vida, e não muitas das vezes obrigando-se a se adoentar ainda mais, eis que por necessidade irá trabalhar mesmo sem a mínima  capacidade laborativa.

Logo, necessário que o Judiciário lhe dê a efetiva tutela previdenciária, já que o INSS é deveras conhecido por sua prática de conceder alta médica muitas das vezes sem quaisquer critérios.  Na verdade, o que se vê é a realização de perícias médicas totalmente dissociadas da legalidade.  Quantos trabalhadores adoentados, flagrantemente incapacitados, são despejados no mercado de trabalho, como se aptos estivessem, devido a perícias mal feitas?  Quantos trabalhadores, vitimados por doenças ocupacionais, não tem seus benefícios enquadramento equivocadamente?

Basta que se analise o número de demandas previdenciárias que diariamente chegam ao Poder Judiciário para se concluir que o INSS simplesmente não cumpre seu papel institucional.

Logo, exige-se que o Poder Judiciário supra a omissão do INSS e possa, de forma rápida e concreta, garantir ao menos a subsistência do incapacitado, aplicando-se medidas judiciais urgentes e que, ainda que previstas fartamente na legislação, não muito raro são postergadas pela falta de subsídios mínimos que permitam ao magistrado deferi-las.

V – A Alta Médica Previdenciária – Presunção de legalidade do Ato Administrativo inexistente

Há um tormento nas lides previdenciárias que reclamam tutelas de urgência: a falta de subsídios “médicos” para elidir a decisão de alta concedida pela Previdência.

Por isso é de fundamental importância a utilização de profissional médico habilitado, que atuará antes de ajuizada a demanda – fazendo os relatórios médicos detalhados – e durante a tramitação do feito – no papel de assistente técnico quando da realização da prova pericial,  subsidiando o magistrado com informações minimamente detalhadas acerca dos diagnósticos e persistência de quadros incapacitantes.

São de suma importância os atestados e laudos médicos, bem como exames que comprovem – através de uma simples análise – a persistência da incapacidade para o trabalho. Diz-se “simples análise” porque havendo diagnóstico médico contrário ao da perícia, evidenciado por exames que atestem o agravamento ou a  persistência  da patologia, toma lugar um conflito entre duas decisões, uma do INSS e outra de profissional médico não ligado à previdência.

O Poder Judiciário terá que decidir, mas com qual delas ficar?  Com a do INSS, que por ser Ato Administrativo gozaria de “presunção de legalidade”?  Ou a do profissional médico não ligado à Previdência Social, pertencente a serviço público ou mesmo particular?

A resposta, em muitos casos, é que a “presunção” conferida ao Ato Administrativo se sobrepõe face ao Princípio da Legalidade do Ato Administrativo.

No entanto o Ato Administrativo não têm  que  obedecer somente à lei jurídica, posto que outros pressupostos devem ser sopesados, como a moralidade e sobretudo a sua finalidade.  Deve, ademais, haver a sua efetiva “motivação”, o que não ocorre nas concessões de altas médicas, já que a perícia sequer embasa o diagnóstico de capacidade, limitando-se a declará-lo sem fundamentação mínima alguma.

Em síntese, o controle jurisdicional não pode ser restrito somente ao exame da legalidade do ato administrativo; este deve se conformar, também, com o interesse coletivo, além de corresponder a vontade de não prejudicar outrem e de dar a cada um o que lhe pertence – princípios de direito natural já lapidarmente formulados pelos jurisconsultos romanos. Ainda assim, deverá ser motivado, sob pena de nulidade, tudo para que se alcance o fim institucional do Ato Administrativo, que nada mais é do que  o de concorrer pra a criação do bem-comum.

Portanto, tratando-se de perícia médica, como Ato administrativo que é, é incorreto dizer que a “presunção de legalidade” possa, de per se, sobrepor-se à diagnósticos firmados por outros profissionais médicos, sobretudo se presentes exames  e outros elementos indiciários da persistência da incapacidade.  Há que se considerar que  ali reina o interesse público decorrente da manutenção da dignidade da pessoa humana, e somente se houver motivação na alta médica poder-se-á garantir a presunção que emana do ato.

VI – A flexibilidade processual como meio de efetividade da decisão de urgência

É sabido que em casos que versem sobre benefícios de incapacidade, há a necessidade de que sejam tomadas medidas de urgência, eis que o direito a perecer, neste caso, pode ser o próprio direito à vida.

Assim cabe ao julgador, na busca do equilíbrio entre os direitos em litígio, decidir a respeito da prevalência de um sobre o outro, mas sempre pautando-se pelo princípio da equivalência dos interesses contrapostos. É que entre as posições contrapostas merece acolhida aquela que, não obstante desfrutar de elevada probabilidade, certamente sofrerá maiores dificuldades de reversão.

Sopesando-se os males que cada parte corre o risco de sofrer, merece maior proteção o pretenso direito de gozo do benefício, já que o sujeito de tal direito  teria maiores dificuldades de desconstituir a situação que se criaria com a manutenção de situação contrária, ou seja, com a negativa de gozo do benefício.

Colhe-se na jurisprudência, aliás, precedente que ilustra bem a questão:

“’Entre proteger a inviolabilidade do direito à vida, que se qualifica como direito subjetivo inalienável assegurado pela própria Constituição da República (art. 5°, caput), ou fazer prevalecer, contra essa prerrogativa fundamental, um interesse financeiro e secundário do Estado, entendo – uma vez configurado esse dilema – que razões de ordem ético-jurídica impõem ao julgador uma só e possível opção: o respeito indeclinável à vida’ (31.1.97, in DJU 13.2.97, Min. Celso de Melo negando, na espécie, o pedido de suspensão da medida liminar)” (TJ-SC, Apelação Cível n. 00.008472-7, Rel. Des. Francisco de Oliveira Filho).

Também no campo doutrinário cabe trazer a lição de Jorge Pinheiro Castelo, para quem10:

“No caso de direitos de conteúdo patrimonial com função patrimonial, de trato sucessivo, como é o caso de direito ao pagamento de prestações de caráter alimentar relativas a pensões, créditos decorrentes de acidentes ou trabalhistas, pagamento de seguro-saúde ou a morte do segurado, constata-se facilmente que a urgência da observância da tutela jurisdicional é inerente e própria da natureza da situação material a ser tutelada.  O provimento antecipatório de urgência de prestação pecuniária que determina o pagamento de prestação alimentar deixa devidamente evidenciada a adoção do método da ponderação de bens, com a eleição do bem e valor que se tutelará em sede de cognição sumária satisfativa, afastando num plano de meramente probabilidade e pelo critério da proporcionalidade o perigo da irreversibilidade da situação fática, ainda que possa existir o perigo da irreversibilidade fática no campo da tutela ordinária”

Portanto, falar-se de tutelas de urgência exige, no campo do Direito Previdenciário, flexibilizar as exigências normativas, adaptando a regra processual em face dos fins sociais a que ela se destina.

Assim, por exemplo, os requisitos11 da tutela antecipada, previstos no artigo 273, do CPC, devem ser interpretados à luz do direito à Dignidade da Pessoa Humana.

O Eminente Desembargador do TRF 4ª Região, Paulo Afonso Brum Vaz, bem elucidou tal pertinência, verbis:

Com efeito, sem embargo das necessárias cautela e ponderação na antecipação da tutela, para que não se periclitem os princípios do contraditório, da amplitude da defesa e do devido processo legal, erigidos à condição de cânones constitucionais, a possibilidade de o provimento antecipatório vir a causar prejuízo patrimonial à parte não deve constituir sério óbice à sua prolação, mormente quando o eventual desfalque possa ser diluído pela disparidade socioeconômico-jurídica existente entre autor e réu. Tenho para mim que o legislador ao reportar-se à “irreversibilidade do provimento antecipado” não cogitou da eventualidade de o provimento antecipatório vir a causar prejuízo patrimonial à parte que se submete aos seus efeitos, senão teria aludido a “prejuízo irreparável”. A irreversibilidade do provimento antecipado está relacionada com a tutela que assume laivos de definitividade, mesmo diante da sentença de improcedência do pedido. Seria o caso em que os efeitos do direito antecipado se incorporassem de tal forma ao patrimônio do beneficiado, de modo que o provimento definitivo não mais pudesse revertê-los, ou que se esgotasse o direito decorrente, em face do seu exercício.12

Assim, deve o rigor da lei ceder espaço à interpretação teleológica, mesmo porque os direitos constitucionalmente assegurados, dentre eles o direito à vida, à dignidade e à própria Previdência Social, em momento algum podem ser limitados quando presentes fortes indícios acerca da plausibilidade que impele a atuação jurisdicional como forma de garantir a plena efetividade da norma constitucional.

Conclusão

Do que foi aqui exposto pode-se concluir que sempre que se esteja em discussão a aplicação do Direito Previdenciário o Estado – através do Poder Judiciário – assume o dever de garantir a prevalência da justiça social, ainda que se faça necessário flexibilizar o rigor que a lei processual impõe, já que ao contrário de meros interesses patrimoniais particulares o que se discute em tais situações é a própria dignidade do cidadão, preceito maior que não pode ser relegado a segundo plano.

Notas
1 Jorge Luis Souto Maior., O Direito do Trabalho como Instrumento de Justiça Social, LTr, São Paulo, p.89.
2 Ib Iden.
3 José Afonso da Silva., Curso de Direito Constitucional Positivo, Malheiros, 1998.
4 O Benefício de Prestação Continuada da Lei Orgânica de Assistência Social apresentou um aumento de 32% em 2003 e de 27% em 2004, passando de R$ 3,4 bilhões em 2002 para R$ 5,8 bilhões em 2004. Em parte esse aumento é conseqüência da aprovação do Estatuto do Idoso, em 2003, quando a idade mínima para obtenção do benefício foi reduzida de 67 para 65 anos. Em 2004, as transferências explicitamente assistenciais somaram R$ 13,5 bilhões. Adicionando-se a isso o valor das aposentadorias e pensões rurais, podemos dizer que em 2004 as transferências de natureza assistencial envolveram recursos da ordem de R$ 37 bilhões, cerca de 19% do total das transferências monetárias realizadas pelo governo federal. Fonte: Relatório Orçamento Social do Governo Federal 2001-2004, cujo release pode ser encontrado em www.fazenda.gov.br/portugues/releases/2005/r020505.asp
5 A lei 8742/93 restringe o benefício aos idosos com mais de 65 anos e  deficientes  incapacitados para a vida independente, e ainda desde que a renda familiar seja inferior à ¼ do salário mínimo.
6 Essa parcela equivale, somente em 2004,  a R$ 6,9 bilhões, o que reduziria o chamado “déficit” anunciado para R$ 25,10 bilhões.
9 Ver: http://conjur.estadao.com.br/static/text/32402,1 acesso em 30.07.05.
10 Tutela antecipada na teoria Geral do Processo, Ltr, 1999, v. I, p. 333.
11 TUTELA ANTECIPADA. REQUISITOS. DEFERIMENTO LIMINAR. 1. Ainda que possível, em casos excepcionais, o deferimento liminar da tutela antecipada, não se dispensa o preenchimento dos requisitos legais, assim a ‘prova inequívoca’, a ‘verossimilhança da alegação’, o ‘fundado receio de dano irreparável’, o ‘abuso de direito de defesa ou o manifesto propósito protelatório do réu’, ademais da verificação da existência de ‘perigo de irreversibilidade do provimento antecipado’, tudo em despacho fundamentado de modo claro e preciso. 2. O despacho que defere liminarmente a antecipação de tutela com apoio, apenas, na demonstração do fumus bonis iuris e do periculum in mora malfere a disciplina do art. 273 do CPC, à medida que deixa de lado os rigorosos requisitos impostos pelo legislador para a salutar inovação trazida pela Lei nº 8.952/94. (STJ – Recurso Especial nº 131.853 S/C – 3ª Turma – Rel. Min. Carlos Alberto Menezes Direito)

 


 

Informações Sobre o Autor

 

Daniel Pestana Mota

 

Advogado, colaborador da Revista Nacional de Direito do Trabalho e da Revista Justiça do Trabalho, mestrando em Sociologia do Trabalho pela UNESP – Marília (SP)

 


 

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Equipe Âmbito Jurídico

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