Resumo: Este meta-artigo aborda alguns aspectos da lei 9.613/98 com as principais alterações trazidas pela lei 12.683/12. Serão consideradas questões referentes à importância de sua origem histórica a fim de elucidar o motivo pelo qual há a exigência de constantes mudanças a fim de coibir a prática de tal crime, ressaltando em especial a marcante extinção do rol taxativo de crimes antecedentes para a configuração do Branqueamento de Capitais. Tratar-se-á da aplicabilidade de delação premiada com seus desdobramentos, evidenciando sua relevância com a finalidade de demolir organizações criminosas que cometam a lavagem como também identificar criminosos, e/ou facilitar a localização de bens, direitos e valores.
Palavras-chave: Lavagem de Capitais, Infração Penal, Crimes antecedentes, Colaboração Premiada.
Abstract: This meta-article is about some aspects of 9.613/98 law with some modifications brought by 12.683/12 law. Some questions will be considered due to their historical origin to elucidate the motive for which there is an obligation for constant changes to prevent this type of crime, highlighting in special the extinction of predecessor crimes to configuration of money laundering. It talks about plea bargaining and its unfolding by showing its relevance with the finality to destroy criminal organizations which practice money laundering, their localization and values.
Keywords: Money laundering, Criminal offence, Plea bargaining and Predecessor crimes.
Sumário: Introdução. 1. História. 2. Etimologia. 3. Conceito. 4. Fases do crime de lavagem de dinheiro. 5. Geração das Legislações em Razão ao Crime Antecessor. 6. Principais Alterações da lei nº 12.683/12 em relação à 9.613/98. 6.1. Mudança da lei de 2ª geração para 3ª geração. 6.2. Tipo Subjetivo. 6.3. Colaboração Premiada. 6.3.1. Origem. 6.3.2. Conceito. 6.3.3. Previsão legal. 6.3.4. Regime Inicial. 6.3.5. Substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos. 6.3.6. Eficácia objetiva da colaboração premiada. 6.3.7 Momento da Colaboração Premiada. Conclusão. Referência Bibliográfica.
Introdução
O presente artigo abrange desde a história do crime de Lavagem de Dinheiro, destrinchando seus mecanismos de ação bem como os caminhos percorridos pelos criminosos a fim de burlar a fiscalização acerca da origem monetária obtida de suas atividades ilícitas.
É descrito de maneira didática o conceito de tal crime, suas fases, a geração na qual o Brasil é inserido bem como as principais alterações ocorridas na lei 9.613/98 em face da 12.683/12.
Serão estudados e discutidos a acessoriedade do crime, o elemento subjetivo, a colaboração premiada e seus desdobramentos.
Em cada tópico houve a preocupação em detalhar cada assunto haja vista a importância da Lavagem de Dinheiro uma vez que apresenta internacionalidade e afeta toda a coletividade, servindo de impulso para o cometimento de crimes na maioria das vezes gravíssimos, como por exemplo, a extorsão mediante sequestro e o narcotráfico.
É importante ressaltar, que neste momento, não há meios de esgotar tal conteúdo uma vez que cada artigo da lei traz consigo algum comentário e opinião, muitas vezes divergentes, entre a doutrina.
A pretensão do artigo é mostrar que a Lavagem de Dinheiro é um crime que advém da criminalidade organizada que produz prejuízo financeiro, mas também “carrega” como sujeitos passivos àqueles do seu crime anterior. É um crime que envolve países formando uma globalização “negra” e merece destaque em seu combate.
1 História
O primeiro país a criminalizar a lavagem de dinheiro foi a Itália através de um decreto que rapidamente foi convertido em lei em 1978, no chamado “anos de Chumbo”. Essa foi criada em face às Brigadas Vermelhas – organização política italiana de esquerda, que à época estava envolvida em atos de sabotagem, sequestros e atentados com escopo econômico. Foi responsável, dentre outros crimes, pela morte do democrata cristão e primeiro ministro, Ado Moro.
Em 1986, era vigente nos EUA a “lei Seca” que proibia a comercialização de bebidas alcoólicas. Através do tráfico de bebidas, que era obtido o dinheiro ilícito pelos criminosos, posteriormente “transformado” em lícito. Houve a necessidade, então da promulgação de uma lei, “Money Laudering Control Act”, que coibisse a pseudo transformação do dinheiro ilícito para lícito. A expressão “lavagem de dinheiro” surgiu neste momento por conta do mecanismo através do qual era feito a declaração da origem monetária.
A origem da expressão lavagem de dinheiro, no dizer CASTELLAR:
“A expressão lavagem de dinheiro originou-se, historicamente, no costume das máfias norte americanas, na segunda década do século 20, de usar lavanderias para ocultar a procedência ilegal de seu dinheiro. Deve-se observar que em muitos países, inclusive Portugal, em vez de ‘lavagem de dinheiro’ é usado o termo “branqueamento de dinheiro”. Internacionalmente, a expressão “Money laudering” é utilizada para designar esta atividade. Esta terminologia vem recebendo algumas críticas no meio jurídico pela sua falta de rigor técnico devido sua origem popularesca, e, inclusive, à expressão branqueamento, é atribuída à pecha de racista. Alguns doutrinadores preferem utilizar o termo Lavagem de Capitais, pelo seu caráter mais abrangente.” (CASTELLAR, op.cit.).
“A origem da expressão lavagem de dinheiro, no dizer de Cervini, “proviene de la costumbre de las ‘máfias’ norte americanas em la década de 20 de adquirir o montar lavanderias para ocultar los ingressos procedentes de sus atividades”, de modo que somente em tempos mais recentes , segundo esse mesmo autor, é que se aplica comumente “para designer la conversion del produto econômico del narcotráfico” (CERVINI apud CASTELLAR, op.cit., p.81).
Após a descriminalização do comércio de bebidas, tais criminosos tiveram que providenciar outros crimes para angariar seu dinheiro “sujo”, aumentando o rol dos crimes antecedentes como, por exemplo: o narcotráfico e jogos. Desta forma o “ativo” dessas empresas criminosas aumentou de forma extraordinária, dificultando assim o depósito do dinheiro vivo (“cash”) nos bancos sem causar suspeita de sua origem ilícita. Os EUA começam, neste lapso temporal, a cercear a facilidade que esses detinham na declaração da origem do dinheiro. Isso fez mais uma vez, com que houvesse mudança na rota do dinheiro. Surgem aí os “Paraísos Fiscais”, que nada mais são que Estados onde a lei facilita a aplicação de capitais estrangeiros, oferecendo tributação baixa e facilidade para a aplicação de dinheiro de origem desconhecida, protegendo a identidade dos proprietários deste bem – “Off Shore Banks”.
A lavagem de dinheiro tornou-se um fenômeno global enovelando países de todo o mundo. Então, em 1988, foi elaborado pela ONU o 1º tratado Global de combate à lavagem de dinheiro – a denominada Convenção de Viena.
Outros tratados internacionalmente reconhecidos acerca deste tema são: Convenção de Estrasburgo (1990), Convenção de Palermo (2000), Convenção Mérida (2003), Convenção de Varsóvia (2005).
No Brasil, em 1998, foi promulgada a lei Federal de nº 9613 que há dois anos sofreu importantes alterações, sobre as quais iremos versar durante o desenvolvimento deste artigo.
2 Etimologia
Etimologicamente a expressão lavagem de dinheiro pode ser dissociada em lavar, verbo vindo do latim “lavare” que significa tornar puro, enquanto dinheiro, substantivo oriundo também dessa língua, “denario” que significava moeda romana, atualmente moeda corrente.
3 Conceito
A acepção deste crime pouco diverge dentre as obras existentes no país e fora. Basicamente, não há alterações significativas no entendimento dos autores.
Destacaremos dois conceitos que nos pareceram bastante completos.
“Lavagem de dinheiro é o processo pelo qual o criminoso transforma recursos ganhos em atividades ilegais em ativos com uma origem aparentemente legal. Essa prática geralmente envolve múltiplas transações, usadas para ocultar a origem dos Ativos financeiros e permitir que eles sejam utilizados sem comprometer os criminosos. A dissimulação é, portanto, a base para toda operação de lavagem que envolva dinheiro proveniente de um crime antecedente.” (http://www.coaf.fazenda.gov.br/links-externos/cartilha.pdf).
“Tradicionalmente, a lavagem de dinheiro tem sido encarada (isoladamente) como a limpeza do dinheiro sujo gerado por atividades criminosas; na imagem mental coletiva, esses crimes estão provavelmente associados ao tráfico de drogas. É claro que a lavagem de dinheiro inclui esse tráfico, mas na verdade abrange muito mais. Para entender e avaliar o poder e a influência da lavagem de dinheiro é necessário recordar a finalidade dos crimes. A imensa maioria dos atos ilegais é perpetrada para conseguir uma só coisa: dinheiro. Se for gerado pelo crime, o dinheiro será inútil a menos que a fonte sórdida dos recursos possa ser disfarçada ou preferivelmente ‘apagada’. A dinâmica da lavagem de dinheiro assenta sobre o âmago corrupto dos muitos problemas sociais e econômicos espalhados pelo mundo todo.” (LILLEY, 2001, p.11).
Nossa legislação pune o crime de lavagem ou ocultação de bens, direitos e valores:
Art. 1o Ocultar ou dissimular a natureza, origem, localização, disposição, movimentação ou propriedade de bens, direitos ou valores provenientes, direta ou indiretamente, de infração penal. (art. 1º da lei 12.683/12)
4 Fases do crime de lavagem de dinheiro
O crime de lavagem de dinheiro possuí 3 fases, a saber: (Baltazar Junior, 2007, p.21).
Primeira fase: é a de colocação (placement), conversão ou ocultação. Nessa o criminoso fará com que não haja conexão entre o dinheiro ilícito e o crime anterior realizando, por exemplo, a compra em “cash” de algum móvel ou imóvel com posterior venda desses e fornecendo assim uma transação comercial com comprovação da origem do dinheiro.
Segunda fase: é a da dissimulação (Layering). Nessa há uma mistura de dinheiro lícito e ilícito em múltiplas transações bancárias a fim de extinguir qualquer conotação ilícita entre os bens.
Terceira fase: é a da integração (integration). Os criminosos retornam o dinheiro à economia através de investimentos lícitos.
5 Geração das Legislações em razão ao Crime Antecessor
A doutrina expõe três gerações de legislações, a saber:
1ª geração ou sistema único: considera a existência da lavagem de dinheiro apenas quando oriunda do tráfico de entorpecentes
2ª geração ou sistema parcial: considera a existência da lavagem de dinheiro quando presentes alguns dos crimes antecedentes descritos em um rol taxativo – como p. ex. tráfico de entorpecentes, terrorismo, extorsão mediante sequestro, dentre outros – como era previsto na lei 9.613/98.
3ª geração ou sistema total: aquele que declina um rol meramente exemplificativo em seu texto legal, podendo ser consideradas infrações antecedentes tanto crime quanto contravenções. Essa é a adotada pela legislação brasileira atual.
O Brasil se inseria anteriormente na de 2ª geração, passando através das alterações trazidas pela lei 12.683/12, a pertencer á 3ª geração.
6 Principais Alterações da lei nº 12.683/12 em relação à 9.613/98
6.1 Mudança da lei de 2ª geração para 3ª geração
A lei 9.613/98 apresentava um rol exaustivo de crimes antecedentes para que se caracterizasse a lavagem de dinheiro conforme era elencado no art. 1º:
“Art. 1º Ocultar ou dissimular a natureza, origem, localização, disposição, movimentação ou propriedade de bens, direitos ou valores provenientes, direta ou indiretamente, de crime:
I – de tráfico ilícito de substâncias entorpecentes ou drogas afins;
II – de terrorismo;
II – de terrorismo e seu financiamento; (Redação dada pela Lei nº 10.701, de 9.7.2003).
III – de contrabando ou tráfico de armas, munições ou material destinado à sua produção;
IV – de extorsão mediante seqüestro;
V – contra a Administração Pública, inclusive a exigência, para si ou para outrem, direta ou indiretamente, de qualquer vantagem, como condição ou preço para a prática ou omissão de atos administrativos;
VI – contra o sistema financeiro nacional;
VII – praticado por organização criminosa.
VIII – praticado por particular contra a administração pública estrangeira (arts. 337-B, 337-C e 337-D do Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940 – Código Penal). (Inciso incluído pela Lei nº 10.467, de 11.6.2002).”
Após a alteração foram abolidos da redação tais crimes fazendo com que qualquer crime ou contravenção, ou seja, que qualquer infração penal, que seja capaz de gerar ativos de origem ilícita, sirva como antecedente para que exista a lavagem de dinheiro, podemos agora destacar a contravenção de “jogo do Bicho”.
Como vimos, a lavagem de capitais é um crime acessório, ou seja, depende de uma infração penal anterior que produza o dinheiro, bem ou valor que será objeto de ocultação, para que subsista.
De acordo com a lei 12.683/12 em seu art. 2º § 1º:
“§ 1o A denúncia será instruída com indícios suficientes da existência da infração penal antecedente, sendo puníveis os fatos previstos nesta Lei, ainda que desconhecido ou isento de pena o autor, ou extinta a punibilidade da infração penal antecedente.”
Desta forma, pelo fato de ser adotada a teoria da acessoriedade limitada, o crime de lavagem de dinheiro será punível caso a conduta antecessora a esse seja típica e ilícita, não havendo a necessidade da comprovação de elementos de autoria, culpabilidade e/ou punibilidade alusivo à infração antecedente, desta forma, havendo absolvição em face da infração penal antecedente com base no reconhecimento da atipicidade ou ilicitude do fato, não será punível também o crime de lavagem de capitais.
Todavia, é importante ressaltar que havendo absolvição da infração antecedente com base em qualquer causa excludente de culpabilidade, existirá a possibilidade da punição pelo crime de branqueamento de capitais.
6.2 Tipo Subjetivo
O elemento subjetivo para configurar o crime de lavagem de capitais é o dolo, ou seja, à vontade e consciência dirigidas a realizar a conduta prevista no tipo incriminador.
A lei 9.613/98, antes das alterações de 2012, conforme já visto, previa um rol taxativo de crimes antecedentes para configurar o crime de lavagem de capitais, havendo a necessidade neste caso, do conhecimento do autor da presença do crime descrito em tal rol. Neste momento, existiam inúmeras críticas devido à lacuna deixada pela lei, uma vez que habitualmente aqueles que apenas ocultavam desconheciam exatamente de qual o artigo penal havia sido obtido o ilícito.
Com o advento da lei 12.683/2012, basta para a configuração do crime em questão, a prática anterior de infração penal que gere vantagens a ser ocultado, desta forma, o elemento subjetivo se verificaria se todos os requisitos do art. 1º da lei de “lavagem” de dinheiro forem preenchidos, conforme seu artigo primeiro:
“Art. 1o Ocultar ou dissimular a natureza, origem, localização, disposição, movimentação ou propriedade de bens, direitos ou valores provenientes, direta ou indiretamente, de infração penal..
Pena: reclusão, de 3 (três) a 10 (dez) anos, e multa. .
§ 1o Incorre na mesma pena quem, para ocultar ou dissimular a utilização de bens, direitos ou valores provenientes de infração penal.
I – os converte em ativos lícitos;
II – os adquire, recebe, troca, negocia, dá ou recebe em garantia, guarda, tem em depósito, movimenta ou transfere;
III – importa ou exporta bens com valores não correspondentes aos verdadeiros.
§ 2o Incorre, ainda, na mesma pena quem: .
I – utiliza, na atividade econômica ou financeira, bens, direitos ou valores provenientes de infração penal; .
II – participa de grupo, associação ou escritório tendo conhecimento de que sua atividade principal ou secundária é dirigida à prática de crimes previstos nesta Lei.(…)”
Destarte com a elaboração da nova redação este obstáculo à punição foi suprimido uma vez que com a abolição do rol de crimes basta que o autor tenha ciência de que o valor tenha sido obtido através de uma infração penal, incluindo claro, as contravenções penais, em especial, o jogo do Bicho, como bem ensina Luiz Flávio Gomes:
“O chamado “jogo do bicho” não é previsto como crime no Brasil, sendo considerado apenas contravenção penal tipificada no art. 51 do Decreto-Lei n. 3.688/1941. Logo, os chamados “bicheiros” ganhavam muito dinheiro e, com essa quantia, compravam imóveis e carros em nome da esposa, parentes, amigos, que funcionavam como “laranjas” ou então abriam empresas de fachada apenas para “esquentar” as quantias recebidas com a contravenção penal. Tal conduta de ocultação ou dissimulação do dinheiro “sujo” passa somente agora a ser punida como lavagem, nos termos do novo art. 1º da Lei n. 9.613/98”.
Frisamos com propriedade que mesmo diante da nova alteração há também a necessidade da existência do dolo no momento que o criminoso tem consciência de que os valores ocultados são produtos de infração penal. Introduzindo na redação como elemento subjetivo o dolo eventual no momento em que revogou a expressão “que sabe” do art. 1º § 2, I. Todavia, não se confunde com o crime do art. 1º, §2º, II que só pode ser punido a título de dolo direto tendo em vista a permanência da expressão “Tendo conhecimento”.
A comprovação do dolo poderá ser obtida com base nos elementos objetivos diante do caso concreto em razão da dificuldade de confirmação da real intenção do autor do crime.
6.3 Colaboração Premiada
6.3.1 Origem
A colaboração premiada também chamada de crown witness (testemunha da coroa), teve origem em países como Itália e Espanha diante da necessidade em combater o terrorismo e o crime organizado.
Ela está presente em nosso Ordenamento Jurídico desde a década de 90, através da lei nº 8.072/90 em seu artigo 8º § único:
Parágrafo único. O participante e o associado que denunciar à autoridade o bando ou quadrilha, possibilitando seu desmantelamento, terá a pena reduzida de um a dois terços.
Outros dispositivos legais discorrem acerca desta benesse também, como por exemplo: CP, art.159, §4º. Lei 7.492/86, art. 25, § 2º, Lei nº 8.137/90, art. 16, § único.
6.3.2 Conceito
Consiste em uma técnica especial de investigação na qual o próprio autor, coautor ou partícipe da infração penal colabora com as autoridades estatais no curso da persecução penal, seja para permitir a localização de bens direitos ou valores objeto do crime, seja para identificação dos demais coautores e partícipes, ou para facilitar a libertação do sequestrado (em caso de sequestro).
Delação premiada X Colaboração Premiada
Delação Premiada
A delação pressupõe a identificação dos demais agentes, ou seja, a incriminação de terceiros, “apontando-os” como culpados pelo crime. Conhecida também como chamamento de corréu.
Colaboração Premiada
Colaboração é o gênero do qual a delação é espécie.
O criminoso tem a possibilidade de colaborar com a persecução penal sem que necessariamente incrimine terceiros, como por exemplo, auxiliar na localização do produto de crime, na localização de pessoa sequestrada, etc…
A colaboração premiada é um beneficio pessoal e plenamente compatível com o Princípio do nemu tenetur se detegere (sujeito não é obrigado a produzir prova contra si mesmo), uma vez que o criminoso não é obrigado a colaborar. É ato voluntário, e o fará caso haja interesse em fazê-lo, obstante não ser necessariamente espontâneo. Nesse sentido, é possível que a autoridade incentive o criminoso com intuito de que haja a colaboração.
O ato é espontâneo quando a vontade partiu do próprio delator e voluntário quando a vontade não partiu desse, a ideia pode ter sido estimulada por um terceiro, no entanto, o delator tem ou não opção de acatá-la.
6.3.3 Previsão legal
A colaboração premiada está espalhada pela legislação, nos diversos dispositivos legais, o legislador exige determinada colaboração, e concede um beneficio.
O legislador não unificou o instituto numa lei específica. Temos a previsão deste instituto, por exemplo, na Lei dos Crimes Hediondos (8.072/90), lei de drogas (11.343/06), Crimes contra ordem tributaria (8.137/90), no Código Penal – Art. 159: Extorsão mediante sequestro – interesse na libertação da vítima, entre outros.
Destacamos a colaboração premiada da lei de “lavagem” de dinheiro, em seu Art. 1º, “§5º, previamente à alteração:
§ 5º A pena será reduzida de um a dois terços e começará a ser cumprido em regime aberto, podendo o juiz deixar de aplicá-la ou substituí-la por pena restritiva de direitos, se o autor, coautor ou partícipe colaborar espontaneamente com as autoridades, prestando esclarecimentos que conduzam à apuração das infrações penais e de sua autoria ou à localização dos bens, direitos ou valores objeto do crime.”
Posteriormente à alteração:
“§ 5o A pena poderá ser reduzida de um a dois terços e ser cumprida em regime aberto ou semiaberto, facultando-se ao juiz deixar de aplicá-la ou substituí-la, a qualquer tempo, por pena restritiva de direitos, se o autor, coautor ou partícipe colaborar espontaneamente com as autoridades, prestando esclarecimentos que conduzam à apuração das infrações penais, à identificação dos autores, coautores e partícipes, ou à localização dos bens, direitos ou valores objeto do crime.”
São verificadas sensíveis alterações neste parágrafo.
Dentre elas o regime inicial de aberto ou semiaberto, o emprego da expressão “a qualquer tempo” e introdução da conjunção “ou”.
Devemos destacar que a palavra “poderá”, usada no texto legal, não significa que se trata de mera discricionariedade do juiz, mas de direito subjetivo do criminoso colaborador, ou seja, preenchido todos os requisitos da colaboração, deverá receber seus benefícios.
6.3.4 Regime Inicial
Com a alteração produzida pela lei º 12.683/12, o cumprimento da pena após a sua redução, poderá se dar tanto em regime aberto quanto em semiaberto.
6.3.5 Substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos
Dependendo do grau de colaboração, o juiz poderá substituir a pena privativa de liberdade por restritiva de direitos, independentemente das disposições do art. 44 do código Penal.
6.3.6 Eficácia objetiva da colaboração premiada
Com a finalidade de que o agente faça jus aos benefícios -prêmios legais- é indispensável aferir a eficácia objetiva de sua colaboração, ou seja, não importa a mera declaração das informações, e sim a concretude dos efeitos obtidos com a colaboração.
Não há interesse acerca dos motivos pelos quais impeliram o criminoso a colaborar com as autoridades. Esses são irrelevantes para a concessão dos benefícios, ao contrário da eficácia objetiva, que é essencial para a concessão do benefício.
6.3.7 Momento da Colaboração Premiada
Os diplomas legais não tratam do momento em que deve ser apresentada a delação premiada, essa poderá se operar a qualquer momento da persecução penal, e até mesmo após o trânsito em julgado da sentença. Isso passa a ser expressamente permitido, ante a nova redação do art. 1º, §5º, da lei de lavagem de dinheiro que acrescentou a expressão “a qualquer tempo”.
Art. 1º § 5o: A pena poderá ser reduzida de um a dois terços e ser cumprida em regime aberto ou semiaberto, facultando-se ao juiz deixar de aplicá-la ou substituí-la, a qualquer tempo, por pena restritiva de direitos, se o autor, coautor ou partícipe colaborar espontaneamente com as autoridades, prestando esclarecimentos que conduzam à apuração das infrações penais, à identificação dos autores, coautores e partícipes, ou à localização dos bens, direitos ou valores objeto do crime.
Neste sentido, merece destaque o ensinamento de Jesus (2005, p. 3):
A análise dos dispositivos referentes à "delação premiada" indica, em uma primeira análise, que o benefício somente poderia ser aplicado até a fase da sentença. Não se pode excluir, todavia, a possibilidade de concessão do prêmio após o trânsito em julgado, mediante revisão criminal. Uma das hipóteses de rescisão de coisa julgada no crime é a descoberta de nova prova de "inocência do condenado ou de circunstância que determine ou autorize diminuição especial de pena" (art. 621, III, do CPP). Parece-nos sustentável, portanto, que uma colaboração posterior ao trânsito em julgado seja beneficiada com os prêmios relativos à "delação premiada".
Eis algumas das importantes aplicações de tal instituto no combate a vários crimes, dentre eles o de "lavagem de dinheiro" visto que esse é uma espécie delitiva que acarreta graves consequências à ordem econômico-financeira e precisa ser combatido severamente.
Conclusão
Diante do exposto, é notória a importância do combate ao crime de Lavagem de Dinheiro pelo dano causado tanto à coletividade quanto à ordem econômica.
De acordo com a lei em estudo, verificamos a necessidade de uma infração anterior para que subsista a Lavagem de Dinheiro que por ser extremamente rentável, expande seus “tentáculos” mundialmente a fim de mascarar a ilicitude da origem de seu capital. Nota-se também a frequente remodelação do modus operandi das organizações criminosas quando a lei tenta criar obstáculos à sua prática, tentando ficar sempre “um passo à frente” da lei.
Por este motivo, existe o dever do Estado em investir na capacitação dos funcionários responsáveis pela persecução criminal bem como leis mais rígidas que produzam efeitos concretos, todos interligados mundialmente, para que dificulte de forma considerável esta prática.
Ratificamos que esse artigo não pretendeu esgotar os estudos acerca da lei referida, elencando apenas alguns aspectos relevantes trazidos por ela.
Enfatizamos a substituição do rol taxativo de crimes antecedentes pela prática de qualquer infração penal que possa gerar bens, direitos ou valores a serem ocultados ou dissimulados.
Discorremos a respeito da delação premiada bem como as alterações produzidas pela lei 12.683/12.
Em suma, é esperado que estas alterações sejam um marco benéfico à persecução criminal frente ao crime de Lavagem de Dinheiro, buscando a efetividade no cumprimento de sua função.
bacharel em Direito e investigadora de polícia
Graduada e pós-graduada na área de biológica e investigadora de polícia
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