Alienação parental – a figura do educador como agente inibidor na causa de afetação da criança e do adolescente

Resumo: Alienação Parental – A Figura do Educador como Agente Inibidor na Causa de Afetação da Criança e do Adolescente tem por finalidade uma reflexão acerca da atuação do educador no problema que atinge diretamente a criança e o adolescente decorrente da Alienação Parental, considerando a legislação vigente e relacionando o educador no exercício de seu ofício, tendo em vista seu contato direto com aqueles vitimados pela Alienação Parental. Tal discussão tem significativa relevância na sociedade brasileira principalmente após a entrada em vigor da Lei n.º 12.318, publicada em 26/08/2010, dispondo acerca do tema, considerando que o assunto tem repercussão geral e precisa ser amplamente debatido entre os pares na coletividade. Desta forma, a pesquisa abordará aspectos de interesse jurídico-social, dentro da temática proposta, principalmente porque envolve aspectos morais e sociais, atingindo diretamente aqueles que devem receber maior amparo dentre as pessoas da sociedade, sendo, inclusive, aqueles com proteção constitucional específica, sobretudo, cuidando este trabalho de analisar as normas legais, sem deixar de atentar para pontos polêmicos que repercutem diretamente no cotidiano das famílias brasileiras, observando também as diretrizes práticas e processuais para casos concretos.

Palavras-chave: alienação parental; educador; mediação; Lei n.º 12.318/10; criança; adolescente.

Sumário: Introdução. 1. Família e a alienação parental. 1.1 Alienação parental e sua relação com a família. 1.2 O conceito de família. 1.3 O conceito de família no contexto social. 1.4 Natureza jurídica da família. 1.5 Garantias legais da família. 2. A proteção normativa para criança e adolescente. 2.1 A Proteção do menor em evidência no Brasil com o advento do Estatuto da Criança e do Adolescente cumprindo a Constituição Federal de 1988. 2.2 O desenvolvimento saudável como um direito fundamental. 3. Alienação parental. 3.1 O que é alienação parental? 3.2 Diferença entre alienação parental e Síndrome de Alienação Parental. 3.3 Possíveis protagonistas da alienação parental. 3.4 Guarda unilateral do filho e a alienação parental. 3.5 Aspectos gerais da proteção legal contra alienação parental. 4. A figura do educador. 4.1. Conceito de educação, educador e o núcleo social a que se aplica. 4.2. A relação entre educador e a criança ou adolescente. 5. Práticas de mediação possíveis pelo educador. Considerações finais. Referências.

INTRODUÇÃO

Existe possibilidade de uma pessoa na atribuição de educador atuar como sendo um agente inibidor frente aos males causados à criança e ao adolescente pela Alienação Parental? É possível que o educador dispondo de conhecimento do tema, da atual legislação e dos instrumentos processuais consiga contribuir para uma sociedade melhor atuando contra a prática da alienação parental, diante desta infeliz realidade?

Ao longo da história, é sabido que homens e mulheres sentem necessidades que os obrigam em viver coletivamente, buscando relacionamento afetivo para satisfazer suas emoções, sendo uma delas a de coabitação. Há uma frase muito utilizada no campo da sociologia afirmando que “O homem é um ser social”. Essa afirmação vem de tempos remotos, tendo origem no século IV a.C. e segundo o professor Dalmo de Abreu Dallari, que menciona em sua obra Elemento da Teoria Geral do Estado essa conclusão de Aristóteles, bem como seu seguidor na era medieval, Santo Tomás de Aquino, que, por sua vez, declarava que “o homem é, por natureza, animal social e político, vivendo em multidão…” (Dallari, 2003, p. 10). De fato, o ser humano não consegue viver sem que exista uma comunidade, e foi isso o que buscou na formação do Estado. Dallari também cita o italiano Oreste Ranelleti, que diz: “Onde quer que se observe o homem, seja qual for a época, mesmo nas mais remotas a que se possa volver, o homem é sempre encontrado em estado de convivência e combinação com os outros, por mais rude e selvagem que possa ser sua origem” (Dallari, 2003, p. 11).

O convívio por meio da formação do Estado ou por ter o homem natureza social, somente mostra que o ser humano tem esta necessidade de conviver com seu semelhante. As pessoas inseridas na coletividade refletem esta necessidade de convivência por meio da formação de um núcleo familiar, assim, é prioritariamente através da família que o indivíduo inicia seu convívio social, tendo em vista que uma sociedade, em regra, é formada por várias famílias. Portanto, relevantes apontamentos entre família e alienação parental serão observados neste trabalho.

Nesse ponto, se direciona o contexto desta pesquisa para se pensar qual a origem do mal resultante da alienação parental. Habitar em comum com uma ou algumas pessoas é o que acontece com a maioria dos indivíduos em todos os tempos e em todo o mundo, pois a estrutura física e mental do ser humano o obriga a expor os sentimentos da alma relacionados com a vida afetiva. Não somente o ser racional desenvolve essa capacidade de compartilhar o convívio, mas, também, se observa na natureza espécies que assim o fazem por meio de instinto, mostrando que a necessidade de se relacionar e conviver coletivamente ou agrupados, ainda que em um núcleo reduzido de seres é uma necessidade sempre presente.

Para o ser humano, ao longo da evolução histórica, essa necessidade de coabitação, essencialmente nos relacionamentos interpessoais e familiares obrigou assim como em outras áreas da vida, ao estabelecimento de regras sociais, inclusive repressivas como se verá neste trabalho quando tratarmos da Lei que dispõe sobre a alienação parental, tudo com a finalidade de estabelecer direitos e deveres individuais dentro do convívio social, bem como normatizar a forma de constituição e extinção das relações afetivas e familiares entre os indivíduos. Também normas oriundas dos direitos e obrigações que envolvem a prole decorrente daquela relação afetiva existente entre as pessoas. Assim, o desenvolvimento deste artigo científico propõe uma reflexão sobre as causas de afetação da alienação parental e possível atuação do educador como agente inibidor, considerando aspectos norteadores do tema, tais como: formação e conceito da família, relação com a sociedade, sua natureza jurídica e garantias legais.

Nesse prisma, estudou-se sobre a proteção do menor no Brasil, considerando o ordenamento jurídico vigente, especialmente na Constituição Federal e Estatuto da Criança e do Adolescente, tecendo considerações quanto a direitos fundamentais da criança e do adolescente, buscando sempre a dignidade da pessoa humana.

Como tema central o leitor neste trabalho terá contato com a Alienação Parental, seu conceito, a diferença entre a alienação e a Síndrome da Alienação Parental, os potenciais protagonistas da Alienação Parental, bem como a proteção legal existente e normatizada.

Paralelamente será possível se debruçar neste trabalho sobre a figura do educador no Brasil, partindo educação como instrumento de transformação de conduta social, apresentando em seguida o conceito de educador e o núcleo social no qual este ofício é encontrado. Ainda sobre o educador, o leitor encontrará uma reflexão acerca de sua relação com a criança e o adolescente, além do alcance da responsabilidade social do educador.

Por derradeiro o presente trabalho apresentará possíveis práticas permitidas ao educador na sua incumbência social de mediação como agente capaz de inibir a prática da alienação parental.

Alienação Parental – A Figura do Educador como Agente Inibidor na Causa de Afetação da Criança e do Adolescente, terá a finalidade de trazer diante da abordagem do tema por doutrinadores e estudiosos do tema, uma reflexão com o fim de contribuir para a reflexão e debate, visando o aprimoramento da sociedade.

1. FAMÍLIA E A ALIENAÇÃO PARENTAL

Improvável pensar em sociedade com todas as suas regras de convivência estabelecidas, seja qual for a vertente do estudo, ciências sociais, humanas, econômicas etc., sem que lancemos mão do eixo estrutural, pilar basilar de qualquer sociedade, em qualquer tempo, que é a família.

Carlos Roberto Gonçalves aponta a família como sendo uma “realidade sociológica”, afirmando que esta é o alicerce do Estado e o “núcleo fundamental em que repousa toda a organização do social” A família protegida pelo Estado como se verá mais adiante neste trabalho é considerada como instituição necessária e sagrada, possuindo variação quanto ao conceito a ser empregado (GONÇALVES, 2013, p. 17).

1.1 Alienação parental e sua relação com a família

A necessidade de conceituar e trazer aspectos gerais sobre a família neste trabalho é justamente porque a alienação parental está intimamente ligada a este instituto. É certo que somente existirá alienação parental se houver família. Haverá possível atuação do educador em desfavor dos atos de alienação parental caso exista família, em contrário, inexistindo família, logo não haverá alienação parental.

Os prejuízos de natureza psicológica produzidos na criança ou no adolescente pelos atos de alienação parental ocorrem exclusivamente por meio de ações praticadas dentro do núcleo familiar, seja no dizer de Paulo Nader, de pessoas da “pequena-família” (pais e filhos) ou, ainda, da “grande-família” (pais, filhos e demais parentes). Isto porque, ato de alienação parental pode ser promovido, como será abordado em título próprio, por qualquer dos genitores da criança ou do adolescente, bem como pelos avós ou por aquele que detenha a autoridade, guarda ou vigilância.

Portanto, a alienação parental está intimamente ligada aos vínculos familiares, justificando-se aqui a necessidade de discorrer acerca deste importante instituto que é a família.

1.2 O conceito de família

Apesar de se tratar de um instituto com imensa repercussão na sociedade, ousar conceituar família é consideravelmente arriscado, podendo se cometer equívocos e, até mesmo, aferir valor mínimo àquele que, de certa forma, é um dos maiores pilares existentes na sociedade em todos os tempos. Segundo Nader, a dificuldade em se conceituar este instituto decorre da complexidade que permeia a ideia de família, inclusive, levando em consideração a “evolução dos costumes” (NADER, 2010, p. 03). Por outro lado, impossível falar de alienação parental ou de qualquer outro assunto que envolva relações afetivas sem que possa apresentar ainda que discretamente como aqui se faz, o conceito de família.

Nos ensinamentos de Nader, encontramos para família, o conceito a seguir:

“…família é uma instituição social, composta por mais de uma pessoa física, que se irmanam no propósito de desenvolver, entre si, a solidariedade nos planos assistencial e da convivência ou simplesmente descendem uma da outra ou de um tronco comum.”

Ao conceituar mencionado instituto, o ilustre doutrinador ainda estabelece uma divisão entre “grande-família” e “pequena-família”, esclarecendo que a primeira diz respeito àquelas relações advindas do casamento e mais recentemente pelas uniões estáveis, e a derradeira se trata de uma formatação composta entre pai, mãe e filhos (NADER, 2010, p. 3), composição esta que, com o advento do reconhecimento da união homoafetiva pode ser composta simplesmente de pais (como gênero) e filhos.

Um conceito apresentado no Dicionário Jurídico para família é: “Sociedade matrimonial composta pelo marido, mulher e filhos.” (PAULA, 2007, p. 110). Nesse diapasão, família, no sentido restrito da palavra, é a união matrimonial entre pessoas que se entrelaçam afetivamente, dispostos a viver uma vida em comum, partilhando dos mesmos ideais e projetos, agregando-se a essa instituição os filhos, que viverão sob a tutela dos pais até que alcancem maioridade ou a emancipação, com independência para constituírem seu próprio núcleo familiar. Porém, há que observá-la de igual modo em sentido amplo, pois nesse contexto a palavra família, além dos indivíduos mencionados no sentido restrito, agrega aqueles que desta união descendem ou ascendem, observado o tronco ancestral comum, bem como os agregados por adoção, ou ainda, constituídos durante essa união, porém fora dela, conhecida também como parentela.

Não é plausível limitar a conceituação de família, uma vez que ela oferece vários caminhos para sua compreensão. Nem a Constituição Federal ou o Código Civil a definem, não existindo assim, uma identidade conceitual para o Direito, nem mesmo para a Sociologia e a Antropologia. Mas é um fenômeno que ultrapassa tais áreas do conhecimento, oscila no tempo e no espaço, e seu conceito é compreendido de forma diferente nos diversos ramos do direito. Aliás, difícil considerar família conceituada a partir da formação entre “homem” e “mulher”, tendo em vista que a sociedade brasileira já evoluiu, seja socialmente ou no aspecto normativo, no sentido de ampliar mencionada conceituação, inserindo, igualmente neste grupo de formação familiar aquelas famílias estabelecidas a partir das relações homoafetivas ou monoparentais, pelo que se torna ainda mais extensa mencionada compreensão do conceito. Tal é a amplitude da família que já existe também decisões em nossos Tribunais no sentido de considerar como núcleo familiar, em condição bem específica, como, por exemplo, no instituto da “inalienabilidade do bem de família”, a existência de família como sendo composta por uma só pessoa, ou seja, no Brasil, para fim de preservação de patrimônio diante de possível execução judicial, aquela pessoa que vive “sozinha”, sem parentes, mas que possui, por exemplo, moradia própria, resta tal moradia impenhorável porque se trata de “bem de família”, embora a “família”, neste caso, seja a pessoa com ela mesma.

Ainda, a exemplo dessa diferenciação tem-se que o conceito de família para o direito penal não é o mesmo no direito tributário. Nas diversas legislações, em diferentes povos e mesmo em diferentes ramos do direito dentro de um mesmo ordenamento, o conceito de família pode ser completamente distinto. No Brasil, a exemplo da Lei n.º 8.245/1.991 (Lei do Inquilinato), alarga-se o conceito no que se diz respeito a aspectos econômicos, quando trata de proteger como sucessores do locatário as pessoas residentes no imóvel que porventura vivam sob sua dependência econômica (art. 11, I), em detrimento de restringir o alcance do conceito de família apenas aos pais e filhos (art. 47, III).

Outro exemplo semelhante envolve o Direito Tributário, quando trata da Declaração de Imposto de Renda de Pessoa Física, na qual o declarante pode incluir como dependente o companheiro(a), mas não pode deduzir como dependentes a prole desse companheiro(a) advinda de relacionamento anterior que eventualmente viva sob sua responsabilidade sem a guarda judicial, mas pelo declarante, são afetivamente considerados na maioria dos casos como um membro de sua família.

Não obstante, nota-se a disposição legal que garante a impenhorabilidade do bem de família, como abordamos a pouco, ao relatar da família formada por apenas uma só pessoa, garantia assegurada pela Lei n. 8.009/90 (bem de família), que, dentre outras questões, trata de resguardar o imóvel residencial próprio do casal ou da entidade familiar, não respondendo tal patrimônio por qualquer tipo de dívida civil, comercial, fiscal, previdenciária ou equiparada que, porventura, tenha sido adquirida pelos cônjuges, pais ou filhos, que sejam proprietários e nele residam, portanto, a impenhorabilidade é oponível em qualquer processo de execução, guardada as devidas exceções, taxadas no art. 3° da referida lei. Nesse prisma, segue recente jurisprudência, por meio da súmula 364, do Superior Tribunal de Justiça, que alcança também aqueles imóveis de propriedade de pessoas solteiras, separadas e viúvas. “O conceito de impenhorabilidade de bem de família abrange também o imóvel pertencente a pessoas solteiras, separadas e viúvas.” (STJ, Corte Especial, j. 15-10-2008, DJU 03-11-2008).

Importante ressaltar que no Brasil as relações privadas como aquelas decorrentes da família são em sua grande maioria reguladas a partir de específico ramo do direito, qual seja, o Direito Civil, que, regra geral, considera família numa definição mais restrita, sendo membros da família aquelas pessoas unidas por relação conjugal ou de parentesco. Muito embora a instituição família possua outros valores que a norteiam como as relações patrimoniais, o forte conteúdo social e moral, como se introduziu anteriormente é absolutamente dominante neste tema, sendo o casamento e mais recentemente a união estável os dínamos propulsores desta instituição. Neste contexto Venosa (2007, p. 2) define família em conceito amplo e restrito:

“… a família em conceito amplo, como parentesco, ou seja, o conjunto de pessoas unidas pelo vínculo jurídico de natureza familiar. Nesse sentido compreende os ascendentes, descendentes e colaterais de uma linhagem, incluindo-se os ascendentes, descendentes e colaterais do cônjuge, que se denominam parentes por afinidade ou afins. Nessa compreensão, não se inclui o cônjuge, que não é considerado parente. Em sentido restrito, família compreende somente o núcleo formado por pais e filhos que vivem sobre o pátrio poder familiar”.

Deve-se observar também a positivação na Carta Magna para o direito de família, esta em sentido restrito, nos casos em que o poder familiar é regido apenas por um dos pais, conforme descreve o artigo de Lei: Art. 226, § 4º: “Entende-se, também, como entidade familiar a comunidade formada por qualquer dos pais e seus descendentes.”

Uma pergunta pertinente, neste momento, sobre o conceito de família permite aprofundar o estudo, sendo a indagação acerca daqueles que vivem sob o mesmo teto, unidos por algum laço afetivo, porém sem as figuras do poder familiar e do vínculo conjugal ou matrimonial. Esse grupo de pessoas é considerado como sendo uma “família”? Dentro de um conceito sociológico, esse grupo pode perfeitamente ser considerado como família, na qual tais indivíduos optaram por viver sob a autoridade de um titular. Referindo-se ao Digesto por Ulpiano, que apresenta a clássica posição do paterfamilias, do Direito Romano, Sílvio S. Venosa (2007, p. 2) exemplifica essa forma de família, reconhecida pelo legislador, ao citar o art. 1.412, § 2º, do Código Civil, que diz: “As necessidades da família do usuário compreendem as de seu cônjuge, dos filhos solteiros e das pessoas de seu serviço doméstico”.

O que se vê atualmente nas famílias de origem em civilizações ocidentais, nas regiões urbanizadas, é que não se cultua mais a ideia de poder, nas quais o patriarca ou quem em seu lugar, tinha suas vontades como a soberana em relação aos demais, sobressaindo, pois, à vontade individual de cada membro da família, que, no conjunto, iguala-se aos direitos familiares, logo, a ideia de pátrio poder já se torna obsoleta e em desuso nesta sociedade moderna.

Como observado anteriormente, por ser a família base da sociedade, logo, antes de ser um fenômeno jurídico, é um fenômeno sociológico, e, por essa razão, sofre várias mutações na medida em que a sociedade avança, alterando muitas vezes seu conceito, compreensão e a extensão. Com o avanço da mentalidade urbanizada, da globalização, demonstrada principalmente pelos meios de comunicação, o conceito de família distanciou-se muito das civilizações do passado. No rol de civilizações mais importantes do passado, segundo aponta Sílvio S. Venosa (2007, p. 3) há a assíria, hindu, egípcia, grega e romana, nas quais o conceito envolvia a família como uma instituição larga e com critérios de hierarquia. Relatos dão conta de que em determinadas civilizações do passado, no estado primitivo, os grupos familiares tinham relações sexuais entre todos os membros que faziam parte da determinada tribo (chamada de endogamia), permitindo até mesmo se afirmar que o início da família apresentava caráter matriarcal, uma vez que somente era possível conhecer a mãe da criança que ficava junto a ela, alimentando e educando-a. Posteriormente, em razão das disputas tribais, carência de mulheres, e ainda, uma possível inclinação natural, os homens foram obrigados a se relacionarem com mulheres de outras tribos. Avançando um pouco mais, encontrar-se-á a condição de homens optando pelo aspecto da exclusividade, ou seja, de se relacionar apenas com uma só mulher, muito embora, em determinadas sociedades como as de origem oriental, adeptas da religião mulçumana, hoje, ainda é considerada normal a poligamia. Por fim, segundo Sílvio de S. Venosa, este contexto resultou na organização que se tem hoje de forma predominante, qual seja, a monogâmica (2007, p. 4).

Essa organização social traz como enfoque o poder patriarcal, ou seja, o homem como sendo o responsável por guardar e manter a sua prole, inclusive, no que diz respeito ao aspecto econômico, onde o homem lidera seus filhos no trabalho familiar, seja na lavoura, seja com oficinas nos fundos de suas casas, persistindo assim até o período da Revolução Industrial, que aconteceu entre os séculos XVIII e XIX, iniciado nos Estados Unidos da América e Europa. Como se percebe, a base de indivíduos que dão formação à família (pais e filhos), não se alterou muito, porém, pode-se sentir a diferença nas finalidades, composição e função de pais e mães, por exemplo.

Em civilizações orientais, nos primeiros anos da era cristã, é sabido que os filhos eram educados pela mãe e trabalhavam com o pai, aprendendo assim seu respectivo ofício, de modo que, em determinados grupos sociais, a maioridade se atingia quando o indivíduo completava trinta anos. No entanto, atividades escolares, esportivas e recreativas acabam por preencher o tempo dos filhos que originalmente eram de responsabilidade dos pais. E o que falar dos ofícios, outrora passados de pai para filho? Os filhos adentram os portões do colégio, ingressam na universidade e é nesse ambiente que se decide, por vezes, sem interferência dos pais, a profissão ou o ofício que pretenderam trilhar. Atualmente, educação formal é dever do Estado, pelo que, o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), Lei 8.069/90, em seu art. 22, estabelece a obrigação dos pais, quanto ao sustento, guarda e educação dos filhos, devendo os pais encaminhá-lo para a tutela do Estado, no aspecto desta forma de educação.

A influência no seio da família pelas transformações sociais não pararam, pois, com a Revolução Industrial, o homem vai para a fábrica, a mulher lança-se para o mercado de trabalho, até que, no século XX, o papel da mulher, no que diz respeito à família, sofre consideráveis alterações. Sob muitas opressões e discriminação, a mulher conquista em muitas legislações, direitos semelhantes aos adquiridos anteriormente pelos homens. Os filhos agora passam a maior parte do tempo em atividades fora do lar. Ocorre também o fenômeno da longevidade em decorrência das melhores condições de vida, permitindo assim, a convivência de diversas gerações na família e no grupo social.

Diz a respeito da instituição família, de forma conservadora, o jurista Eduardo Espínola (2001, pp. 15 e 16):

A despeito das críticas e das vicissitudes que, em alguns períodos da história, e ainda recentemente, lhe têm posto a prova os alicerces, a família subsiste, e é considerada em todos os países e em todos os sistemas legislativos como instituição necessária, cercada no momento atual da civilização, de favores inspirados pela religião e pela moral e aos quais a lei confere garantia coercitiva.”

Menciona, ainda, o renomado doutrinador as palavras de Pietro Cogliolo: “Quando vejo um Código Penal punir quem perturba a paz das famílias, posso reconhecer nisso um crime que não corresponde às exigências da técnica jurídica, mas posso também e devo reconhecer a alta tutela da moralidade pública.”

1.3 O conceito de família no contexto social

 Pode-se afirmar que a família é um fenômeno social, presente no tempo e no espaço e, desde os tempos mais remotos, verifica-se a existência desta instituição. Não se pode falar em sociedade sem versar sobre a família, pois a primeira não existe sem a segunda. Por ela se inicia a habitação em comum e o relacionamento entre pessoas dentro e fora do seio familiar. Nos tempos modernos, a família encontra proteção do próprio Estado que lhe assegura direitos e estabelece obrigações a seus indivíduos, muito embora, à margem da lei, se vislumbra a guarida da família na moral, nos costumes e nos dogmas da religião.

Por mais que a sociedade tenha evoluído em determinadas áreas, inclusive quanto ao conceito da instituição família, muitos indivíduos procuram resguardá-la dessas mudanças, optando por fixar, ainda, os padrões tradicionais para si e seus descendentes fundamentando tal atitude na moral.

Outros, ainda, sustentados pelo credo religioso, não abrem mão de manter intocável este pilar da sociedade, sem mesmo alterar quaisquer “princípios” que norteiam essa sagrada instituição. Outrossim, em casos isolados, vê-se até mesmo aqueles que, firmados nesta fé, repudiam outras pessoas da mesma sociedade que não pactuam do mesmo pensamento em relação à família, o que deve ser considerado como atitude pouco salutar, uma vez que o indivíduo foi criado sob a tutela do livre-arbítrio, podendo não somente pensar como queira, mas, sobretudo, agir conforme aquilo que lhe aprouve, não isentando-o obviamente, das consequências de atos praticados, sejam eles bons ou ruins.

Mas, dentro deste contexto e para se fixar melhor a ideia de família, é conveniente apresentar breve relato sobre os primórdios que ilustram a instituição família, extraído da Bíblia Sagrada.

Numa vertente cristã, uma das primeiras famílias que se pode encontrar na história é apresentada neste livro épico, tendo como precursores Adão e Eva, personagens bíblicos que viviam maritalmente no Jardim do Éden. A palavra Éden quer dizer “mundo”, ou seja, Adão e Eva exerciam seu convívio familiar num local reservado a eles como família (no jardim do mundo). O Livro de Gênesis (primeiro livro da Bíblia) descreve que a humanidade teve início a partir de Adão, mencionando após ele, o desenvolvimento de outros núcleos familiares. Como dado estatístico em relação ao tempo, encontram-se relatos que a terra possui 4,5 bilhões de anos e que o homem foi criado há cerca de 6.000 anos, muito embora não seja possível precisar essas datas, é possível se notar que essa instituição percorre por muito tempo as sociedades.

Fato é que, desde a criação do ser humano a família era constituída como é nos tempos modernos para alguns doutrinadores, ou seja, pais e filhos, assim, Adão e Eva, com seus filhos Caim, Abel e Sete, sendo exemplo de constituição de família nos tempos primórdios. Caim foi o primeiro membro desta família a se desvencilhar e constituir seu próprio núcleo famíliar longe de seus pais. Nos primórdios, várias civilizações, então chamadas tribos, foram se desenvolvendo e que, por meio delas, foram construídas as primeiras cidades pelos homens, bem como os primeiros sistemas de agricultura, utilização dos recursos naturais e as artes. Por todo exposto, nota-se que o eixo central do desenvolvimento social desde os tempos mais remotos é a família.

Salutar ressaltar ao leitor que, sendo o enfoque deste trabalho a Alienação Parental e que suas causas e consequências decorrem do núcleo familiar, é importante frisar que a família não é constituída apenas pelo “casamento”, mas, também pela “união estável”, podendo-se, inclusive, dizer que esta última é mais antiga que aquela, considerando o relato da escritora Ana Cláudia S. Scalquette (2008, p. 1), “A união de fato entre duas pessoas de sexos diferentes nasceu com o surgimento da família.” Sem necessidade de regularização legal, duas pessoas decidiam partilhar suas vidas com objetivos comuns. O casamento vinculou-se da constituição da família como uma regularização legal, ou seja, com a formalização, aqueles que procuravam ter uma habitação comum, viver entrelaçados pelo vínculo afetivo, precisavam passar por essa solenidade para serem reconhecidos pela sociedade como casal, atendendo assim, às exigências impostas e podendo ser considerados como núcleo familiar. De outra forma, os que optavam por não solenizar seu convívio, enquadravam-se no princípio da ilegitimidade, sendo legal, apenas a família constituída por meio da solenidade, sendo a celebração do casamento ou a formalização legal. Neste diapasão, importante fixar que o casamento e a união estável, no Brasil não podem mais considerar exclusivamente aquelas uniões entre casais heterossexuais, porquanto nas recentes decisões dos Tribunais, tanto o instituto da união estável, quanto o casamento, foram estendidos legalmente para casais homoafetivos que, igualmente, detém o poder de constituição de família, sem isenção dos riscos da prática prejudicial de afetação da Alienação Parental.

1.4 Natureza jurídica da família

A família, por mais poder que exerça sobre seus membros e a sociedade, não possui personalidade jurídica, nem também se trata de organização persofinicada, detentora de direitos e obrigações, muito embora, no passado, defendeu-se a ideia de que a família constituía uma pessoa jurídica. O fundamento para tal inclinação baseava-se em ser ela possuidora de direitos extrapatrimoniais, a exemplo do nome, pátrio poder, propriedade de bem de família, sepulcros, etc., o que se torna insustentável, dada a falta de assertiva do conceito.

Não pode ser a família uma pessoa jurídica, porque além de não possuir autonomia para adquirir para si direitos e obrigações, não consta do rol taxativo do art. 44 do Código Civil, cujo teor é apor quem são as pessoas jurídicas de direito privado. Outrossim, são-lhe outorgados por meio de seus respectivos membros direitos e obrigações, exercidos em nome da família ou ainda, por ser representação dela. Os chamados direitos subjetivos que, porventura, estejam ligados à família, como por exemplo: o nome, o poder familiar (que pelo novo Código Civil substituiu o pátrio poder), a defesa da memória de seus mortos, nada mais são do que direitos que devem ser exercidos pelos respectivos membros da família. Por exemplo, em caso de ofensa moral à memória de um membro da família falecido, seja por calúnia ou difamação, em processo de ação de indenização por reparação de danos, no qual se indenizou pecuniariamente a memória, fará jus aos direitos a família, representada por seus membros que usufruirão, cada qual o seu quinhão. Portanto como escreve Sílvio S. Venosa (2007, p.7) “A família nunca é titular de direitos. Os titulares serão sempre seus membros individualmente considerados.”

De igual modo, também se defendeu ser a família um organismo jurídico, o que não procede, pois, como se pôde analisar anteriormente, a família é o berço da sociedade, portanto apresenta-se como sendo um dado sociológico e biológico de caráter natural, que com o advento do Estado, é por ele reconhecido, ou seja, antes de existir o fenômeno jurídico, já existia a família.

Por fim, a doutrina majoritária vê a família como uma instituição. Essa teoria foi enunciada na França por Maurice Hauriou, como ainda um conceito vago e impreciso, porém desenvolvida posteriormente. Uma instituição, segundo Venosa, deve ser compreendida como uma forma regular, formal.

No campo da sociologia, afirma Venosa que a família é entendida também como instituição permanente e integrada de pessoas de diferentes sexos que se unem por vínculos de afetividade. Logo, por ser o direito uma ciência social, este assim a reconhece, bem como a regulamenta (2007, p. 8).

No estudo das pessoas jurídicas, encontram-se entidades com características morais, porém sem personalidade, visto que lhes faltam requisitos imprescindíveis, são assim denominadas: entidades de grupos com personificação anômala, como são os casos da massa falida, a herança jacente e o espólio, incluindo-se neste grupo a família, guardadas as devidas proporções, pois a família, em detrimento das demais entidades não personificadas, que há pouco se mencionou, não possui nem mesmo representação processual, uma vez que os membros da instituição família é quem exercem tal atividade.

1.5 Garantias legais da família

Por ser a família uma instituição de tal magnitude e importância na sociedade, obviamente que não poderia estar à margem da segurança jurídica, dada sua influência direta e permanente na vida dos indivíduos, inclusive para regular as questões atinentes à alienação parental que envolve a relação entre os pais e seus filhos menores. Direta porque, antes mesmo de o indivíduo nascer, ou seja, desde a concepção, dela já passa a fazer parte, sendo essa a primeira instituição da qual fará parte, nela permanecendo, tendo em vista que, suas atitudes, forma de vida, pensamentos, posicionamento em relação à sociedade, trarão consequências não somente para si, mas aos que fazem parte de seu grupo familiar. Dessa forma, não haveria no Brasil mais acertada positivação para assegurar direitos e obrigações à família do que a encontrada atualmente, quando o legislador constituinte gravou na Constituição Federal garantias a tal instituição, muito embora encontrar-se-á regulamentação e normas em outros diplomas legais, como é o caso da Lei n. 10.406, de 10 de janeiro de 2002, o vigente Código Civil. Enfatiza-se ainda a assertiva, porque a Constituição Federal é o ponto mais alto do Sistema Jurídico, contendo todas as normas fundamentais de um Estado, não sendo permitida, regra geral, a aplicabilidade de quaisquer normas inconstitucionais, portanto, é a lei fundamental da organização jurídica de um Estado, normatizando e delimitando os poderes políticos e dentre outras atribuições, tratando das formas de estado e de governo, do sistema de governo, do modo de aquisição, exercício e perda de poder político, e dos principais fundamentos da ordem econômica e social, das quais a instituição família se enquadra.

Sílvio S. Venosa (2007, p. 7) afirma que:

“Em nosso país, a Constituição de 1988 representou, sem dúvida, o grande divisor de águas do direito privado, especialmente, mas não exclusivamente, nas normas de direito de família. O reconhecimento da união estável como entidade familiar (art. 226, parágrafo 7º), representou um grande passo jurídico e sociológico em nosso meio”. (grifo nosso)

Portanto, não haveria lugar melhor na organização jurídica, para positivação de suas garantias estando a família próxima das garantias constitucionais da dignidade da pessoa humana, da igualdade entre as pessoas, dentre outras.

O legislador constituinte originário reservou o artigo 226 da Constituição Federal para estabelecer fundamentos, nos quais, leis infraconstitucionais que regulam a matéria baseiam-se, inclusive, aquelas que dispõem sobre o Estatuto da Criança e do Adolescente (Lei n.º 8.069/90) e sobre a Alienação Parental (Lei n.º 12.318/2010). Portanto, faz-se necessária menção do referido artigo de nossa Magna Carta na íntegra, uma vez que essa positivação é a principal base para as demais normas que regulam a matéria:

“Art. 226. A família, base da sociedade, tem especial proteção do Estado.

§ 1.º O casamento é civil e gratuita a celebração.

§ 2.º O casamento religioso tem efeito civil, nos termos da lei.

§ 3.º Para efeito da proteção do Estado, é reconhecida a união estável entre o homem e a mulher como entidade familiar, devendo a lei facilitar sua conversão em casamento.

§ 4.º Entende-se, também, como entidade familiar a comunidade formada por qualquer dos pais e seus descendentes.

§ 5.º Os direitos e deveres referentes a sociedade conjugal são exercidos igualmente pelo homem e pela mulher.

§ 6.º O casamento civil pode ser dissolvido pelo divórcio, após separação judicial por mais de um ano nos casos expressos em lei, ou comprovada separação de fato por mais dois anos.

§ 7.º Fundado nos princípios da dignidade da pessoa humana e da paternidade responsável, o planejamento familiar é livre decisão do casal, competindo ao Estado propiciar recursos educacionais e científicos para o exercício desse direito, vedada qualquer forma coercitiva por parte de instituições oficiais ou privadas.

§ 8.º O Estado assegurará a assistência à família na pessoa de cada um dos que a integram, criando mecanismos para coibir a violência no âmbito de suas relações.”

 Como a Constituição Federal apresentou em seu bojo a normatização, coube ao Código Civil regulamentar as regras de direitos e obrigações pertinentes à família, que o fez reservando o Livro IV, da Lei n. 10.406/2002. O direito de família está nos artigos de 1.511 a 1.783, divididos em dois títulos, sendo eles: “O Direito Pessoal e o Direito Patrimonial”. Sendo esse trabalho sobre a alienação parental e não sobre todo o direito de família, a delimitação será tão somente a de informar a localização do assunto família no mencionado diploma legal, sem deixar de utilizar, no que couber, as referências ali expostas quando necessárias no decorrer dos assuntos aqui tratados.

2. A PROTEÇÃO NORMATIVA PARA CRIANÇA E ADOLESCENTE

O surgimento da sociedade e seu desenvolvimento trouxeram a necessidade de se estabelecerem regras de conduta para o viver em coletividade. Assim, os direitos e deveres impostos ao indivíduo se originam da construção evolutiva do convívio social. Estes direitos e deveres se exteriorizam por meio de normas decorrentes de um conjunto de regras que objetivam disciplinar a convivência social humana. Por sua vez, o conjunto de regras obrigatórias a que se sujeita o indivíduo possui um “alvo” a ser atingido, qual seja, a “paz social”. Estudiosos defendem que a paz social somente se torna o foco quando as regras e sua aplicabilidade possuem um elemento primordial chamado “Justiça”, ou seja, quanto maior a sensação de justiça impetrada em determinada coletividade, menor serão os distúrbios vivenciados pelo descumprimento de normas ali fixadas.

Segundo Paulo Dourado Gusmão há certa confusão praticada por filósofos, políticos, literatos e também por alguns juristas ao relacionarem o direito e a justiça. De fato, são duas necessidades distintas que não podem se confundir. Afirma GUSMÃO que o direito é “o veículo para a realização da justiça”, sendo a justiça “a meta da ordem jurídica”.

O entendimento da ideia de justiça para os ocidentais se baseia nos filósofos Platão e Aristóteles que deram um sentido ético e formal, bem como dos juristas romanos constituindo o sentido jurídico e material (GUSMÃO, 2008, p. 73).

Em síntese é possível afirmar que “justiça é igualdade de tratamento jurídico, bem como a proporcionalidade da pena ao delito, da indenização ao dano, do preço à coisa vendida, da prestação à contraprestação, etc…” (GUSMÃO, 2008, p. 74).

Cuida-se de tratar os iguais de formal igual e os desiguais de maneira desigual. Dentro deste contexto e nessa fundamentação é que surge a proteção da criança e do adolescente por meio de normas específicas emanadas do ordenamento jurídico. Ao mesmo tempo que é preciso condicionar direitos igualitários entre os pares da mesma coletividade, a exemplo: direitos iguais ao adulto e à criança, é necessário que o tratamento, neste exemplo, seja desigual para que se possa alcançar a igualdade de direitos, considerando a condição de vulnerabilidade dos menores.

Vejamos outros exemplos, a título de fixação: a) prioridade do atendimento de pessoas com mais de 60 anos; b) assentos exclusivos aos portadores de necessidades especiais; c) licença maternidade remunerada à gestante; d) programas assistenciais de governo aos menos favorecidos, dentre outros exemplos.

A partir dos exemplos apresentados, compreende-se a necessidade de tratamento diferenciado ao menor que resulta na busca da Justiça. O mencionado tratamento desigual ocorre por meio de normatização, sendo regulado pelo Estado através de leis que expressam a real necessidade daquele grupo social.

Assim, a criança e o adolescente recebem em nossa sociedade proteção legislativa específica, objetivando o legislador a compensação legal para distribuição da justiça de maneira igual, o que pode parecer privilégio, no entanto, cuida ser uma necessidade se se pretende alcançar uma sociedade equilibrada quanto à sua finalidade.

2.1 A Proteção do menor em evidência no Brasil com o advento do Estatuto da Criança e do Adolescente cumprindo a Constituição Federal de 1988.

A alienação parental afeta não somente a figura do alienado (que veremos mais adiante), mas, atinge principalmente a criança ou adolescente, tendo em vista sua vulnerabilidade, o que, necessariamente, exige do poder público uma compensação legislativa para amenizar os danos a eles causados.

No Brasil o menor possui lei especial cuja finalidade consiste em proteger a criança e o adolescente, trazendo tratamento para essas pessoas em condições consideradas de vulnerabilidade. Fazemos menção da Lei n.º 8.069/90, conhecida como Estatuto da Criança e do Adolescente. Referida norma legal é considerada como sendo um microssistema que vem regulamentar o art. 227 da Constituição Federal. Microssistema é um conjunto de normas peculiares para regramento de uma temática específica (ex.: Código de Defesa do Consumidor – CDC). Como o Estatuto da Criança e do Adolescente, também conhecido pela sigla “ECA” tem disposição peculiar na proteção do menor, é considerado pela doutrina como microssistema.

Observe que o ECA existe porque teve a obrigação legal de regulamentar o art. 227 da Magna Carta, cujo teor dispõe sobre o dever do Estado, além da família e da sociedade, de assegurar ao menor, dentre outras prerrogativas, o direito à vida, à saúde, alimentação e educação, lazer e profissionalização, dignidade e respeito, inclusive, de estar a salvo de toda a forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão. Neste contexto é que surge a Lei n.º 8.069 constituindo tratamento legislativo especial ao menor.

Na obra coordenada por Simone Diogo Carvalho Figueiredo, a mencionada proteção aqui em exposição diz respeito em cuidar do desenvolvimento de todas as faculdades da criança e do adolescente, sendo referida proteção como de caráter “integral” (FIGUEIREDO, 2012, p. 593).

Nesta análise a proteção integral em favor da criança e do adolescente deve ocorrer independente de qualquer situação e não somente em situação de perigo, além de alcançar todos os seus direitos assegurados na norma legal (FIGUEIREDO, 2012, p. 593).

Apesar do ECA não ser objeto de estudo sistemático neste trabalho, salutar distinguir a criança do adolescente para fins didáticos, de acordo com a normatização posta. Assim, de acordo com o art. 2º, da lei 8.069/90, criança é toda pessoa cuja idade seja até 12 (doze) anos incompletos, e, adolescente é toda pessoa com idade entre 12 (doze) e 18 (dezoito) anos.

Este diploma legal traz ao menor garantias tão abrangentes que condicionam todas as demais normas a serem interpretadas no sentido de proteção integral. Tal é a proteção que além dos familiares e sociedade como acima mencionado, o Estado também tem o dever de protegê-lo, o que procura fazer por meio de órgãos específicos como Conselho Tutelar, Varas Judiciais Especializadas da Infância e Juventude, Defensoria Pública e Ministério Público, tendo este último obrigatória atuação em ações judiciais que envolvam interesses do menor, conforme dispõe o art. 82, I, do Código de Processo Civil: “Compete ao Ministério Público intervir nas causas em que há interesses de incapazes.”.

Portanto, nas ações judiciais decorrentes de alienação parental, necessariamente haverá atuação de membro do Ministério Público.

Ademais, apesar de a alienação parental ter no ordenamento jurídico norma específica, esta deverá no que couber, receber interpretação nos moldes do que dispõe o Estatuto da Criança e do Adolescente, ou seja, cuidando da proteção integral do menor.

2.2 O Desenvolvimento Saudável como um Direito Fundamental

Como se mostrará, a prática da alienação parental atinge não somente o genitor alienado, mas o menor em desenvolvimento. Se este mal afeta a criança e o adolescente em seu desenvolvimento saudável, então, por preceitos aqui já expostos, a proteção deve se seguir como remédio para cumprimento do que assegura a Constituição Federal quanto à tutela integral do menor.

Neste ponto, fazemos referência à Constituição Federal, também conhecida como Norma Fundamental ou Carta Magna, a norma matriz que dá validade a todas as outras normas que abaixo dela estão. No estudo da Constituição encontramos vários conceitos de acordo com cada ciência a ser pesquisada. Como nosso destino nesta pesquisa não é o estudo da Constituição, trazemos sinteticamente o conceito apenas para fixar o entendimento de que se trata da norma de maior relevância dentro do sistema jurídico e que sem sua validade as demais normas jurídicas se tornam ineficazes. Conceitua Dallari o que é Constituição (DALLARI, 2010, P. 25):

“A Constituição é a declaração da vontade política de um povo, feita de modo solene por meio de uma lei que é superior a todas as outras e que, visando a proteção e a promoção da dignidade humana, estabelece os direitos e as responsabilidades fundamentais dos indivíduos, dos grupos sociais, do povo e do governo.”

Em análise de sustentação deste conceito, Dallari procura demonstrar que, embora a conceituação apresentada possa parecer “palavrosa”, com muitas palavras, afirma que se torna claro e de fácil compreensão quando divididos em elementos essenciais de uma Norma Fundamental, a saber: a) é a vontade política de um povo; b) trata-se de uma solenidade necessária; c) é Lei superior; d) demonstra a proteção e promoção da dignidade humana; e) estabelece os direitos e responsabilidades dos indivíduos, do povo, dos grupos sociais e do governo. (DALLARI, 2010, pgs. 25-32)

Assim, a Constituição Federal ou Norma Fundamental idealizada por Hans Kelsen, segundo Gusmão pode ser entendida “como a norma que é fonte de validade das normas jurídicas de um sistema jurídico.” (GUSMÃO, 2008, p. 94).

Pois bem, esta explanação tem o condão de afirmar que é na Constituição Federal que o indivíduo encontrará amparo para ver seus direitos assegurados, exatamente como ocorre com a proteção integral da criança e do adolescente no art. 227, da Magna Carta. Nesse diapasão vem a afirmação de que o desenvolvimento saudável da criança não se trata, por exemplo, de simples fixação de políticas públicas ou plano de governo, cujo teor poderá ou não constar interesses voltados ao menor. O desenvolvimento saudável da criança e do adolescente é dever assegurado em norma constitucional, portanto, uma garantia fundamental que deve ser observada por todos.

Garantia fundamental neste contexto não se limita ao caráter de essencialidade popular, ou seja, não se trata apenas de se ter o conhecimento de que é importante. Além de ser importante, a garantia fundamental de que nos referimos é o “dever ser”, configurando obrigação de existência a ser cumprida pela família, sociedade e pelo Estado, este com dever de imposição, inclusive lançando mão da coercibilidade.

O desenvolvimento saudável da criança e do adolescente como direito fundamental assegurado na Constituição coaduna-se com o núcleo central da Norma Fundamental que é a Dignidade da Pessoa Humana, valor individual e indisponível estabelecido como direito e garantia fundamental de primeira geração, constante explicitamente da Constituição Federal de 1988, no art. 1º, inciso III, “in verbis”:

“art. 1.º A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos: …

III – a dignidade da pessoa humana; …”

É certo que a alienação parental prejudica diretamente o desenvolvimento saudável da criança e do adolescente ferindo consequentemente a dignidade individual do menor e também do alienado, pelo que, resta necessária a normatização vigente, bem como profunda discussão e reflexão no meio social com a finalidade de inibir tais atos desqualificadores no que diz respeito a importante evolução social.

3. ALIENAÇÃO PARENTAL

Depois das justificativas apresentadas para demonstrar a relação direta da família com a alienação parental, da demonstração de que há no ordenamento jurídico uma proteção legislativa especial à criança e ao adolescente, a partir deste ponto da pesquisa, adentra-se mais especificamente a reflexão aqui proposta. Para tanto, é importante que o leitor tenha esclarecido o que é a alienação parental, suas consequências e protagonistas, bem como a forma legislativa adotada pelo Estado para combatê-la, o que se faz a seguir na expectativa de que a presente temática possa alcançar inclusive aquela parcela da sociedade que mantém diretamente contato e influência, seja intelectual ou afetiva com a criança e o adolescente, além daquelas pessoas eventualmente envolvidas de alguma forma com a alienação parental.

3.1 O que é alienação parental?

Apesar da Síndrome da Alienação Parental ser legislativamente combatida recentemente, pois a lei que dispõe sobre o tema foi publicada em 26 de agosto de 2010 (Lei nº 12.318), pesquisadores afirmam que tanto no campo da medicina como na ciência jurídica o fenômeno existe há alguns séculos e em razão da falta de preparo ao lidar com a considerada doença, por certo a afetação alcançou sobremaneira aqueles que menos ainda poderiam lidar com tais atos, os vulneráveis.

Então, do que trata a alienação parental?

A própria Lei 12.318/2010, no art. 2º, cuidou em conceituar alienação parental que passamos a transcrever:

“…interferência na formação psicológica da criança ou do adolescente promovida ou induzida por um dos genitores, pelos avós ou pelos que tenham a criança ou adolescente sob sua autoridade, guarda ou vigilância para que repudie genitor ou que cause prejuízo ao estabelecimento ou a manutenção de vínculos com este.”

Consiste nas ações que praticadas por um dos genitores do menor, parentes ou pessoas que detenham autoridade sobre a criança e o adolescente trazem prejuízo de cunho psicológico, afetando sua formação, objetivando especificamente desfavorecer a relação afetiva entre o outro genitor e o filho menor.

No dizer de Douglas Phillips Freitas alienação parental é :

“…um transtorno psicológico caracterizado por um conjunto sintomático pelo qual um genitor, denominado cônjuge alienador, modifica a consciência de seu filho, por meio de estratégias de atuação e malícia (mesmo que inconscientemente), com o objetivo de impedir, obstaculizar ou destruir seus vínculos com o outro genitor, denominado cônjuge alienado.” (FREITAS, 2013, p. 26)

A Alienação Parental é uma campanha hostil e astuta, sendo na maioria das vezes mentirosa, disferida contra o outro cônjuge numa espécie muito peculiar de “difamação”, atingindo-o indiretamente porque o agente recebedor daquele ato é a criança ou adolescente e a finalidade do ato é, exclusivamente, prejudicar a relação afetiva constante do vínculo entre o menor e a pessoa alienada. Fica evidente que referida ação tem como alvo a relação de afeto existente entre o genitor alienado e seu filho menor.

Importante mencionar que apesar de ser o principal alvo a relação afetiva existente entre genitor alienado e seu filho, a afetação psicológica existente em decorrência da síndrome atinge diretamente a criança ou adolescente em maior grau, dada sua condição de vulnerabilidade.

Cumpre ainda salientar que, como acertadamente ensinou Freitas ao conceituar alienação parental, o ato de alienação ocorre, por vezes, de forma inconsciente, ou seja, o genitor alienador está tão preocupado em prejudicar o relacionamento afetivo existente entre o outro genitor e o menor que não se dá conta, às vezes, do mal que está causando à sua própria prole. Nesse diapasão é pertinente afirmar acerca da importância de propagação de ações no combate à alienação parental, inclusive por meio da mídia televisiva e redes sociais, objetivando despertar a consciência daquele que a pratica inconscientemente, talvez numa condição de inconformismo como é possível ocorrer, por exemplo, com a extinção do vínculo conjugal.

Em algumas situações sequer existe motivo verdadeiro de descrédito do genitor alienado como afirma Freitas: “Geralmente, não há motivos reais que justifiquem essa condição. É uma programação sistemática promovida pelo alienador para que a criança odeie, despreze ou tema o genitor alienado, sem justificativa real.” (FREITAS, 2013, p. 26).

Como o trabalho neste momento conceitua alienação parental objetivando auxiliar na reflexão presente, relevante expor alguns exemplos de atos que, por sua vez, são caracterizadores da alienação. Aliás, a própria n.º Lei 12.318, em seu texto, apresenta rol exemplificativo. Eis alguns exemplos: a) promover a desqualificação do genitor alienado; b) praticar atos que dificultam o exercício do poder familiar; c) praticar atos que cause dificuldade do contato do menor com o genitor; d) prejudicar o direito de convivência entre o genitor e seu filho alienado; e) deixar de compartilhar informações pertinentes à vida escolar ou médica; f) mudar de endereço com a finalidade exclusiva de dificultar visitas; g) caluniosamente apresentar falsa denúncia em desfavor do alienado, dentre outras atitudes.

Importante observar que não existem um rol taxativo ou atos declarados a se configurar alienação parental. É preciso identificar dentre as atitudes do alienador aquelas que em sua essência tem a finalidade de afetação daquela relação afetiva. Freitas em sua obra Alienação Parental, Comentários à Lei n.º 12.318/2010, cita Maria Pisano Motta que apresenta outros exemplos de atos de alienação, sendo pertinente sua colação na presente pesquisa:

“É a recusa de passar as chamadas telefônicas; a passar a programação de atividades com filho para que o outro genitor não exerça o seu direito de visita; apresentação do novo cônjuge ao filho como seu novo pai ou mãe; denegrir a imagem do outro genitor; não prestar informações ao outro genitor acerca do desenvolvimento social do filho; envolver pessoas próximas na lavagem cerebral dos filhos; tomar decisões importantes a respeito dos filhos sem consultar o outro genitor; sair de férias sem os filhos e deixa-los com outras pessoas que não o outro genitor, ainda que este esteja disponível e queira cuidar do filho; ameaçar o filho para que não se comunique com o outro genitor.” (FREITAS, 2013, p. 27)

Desta forma nota-se que inúmeros são os atos de prática pelo agente alienador ensejadores da alienação que, necessariamente, não precisam constar da norma regulamentadora, e como acima mencionada, para a apuração ou configuração deste mal causado ao menor e a seu parente alienado, importante atentar para a intenção originária daquela atitude, ou seja, aquele propósito de prejudicar a relação de convivência entre o parente alienado e a criança ou adolescente.

Com o propósito de fixação conceitual, colacionamos o que afirma ser alienação parental o pesquisador e psiquiatra Richard A. Gadner, conhecido como um dos primeiros profissionais a identificar e tratar o assunto como sendo alienação parental. Denise Maria Perissini da Silva, em seu artigo sobre o tema trouxe referido conceito, a saber:

“A síndrome de alienação parental (SAP) é uma disfunção que surge primeiro no contexto das disputas de guarda. Sua primeira manifestação é a campanha que se faz para denegrir um dos pais, uma campanha sem nenhuma justificativa. É resultante da combinação de doutrinações programadas de um dos pais (lavagem cerebral) e as próprias contribuições da criança para a vilificação do pai alvo.”

No conceito apontado por Gadner verifica-se que o pesquisador inicialmente vincula a alienação parental entre os pais (pai/mãe) e o filho. Aliás, chega a direcionar tal síndrome como decorrência da quebra de vínculo conjugal do casal, tendo como consequência uma disputa de manutenção de guarda do filho.

Denise Maria Perissini da Silva demonstra em artigo publicado acerca do tema que outros doutrinadores também vinculam em primeiro momento esta síndrome a uma relação em família restrita.

“Segundo SILVA (2011), a Alienação Parental (AP) é uma patologia psíquica gravíssima que acomete o genitor que deseja destruir o vínculo da criança com o outro, e a manipula afetivamente para atender motivos escusos. Quando a própria criança incorpora o discurso do(a) alienador(a) e passa, ela mesma, a contribuir com as campanhas de vilificação do pai/mãe-alvo, instaura-se a Síndrome de Alienação Parental (SAP). A Alienação Parental deriva de um sentimento neurótico de dificuldade de individuação, de ver o filho como um indivíduo diferente de si, e ocorrem mecanismos para manter uma simbiose (um tipo de vínculo de dependência extrema, que impede o outro de ser o que é mesmo) sufocante entre mãe e filho, como a superproteção, dominação, dependência e opressão sobre a criança. O pai/mãe acometido(a) pela AP não consegue viver sem a criança, nem admite a possibilidade de que a criança deseje manter contatos com outras pessoas que não com ela. Para isso, utiliza-se de manipulações emocionais, sintomas físicos, isolamento da criança com outras pessoas, com o intuito de incutir-lhe insegurança, ansiedade, angústia e culpa. Por fim, mas não em importância ou gravidade, pode chegar a influenciar e induzir da criança a reproduzir relatos de eventos de supostas agressões físicas/sexuais atribuídas ao outro genitor, com o objetivo único (do(a) alienador(a), é claro!) de afastá-lo do contato com a criança. Na maioria das vezes, tais relatos não têm veracidade, dadas certas inconsistências ou contradições nas explanações, ou ambivalência de sentimentos, ou mesmo comprovação (por exemplo, resultado negativo em exame médico); mas se tornam argumentos fortes o suficiente para requerer das autoridades judiciais a interrupção das visitas e/ou a destituição do poder familiar do “suposto” agressor (o outro genitor).”

No entanto, com maior abrangência quanto a possíveis pessoas envolvidas, o legislador brasileiro amplia a afetação da alienação parental quando conceituando no art. 2º da Lei 12.318 referido mal, descreve que a doença pode ser promovida ou induzida por um dos genitores, pelos avós ou, ainda, por qualquer que detenha autoridade, guarda ou vigilância sobre a criança ou o adolescente. Desta forma, a alienação parental não se limita tão somente a família em sentido estrito (pequena família – pai, mãe e filho), mas, também alcança a família em sentido amplo (grande família – parentes), e, ainda, aquele que eventualmente mantenha sob sua guarda ou autoridade o menor, a exemplo de um tutor ou curador especial.

Portanto, é possível considerar que a Alienação Parental consiste na prática de qualquer ação que interfira diretamente na formação psíquica da criança ou adolescente promovida por qualquer um dos genitores que detenha ou não a guarda do menor, por ascendentes e outros parentes ou, ainda, pessoas que possuam autoridade, guarda ou vigilância do menor, cuja finalidade seja de causar prejuízo no relacionamento afetivo existente entre a pessoa alienada e a criança ou adolescente, refletida por meio dos sintomas de repúdio e distanciamento que este último passa a apresentar em relação ao alienado.

3.2 Diferença entre Alienação Parental e Síndrome de Alienação Parental.

Em se tratando de um conjunto de ações que resulta numa enfermidade cuja patologia vincula especificamente a psicologia, dada a interferência na formação psicológica, percebe-se que a alienação em si não é a causa do prejuízo aos envolvidos, mas, o que gera real prejuízo são os sintomas resultantes dela, e estes são os resultados que a sociedade luta para evitar.

Enquanto a alienação parental é ato de induzimento do menor no propósito de incutir em sua mente o desejo errôneo de desprezar e rejeitar a relação afetiva com aquele genitor que está sendo vítima dos atos de alienação, a síndrome nada mais é do que o conjunto de sintomas apresentados pela criança ou adolescente após a investida do genitor alienador praticando o ato de alienação.

Exemplificando a diferença entre Alienação Parental e a SAP (Síndrome da Alienação Parental) pode-se considerar: o pai que detém a guarda da criança e, em época de reunião de pais no colégio, a mãe deseja participar da reunião, porém o pai informa que ele mesmo estará presente, não havendo necessidade da genitora em participar. Porém, após a reunião, o pai passa a incutir no filho que a mãe não se importa com ele porque, sequer, manifesta desejo em saber acerca do desenvolvimento escolar do filho. Outro exemplo: o pai que não possui a guarda do filho, mas tem o direito de visita regulamentado, e, ao se dirigir para a visitação a tem frustrada porque sem prévio aviso, e de forma recorrente, a mãe nos dias e horários de visita resolve sair levando consigo o filho, incutindo na mente do menor que o pai não gosta do filho e apenas o visita por uma obrigação e não por amor. Os exemplos hipotéticos aqui relatados são típicos de alienação parental.

Já a Síndrome da Alienação Parental é a atitude apresentada pelo menor em relação ao genitor alienado depois de ter em sua mente incutida aquela informação de descrédito, fazendo com que a criança ou adolescente demonstre falta de motivação na relação com o genitor alienado, ou com palavras e atitudes apresente considerável atitude de descrédito, restando desmotivado naquela relação de afeto, passando a agir com dúvidas quanto ao sentimento existente para com o genitor vitimado, numa nítida influência negativa em sua formação psicológica.

Acerca da distinção entre a SAP e a Alienação Parental, afirma Denise Maria Perissini da Silva:

“É preciso esclarecer a seguinte distinção entre Alienação Parental e Síndrome de Alienação Parental:

– A Alienação Parental (AP) caracteriza o ato de induzir a criança a rejeitar o pai/mãe-alvo (com esquivas, mensagens difamatórias, até o ódio ou acusações de abuso sexual).

– A Síndrome de Alienação Parental (SAP) é o conjunto de sintomas que a criança pode vir ou não a apresentar, decorrente dos atos de Alienação Parental.

A Síndrome de Alienação Parental existe, pode ser evidenciada em inúmeros casos em que a criança passa a rejeitar o pai sem motivo plausível, e para isso cria, distorce ou exagera situações cotidianas para tentar “justificar” a necessidade de afastamento do pai, inclusive reproduzindo falas de outras pessoas. A pessoa que induz a criança a rejeitar imotivadamente o outro pai, inclusive mediante relatos inverídicos de molestação sexual, apresenta um distúrbio psicopático gravíssimo, uma sociopatia crônica, porque não tem nenhum sentimento de respeito e consideração pelo outro, importando-se apenas com seus próprios interesses egoísticos e narcísicos. Acusam o outro pai de agressão à criança, mas quando manipulam emocionalmente a criança para verbalizar acusações infundadas, tornam-se eles sim os verdadeiros agressores das crianças, não se conscientizando de que os vínculos parentais são essenciais para o equilíbrio psíquico da criança enquanto ser em formação. Um substrato simbólico da Alienação Parental é induzir os filhos a formular falsas acusações de agressão física e/ou abuso sexual contra o(a) outro(a) genitor(a).”

Assim, evidente que todo o esforço a ser despendido para rechaçar a causa da alienação parental se concentra em minimizar os resultados que ela provoca, especificamente no menor que, na maioria dos casos não é tratado como filho pelos alienadores, mas, apenas e tão somente como uma “moeda de troca”, um instrumento de satisfação e prazer pessoal do alienador que não almeja outra coisa, senão prejudicar aquela relação afetiva.

Portanto, a reflexão aqui trazida objetiva determinada parcela da coletividade, aquela que exerce o ofício de educadores, como sendo potencial válvula propulsora, uma importante ferramenta contra a alienação parental na conscientização e até mesmo de ação de seu combate para que a sociedade seja privilegiada na manutenção de crianças e adolescentes saudáveis neste quesito, além de adquirirem maior proteção em face deste mal.

Não obstante, salutar dizer que mais importante do que o conhecimento do educador acerca do tema será o trabalhar do Estado para trazer a efetividade à norma que dispõe sobre a temática, agindo para inibir sua ocorrência. Ressalte-se que, ao dizer do trabalhar do Estado para a efetividade da Lei é igualmente ver a população tendo conhecimento, porquanto, como já apontado, a alienação parental pode ocorrer em alguns casos, sem que o alienador se dê conta de que está a praticá-la. Portanto, aqui não basta simplesmente o que dispõe a Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro – LINDB, em seu art. 3º, que expressa a impossibilidade de alguém alegar que descumpriu a Lei porque não a conhece. Apesar de a norma legal impedir aos cidadãos de pretender se escusar do cumprimento da lei, e aqui se inclua a Lei de Alienação Parental, é preciso mais, ou seja, é necessário que efetivamente os possíveis protagonistas tenham conhecimento não somente da norma legal, mas, igualmente do objetivo pela qual fora criada.

3.3 Possíveis Protagonistas da Alienação Parental.

Como declinado anteriormente a alienação parental precipuamente se dá no seio familiar, ou seja, ocorre por meio dos genitores, parentes (avós) ou pessoas que possuam autoridade, guarda ou vigilância da criança e adolescente.

Estas pessoas são aqueles possíveis protagonistas das questões relativas com alienação parental.

Os protagonistas com maior incidência de casos são as pessoas que compõem o núcleo familiar restrito, sendo pais e filhos. Os filhos aqui sempre serão menores (crianças e/ou adolescentes) e estão envolvidos com a alienação sendo diretamente as vítimas com maior afetação dada sua condição de vulnerabilidade como já demonstramos sua condição de hipossuficiência. As crianças ou adolescentes são as vítimas que sofrem os atos praticados pelo agente alienador e sofrem em seu psicológico a interferência decorrente da influência negativa ocasionada pela prática do ato de alienação. Disto, extraímos que não há, em tese, possibilidade de um menor ser considerado como agente alienador ou a vítima destinatária do ato de alienação.

Dentre os protagonistas na pequena família temos o genitor alienado que é aquele indivíduo que sofre a agressão contra sua relação afetiva com o filho, pela alienação praticada. Este indivíduo é a vítima destinatária da ofensa, sendo aquela pessoa que tem sua relação afetiva com seu filho prejudicada em face das investidas inescrupulosas praticadas pelo genitor alienador. Ressalte-se que, na maioria das vezes o ato de alienação praticado tem ofensas cujo teor se trata de inverdades, formada quase que como um ato de desespero do alienador em ver o bem estar e o relacionamento entre o alienado e seu filho.

Para auxiliar na compreensão daqueles agentes considerados como os prejudicados pela alienação parental e assim individualizar as pessoas atingidas pela alienação, pode ser chamada de “vítima destinatária” o genitor alienado, porquanto, o destino final pretendido pelo alienador do ato final da alienação é o genitor alienado, tendo em vista a intenção precípua de se causar dano ao outro genitor. No entanto, além da afetação causada ao destinatário final, ocorre também o prejuízo ao menor, que neste caso, pode ser considerado pelo alienador também como um instrumento para causar aquele mal. Indiscutivelmente e pelas razões aqui já expostas, a criança ou adolescente sofre consideravelmente mais do que a vítima destinatária ou genitor alienado.

Por derradeiro, encontra-se a figura do agente alienador, pessoa que se utiliza da criança ou adolescente alienando-a com a finalidade de atingir o genitor alienado, com isso, prejudicando a relação de afeto existente entre a vítima destinatária e seu filho.

Com as considerações acima, é possível concluir que diante de uma situação de alienação parental haverá no mínimo, três personagens envolvidos, sendo o alienador, o alienado (vítima destinatária) e o menor, não podendo se perder de vista que o ato resultará em prejuízo a duas partes nesta relação triangular com o prejuízo maior recaindo sobre aquele que pouca ou nenhuma condição tem para se defender, a criança ou adolescente.

Diante dessa relação triangular na afetação trazida pela alienação, importante considerar também, a existência de casos em que a alienação ocorre na modalidade bilateral. Alienação Parental Bilateral ocorre quando os atos de alienação são praticados pelos responsáveis pela criança em desfavor do outro concomitantemente. Neste caso, a interferência na formação psicológica da criança é praticada de forma que o alienante passa a ser, ao mesmo tempo alienado e vice-versa. Segundo Freitas, “a prática da alienação parental, não raras vezes, é promovida por ambos os genitores, ou por aqueles que exercem a função de guarda do menor.” (FREITAS, 2013, pg. 33).

Nesta situação, conforme relata referido autor, o menor tem maior probabilidade de desenvolver transtornos psicológicos mais severos.

Avançando um pouco mais, temos que, segundo a Lei n.º 12.318/2010, é possível afirmar que a alienação parental atinge igualmente o núcleo familiar em sentido amplo, ou seja, pessoas da grande família também poderão figurar, ora como alienante, ora como alienado. Isto porque, ao conceituar a alienação no art. 2º, a Lei em referência descreve que o induzimento ou a promoção dela poderá ocorrer pelos genitores, pelos avós ou pelos que tenham o menor sob sua guarda, autoridade ou vigilância.

Assim, ao analisar os protagonistas, impossível vincular atos de alienação parental somente quando praticados pelos genitores, apesar da ênfase merecida em razão de ser sua ocorrência na maioria dos casos.

Na verdade o que se observa é que a proteção ao menor proposta pelo legislador brasileiro foi mais ampla objetivando alcançar aquelas relações que estão além dos genitores.

Depreende-se desta análise que um parente ou qualquer outra pessoa que tenha sobre si, a guarda, autoridade ou vigilância sob a criança ou adolescente poderá praticar os atos de alienação parental que devem ser rechaçados nos termos da legislação vigente. Assim, é possível, por exemplo, que os avós sejam potenciais alienadores ou vítimas da alienação. Igualmente, qualquer outro parente ou pessoa que detenha a guarda judicial do menor se encontre inserida neste grupo, inclusive um tutor que tenha alcançado tal qualificação por ato de disposição de última vontade dos pais (testamento). Desta forma é possível se discutir judicialmente condição de alienação parental, por exemplo, quando as vítimas alienadas são os avós do menor que sofrem a agressão empregada por seu tutor legalmente constituído, quando do falecimento dos pais.

Diante do exposto, temos uma relação de protagonistas que podem ser envolvidos na alienação parental que não se limita exclusivamente à família em sentido estrito (pais e filhos), observada em todas as situações uma relação triangular, cuja pessoa mais prejudicada sempre será a criança ou adolescente, inclusive sobre ela impera o dever decorrente do poder familiar e da guarda.

3.4 Guarda unilateral do filho e a alienação parental.

Uma situação que está intimamente ligada à Alienação Parental é a Guarda Unilateral. Isto ocorre porque grande parte dos problemas que envolvem a alienação parental resulta de uma família cujo vínculo conjugal se extinguiu e a prole do casal resguarda guarida dos genitores com o estabelecimento de guarda dos filhos, sendo, na maioria dos casos, a guarda unilateral, e esta situação em muitos casos, independente de quem a detenha, é o que desencadeia a alienação, justificando ser importante discorrer acerca deste instituto vinculado ao Direito de Família, a guarda, embora não seja objeto específico deste trabalho, mas, com relação direta sobre o tema principal.

Independentemente de qualquer mandamento por legislação a guarda dos filhos é mais do que um instituto jurídico, isto porque, se manifesta quase sempre instintivamente. A guarda está ligada diretamente à proteção da prole. É perfeitamente possível o entendimento de que tal proteção existe antes mesmo da “letra da lei”. Proteger os filhos além de um “dever-ser” é um “dever moral”, originário do instinto do ser humano. Nader tratando do assunto no direito de família afirma que:

 “a proteção não é um dever que dimana da lei, mas diretamente da moral, e a sua observância é fato instintivo na escala animal; na escala humana ganha dimensão maior, porque a carência dos filhos no conjunto não diz respeito apenas às necessidades de sobrevivência e afeto, também às de formação, educação, apoio, aconselhamento, cultura, encaminhamento na vida social.”(NADER, 2010, pg. 253)

Embora a proteção seja instintiva, o viver em sociedade exige regras obrigatórias com o fim de regular a convivência e de certa forma, também as relações privadas, sendo definidas na medida em que a sociedade evolui. Justifica-se o estabelecimento de normas quando, ao olhar para o passado, encontramos, por exemplo, o chamado “poder ilimitado” sobre os filhos, sendo ali possível, inclusive, a venda e a disposição em relação à vida dos filhos, regras como tais, previstas na Lei de XII Tábuas:

“Na Roma dos primeiros séculos de nossa era, o “pater famílias” possuía poder ilimitado sobre os filhos (ius vitae necisque) e ao Estado não cabia qualquer interferência na relação. Além de dispor sobre a vida de seus filhos, podia vendê-los. Esta prática chegou a ser prevista na lei de XII Tábuas.” (NADER, pg. 254).

Quanto à proteção da pessoa dos filhos menores, especificamente acerca da guarda, no Ordenamento Jurídico Brasileiro o instituto recebe guarida no Direito Civil, por meio da Lei n.º 10.406/2002, o Código Civil Brasileiro, regulando a matéria entre os artigos 1.583 a 1.590.

Nesse momento, importante definir o que vem a ser guarda e, segundo Freitas, guarda é “a condição de direito de uma ou mais pessoas, por determinação legal ou judicial, em manter um menor de 18 anos sob sua dependência sociojurídica” (Freitas, 2013, pg. 99).

Paulo Nader ao conceituar guarda afirma que se trata de “entender não apenas o poder de conservar o menor sob vigilância e companhia, mas fundamentalmente o de orientá-lo no cotidiano, dando-lhe assistência de que necessita, sem com isto exonerar a responsabilidade de outrem.” (Nader, 2010, pg 255).

O conceito de guarda não ficou limitado tão somente aos doutrinadores da ciência jurídica recebendo definição legal quando o texto da Lei ao trazer regramento acerca do instituto cuidou em defini-la, recebendo conceituação legislativa como passamos a transcrever:

“art. 1.583. …

§ 1º. Compreende-se por guarda unilateral a atribuída a um só dos genitores ou a alguém que o substitua (art. 1.584, § 5º) e, por guarda compartilhada a responsabilização conjunta e o exercício de direitos e deveres do pai e da mãe que não vivam sob o mesmo teto, concernentes ao poder familiar dos filhos comuns. …”

Desta forma é possível considerar que a guarda resulta do dever moral e legal de proteção do vulnerável por seus genitores ou por pessoa legalmente designada, cujo objetivo é a responsabilidade pela criação, formação, companhia e assistência moral, intelectual, financeira e educacional.

A guarda está dividida em algumas espécies, restando mencionadas pela norma legal as formas: unilateral e a compartilhada.

A guarda é unilateral quando está sob a responsabilidade de apenas um dos genitores ou a pessoa que os substitua. Recaem sobre os “ombros” deste guardião, em regra, as responsabilidades decorrentes deste instituto quanto à proteção do menor. Observe que, independentemente do auxílio ou da atuação do outro genitor, aquele que detém a guarda recebe tal incumbência e dela não poderá se eximir sob pena de sofrer as sanções legais, inclusive na esfera penal, como no caso de abandono de incapaz, se for o caso.

Importante salientar que não se pode afastar a responsabilidade legal decorrente da procriação àquele que eventualmente deixou de exercer ou que nunca tenha exercido a guarda sobre a criança ou adolescente, ou seja, o fato de não possuir a guarda não exonera o indivíduo que não a possua do dever de criar, educar, alimentar, dar formação, dentre outras responsabilidades para com o menor.

Ao tratarem sobre a guarda Pablo Stolze Gagliano e Rodolfo Pamplona Filho afirmam que a “Guarda unilateral ou exclusiva – é ainda a modalidade mais comum e difundida no Brasil, em que um dos pais detém exclusivamente a guarda, cabendo ao outro direito de visitas. O filho passa a morar no mesmo domicílio do seu guardião.” Nesta conceituação não se trata de família monoparental, tipo de família restrita que mantém em seu núcleo simplesmente um genitor e a prole, mas, da família em sentido estrito (família pequena) cujo núcleo outrora era formado pelos genitores e filhos, e, com a extinção do vínculo conjugal e a separação de corpos, apenas um dos genitores passa a ter em sua moradia de forma permanente seus filhos.

Importante também esclarecer que a guarda unilateral não extingue o poder familiar daquele que não a detém. Diferentemente do que possam pensar alguns pais, o fato de não possuir a guarda de seus filhos não quer dizer que está desonerado de arcar com suas responsabilidades de pai/mãe decorrentes do poder familiar. Inclusive, todos devem ter ciência de que igualmente a recíproca é verdadeira, ou seja, os deveres dos filhos, nestes casos também permanecem para com seus pais, independentemente de possuir ou não o genitor a guarda daquele. Assim, tanto a responsabilidade dos pais sem a guarda como o dever dos filhos para com seus pais existirá enquanto permanecer o poder familiar que persistirá e não havendo outro motivo legal, apenas extinguir-se-á quando a criança ou adolescente alcançar a maioridade, forma de cessação do poder familiar também chamada de extinção por fato natural.

Apenas para alinhar as informações acerca do Poder Familiar, se trata de um “instituto de ordem pública que atribui aos pais a função de criar, prover a educação de filhos menores não emancipados e administrar seus eventuais bens” (Nader, 2010, pg. 343). Tal instituto tinha referência no Código Civil de 1916 revogado, por meio da expressão “pátrio poder” e sua evolução atualmente já propõe por estudiosos do tema nova alteração de “poder familiar” para “autoridade parental” considerando a evolução em torno da família e o abrandamento do conceito do instituto.

Sintetizando, a guarda unilateral é aquela na qual apenas um dos genitores detém a guarda do filho menor restando ao outro o direito de visitação, sendo esta forma de guarda a mais utilizada no Brasil, sendo aquela que origina consideráveis casos da alienação parental. Na guarda unilateral não se afasta o poder familiar daquele genitor que não possui a guarda. Por derradeiro, o exercício da guarda unilateral pode se dar por outra pessoa que não seja um dos genitores da criança ou adolescente, desde que por determinação judicial ou disposição de última vontade dos genitores.

O Código Civil no artigo acima mencionado prescreve como outra forma de guarda além da unilateral, a guarda compartilhada.

Tratada como a modalidade de guarda que em tese atende melhor aos interesses do menor, bem como considerada como aquela que diferentemente da guarda unilateral atenua as situações de alienação parental, a compartilhada possibilita a permanência da guarda concomitantemente aos genitores mesmo após a extinção do vínculo conjugal. Nesta forma o propósito é fazer com que os pais compartilhem entre si a criação, convivência, educação e desenvolvimento do filho mantendo para ambos, ao mesmo tempo, a guarda. No dizer de Silvio de Salvo Venosa acerca da guarda compartilhada, “a ideia é fazer com que os pais separados compartilhem da educação, convivência e evolução dos filhos em conjunto.” “… reflete o compromisso dos pais em manter dois lares para seus filhos e cooperar de forma conjunta em todas as decisões” (Venosa, 2011, pg. 1641).

A guarda compartilhada é modalidade que se demonstra demasiadamente vantajosa, considerando que há esforço de ambos os pais no sentido de influenciar beneficamente na formação psicológica de sua prole. Para Gagliano e Pamplona Filho:

“Guarda compartilhada ou conjunta – modalidade preferível em nosso sistema, de inegável vantagens, mormente sobre o prisma da repercussão psicológica na prole, se comparada a qualquer das outras. Nesse tipo de guarda, não há exclusividade em seu exercício. Tanto o pai quanto a mãe detém-na e são corresponsáveis pela condução da vida dos filhos.”

Objetivando o bem estar do menor a sociedade brasileira recebe em seu ordenamento jurídico nova Lei da Guarda Compartilhada sob n.º 13.058/2014, alterando a norma fixada à de 2008, cuja finalidade é o melhoramento ainda mais do período de convivência dos pais com o filho, buscando o equilíbrio no relacionamento de pais “separados” e o fruto de sua extinta relação.

Com o fito de manter bem estabelecida a definição da guarda compartilhada colacionamos a seguir a explicação didática de Karen Ribeiro Pacheco Nioac de Sales, citada por Freitas em sua obra:

“A modalidade compartilhada atribuída à guarda dá uma nova e inédita conotação ao instituto do pátrio poder, já que tem por finalidade romper com a ideia de poder e veicula a perspectiva da responsabilidade do cuidado das crianças e do convívio familiar. A partir deste novo conceito, é retirada da guarda a conotação de posse, privilegiando-se a ideia de estar com, de compartilhar, sempre voltada para o melhor interesse das crianças e consequentemente dos pais.”

Como reflexão, numa comparação entre as duas formas de guarda, não é demais a afirmativa que a guarda compartilhada é aquela que melhor atende aos interesses do menor e de seus pais, inclusive, quando se trata da temática alienação parental, porquanto, perceptível que a condição de eventuais conflitos que possam resultar na aparição da alienação parental é diminuta e, apesar de não ser o foco deste trabalho, devem os “olhares” se voltar para esta promissora forma de guarda, a compartilhada, no sentido de ter do Poder Público e de toda a sociedade estratégias para sua eficácia e maior fluência, tendo em vista o bem que ela pode proporcionar não somente à criança e ao adolescente, mas à coletividade.

Acima, estão as formas de guarda estabelecidas no Código Civil Brasileiro, constantes do art. 1.583. No entanto, analisando contornos doutrinários do tema guarda, encontramos outras modalidades que aqui, serão apenas objeto de informação para conhecimento do leitor. Desta maneira, vêem-se na doutrina também os tipos de guarda: a) Alternada. Quando há um revezamento entre os genitores quanto à guarda, alternando-a em períodos exclusivos, constituindo ao outro o direito de visitação. Cuidado, apesar de se assemelhar a guarda compartilhada não se confundem, porquanto, na forma aqui apresentada a guarda é exclusiva e individual de cada genitor. Mencionam Pamplona Filho e Gangliano sobre a guarda alternada que “há uma alternância na exclusividade da guarda, e o tempo de seu exercício dependerá da decisão judicial.” Os autores ainda afirmam não ser “uma boa modalidade, na prática, sob o prisma do interesse dos filhos.” (Pamplona Filho e Gangliano, 2010, pg. 104). b) Nidação. Também conhecida como aninhamento é a modalidade em que os genitores como guardiões após o rompimento do vínculo conjugal deixam o lar, ambos, permanecendo ali a prole, havendo um revezamento dos genitores exercendo a guarda no lar onde residem apenas os filhos. Neste caso, ambos os pais saem de residência, mas, para o exercício da guarda, de forma individual, retornam a ela. “Tipo de guarda pouco comum, sobretudo porque os envolvidos devem ser ricos ou financeiramente fortes. Afinal, precisarão manter, além das suas residências, aquela em que os filhos moram”. (Pamplona Filho e Gangliano, 2010, pg. 105).

A Guarda é o instituto do Direito de Família que permite aos genitores ou à pessoa designada praticar a proteção aos menores sob sua responsabilidade, destinando-lhes além do afeto constituído pelo vínculo natural, cuidados por meio do auxílio no desenvolvendo psicológico e intelectual, subsídios de caráter alimentar e educacional, dentre outras obrigações inerentes do poder familiar.

Especialmente na guarda unilateral, embora haja aspectos positivos nela inseridos e inerentes da guarda como gênero propriamente dito, como já apontado, esta modalidade proporciona com maior evidência a possibilidade do desencadeamento de atos da alienação parental por suas características peculiares. Clama-se pelo esforço conjunto da sociedade e do Estado na conscientização geral para que os casais separados de corpos, quanto à guarda de seus filhos, possam repudiar a unilateral e, objetivando o melhor para si e sua prole, optar pela guarda compartilhada por se apresentar como mais vantajosa nos termos aqui apresentados.

3.5 Aspectos gerais da proteção legal contra alienação parental.

Por mais que os trabalhos acadêmicos e doutrinários que permeiam o tema alienação parental permitam uma reflexão aquém dos limites da norma regulamentada, impossível abordá-lo sem expor, ainda que de forma basilar, aspectos relativos ao texto da Lei. Assim, o presente trabalho abordará a norma sem qualquer pretensão de análise técnico-jurídico, porém, considerando os pontos de maior importância com a temática aqui apresentada.

Trata-se da Lei n.º 12.318/2010, dispondo acerca a alienação parental, publicada na data de 26 de agosto de 2010, com vigência a partir da referida data, nos termos do art. 11, da própria norma.

A Lei possui onze artigos dos quais dois tiveram veto presidencial (arts. 9º e 10), portanto, uma lei vetada parcialmente. Os artigos vetados após manifestação do Ministério da Justiça, possuem sua justificativa na mensagem n.º 513, datada de 26 de agosto de 2010, da Subchefia para Assuntos Jurídicos, da Casa Civil, cujo teor consiste na contrariedade do interesse público.

A seguir, colacionamos os artigos vetados e respectivas razões que justificam a não permanência do texto da Lei na íntegra:

“Art. 9o As partes, por iniciativa própria ou sugestão do juiz, do Ministério Público ou do Conselho Tutelar, poderão utilizar-se do procedimento da mediação para a solução do litígio, antes ou no curso do processo judicial. 

§ 1o O acordo que estabelecer a mediação indicará o prazo de eventual suspensão do processo e o correspondente regime provisório para regular as questões controvertidas, o qual não vinculará eventual decisão judicial superveniente. 

§ 2o O mediador será livremente escolhido pelas partes, mas o juízo competente, o Ministério Público e o Conselho Tutelar formarão cadastros de mediadores habilitados a examinar questões relacionadas à alienação parental. 

§ 3o O termo que ajustar o procedimento de mediação ou o que dele resultar deverá ser submetido ao exame do Ministério Público e à homologação judicial.

Razões do veto 

O direito da criança e do adolescente à convivência familiar é indisponível, nos termos do art. 227 da Constituição Federal, não cabendo sua apreciação por mecanismos extrajudiciais de solução de conflitos. 

Ademais, o dispositivo contraria a Lei no 8.069, de 13 de julho de 1990, que prevê a aplicação do princípio da intervenção mínima, segundo o qual eventual medida para a proteção da criança e do adolescente deve ser exercida exclusivamente pelas autoridades e instituições cuja ação seja indispensável.

Art. 10. O art. 236 da Seção II do Capítulo I do Título VII da Lei no 8.069, de 13 de julho de 1990 – Estatuto da Criança e do Adolescente, passa a vigorar acrescido do seguinte parágrafo único: 

‘Art. 236. …

Parágrafo único. Incorre na mesma pena quem apresenta relato falso ao agente indicado no caput ou à autoridade policial cujo teor possa ensejar restrição à convivência de criança ou adolescente com genitor.’ (NR)

Razões do veto

O Estatuto da Criança e do Adolescente já contempla mecanismos de punição suficientes para inibir os efeitos da alienação parental, como a inversão da guarda, multa e até mesmo a suspensão da autoridade parental. Assim, não se mostra necessária a inclusão de sanção de natureza penal, cujos efeitos poderão ser prejudiciais à criança ou ao adolescente, detentores dos direitos que se pretende assegurar com o projeto.”

A Lei traz em seu artigo 1º a referência textual de sua proposta, apontando assim literalmente sua disposição.

“Art. 1o Esta Lei dispõe sobre a alienação parental.” 

Cuidou o legislador no artigo 2º em apresentar no texto legal o conceito de alienação parental, bem como aponta os principais indivíduos com potencial probabilidade de se envolver com as questões atinentes à alienação parental. No mesmo artigo o legislador cuidou em apresentar, a título de exemplo para auxiliar no entendimento do conceito, algumas formas de alienação parental, ressaltando que aquelas disposições ali prescritas não se constituem rol taxativo, ou seja, não se limitam tão somente àqueles exemplos constantes da norma, podendo, inclusive, contar com outras formas declaradas em Juízo ou por meio de perícia designada.

“Art. 2o Considera-se ato de alienação parental a interferência na formação psicológica da criança ou do adolescente promovida ou induzida por um dos genitores, pelos avós ou pelos que tenham a criança ou adolescente sob a sua autoridade, guarda ou vigilância para que repudie genitor ou que cause prejuízo ao estabelecimento ou à manutenção de vínculos com este. 

Parágrafo único. São formas exemplificativas de alienação parental, além dos atos assim declarados pelo juiz ou constatados por perícia, praticados diretamente ou com auxílio de terceiros:

I – realizar campanha de desqualificação da conduta do genitor no exercício da paternidade ou maternidade; 

II – dificultar o exercício da autoridade parental; 

III – dificultar contato de criança ou adolescente com genitor; 

IV – dificultar o exercício do direito regulamentado de convivência familiar; 

V – omitir deliberadamente a genitor informações pessoais relevantes sobre a criança ou adolescente, inclusive escolares, médicas e alterações de endereço; 

VI – apresentar falsa denúncia contra genitor, contra familiares deste ou contra avós, para obstar ou dificultar a convivência deles com a criança ou adolescente; 

VII – mudar o domicílio para local distante, sem justificativa, visando a dificultar a convivência da criança ou adolescente com o outro genitor, com familiares deste ou com avós.” 

A causa da alienação parental está de maneira resumida informada no art. 3º quando declina ser a síndrome uma prática que fere direito constitucional dos menores, afirmando ainda a condição prejudicial para a convivência familiar, assim como a realização de afeto nas relações entre genitores e filhos, além de se tratar de um abuso moral.

“Art. 3o A prática de ato de alienação parental fere direito fundamental da criança ou do adolescente de convivência familiar saudável, prejudica a realização de afeto nas relações com genitor e com o grupo familiar, constitui abuso moral contra a criança ou o adolescente e descumprimento dos deveres inerentes à autoridade parental ou decorrentes de tutela ou guarda.” 

Atos praticados contra esses direitos da criança e do adolescente possuem um caráter de considerável negatividade para a sociedade que recebe um retrocesso com tais atitudes, considerando que muitos, eivados de rancor, podem inclusive, desconsiderando a pessoa do filho, valer-se da prole tão somente para atacar a sua vítima direta, o outro genitor. “O genitor alienador pode até desinteressar-se pelo filho e fazer da luta pela guarda apenas um instrumento de poder e controle e não um desejo de afeto e cuidado.” (Freitas, 2013, pg. 44).

Nos artigos 4º e 5º da Lei 12.318/2010, a norma apresenta aspectos processuais e procedimentais diante de indícios da alienação parental no curso de um processo que envolva a relação entre pais e filhos, ou, ainda, em situações fatídicas em que, embora não haja processo judicial em andamento ocorram atos de alienação como acima apontado que demandem a interposição de medida judicial para combatê-la.

“Art. 4o Declarado indício de ato de alienação parental, a requerimento ou de ofício, em qualquer momento processual, em ação autônoma ou incidentalmente, o processo terá tramitação prioritária, e o juiz determinará, com urgência, ouvido o Ministério Público, as medidas provisórias necessárias para preservação da integridade psicológica da criança ou do adolescente, inclusive para assegurar sua convivência com genitor ou viabilizar a efetiva reaproximação entre ambos, se for o caso. 

Parágrafo único. Assegurar-se-á à criança ou adolescente e ao genitor garantia mínima de visitação assistida, ressalvados os casos em que há iminente risco de prejuízo à integridade física ou psicológica da criança ou do adolescente, atestado por profissional eventualmente designado pelo juiz para acompanhamento das visitas. 

Art. 5o Havendo indício da prática de ato de alienação parental, em ação autônoma ou incidental, o juiz, se necessário, determinará perícia psicológica ou biopsicossocial. 

§ 1o O laudo pericial terá base em ampla avaliação psicológica ou biopsicossocial, conforme o caso, compreendendo, inclusive, entrevista pessoal com as partes, exame de documentos dos autos, histórico do relacionamento do casal e da separação, cronologia de incidentes, avaliação da personalidade dos envolvidos e exame da forma como a criança ou adolescente se manifesta acerca de eventual acusação contra genitor. 

§ 2o A perícia será realizada por profissional ou equipe multidisciplinar habilitados, exigido, em qualquer caso, aptidão comprovada por histórico profissional ou acadêmico para diagnosticar atos de alienação parental.

§ 3o O perito ou equipe multidisciplinar designada para verificar a ocorrência de alienação parental terá prazo de 90 (noventa) dias para apresentação do laudo, prorrogável exclusivamente por autorização judicial baseada em justificativa circunstanciada.” 

Conceituar, exemplificar e apresentar a causa que resultou na promulgação da Lei de Alienação Parental sem estabelecer consequências ao alienador praticante de tais atos prejudiciais à criança e ao adolescente seria a mesma condição de “status quo ante”, ou seja, seria como se não existisse norma regulamentadora para inibir atos típicos da mencionada síndrome. Portanto, nos termos do art. 6º da Lei 12.318, evidenciada a alienação parental ou ainda qualquer ato que constitua dificuldade na relação de convivência entre o menor e o genitor por meio de uma medida judicial, seja esta medida uma ação movida em face do ato de alienação praticado antes da existência de uma demanda judicial (ação autônoma) ou mesmo surgida após a existência de uma ação principal (ação incidental), haverá, independentemente de responsabilidade civil ou criminal pelo ato praticado, a aplicação de sanção, cuja fixação ocorrerá na medida de sua gravidade a ser estabelecida pelo Magistrado em sentença condenatória podendo ser desde uma mera advertência até a declaração de suspensão do Poder Familiar, sendo também aqui utilizada como medida coercitiva a alteração da modalidade de guarda.

“Art. 6o Caracterizados atos típicos de alienação parental ou qualquer conduta que dificulte a convivência de criança ou adolescente com genitor, em ação autônoma ou incidental, o juiz poderá, cumulativamente ou não, sem prejuízo da decorrente responsabilidade civil ou criminal e da ampla utilização de instrumentos processuais aptos a inibir ou atenuar seus efeitos, segundo a gravidade do caso: 

I – declarar a ocorrência de alienação parental e advertir o alienador; 

II – ampliar o regime de convivência familiar em favor do genitor alienado; 

III – estipular multa ao alienador; 

IV – determinar acompanhamento psicológico e/ou biopsicossocial; 

V – determinar a alteração da guarda para guarda compartilhada ou sua inversão; 

VI – determinar a fixação cautelar do domicílio da criança ou adolescente; 

VII – declarar a suspensão da autoridade parental. 

Parágrafo único. Caracterizado mudança abusiva de endereço, inviabilização ou obstrução à convivência familiar, o juiz também poderá inverter a obrigação de levar para ou retirar a criança ou adolescente da residência do genitor, por ocasião das alternâncias dos períodos de convivência familiar. 

Art. 7o A atribuição ou alteração da guarda dar-se-á por preferência ao genitor que viabiliza a efetiva convivência da criança ou adolescente com o outro genitor nas hipóteses em que seja inviável a guarda compartilhada.” 

Importante salientar que o rol do art. 6º também se constitui como exemplificativo, sem esgotamento no texto legal acerca das medidas aplicáveis à pretensa inibição dos atos de alienação parental, como apontado doutrinariamente:

“Assim, os incisos do art. 6º da lei da Alienação parental são números apertus, ou seja, trata-se de um rol exemplificativo de medidas, não esgotando, de forma alguma, outras que permitam o fim ou a diminuição dos efeitos da Alienação Parental, como aduz o próprio caput do artigo: (…) e da ampla utilização de instrumentos processuais aptos a inibir ou atenuar seus efeitos, segundo a gravidade do caso.”

Assim, considerando o objetivo principal que se busca no desenvolvimento deste trabalho, as informações apresentadas aqui acerca da Lei 12.318/2010, embora ínfimas quando comparadas a uma análise sistemática da norma, possibilitam ao leitor um contato com o tema e o texto legal, bem como a correlação entre o propósito do que dispõe a Lei de Alienação Parental e o que pode fazer um indivíduo inserido na sociedade contribuindo para inibir a prática de tais atos como é o caso da figura do educador atuando como este agente.

4. A FIGURA DO EDUCADOR

Como é possível alguém exercer liderança transferindo saberes sem, sequer, atentar para as mazelas sofridas por aqueles que estão recebendo o ensinamento, se é que realmente recebem dada situação psicológica adversa eventualmente vivida, como as provocadas pela alienação parental?

Ao escrever acerca da pedagogia da autonomia, o Mestre Paulo Freire afirma que “não é possível exercer a atividade do magistério como se nada ocorresse conosco. Como impossível seria sairmos na chuva expostos totalmente a ela, sem defesas, e não nos molhar.” (Freire, 1996, pg. 38), ou seja, quanto à reflexão aqui proposta, é impossível ao educador perceber que uma criança ou adolescente está sofrendo psicologicamente porque está sendo uma vítima e um instrumento de alienação sem que seja por ele suscitada qualquer atitude em defesa daquele vulnerável.  

Assim, este capítulo trará em seu contexto uma análise quanto à finalidade precípua a que se problematiza o tema. Após uma visão geral da proteção da criança e do adolescente na sociedade brasileira, inclusive com a abordagem da principal Lei de nosso Ordenamento Jurídico que dispõe a regulamentar a inibição dos atos de alienação parental, adentraremos na seara do compromisso do educador com tal questão. Diante disso questiona-se: Qual a relação da educação com a alienação parental? Educador, neste contexto, é exclusivamente aquele que exerce profissionalmente o ofício de “professor” ou também aquele que está diretamente ligado ao encargo de transmitir conhecimento? É possível uma atuação particular do educador no combate da síndrome da alienação parental? Estes questionamentos, dentre outros possibilitarão uma reflexão do leitor acerca da problemática discutida.

A Lei de Alienação Parental expressa textualmente no rol exemplificativo do art. 2º que, dentre as formas de alienação parental existentes está a ausência deliberada do genitor alienador em omitir informações pessoais e importantes acerca da criança e do adolescente, inclusive informações escolares. Neste texto, o legislador deixa claro que o fator “educação” está diretamente ligado à alienação parental, motivo pelo qual, passa-se a presumir ser o educador potencial “aparelho” eficaz contra a SAP, numa pretensão não tão distante da realidade, bem como da necessidade para contribuição de uma legislação eficiente.

É certo que o ato específico de omissão das informações escolares pelo agente alienador ao genitor alienado com a finalidade de prejudicar a relação deste com seu filho(a) atualmente já possui mecanismos legais que podem inibi-lo, quais sejam, aquelas regras contidas na nova Lei da Guarda Compartilha e na Lei de Diretrizes e Base da Educação Nacional. É como afirma Freitas:

“Importante salientar que dentre os exemplos de alienação parental arrolados na lei, como o de omitir informações escolares, tal problema encontra-se solucionado com o advento de duas normas, a nova lei da guarda compartilhada (13.058/2014) e a reforma da lei de Diretrizes e Base da Educação Nacional – LDB (Lei 9.394, de 20 dezembro de 1996 – alterada pela Lei 12.013, de 6 de agosto de 2009) que incluiu inciso VII no art. 12: “VII – informar pai e mãe, conviventes ou não com seus filhos, e, se for o caso, os responsáveis legais, sobre a frequência e o rendimento dos alunos, bem como sobre a execução da proposta pedagógica da escola”. (Freitas, 2013, pg. 43). 

No entanto, a reflexão que se propõe aqui além da obrigatoriedade da instituição de ensino em prestar as informações escolares para ambos os genitores ou aos responsáveis pela criança ou adolescente, independentemente daquele que detenha a guarda do menor como apontado a pouco, se estende à atuação do educador a partir de um “olhar sensível” na percepção de atitudes do menor, de atos de seus genitores ou responsáveis que digam respeito a ações indicativas de presença da síndrome da alienação parental, motivo pelo qual o educador não deve se limitar apenas ao que dispõem as normas legais aqui referidas como sendo suficientes para, no âmbito de sua atuação profissional, atuar em prol do menor e por consequência do genitor alienado, considerando que tal limitação não é suficiente contribuição para inibir a alienação parental, pelo que, necessário e possível se fazer mais.

4.1 – Conceito de educação, educador e o núcleo social a que se aplica

A partir da análise anterior, se discorre acerca da educação em sentido amplo, antes de adentrar na figura do educador como eixo central neste momento da reflexão.

Educação consiste no ato de educar, trazer ao educando instrução, discipliná-lo quanto à conduta e hábitos, transferindo-lhe costumes e valores decorrentes da comunidade a que estão inseridos. A educação é uma qualidade do indivíduo que se forma por meio das situações vivenciadas no decorrer da vida.

Segundo René Hubert a educação “é um conjunto de ações e influências exercidas voluntariamente por um ser humano em outro, normalmente de um adulto em um jovem.”

A educação tem um fator de tamanha importância na vida do ser humano porque o acompanha por toda sua existência, claro, desde que o indivíduo se permita ser por ela envolvido. Mesmo que a pessoa nunca tenha frequentado a escola convencional ainda assim não se encontrará afastada da educação, isto porque, ela se manifesta na coletividade inclusive fora do ambiente formal da escola tendo como exemplo, aquela educação que se transmite através dos costumes.

Diz-se que a educação acompanha o indivíduo durante sua existência baseando-se na ideia de que a educação é um “processo contínuo de desenvolvimento das faculdades físicas, intelectuais e morais do ser humano”.

O propósito central da educação não deve ser outro, a não ser conduzir a pessoa numa integração de melhor nível possível dentro da sociedade ou em seu próprio grupo.

A educação no sentido formal (educação escolar) é aquela que vemos nos núcleos de educação continuada, como escolas, colégios, faculdades, universidades, apresentada como processo contínuo de formação e ensino aprendizagem, decorrente de políticas públicas de desenvolvimento social e formação intelectual de determinada coletividade.

Como informação complementar acerca da educação formal, no Brasil existe uma legislação específica para salvaguardar e direcionar a atuação do Estado e da sociedade quanto ao processo contínuo de formação, sendo atualmente regrada pela Lei nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996, conhecida como LDBEN – Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional que se divide em níveis entre a educação infantil, fundamental, médio e superior.

À margem da educação escolar é possível encontrar na sociedade outros ambientes e espaços de convívio social onde o indivíduo recebe conhecimento e formação. Há também um processo permanente de ensino-aprendizagem conhecido como “endoculturação” ou “socialização” em que a pessoa desde o nascimento até a morte, por constar inserido em determinado grupo social, consequentemente se submete permanentemente ao aprendizado de valores morais e culturais considerando que não se recebe mencionado aprendizado, por exemplo, geneticamente.

Neste diapasão, importante a indagação: Educador é somente aquele profissional que milita na educação formal?

Referido questionamento é de considerável relevância porque a alienação parental em suas várias formas pode ser detectada ou percebida em diversos ambientes frequentados pela criança ou adolescente e seus genitores que não seja aquele ambiente de formação escolar.

Assim, considerando o contexto explicitado acima, é possível estender a figura do educador como sendo “aquela pessoa que direta ou indiretamente exerce influência num lapso temporal relativamente importante sobre o pequeno núcleo familiar (pais e filhos) transmitindo-lhes o saber, ainda que se trate do conhecimento não formal como o aprendizado cultural e moral”.

Desta forma, é possível pensar na figura do educador como sendo, não somente o professor de escola, devendo ser incluída aqui, por exemplo, a figura do líder religioso (padre, pastor, sacerdote, etc…), profissionais de saúde, assistentes sociais, agentes comunitários, profissionais de ONG’s e outras instituições educativas do contra turno escolar.       

4.2 A relação entre educador e a criança ou adolescente

O educador no exercício de suas atividades assume um papel importante na vida da criança ou adolescente e, embora na maioria dos casos não haja relação de parentesco entre menor e educador, há considerável influência, sendo o educador aquele agente responsável pela transferência de informações que resultarão diretamente no desenvolvimento intelectual e pessoal do menor, tido como pessoa recebedora das informações decorrentes da relação ensino-aprendizagem.

Como abordado a pouco, em se tratando das situações em que pode ocorrer a alienação parental, não se pode considerar como educador apenas o professor do ensino formal, devendo assumir este papel todo aquele que exerce sobre o hipossuficiente o encargo de lhe transmitir conhecimento. Assim, é educador o professor que diariamente se depara com o aluno em sala de aula e demais ambientes de uma unidade escolar transmitindo-lhe informações que contribuam na formação intelectual, moral, de caráter, dentre outras.

Não é diferente quando se trata de ações praticadas contra turno escolar, sendo, também, educador, por exemplo, o pastor, o padre, o sacerdote, o líder espiritual que tem a criança ou adolescente sob sua “autoridade” para lhe transferir informações de cunho espiritual e moral, igualmente num sistema “ensino-aprendizagem”, influenciando na formação da pessoa como indivíduo inserido na sociedade. Igualmente, é possível considerar serem educadores aquelas pessoas em outros segmentos “extra escola” cuja atuação em relação ao menor têm deveras relevância dado tempo de convivência e de participação na vida do menor a exemplo de um médico que acompanha seu desenvolvimento, de um professor de línguas, um agente comunitário que acompanha o desenvolvimento da criança e daquele determinado núcleo familiar, enfim, inúmeros exemplos que se enquadram no perfil de pessoas com considerável potencial a ser um agente inibidor da alienação parental.

Pergunta-se então, qual a possibilidade deste agente, em seu tipo particular de relação com a criança ou adolescente manter um convívio com o menor a ponto ser um agente inibidor da alienação parental? É preciso uma relação de parentesco? É preciso uma relação de afeto? Deve se “invadir” a intimidade da família para ser um agente inibidor da alienação parental?

Para resposta a tais questionamentos e esclarecendo acerca da possibilidade de atuar contra o mal da alienação parental nos limites da relação existente entre o vulnerável e o educador é preciso, precipuamente, se debruçar sobre os Princípios Constitucionais voltados à proteção do menor, bem como a normatização trazida pelo Estatuto da Criança e do Adolescente. Desta forma, independentemente de uma relação afetiva ou de parentesco, há um dever intrínseco que vincula cada membro da sociedade. Como destacamos acima ao tratar das garantias legais da família e da proteção do menor, há uma obrigação legalmente estabelecida para que, não somente o Estado e a família cuidem em proteger o menor, mas, igualmente a Sociedade, assim, nos termos do “caput” do art. 227 da Constituição Federal, há um dever da coletividade em salvaguardar a criança e o adolescente da violência que lhes é imposta pela crueldade resultante da alienação parental. Aqui, caro leitor, quando se fala em sociedade como cuidadora dos interesses dos menores inclui-se necessariamente a figura do educador. O educador somente existirá enquanto inserido em um grupo social por mais remoto ou simplista que este possa ser. Dalmo de Abreu Dallari ao mencionar Ranelletti em sua obra Elementos da Teoria Geral do Estado afirma:

“onde quer que se observe o homem, seja qual for a época, mesmo nas mais re-motas a que se possa volver, o homem é sempre encontrado em estado de con-vivência e combinação com os outros, por mais rude e selvagem que possa serna sua origem. O homem singular, completamente isolado e vivendo só, próxi-mo aos seus semelhantes mas sem nenhuma relação com eles, não se encontrana realidade vida.” Dallari, 2003, pg. 11).

   Desta forma, evidente que por mais formal a relação vivida entre menor e educador, além do compromisso de ensino-aprendizagem, sempre existirá o dever de cuidado com a integridade daquele a quem se destina o ensino. O indivíduo enquanto educador não pode “fechar os olhos” ao perceber que a criança ou adolescente está sofrendo os males decorrentes da alienação parental.

Não pode o educador estar alheio aos atos de alienação parental que atingem um menor alegando desconhecê-los, porquanto, a matéria possui considerável divulgação por meio de artigos, livros e doutrinas de pesquisadores do tema, além do texto legal que, em simples leitura permite a compreensão básica do que se trata e de sua forma de exteriorização, bem como das vítimas da síndrome da alienação parental.

Assim, este momento da reflexão possibilita ao leitor considerar que a atuação do educador diante da temática discutida deve ser mais humanista do que propriamente técnica, respeitando sempre a intimidade do indivíduo e de sua família, porém, sem manter-se alheio às vicissitudes e mazelas trazidas por esta síndrome.

Embora não haja especificamente uma responsabilidade legal do educador como sendo agente inibidor da alienação parental, importante considerar, no mínimo, o dever moral, porquanto, esta ação contribui para uma sociedade melhor.

5. PRÁTICAS DE MEDIAÇÃO POSSÍVEIS PELO AO EDUCADOR

Por derradeiro, depois da reflexão havida sobre a família, a proteção legal do menor, análises de conceitos, protagonistas e Lei da Alienação Parental, após discorrermos acerca da figura do educador passando pela educação, conceitos e a relação importante entre educador e menor, demonstrando neste último a necessidade em manter o educador um “olhar” sensível para perceber naquelas crianças e adolescentes que com ele se relacionem no ensino-aprendizagem, bem como no genitor alienado a presença de afetação da síndrome, com o propósito de contribuir para afastar ou amenizar a atuação da alienação parental, necessário se faz apor neste trabalho, ainda que de forma geral e sucinta, possíveis maneiras práticas pelas quais o educador pode fazer uso diário na mediação diante dos conflitos de tal natureza.

Embora não se vislumbre um poder de atuação do educador diretamente constituído em lei, passamos a dispor sobre mecanismos que o retiram da inércia.

É preciso dizer que a aplicabilidade da reflexão que se apresenta pressupõe a percepção clara e inequívoca de que se trata de atos de alienação parental. Assim, não se deve aceitar ou incentivar qualquer investida irresponsável e de forma negligente quando se trata de atuar na mediação para inibir a alienação parental. Uma atuação duvidosa contra supostos atos de alienação parental por parte do educador ou de quem quer que seja pode resultar num conflito de resultado negativo semelhante àqueles ocasionados pela síndrome, portanto, a cautela, serenidade, atitudes conscientes são virtudes que também se esperam daqueles que lutam contra a síndrome da alienação parental afim de não causar um mal maior.

Pois bem, um educador que se depare com uma criança ou adolescente vítima de alienação parental ou, ainda, no desempenho de sua atividade observe que está diante do genitor alienador, poderá valer-se da própria norma de proteção do menor, o ECA, para inibir a ação alienadora.

Importante ressaltar que, dependendo da posição de atuação do educador, antes mesmo de providências consideradas aqui como sendo mais enérgicas, poderá como agente moderador mediar por meio da orientação aquela situação, considerando que este tipo de atitude não tem uma forma legal de se apresentar, se não a boa intenção e a predisposição com desejo de ver tal conflito pacificado. Entende-se possível a “orientação” como instrumento do educador na atuação contra alienação parental, desde que ele tenha contato com os genitores ou protagonistas da alienação. Assim, por exemplo, um padre que trabalhe numa paróquia atendendo determinada família, além da orientação espiritual transmitida, poderá no caso de litígio familiar que seja evidente aqueles atos de alienação como exemplificados na norma, orientar os envolvidos dos males de afetação, bem como das consequências legais impostas pela Lei de Alienação Parental caso persistam referidas práticas.    

Da mesma forma poderá atuar o pastor quando eventualmente membros de sua igreja se vêem em situação semelhante, cujo resultado terá como consequência a afetação psicológica da criança ou adolescente. Cumpre ao líder espiritual em sua atuação de ensino moral e religioso orientar seus fiéis quanto aos prejuízos trazidos por aqueles atos de alienação assim que percebidos pelo educador. Os exemplos acima servem para todo o educador, desde o técnico profissional àquele que exerce o ofício de educar nos moldes aqui já apresentados. Também é o caso do professor que em contato com o aluno menor percebe que está sendo usado como instrumento de alienação e, constituindo um “canal” de conversa com os genitores ou protagonistas da síndrome, pode exercer a mediação inibindo aqueles atos por meio da orientação acerca das consequências legais a que estão sujeitos.

Ressalte-se que práticas de mediação como estas já são uma realidade em nossa sociedade com atuação direta dos Tribunais de Justiça dos estados em certos tipos de litígios de natureza privada, inclusive investindo o órgão em treinamento e aprimoramento de pessoas da sociedade civil, capacitando-as para intermediação de conflitos, o que possibilita um investimento também voltado para os casos em que haja presença da alienação parental. 

No entanto, afastada a possibilidade de inibir a alienação pela orientação, o educador não pode deixar de buscar a proteção do menor. Diante disto, é possível que o educador atue contra a síndrome, basicamente, levando ao conhecimento das autoridades constituídas relevante fato. O educador após ter orientado sem sucesso as partes pode levar o caso ao Conselho Tutelar, sendo este, nos termos do art. 131, do Estatuto da Criança e do Adolescente, um “órgão permanente e autônomo, não jurisdicional, encarregado pela sociedade de zelar pelo cumprimento dos direitos da criança e do adolescente”. Buscar o Conselho Tutelar denunciando os atos de alienação parental é medida salutar a ser praticada pelo educador, pois é atribuição deste Conselho as providências extrajudiciais necessárias que resultam em atenuação ou, até mesmo, extinção da alienação. As atribuições do Conselho Tutelar vinculadas à proteção do menor constam do art. 136, da Lei n.º 8.069/90.

Poderá ainda o educador se valer do órgão do Ministério Público quando o objetivo for atuar em prol da criança e do adolescente inibindo a alienação parental. O educador exercerá tais providências por meio de uma representação formal diretamente no “parquet”. Cumpre ressaltar que é competência do Ministério Público a atuação nos casos em que envolva interesses de pessoa menor. O art. 82, do Código de Processo Civil, afirma que nas causas em que há interesses de menores haverá intervenção do Ministério Público:

“Art. 82. Compete ao Ministério Público intervir:

I – nas causas em que há interesses de incapazes; …”

O Ministério Público deverá representar em juízo sempre que houver infrações cometidas contra as normas de proteção à infância e juventude, nos termos do que dispõe o art. 201, X, do ECA. Assim, considerando que a alienação parental é ato que fere direito fundamental da criança e do adolescente conforme prescrito no art. 3º da Lei n.º 12.318/2010, a denúncia formalizada pelo educador ao membro do Ministério Público acerca da prática de atos de alienação parental realizados contra a criança e seu genitor é medida que obriga referido órgão, no mínimo, a instaurar procedimento para apuração dos fatos que, se comprovados, deverão resultar em medida judicial pertinente.

São algumas atitudes possíveis ao educador, podendo ser por ele adotadas, sempre com o devido cuidado e responsabilidade como mencionado acima, sempre no propósito de contribuir com a diminuição do sofrimento daqueles mais prejudicados nos litígios de família, contribuição que, por consequência, beneficiará também a sociedade como um todo.

Como se observa, independentemente de uma atribuição legal conferida ao educador como agente inibidor da alienação parental, considerando sua posição de proximidade com o menor e/ou seus genitores, aliada ao conhecimento e reflexão sobre o tema, é possível que o educador possa atuar fazendo frente à síndrome que precisa ser objeto de combate não apenas pelo Poder Público, mas, igualmente, pela sociedade civil em geral, cujo resultado será a consequente e esperada evolução social.   

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Discorrer sobre um tema de problemáticas tão relevantes para nossa sociedade é permitir a ampliação de debates no aprimoramento de valores dos quais uma sociedade livre e justa não pode se permitir afastar-se. As famílias vivenciam os prejuízos causados pela alienação parental diariamente e com ela não podem conviver como se tal malefício fosse algo a se acostumar considerando os prejuízos causados às pessoas que ela atinge, sendo que há reais possibilidades de inibição desta síndrome.

Este trabalho possibilitou refletir sobre a afetação que a alienação parental proporciona ao genitor alienado e à criança ou adolescente que passa a ser usada pelo alienador como instrumento da alienação.

Neste contexto, se permitiu analisar a família, especificamente quanto a seu conceito, natureza jurídica, garantias legais, bem como sua relação direta com a alienação parental. A pesquisa proporcionou reflexão acerca da proteção normativa, tanto na norma Constitucional (Constituição Federal) quanto infraconstitucional (Estatuto da Criança e do Adolescente), além da afirmativa quanto ao dever de desenvolvimento saudável com direito fundamental do menor.

O trabalho promoveu a oportunidade de falar do que se trata a alienação parental, a diferença entre síndrome e alienação parental, dos potenciais protagonistas, e, de alguns aspectos específicos da Lei de Alienação Parental (Lei n.º 12.318/2010). Ainda, como instituto diretamente vinculado à Síndrome da Alienação Parental, foi possível abordar sobre a “guarda” e suas modalidades.

Houve a oportunidade de se pensar a respeito da figura do educador, desenvolver reflexão acerca de quem é assim considerado, de apresentar a relação do educador com a criança e o adolescente, indicando, por conseguinte, práticas permissivas ao educador que lhe outorga direitos para atuar como mediador e agente inibidor diante de eventual caso de alienação parental.

Desta forma, é possível pensar numa ampliação legislativa no sentido de estabelecer regras no próprio texto da norma que dê maior legitimidade a determinados entes ou segmentos da sociedade, guardadas as devidas cautelas, para atuação específica nos casos de constatação de alienação parental, agindo por meio da mediação, seguindo, inclusive, a tendência do Novo Código de Processo Civil, com publicação para entrada em vigor a partir de março de 2016 (Lei n. 13.105/2015) que privilegia a solução de conflitos por meio da mediação ao invés do litígio, de forma a possibilitar um maior envolvimento da sociedade na proteção da criança e do adolescente.

A pesquisa permite concluir que o Estado tem o dever de ampliar suas políticas públicas voltadas para educação familiar por meio de divulgação em campanhas publicitárias e investimentos em programas destinados à família, capacitando e remunerando profissionais educadores para atuar, seja com os pais ou crianças e adolescentes frente à alienação parental, inibindo e, porque não até extinguindo este infortúnio antes mesmo de seu agravamento que na maioria dos casos, acaba por resultar em intervenção judicial, abarrotando ainda mais o Judiciário.

Esta reflexão ainda permite afirmar que é inaceitável esperar ou pressupor que o Poder Judiciário seja quase que com exclusividade o “agente inibidor” da alienação parental, atuando como ente soberano nessa questão.

Ora, há que se ponderar o prejuízo para a sociedade quando se transfere esta responsabilidade de todos para o sistema do Poder Judiciário. Isto porque, quando o caso de alienação parental é objeto de análise pelo magistrado, principalmente em razão dos quase infinitos processos que se perpetuam em nossos tribunais decorrentes da sempre crescente demanda, por mais atuante que possa ser aquele julgador, por se tratar de processo judicial, resta a certeza de que aquele menor, independentemente do resultado final da ação judicial, já tenha sido afetado pelas sequelas trazidas pela síndrome da alienação parental de forma irreparável devido a demora na tramitação dos processos, cujo tempo, ao invés de apagar, causará um mal ainda maior, ou seja, prejuízo não apenas àquele indivíduo a que se destina a afetação, mas, à criança ou adolescente que é usada como instrumento de alienação e, também à toda coletividade.   

Então, porque não imaginar a possibilidade da sociedade civil contribuir com maior eficiência no combate da síndrome da alienação parental, atuando por meio dos professores no âmbito escolar e de educadores que exercem tal ofício através de associações, ONG’s, igrejas e outras entidades sem fins lucrativos, e, porque não incluir também o empresariado em geral, considerando que suas empresas devem cumprir função social, todos neste combate, realizando, por exemplo, palestras educativas, seminários específicos sobre a temática, atuando por meio de profissionais especializados, bem como na preparação de pessoal para tal finalidade.

Aqui, cumpre destacar uma pesquisa de campo realizada para consecução deste artigo que trouxe informações consideráveis a respeito do tema. Os participantes, todos educadores e, na maioria, profissionais da área da educação infantil (professores, coordenadores e diretores de escola), além de outros educadores do contra turno escolar, auxiliaram na pesquisa respondendo “sim” ou “não” às seguintes afirmativas: a) Sei do que se trata a Alienação Parental; b) Conheço a Lei que dispõe sobre a Alienação Parental; c) Desenvolvo trabalho educacional com crianças ou adolescentes (crianças: até 12 anos; adolescentes: acima de 12 até 18 anos); d) Desenvolvo trabalho educacional e dentre os menores há filhos de pais “separados”; e) Tenho conhecimento de que alguns pais (pai ou mãe) ou parentes (avós) tiveram dificuldades de contato com o filho(a) por causa do outro genitor; e f) Já identifiquei criança/adolescente com perda de rendimento escolar, cujo motivo tenha relação com a “separação” dos pais.

A pesquisa revelou que, daqueles entrevistados:

a) 70% sabem o que é Alienação Parental.

b) apenas 20% conhecem a Lei 12.318/2010 (Lei de Alienação Parental).

c) 74% desenvolvem atividades com crianças ou adolescentes.

d) 90% desenvolvem trabalho com crianças e/ou adolescentes, cujos pais não mantem mais aquele vínculo conjugal.

e) 84% sabem de pais que tiveram dificuldades de contato com o filho(a) por causa do ex-cônjuge.

f) 88% já identificaram perda de rendimento em crianças, cujos pais não mais convivem maritalmente.

Assim, os dados acima revelam que embora a maioria dos educadores ainda não tenha contato com o texto da lei, sabem do que se trata a alienação parental e mais, a significativa maioria tem possibilidade de reconhecê-la, tendo em vista a percepção para identificar situações vividas pelo genitor alienado, bem como pelo menor que pode configurar a prática da alienação.

Diante do exposto, não seria de bom alvitre considerar a figura do educador como sendo um agente inibidor da afetação trazida pela alienação parental?

Há que se considerar o educador como um “caminho mais curto” e a de maior eficácia no combate ante a prejudicial síndrome aqui rechaçada.

Portanto, a pesquisa procurou contribuir para a importante reflexão que precisa ser crescente em nossa sociedade objetivando amenizar as consequências maléficas decorrentes desta que tem afetado inúmeras crianças e adolescentes de forma quase que irreparável, além de abalar famílias inteiras, retirando destes e da coletividade a paz de espírito tão necessária, constituindo, sobretudo, um retrocesso no caminho da evolução para uma sociedade mais justa e isonômica.

 

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Informações Sobre o Autor

Renato Oliveira Batista

Advogado com atuação nas áreas Cível Família Empresarial e Trabalhista; Professor especialista em curso superior; Contabilista


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