“Por esse pão pra comer, por esse chão pra dormir. A certidão pra nascer, e a concessão pra sorrir; por me deixar respirar, por me deixar existir…
Deus lhe pague.”
Assim como sugere a música de Chico Buarque, composta em 1971, há no Brasil um significativo contingente de pessoas que vivem em circunstâncias degradantes, subjugadas por outra pessoa. Dentre elas, há aquelas que são sujeitadas ao trabalho escravo.
Escravo, em uma das definições encontradas no dicionário Aurélio, é caracterizado como “aquele que está inteiramente sujeito a outrem, ou a alguma coisa”.
Legalmente, a escravidão foi abolida no Brasil no ano de 1888, por meio da Lei Áurea. Porém, a prática de sujeitar uma pessoa a oferecer-se inteiramente aos ditames de outra é ainda freqüente no país, mesmo passados mais de 100 anos do “fim da escravidão”.
Atualmente, o trabalho escravo pode ser identificado de várias formas, entre elas há o aliciamento de pessoas para trabalhos forçados em zonas rurais de difícil acesso, e a imigração de bolivianos para cidades do Brasil, São Paulo principalmente, para o trabalho em confecções.
Em ambos os casos, as pessoas são atraídas pela proposta de emprego por acreditarem que ele será justo e digno. Entretanto, são levadas até o local combinado e, depois, forçadas fisicamente a permanecerem lá, seja por homens armados, ameaças, espancamentos, ou pelo simples fato de serem mantidos trancados dentro do ambiente de trabalho. Há também a coação moral pela dívida que os trabalhadores contraem com o empregador, ao serem obrigados a pagar pelo transporte que as deixou ali, pela estadia, instrumento de trabalho e alimentação que, na maioria dos casos, só são oferecidos pelo patrão, e a preços exorbitantes.
Nota-se, portanto, que embora a escravidão moderna não seja marcada por pessoas acorrentadas em senzalas oitocentistas, grilhões, pelourinhos e chicotes, ela é tão degradante e presente quanto àquela “abolida” há mais de 100 anos. Resta-nos encontrar alternativas eficientes o bastante para erradicar o trabalho escravo.
A primeira alternativa, talvez a mais importante, e cujos resultados serão sentidos a longo prazo, mas de forma essencial, é propiciar a educação de qualidade para a sociedade.
O ensino muda o homem e faz com que ele mude a sociedade. Se o governo investir em educação eficaz para todos, as pessoas irão perceber que têm seus direitos individuais e sociais e também que o governo tem a obrigação de garantir escolas para seus filhos, saúde, transporte, higiene básica… Elas não aceitarão mais serem submetidas a condições degradantes de trabalho; passarão até mesmo a observar mais atentamente às condições “suspeitas” do trabalho que lhes é oferecido.
Se houver investimento em educação adequada, aqueles que não se envolvem diretamente com o trabalho escravo indignar-se-iam com o problema de tal forma que passariam a buscar soluções para acabar com ele. Essas soluções podem variar de ajuda aos explorados e denúncia dos patrões, ou ao boicote na compra do material proveniente das áreas conhecidas por meio de denúncia.
E essa educação não pode ser resumida a cartilhas, ou propagandas televisivas referentes ao tema. Medidas dessa natureza são ineficazes na resolução dos problemas que afetam a população brasileira. Tomemos como exemplo o fato de que, em época de chuva, o governo lança dessas mesmas estratégias para tentar erradicar a dengue. Oferece cartilhas, lança vídeos educativos, e até contrata agentes para que, de casa em casa, peçam para que não se deixe acumular água parada… Porém, como se percebe, ainda há dengue, e em níveis similares a dos anos anteriores.
Dessa forma, para que as pessoas tenham consciência do tamanho do problema que é o trabalho escravo, é necessário que sejam educadas de acordo com programas honestamente elaborados, que as façam conhecer seus direitos.
A segunda alternativa sugerida é a maior fiscalização das áreas, conhecidas por meio de denúncia, que utilizam o trabalho escravo em suas atividades. Uma pesquisa realizada em 2003, pela Secretaria de Inspeção e Trabalho e pela Comissão Pastoral da Terra, traz uma comparação entre o número de denúncias e o de resgate relativos ao trabalho escravo. Revela que quanto maior a incidência de trabalhos forçados no estado, maior é a diferença entre denúncia e resgate. O estado do Pará, por exemplo, campeão em ocorrências de trabalho forçado, marca 4.556 denúncias e somente 1.774 resgates. Mato Grosso, que está entre os cinco estados brasileiros de maior incidência de trabalho escravo, relaciona 927 denúncias contra 676 resgates. Como se percebe, a margem de diferença entre denúncias e resgates é absurda, e contribui para a manutenção da exploração.
A pesquisa citada demonstra que, em determinados estados, a política de fiscalização voltada ao combate do trabalho escravo deve ser revista. Faz-se necessário que ações sejam desenvolvidas no sentido de garantir a presença permanente de fiscalização nos locais onde há maior incidência de denúncias.
Cabe ressaltar, porém, que o trabalho de fiscalização deve ser acompanhado de aparato policial para garantir sua plena execução, pois se sabe que alguns fiscais são ameaçados ou até mesmo assassinados quando estão no desempenho de suas funções.
A terceira alternativa para a erradicação do trabalho escravo é a promoção de desenvolvimento nas regiões de onde provêm os cativos. Cerca de 40% dos explorados vêm do estado do Maranhão, conforme pesquisa desenvolvida pela Organização Internacional do Trabalho.
Faz-se necessário que sejam implementados programas que resultem na melhoria da condição de vida das pessoas oriundas daquelas áreas. Atualmente, existem programas do Governo Federal, como Fome Zero, Bolsa Escola, Programa para Prevenção e Eliminação da Exploração do Trabalho Infantil – PETI, dentre outros que deveriam garantir o mínimo necessário para a sobrevivência das famílias mais pobres, mas não atingem ao objetivo.
Se houvesse, porém, integração dos programas federais, com iniciativas de ONG’s, movimentos sociais e com programas estaduais e municipais, já implicaria em desenvolvimento significativo nas regiões, e conseqüente desinteresse dos explorados a saírem de onde vivem para trabalharem em outros locais.
Em suma, é fato que existem pessoas que são submetidas a trabalhos forçados até os dias de hoje no Brasil. Por isso, é necessário que alternativas como maior fiscalização de áreas conhecidas como usurpadoras de trabalho escravo, desenvolvimento das regiões de onde provêm os cativos e educação adequada para a sociedade, sejam utilizadas como ferramentas para a erradicação do trabalho forçado.
“Por mais um dia, agonia, pra suportar e assistir. Pelo rangido dos dentes, pela cidade a zunir. E pelo grito demente que nos ajuda a fugir… Deus lhe pague”. Embora passados 35 anos da composição, o tema da degradação e subjugação humana sugerido pela música “Deus lhe pague” é ainda contemporâneo. É possível por um fim nisso, de forma que nossos netos só tenham referência do que foi o trabalho escravo por livros de história.
Acadêmica de Direito na Universidade de Cuiabá
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