Análise poliédrica da alienação parental e da síndrome de alienação parental

Resumo: Tendo em vista a elevada frequência dos casos de alienação parental (concernentes ao Direito de Família), é imprescindível a intensificação da discussão teórica sobre esse ato alienante (suas características, suas possíveis consequências, as formas de evitar que a alienação parental alcance o nível de síndrome, dentre outros aspectos). Para tanto, é fundamental a aliança entre o Direito e a Psicologia.[1]

Palavras-chave: Alienação Parental. Síndrome de alienação parental. Direito de Família. Psicologia Jurídica.

Abstract: Given the high frequency of cases of parental alienation (pertaining to family law), it is indispensable to intensify the theoretical discussion of this alienating act (its characteristics, its possible consequences, ways to prevent that parental alienation reaches the level of the syndrome, among others). Therefore, it is essential the alliance between Law and Psychology.

Keywords: Parental Alienation. Parental Alienation Syndrome. Family Law. Judicial Psychology.

Sumário: Introdução. 1. Análise das principais características da alienação parental. 2. A distinção entre Ambiente Familiar Hostil e alienação parental. 3. A síndrome de alienação parental em contraposição à mera alienação parental.

4. Novo ordenamento familiar e sua influência nos casos de alienação parental.

5. Os danos acarretados pela alienação parental. 6. Estatísticas do Instituto Brasileiro de Direito de Família. 7. O combate à alienação parental, com destaque para a função que deve ser desempenhada pelo Poder Judiciário. Conclusão. Referências.

Introdução

Tal como descreve Miguel Reale, em Lições preliminares de Direito, o Direito consiste na ordenação heterônoma (validade objetiva e transpessoal das normas jurídicas), coercível (seu descumprimento acarreta sanções ao infrator) e bilateral-atributiva (as relações intersubjetivas de exigibilidade são estabelecidas segundo uma proporção objetiva) das relações sociais na medida do bem comum.

A Psicologia tem como objeto de estudo o comportamento dos seres humanos e seus processos psíquicos. Analisa as ações, as reações, os pensamentos, os sentimentos, as percepções humanas, dentre outros aspectos do seu foco de estudo.

Já que, assim como quaisquer outras regras sociais, as normas jurídicas ordenam a conduta humana, o Direito estabelece um relevante diálogo com a Psicologia. De fato, tendo em mente a realização da justiça, é fundamental ao operador do Direito compreender com profundidade toda a composição dos fatores comportamentais, sociais e individuais do caso concreto para só então aplicar as normas jurídicas.

No âmbito jurídico, recorre-se intensamente à Psicologia, por exemplo, nos casos marcados pela dúvida no que diz respeito à presença de transtornos mentais, como a pedofilia, a psicopatia, a sociopatia e o distúrbio de múltiplas personalidades. Muitas vezes, os distúrbios mentais que criminosos apresentam estão intimamente relacionados com os crimes por eles cometidos, por isso há essa elevada preocupação com a detecção desses transtornos. Para que a justiça seja efetivada, um indivíduo que não tem noção do que, para a sociedade, é certo e do que é errado não deve ser julgado da mesma forma que uma pessoa perfeitamente sã. Assim, a Psicologia Jurídica consiste em uma exímia ferramenta para a realização da justiça por meio das decisões judiciais. Nesse mesmo sentido, essa ilustre ferramenta se faz frequentemente necessária no Direito de Família, tal como se verifica nos casos de alienação parental.

A chamada alienação parental (AP), também conhecida como implantação de falsas memórias, é a expressão cunhada pelo médico-psiquiatra norte-americano Richard Gardner para designar o ato de prover uma criança de uma série de informações que denigram um dos genitores com o intuito de que ela o odeie, sem qualquer justificativa plausível. Tal conduta se faz presente, geralmente, em separações conflituosas de casais quando os cônjuges que ficam com a guarda dos filhos utilizam as crianças como instrumento de vingança contra os genitores que não detêm a guarda.

No Brasil, caracteriza-se, como ato de alienação parental, de acordo com o art. 2º Lei n° 12.318, sancionada em 26 de agosto de 2010, “a interferência na formação psicológica da criança ou do adolescente promovida ou induzida por um dos genitores, pelos avós ou pelos que tenham a criança ou adolescente sob a sua autoridade, guarda ou vigilância para que se repudie genitor ou que cause prejuízo ao estabelecimento ou à manutenção de vínculos com este.” (BRASIL, 2010).

1. Análise das principais características da alienação parental

Na maioria dos casos de AP, é a mãe que desempenha o papel de genitor alienante e o pai (estereotipado na sociedade como o agressor, o traidor sem escrúpulos, o culpado pelo desentendimento familiar e pela separação), de genitor alienado. Ela se faz de vítima e, por meio de uma campanha difamatória contra o pai, busca transferir ao filho sua raiva e suas próprias frustrações em relação ao ex-esposo, principalmente, quando a separação do casal se dá em virtude de adultério. Embora a essência dos casos de alienação parental seja a mesma (separar e eliminar o ex-cônjuge da convivência com o filho), as causas são múltiplas: geralmente vingança, possessividade, ciúme e inveja.

Via de regra, o perfil do genitor alienante é o de um indivíduo super-protetor que almeja o amor dos filhos com exclusividade e, para obtê-lo, não hesita em valer-se de meios escusos, até mesmo, alegando que o filho foi vítima de abuso sexual praticado pelo genitor alienado quando, na realidade, não havia nenhum indício de tal abuso. A inocorrência de tal abuso, contudo, deverá ser confirmada através de apurada análise executada por psicólogo e assistente social da fala dos filhos, que, nas situações em que não houve abuso sexual, é caracterizada pelo uso de vocabulário adulto e dificuldades para discorrer a respeito dos detalhes do ato libidinoso, enquanto, nos verdadeiros casos de abuso sexual, o que se observa é a fluidez na descrição pelo menor dos detalhes do abuso. Nesse ambiente conflituoso de falsas acusações contra uma figura de elevada importância para o infante, são delineados efeitos danosos para a construção da personalidade e caráter do menor. Evidencia-se, então, um verdadeiro descumprimento do direito de convívio familiar saudável e harmonioso, estabelecido pelo Estatuto da Criança e do Adolescente.

O genitor alienante, além de denegrir a imagem do outro genitor, geralmente não compartilha com o alienado informações relevantes referentes à prole (como o rendimento escolar, doenças) e toma decisões importantes acerca da vida dos filhos, sem consultar o outro genitor, por exemplo, resolve, sem antes discutir com o alienado, mudá-los para outra escola. Em alguns casos, o progenitor praticante de AP resolve mudar de cidade e levar os filhos consigo com o intuito de afastar e dificultar o contato dos menores com o genitor alienado e com a família deste. Outros comportamentos bastante comuns ao alienante são: obrigar os filhos a tomar partido da mãe ou do pai, ameaçando-os das conseqüências caso eles optem por apoiar o outro genitor (tais consequências vão desde o corte de presentes à criança a ameaçar o infante de que ele vai perder o amor do alienante); apresentar o novo companheiro à criança como sendo seu novo pai ou mãe; controlar rigidamente os horários de visita; manipular o agendamento de atividades dos filhos com o intuito de dificultar o contato com o genitor alienado; criticar o desempenho profissional e a situação financeira do ex-cônjuge; dar mais presentes aos filhos do que o outro genitor e tecer críticas aos dados pelo alienado; denegrir a imagem do novo companheiro do genitor vítima de AP. Em casos extremos de AP, o alienador chega a destruir objetos para responsabilizar o ex-cônjuge como autor de tais violências ou até mesmo a se machucar (há casos de até automutilação). Nos casos de a mãe ser o alienante, é muito frequente ela discutir dramaticamente com o outro genitor e chorar na frente dos filhos com o intuito de fazê-los se voltarem contra o pai por também internalizarem o sofrimento (muitas vezes encenado e dissimulado) da mãe, a raiva e mesmo o ódio pelo pai.

2. A distinção entre Ambiente Familiar Hostil e alienação parental

O Ambiente Familiar Hostil (conhecido pela doutrina estrangeira como Hostile Aggressive Parenting) é, muitas vezes, tido como sinônimo de Alienação Parental, mas não devem ser confundidos. A alienação parental está ligada a situações envolvendo a guarda de filhos ou caso análogo por pais divorciados ou em processo de separação litigiosa. Está mais relacionada ao fator psicológico. Enquanto, o ambiente familiar hostil (AFH) é mais abrangente, fazendo-se presente em qualquer situação em que duas ou mais pessoas ligadas à criança ou ao adolescente estejam divergindo sobre aspectos referentes à criação do infante (educação, religião, valores, atividades esportivas e lúdicas, etc.), por exemplo, quando os avós divergem dos pais acerca da criação das crianças. O AFH está mais associado intimamente não ao aspecto psicológico, mas sim aos comportamentos e às decisões concretas que influenciem a vida e o desenvolvimento dos menores.

3. A síndrome de alienação parental em contraposição à mera alienação parental

A síndrome de alienação parental (SAP), ao contrário da AP, só se faz presente quando a criança passa a nutrir sentimento de repulsa ao genitor alienado, a recusar-se a vê-lo e, ainda por cima, a contribuir na campanha difamatória contra ele. Portanto, a SAP nada mais é do que resultado de AP severa, sendo considerada um subtipo de alienação parental. Assim, a síndrome refere-se à conduta do filho, enquanto a alienação parental relaciona-se com o processo desencadeado pelo progenitor. Quando o abuso ou negligência parental por parte do suposto genitor alienado, de fato, estão presentes, a explicação de síndrome de alienação parental para a hostilidade da criança não é aplicável. Conforme Richard Gardner, “A SAP é caracterizada por um conjunto de sintomas que aparecem na criança geralmente juntos, especialmente nos tipos moderado e severo. Esses incluem:

1. Uma campanha denegritória contra o genitor alienado.

2. Racionalizações fracas, absurdas ou frívolas para a depreciação.

3. Falta de ambivalência.

4. O fenômeno do “pensador independente”.

5. Apoio automático ao genitor alienador no conflito parental.

6. Ausência de culpa sobre a crueldade e/ou a exploração contra o genitor alienado.

7. A presença de encenações ‘encomendadas’.

8. Propagação da animosidade aos amigos e/ou à família extensa do genitor alienado.” (GARDNER, 2002, p.3).

Os filhos, em um engenho de autodefesa, negam o conflito e passam a crer que a raiva e a rejeição que sentem pelo genitor alienado não são frutos da influência do alienante, mas sim provenientes deles próprios. Segundo Marco Pinho, “Fato é que eventualmente a criança vai internalizar tudo e perderá a admiração e o respeito pelo pai, desenvolvendo temor e mesmo raiva do genitor. Mais: com o tempo, a criança não conseguirá discernir realidade e fantasia e manipulação e acabará acreditando em tudo e, consciente ou inconscientemente, passará a colaborar com essa finalidade, situação altamente destrutiva para ela e, talvez, neste caso específico de rejeição, ainda maior para o pai. Em outros casos, nem mesmo a mãe distingue mais a verdade da mentira e a sua verdade passa a ser ‘realidade’ para o filho, que vive com personagens fantasiosos de uma existência aleivosa, implantando-se, assim, falsas memórias, daí a nomenclatura alternativa de ‘Teoria da implantação das falsas memórias’.” (PINHO, 2009, p. 3).

Alguns outros efeitos comuns que podem ser provocados na criança poderão variar de acordo com a idade, sua personalidade e o tipo de vínculo que ela possuía com os pais.

4. Novo ordenamento familiar e sua influência nos casos de alienação parental

Nos últimos anos, houve um número crescente de denúncias de alienação parental. O principal motivo desse aumento não reside em um suposto crescimento do número de casos de AP, mas sim no novo ordenamento familiar. Décadas atrás, geralmente os homens não tinham muito contato com os filhos, por conta do trabalho, enquanto as mães, que, muitas vezes, trabalhavam como donas de casa, passavam a maior parte do dia próximas à prole. Era comum, em uma situação conflituosa de separação do casal, o homem, mesmo amando profundamente seus filhos, adotar uma atitude passiva frente à alienação parental, com a esperança de que futuramente pudesse reatar o laço com os filhos subitamente rompido. Até o restabelecimento dessa relação, o sofrimento do pai com a falta de convívio com suas crianças era intenso.

Entretanto, com a superação da estrutura familiar patriarcal, tornou-se comum a mãe também se dedicar a uma profissão fora de casa e não somente às tarefas domésticas e ao cuidado com os filhos, atividades essas que ela passou a dividir com o marido. Como resultado, desponta o interesse tanto da mãe quanto do pai em conservar sua influência sobre a vida dos filhos e o contato frequente com os mesmos. Entretanto, comumente a separação do casal é conflituosa e, portanto, no início, geralmente não há um entendimento no tocante à relação de forças referentes ao contato com a prole. Nessa situação de tensão, o genitor que detém a guarda dos filhos, que, na maioria dos casos, é a mãe, pode tomar medidas que visem a induzir os filhos a preferi-lo em detrimento do outro genitor.

Com esse novo ordenamento familiar, muitos pais, em vez de agirem de forma passiva diante da alienação parental, passaram a lutar vigorosamente pela manutenção do laço parental nos mesmos padrões de quando havia sido estabelecido o casamento marcado pela divisão das atribuições da vida em comum do casal, as quais englobam a educação e o cuidado com os filhos.

5. Os danos acarretados pela alienação parental

A programação de um filho, por meio de campanha difamatória contra o outro genitor, definitivamente é um abuso emocional contra a criança já que pode acarretar o abatimento progressivo da relação psicológica entre ela e um genitor amoroso e, às vezes, até mesmo o aniquilamento total dessa relação, o qual provavelmente prejudicaria o desenvolvimento emocional e psicossocial do filho, além de poder causar um profundo trauma nos pais alienados. De acordo com Marco Pinho, “A respeito do trauma dos pais abandonados pelos filhos por causa da Síndrome de Alienação Parental, Gardner conclui que a perda de uma criança nesta situação pode ser mais dolorosa e psicologicamente devastadora para o pai-vítima do que a própria morte da criança, pois a morte é um fim, sem esperança ou possibilidade para reconciliação, mas os ‘filhos da Alienação Parental’ estão vivos, e, consequentemente, a aceitação e renúncia à perda é infinitamente mais dolorosa e difícil, praticamente impossível, e, para alguns pais, afirma o ilustre psiquiatra, ‘a dor contínua no coração é semelhante à morte viva’.” (PINHO, 2009, p. 10).

Os danos causados a ele por conta da perda de contato com os filhos e das acusações, muitas vezes, monstruosas contra o genitor alienado podem assumir diversas nuances: estresse, perda de confiança em si mesmo, depressão, isolamento, paranoia, desvio de personalidade, delinquência e, até mesmo, suicídio.

Os efeitos da alienação parental nos filhos são diversos: introspecção, conduta anti-social, isolamento social, sentimento de abandono e solidão, falta de auto-estima, baixo rendimento escolar, fugas de casa, rebeldia, instabilidade emocional, depressão, melancolia, angústia, regressões no tocante ao comportamento (ações condizentes a uma idade mental inferior), negação da separação dos pais, culpa (posteriormente ou, no momento atual, a criança crê em que a situação conflituosa entre seus pais seja culpa sua, por conta, por exemplo, de seu mau comportamento ou seu baixo rendimento escolar), aproveitamento da situação conflituosa entre os pais (às vezes, a criança busca se beneficiar da circunstância, oferecendo-a como pretexto para atingir seus intuitos ou para escapar de suas responsabilidades ou fracassos), uso de álcool, tabagismo e outras drogas, suicídio (diante da tortura psicológica a que são submetidos pelo genitor alienante e do conflito interior do filho quanto a qual genitor apoiar, muitas crianças e adolescentes vítimas de alienação parental encaram o suicídio como uma válvula de escape; muitas vezes, o filho comete tentativa de suicídio para chamar atenção, suprir a carência parental, tentar reaproximar os pais ou simplesmente para encontrar o genitor alienado fora dos dias de visitação). Geralmente, quando o filho consegue alcançar certa independência do guardião, o que lhe permite entrever a irrazoabilidade do distanciamento a que foi induzido, padece de um grave complexo de culpa ao perceber que foi cúmplice de uma injustiça contra o genitor alienado.

6. Estatísticas do Instituto Brasileiro de Direito de Família

Tal como indicam estatísticas do Instituto Brasileiro de Direito de Família (IBDFAM),

– 70% dos delinquentes menores de idade problemáticos cresceram longe de um genitor;

– 72% de adolescentes que praticam crimes graves e homicídios vivem em lares de pais separados;

– em crianças sem a presença do pai, a probabilidade de apresentar baixo rendimento escolar é duas vezes maior;

– com a ausência do pai na família, há uma grande queda da disciplina e a probabilidade de o infante conseguir se formar com êxito no ensino superior diminui em 30%;

– crianças e adolescentes distantes do pai têm probabilidade onze vezes maior de se comportarem de forma rebelde ou de terem alterações comportamentais;

– a probabilidade de filha longe do pai engravidar ou abortar, ao longo da adolescência ou durante os primeiros anos de faculdade, é três vezes maior;

– é cinco vezes maior a probabilidade de garotas que crescem longe do pai terem relação sexual antes da adolescência;

– são três vezes maiores as chances de meninas longe do pai serem vítimas de pedofilia e até de procurarem, em algum homem mais velho, a figura do pai distante;

– existe uma tendência de replicação da ausência ou do distanciamento do pai. Garotas que crescem somente com a mãe apresentam duas vezes mais chances de se divorciarem.

7. O combate à alienação parental, com destaque para a função que deve ser desempenhada pelo Poder Judiciário

Caso um dos pais perceba que o comportamento e a maneira de agir do filho em relação a ele mudou de forma a demonstrar sinais de alienação parental, o progenitor alienado deve requerer a um advogado o encaminhamento ao Centro de Apoio Psicossocial do Tribunal de Justiça, responsável por analisar as acusações.

Em processos judiciais de guarda de menor, deve-se priorizar o interesse do infante, o bem-estar da criança, e não os desejos dos adultos que estejam evolvidos (princípio do melhor interesse da criança). Constatada a inexistência de provas de que o contato com o outro genitor (que seria o alienado) seja prejudicial à criança, deve-se preservar o direito dela de conviver com o outro genitor (direito fundamental à convivência familiar garantido pela Constituição da República e também por normas infraconstitucionais: art. 227 da CF/88; art. 4º do Estatuto da Criança e do Adolescente), convivência que inclusive consiste em dever moral de cada um dos pais tendo em vista que afeta o desenvolvimento dos filhos.

Caso seja identificado o processo de AP, é fundamental que o Poder Judiciário anule seu desenvolvimento, evitando, assim, que a síndrome se estabeleça. É de suma importância que os juízes estejam atentos aos sinais da alienação parental e que, nesses casos, exijam, com urgência máxima, rígida perícia psicossocial (o exame psicológico e psiquiátrico das partes envolvidas), sendo ouvido o Ministério Público. O resultado da perícia deve ser apresentado, em um período de até 90 dias e deve ser entregue com o apontamento de ações que sejam necessárias para a manutenção do bem-estar emocional e do desenvolvimento psicossocial sadio do menor. O juiz deve, então, estipular as providências imprescindíveis à proteção da criança ou do adolescente vítima de AP, as quais devem visar à aproximação da criança com o genitor alienado, evitando, dessa forma, que o alienante tenha sucesso no processo de alienação. Conforme Priscila Fonseca, “As providências judiciais a serem adotadas dependerão do grau em que se encontra o estágio da alienação parental. Assim, poderá o juiz: a) ordenar a realização de terapia familiar, nos casos em que o menor já apresente sinais de repulsa ao genitor alienado; b) determinar o cumprimento do regime de visitas estabelecido em favor do genitor alienado, valendo-se se necessário, da medida de busca e apreensão; c) condenar o genitor alienante ao pagamento de multa diária, enquanto perdurar a resistência às visitas ou à prática que enseja a alienação; d) alterar a guarda do menor, principalmente quando o genitor alienante apresentar conduta que se possa reputar como patológica, determinando, ainda, a suspensão das visitas em favor do genitor alienante, ou que elas sejam realizadas de forma supervisionada; e) dependendo da gravidade do padrão de comportamento do genitor alienante ou diante da resistência dele perante o cumprimento das visitas, ordenar sua respectiva prisão.” (FONSECA, 2006, p. 167).

É necessário ressaltar que, em muitos casos de alienação parental, a mãe, que geralmente atua como o alienador, vale-se dissimuladamente da Lei Maria da Penha para se fazer de vítima, enquanto o pai é estereotipado com o papel de vilão e agressor. Por isso, o juiz deve estar bastante atento para as circunstâncias do caso e, assim, verificar quem de fato é a vítima no caso em questão (os filhos e o pai), em vez de aplicar indiscriminadamente a Lei Maria da Penha. Como já foi ressaltado, algumas mulheres praticantes de AP até forjam evidências de falsas violências supostamente praticadas pelos seus maridos ou ex-maridos.

O advogado que trabalha, no âmbito do Direito de Família, também deve estar atento aos elementos identificadores da alienação parental. Quando procurado pelo genitor alienante para sua defesa perante o tribunal, o advogado deve recusar-se a tal defesa. De acordo com Priscila Fonseca, “Quando está patente o processo de alienação parental, promovido pelo progenitor alienante, não se permite aos advogados, em nome de uma suposta defesa de seus diretos, prejudicar aquele que é, em tais casos, o interesse maior a ser protegido: o do menor. Em tais situações, a recusa ao patrocínio da causa do progenitor alienante impõe-se, também por força do comando constitucional que erige à condição de dever da sociedade – e, por conseguinte, de todo e qualquer cidadão, assegurar à criança e ao adolescente, com absoluta prioridade, o direito à convivência familiar.” (FONSECA, 2006, p. 168).

No Brasil, uma das maiores conquistas do combate à alienação parental foi a aprovação do Projeto de Lei nº 4053, segundo o qual, a alienação parental, pelo fato de consistir em um abuso, no exercício do poder familiar, e um desrespeito aos direitos de personalidade da criança em formação, é tema de interesse público e apresenta punições cabíveis que vão desde advertência e multa até a perda da guarda da criança e prisão. É preciso destacar que o substitutivo ao citado Projeto de Lei adotou um conceito mais abrangente de alienação parental: em vez de considerar apenas os casos envolvendo os genitores e os filhos, o substitutivo ao PL 4053/08 também concebe como alienação parental os casos envolvendo os avós, os tios ou as pessoas que tiverem, sob a sua vigilância, autoridade ou guarda, a criança ou o adolescente.

A nível mundial, ter-se-á como importante avanço no combate à AP a inclusão da SAP na próxima atualização do Manual de diagnóstico e estatística das perturbações mentais – DSM, elaborada pela Associação Americana de Psiquiatria. A síndrome de alienação parental receberá, então, o status de doença específica, o que deverá aniquilar o argumento de que a SAP é algo impreciso, vago, duvidoso por não constar no citado manual.

Conclusão

Em suma: a alienação parental consiste na prática de um conjunto de comportamentos abusivos que podem afetar imensamente a saúde emocional e o desenvolvimento psicossocial das crianças e causar trauma aos genitores alienados, o qual, em muitos casos, é profundo e, até mesmo, irreversível. Logo, a sociedade como um todo deve se esforçar no combate à AP, com destaque para o esforço por parte dos psicólogos e dos operadores do Direito.

 

Referências
ALMEIDA, Maria das Graças. A Síndrome da alienação parental e da morte parental: breves considerações. Revista Erga Omnes, nº 5, p. 48-53, 2009.
BRASIL. Lei 12318, de 26 de agosto de 2010. Dispõe sobre a alienação parental e altera o art. 236 da Lei no 8.069, de 13 de julho de 1990. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2007-2010/2010/Lei/L12318.htm>. Acesso em: 31 ago. 2012.
______. Projeto de Lei 4053, de 2008. Dispõe sobre a alienação parental. Disponível em: <http://www.camara.gov.br/sileg/integras/601514.pdf>. Acesso em: 31 ago. 2012.
FONSECA, Priscila Maria Pereira Corrêa da. Síndrome de alienação parental. Revista Pediatria, nº 3, p. 162-168, 2006.
GARDNER, Richard Alan Gardner. O DSM tem equivalente para o diagnóstico de Síndrome de Alienação Parental (SAP)?. Trad. Rita Rafaeli. Disponível em: < http://www.alienacaoparental.com.br/textos-sobre-sap-1/o-dsm-iv-tem-equivalente>. Acesso em: 31 ago. 2012.
PINHO, Marco Antônio Garcia de. Alienação Parental. Jus Navigandi, Teresina, ano 13, nº 2221, 31 jul. 2009. Disponível em: <http://jus.com.br/revista/texto/13252/alienacao-parental>. Acesso em: 31 ago. 2012.
REALE, Miguel. Lições preliminares de Direito. 27. ed. São Paulo: Saraiva, 2002.
Nota
[1] Trabalho orientado Pelo Prof. Dr. Denis Barros de Carvalho, Professor Dr. do Mestrado em Desenvolvimento e Meio Ambiente.

Informações Sobre o Autor

Gabriela dos Santos Barros

Acadêmica de Direito na Universidade Federal do Piauí


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