Descrição: O escopo do presente trabalho é traçar um breve panorama das normas que estruturam a seguridade social no Brasil e, a partir daí, explicitar os três segmentos que o integram – a saúde, a assistência e a previdência social – enfatizando, em cada um deles, os fundamentos legais, o objetivo da proteção, a abrangência da cobertura, a clientela protegida, os benefícios ofertados e a necessidade de contributividade ou financiamento, para, ao final, apresentar conclusões acerca de sua efetividade.
Sumário: 1 – Introdução 2 – Breve Histórico da Seguridade Social no Brasil 3 – Seguridade Social 4 – Saúde 5 – Assistência Social 6 – Previdência Social 7 – Conclusão.
1 – Introdução
O debate de questões referentes à seguridade social é sempre muito atual, tendo em vista que envolve senão a totalidade, ao menos, grandes segmentos da população de um Estado.
Tal é a situação atualmente na Franca, onde o governo pretende alterar a idade mínima para aposentadoria, o que tem gerado manifestações de protesto e greves por todo país, conforme amplamente noticiado pela mídia. Também é questão que preocupa a massa de trabalhadores no Brasil, ante a proximidade da eleição de novo Presidente da República nos próximos dias e o sempre propalado déficit do orçamento da seguridade social.
Mas como se verá, a seguridade social, tal como concebida pelos constituintes de 1988, é um sistema que, baseado no princípio da solidariedade social, abarca outros segmentos e comporta outras discussões, não ficando limitado à questão do benefício da aposentadoria, embora se reconheça que este tema é realmente palpitante.
2 – Breve Histórico da Seguridade Social no Brasil
Embora possam ser encontradas normas sobre seguridade social no Brasil nas Constituições de 1824 e 1891, no Código Comercial de 1850 e em algumas leis esparsas, inclusive do período colonial, o marco inicial, segundo a doutrina majoritária, é a Lei Eloy Chaves (Decreto Legislativo n. 4.862, de 24/1/23), que criou as Caixas de Aposentadoria e Pensões nas empresas de estradas de ferro, assegurando aposentadoria aos seus trabalhadores e pensão aos dependentes, além de assistência médica e redução no custo de medicamentos.[1]
A partir daí, foram criados institutos de aposentadoria e pensão por categorias profissionais (dos Marítimos, em 1933; dos Comerciários e dos Bancários, ambos em 1934; dos Industriários, em 1936; dos Servidores do Estado e dos Empregados em Transportes de Carga, estes em 1938).[2]
A Constituição de 1934 foi a primeira a estabelecer uma forma tripartide de custeio, baseada em contribuições dos trabalhadores, dos empregadores e do Poder Público. Já a de 1946 empregou pela primeira vez a expressão “previdência social”, buscando sistematizar as normas de âmbito social, ademais de instituir a obrigação do empregador de manter seguro de acidentes de trabalho.[3]
As Caixas de Aposentadorias e Pensões, que possuíam cada qual regras próprias para a concessão de benefícios, tiveram seus planos padronizados pela Lei Orgânica da Previdência Social (LOPS) – Lei n. 3.807/60. Paralelamente, o Estatuto dos Funcionários Públicos Civis da União (Lei n. 1.711/52) regulou apartadamente o direito à aposentadoria dos ocupantes de cargos públicos federais e pensão a seus dependentes, o qual restou vigente até a publicação da Lei n. 8.112/90.[4]
Com a edição do Decreto-lei n. 72, de 21/11/66, foram unificados os diversos Institutos de Aposentadoria e Pensão (IAP), surgindo assim o Instituto Nacional de Previdência Social (INPS).[5]
A Constituição de 1967 prescreveu a criação do seguro-desemprego, o qual foi regulamentado com a denominação de auxílio-desemprego. No mesmo ano, o Seguro de Acidentes do Trabalho (SAT) foi incorporado à Previdência Social, através da Lei n. 5.316, deixando assim de ser realizado com instituições privadas e passando a ser financiado por contribuições vertidas ao caixa único do regime geral previdenciário.[6]
Com o advento da Lei Complementar n. 11/71, que criou o Fundo de Assistência e Previdência do Trabalhador Rural (FUNRURAL), esta classe foi integrada à previdência social; o mesmo ocorreu com os empregados domésticos, a partir da Lei n. 5.859/72.
Em 1977, com a publicação da Lei n. 6.439, operou-se transformação estrutural no modelo previdenciário, com a instituição do Sistema Nacional de Previdência e Assistência Nacional (SINPAS), o qual se destinava a integrar as atividades de previdência social, assistência médica, assistência social e gestão administrativa, financeira e patrimonial, entre várias entidades vinculadas ao Ministério da Previdência e Assistência Social.[7]
Assim, algumas autarquias foram especialmente criadas: ao Instituto de Administração Financeira da Previdência e Assistência Social (IAPAS), coube a arrecadação e fiscalização das contribuições; e ao Instituto Nacional de Assistência Médica da Previdência Social (INAMPS), o atendimento dos segurados e dependentes na área da saúde.[8]
No mais, foram mantidos o INPS, encarregado do pagamento e manutenção dos benefícios previdenciários; a Fundação Legião Brasileira de Assistência (LBA), para o atendimento a idosos e gestantes carentes; a Fundação Nacional do Bem-Estar do Menor (FUNABEM), para atendimento a menores carentes; a Central de Medicamentos (CEME), para fabricação de medicamentos a baixo custo, e a Empresa de Processamento de Dados da Previdência Social (DATAPREV), para controle de dados do sistema.[9]
A Constituição de 1988, enfim, estabeleceu o atual sistema de seguridade social, que compreende “um conjunto integrado de ações de iniciativa dos Poderes Públicos e da sociedade, destinado a assegurar os direitos relativos à saúde, à previdência social e à assistência social” (art. 194, CF/88), o qual já passou por várias reformas, introduzidas pelas Emendas Constitucionais n. 20/98, 41 e 42/03 e 47/05.[10]
Em 1990, foi criado o Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), para substituir o INPS e o IAPAS, incorporando as funções de ambos. Deve ser salientado, todavia, que com o advento da Lei n. 11.457/07, as atribuições de arrecadação, fiscalização e cobrança de contribuições, bem como de aplicação de penalidades, ou seja, as relativas ao custeio da seguridade social, foram transferidas para a Secretaria da Receita Federal do Brasil.[11]
Foram então publicadas as Leis dos Planos de Custeio (Lei 8.212/91) e de Benefícios (Lei n. 8.213/91), as quais permanecem vigentes, com várias alterações posteriores.
3 – Seguridade Social
Sérgio Pinto Martins explica que a expressão “seguridade social” só foi adotada a partir da Carta de 1988, quando então houve nítida separação entre o Direito da Seguridade Social e o Direito do Trabalho, com a inclusão de um capítulo dedicado a ela (arts. 194 a 204), incluído no título que trata da “ordem social”, diferentemente do que ocorria na Constituição anterior, a qual trazia a matéria no título da “ordem econômica”, em um único dispositivo (art. 165), que tratava dos direitos trabalhistas e previdenciários.[12]
Ensina que, apesar da preferência dos constituintes pela expressão “segurança social” em relação à “seguridade social”, esta acabou prevalecendo, porque, proveniente do latim (securitate(m), securitas), denota concepção de provisão para o futuro, enquanto a primeira dá ideia de presente.[13]
Segundo José Cretella Júnior, “a seguridade social é o conjunto de medidas tomadas pelo poder público e pelos particulares, em conjunto ou separadamente, em prol dos direitos concernentes à saúde, à previdência e à assistência social”[14]
Os fundamentos desta são encontrados entre aqueles que inspiram a própria República: os princípios da dignidade da pessoa humana, da cidadania e do valor social do trabalho (art. 1º, CF/88). Nunca é demais lembrar que os direitos à saúde, à assistência social e à previdência social também estão garantidos entre os direitos sociais (art. 6º, CF/88).
Seus objetivos, insculpidos no parágrafo único, do art. 194, da Carta Magna, têm status de verdadeiros princípios, a espraiar sua normatividade para todo o sistema securitário.[15]
Entre eles, vale a pena destacar, para os fins deste trabalho, o da universalidade da cobertura, e do atendimento. Este possui, pois, duas dimensões: uma objetiva, qual seja, a universalidade da cobertura, referida a situações de necessidade, relacionadas com todas as contingências da vida, podendo ser compreendida como o elenco de prestações disponíveis; outra subjetiva, relacionada com a universalidade do atendimento, e que diz respeito aos sujeitos protegidos, no sentido de que todas as pessoas são credoras de proteção social.[16]
Entretanto sobre os princípios que norteiam a seguridade social sobreleva o da solidariedade social, cujas origens remotas devem ser buscadas na natureza gregária do homem, e mais proximamente na assistência social, sobretudo a partir do cristianismo e da ideia de caridade; no seguro privado e no mutualismo, os quais evoluíram para a noção de seguro social.[17]
De forma bastante simplificada, pode-se dizer que a ideia básica do seguro privado consiste na cotização de fundos de grupos privados buscando se precaverem de danos eventualmente sofridos por qualquer delas, enquanto que no mutualismo, historicamente, tais grupos referem-se a trabalhadores subordinados, que buscam tutelar sua força de trabalho através de contribuições sucessivas visando futuras prestações de caráter continuado.[18]
Ambas as técnicas de proteção apresentam em comum a característica da facultatividade de admissão no sistema, de tal forma que a clientela fica reduzida apenas às pessoas interessadas na própria proteção, traço que as diferencia do seguro social, eis que neste as contribuições são marcadas pela obrigatoriedade. Demais disso, em razão da amplitude de recursos necessários e da clientela protegida, é necessário aporte de recursos pelo Estado e pelas empresas, estas comparecendo como contribuintes, mas não como beneficiárias.[19]
O princípio da solidariedade social extrema-se na seguridade social, a qual, no caso do Brasil, como já salientado, engloba os segmentos da saúde, assistência e previdência social, e alcança toda a população, significando a contribuição pecuniária de uns em favor de outros beneficiários, no espaço e no tempo, de acordo com a capacidade contributiva e as necessidades dos diferentes níveis de clientela protegidos.[20]
4 – Saúde
Especificamente quanto à saúde, apontam-se como fundamentos específicos os arts. 196 a 200, da CF/88, e as Leis n. 8.080/90, 8.142/90 e 8.689/93, que tratam respectivamente do Sistema Único de Saúde (SUS); da participação da comunidade na gestão deste; e da extinção do INAMPS e da assunção de suas funções, competências, atividades e atribuições pelas instâncias federal, estadual e municipal gestoras do SUS.
Sobre o SUS, saliente-se que é integrado por órgãos e instituições públicas federais, estaduais e municipais, da Administração direta e das fundações mantidas pelo Poder Público, atuando de forma descentralizada, hierarquizada e regionalizada, podendo a iniciativa privada dele participar de forma complementar (art. 4º, Lei n. 8.080/90).
Pois bem. Como se depreende do art. 196, da CF/88, as políticas sociais e econômicas atinentes à saúde têm como objetivos (i) reduzir o risco da doença e ouros agravos e (ii) garantir acesso universal e igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação. Em síntese, visa-se à prevenção da doença e à recuperação da saúde.
Disso se infere a amplitude de sua abrangência: a universalidade do acesso e à cobertura da prestação. Em outras palavras: a clientela protegida é a totalidade da população, independentemente de contribuição.
Acerca deste dispositivo constitucional, Martinez tece arguta observação:[21]
“É visível a preocupação em circunscrever o universo do direito-dever de forma difusa, de maneira a não revelar a incapacidade do Estado em proporcionar, não só a universalidade do atendimento, mas também o mesmo nível de qualidade aos habitantes de todos os quadrantes. […] Há direito subjetivo de todos à assistência à saúde nas condições ofertadas pelo Estado, independentemente de contribuição, limitado à fortaleza dos direitos disponíveis.”
A desnecessidade de contribuição para auferir as políticas e ações destinadas à saúde, entretanto, não significa que esta não tenha fontes de financiamento determinadas constitucionalmente, sem o que inviabilizadas restariam qualquer proteção e, consequentemente, a efetividade de tal direito subjetivo público.
Tais fontes emergem de recursos provenientes do orçamento da seguridade social, oriundos das contribuições sociais previstas no art. 195, bem como de aportes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, observados inclusive percentuais de aplicações mínimos (art. 198, §§ 1º a 3º, CF/88).
Sobre este ponto, saliente-se que a Lei n. 8.080/90 especifica outras fontes de custeio, no art. 32. São elas provenientes de recursos de (i) serviços que possam ser prestados sem prejuízo da assistência à saúde; (ii) ajuda, contribuições, doações e donativos; (iii) alienações patrimoniais e rendimentos de capital; (iv) taxas, multas, emolumentos e preços públicos arrecadados no âmbito do SUS; e (v) rendas eventuais, inclusive comerciais e industriais.
Considerando que são ações a cargo dos integrantes do SUS aquelas constantes do art. 200, da CF/88, por via de consequência, são exemplos de benefícios a serem auferidos por toda a população, extraídos do texto da própria Lei n. 8.080/90: (i) assistência terapêutica integral, inclusive farmacêutica; (ii) serviços de vigilância sanitária, epidemiológica e nutricional; (iii) ações de saneamento básico; (iv) ações de proteção ao meio ambiente, nele compreendido o do trabalho; (v) ações relacionadas à política de sangue; (vi) ações direcionadas à saúde do trabalhador (art. 6º).
5 – Assistência Social
Por sua vez, a assistência social encontra fundamento nos arts. 203 e 204, da CF/88, bem como na Lei n. 8.742/93, denominada Lei Orgânica da Assistência Social (LOAS), consolidada com a Lei n. 12.101/09, tendo aquela criado o atual Conselho Nacional de Assistência Social (CNAS), que fixa normas para a atuação de entidades e organizações sem fins lucrativos na área. Vale ainda destacar a Lei n. 9.649/98, a qual dispôs sobre a organização da Presidência da República e dos Ministérios, resultante da conversão de Medida Provisória, e que extinguiu a LBA e o Centro Brasileiro da Infância e Adolescência (CBIA), sucessor da FUNABEM.[22]
São seus objetivos (i) a proteção à família, à maternidade, à infância, à adolescência e à velhice, incluído o amparo a crianças e adolescentes carentes; (ii) a promoção da integração ao mercado de trabalho; (iii) a habilitação e reabilitação das pessoas portadoras de deficiência e (iv) a garantia de um salário-mínimo de benefício mensal à pessoa portadora de deficiência e ao idoso que comprovem não terem meios de fazê-lo por si ou por suas famílias (art. 203, da CF/88).
A clientela protegida fica restrita às pessoas carentes, que efetivamente comprovem suas necessidades, independentemente de qualquer contribuição. Percebe-se, pois, que o âmbito de abrangência é o do universalidade, porém mitigado.[23]
Quanto ao financiamento, diga-se que também por disposição constitucional os recursos advêm do orçamento da seguridade social, previstos no art. 195, além de outras fontes, sendo facultado aos Estados e ao Distrito Federal vincular a tal fim até cinco décimos por cento de sua receita tributária líquida, vedada a aplicação desses recursos ao pagamento de despesas com pessoal e encargos sociais; serviço da dívida ou qualquer outra despesa não vinculada diretamente aos investimentos ou ações apoiados (art. 204, da CF/88).
São benefícios ofertados, nos termos da LOAS, o de caráter continuado, consistente no pagamento de um salário-mínimo ao idoso, com 65 anos ou mais, ou ao portador de deficiência, e os de natureza eventual, referentes ao auxílio-natalidade e auxílio por morte, em qualquer caso a pessoas carentes, assim entendidas aquelas que tenham renda familiar per capita inferior a um quarto do salário mínimo (arts. 20 e 22, da Lei n. 8.742/93, e art. 34, da Lei n. 10.741/03).[24]
Com relação ao requisito da renda familiar, diga-se que a questão foi levada ao Supremo Tribunal Federal, o qual decidiu pela constitucionalidade da norma, no julgamento da ADI n. 1.232/1. A despeito disso, posteriormente foram editadas as Leis n. 9.533/97 e 10.689/03, as quais prescreveram a presunção da miserabilidade com o parâmetro de renda familiar per capita de meio salário-mínimo (arts. 5º, I, e 2º, § 2º, respectivamente). A questão encontra-se novamente na Corte Suprema, no RE n. 567.985/MT, no qual já foi reconhecida repercussão geral.[25]
Confira-se:[26]
“REPERCUSSÃO GERAL – BENEFÍCIO ASSISTENCIAL DE PRESTAÇÃO CONTINUADA – IDOSO – RENDA PER CAPITA FAMILIAR INFERIOR A MEIO SALÁRIO MÍNIMO – ARTIGO 203, INCISO V, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. Admissão pelo Colegiado Maior.”
Estão prescritos também no mesmo diploma legal serviços assistenciais, direcionados para crianças e adolescentes em risco pessoal e social e às pessoas que vivem nas ruas (art. 23, Lei n. 8.742/93).
6 – Previdência Social
De acordo com Castro e Lazzari, a previdência social é[27]
“[…] o ramo da atuação estatal que visa à proteção de todo indivíduo ocupado numa atividade laborativa remunerada, para proteção dos riscos decorrentes da perda ou redução, permanente ou temporária, das condições de obter seu próprio sustento. Eis a razão pela qual se dá o nome de seguro social ao vínculo estabelecido entre o segurado da Previdência e o ente segurador estatal.”
Pois bem. Seu fundamento constitucional está nos arts. 201 a 202, valendo ser referidas novamente as Leis n. 8.212/91 e 8.213/91, que instituem respectivamente os planos de custeio e de benefícios, bem como o Decreto n. 3.048/99, que introduz o regulamento da previdência social.
O objetivo da previdência social é a proteção do segurado em caso de doença, invalidez, morte, idade avançada, maternidade, desemprego, bem como de seus dependentes, através da pensão por morte e do auxílio reclusão, além do pagamento do salário-família ao segurado (art. 201, da CF/88).
Ao contrário do que ocorre com a saúde e a assistência social, a previdência social adota regime de caráter contributivo e obrigatório, razão pela qual apenas quem para ela contribui e atende às condições previstas em lei pode auferir dos benefícios previstos.[28]
Tem-se aqui também o universalismo mitigado, porque, embora não se restrinja a filiação a certas classes de trabalhadores, estando ela vedada genericamente apenas aos integrantes de regimes próprios de previdência, como os servidores públicos federais, estaduais e municipais (estes quando os tiverem), é imprescindível o recolhimento de contribuição.
Neste sentido, leciona Paulsen:[29]
“As ações e serviços de saúde são de acesso universal e igualitário, conforme art. 196 da Constituição, não demandando contrapartida específica por parte dos usuários. Os serviços e benefícios assistenciais, por sua vez, por determinação expressa do art. 203 da Constituição, também são gratuitos, prestados a quem necessitar, independentemente de contribuição.
A previdência social, diferentemente, organizada sob a forma de regime geral, é de filiação obrigatória e tem caráter contributivo, conforme estabelece o art. 201 da Constituição, com a redação da EC 20/98. Assim, todos os segurados obrigatórios, que exercem atividade econômica, independentemente do nível de renda que possuam, têm de contribuir para a previdência social.”
Aqui também o financiamento provém das fontes previstas no art. 195, da CF/88, o qual, aliás, diz respeito a todo o sistema de seguridade social: recursos oriundos de toda a sociedade de forma direta e indireta, bem como de outros provenientes dos orçamentos da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, mais contribuições a cargos dos empregadores (incidentes sobre folha de salários, receita ou faturamento e lucro); dos empregados; dos concursos de prognósticos e do importador de bens e serviços ou pessoas equiparadas.
Importante ressaltar que além de tais contribuições, é possível a instituição de outras, desde que obedecido o art. 154, I, da CF/88 (§ 4º, do art. 195), ou seja, por meio de lei complementar.
Em linhas gerais, os benefícios previdenciários são aqueles elencados no art. 18, da Lei n. 8.213/91, em consonância, aliás, com o objetivo da previdência social, delineado no já referido art. 201, da CF/88.[30]
Neste particular é importante ressaltar que a EC n. 20/98 estabeleceu a aposentadoria por tempo de contribuição e não mais por tempo de serviço, sendo necessários 35 anos de contribuição para o homem e 30 anos para a mulher, com exceção daqueles que comprovem tempo exclusivo de magistério infantil ou no ensino fundamental e médio. Além disso, o salário-família e o auxílio-reclusão passaram a ser devidos apenas ao dependente de segurado de baixa renda.[31]
7 – Conclusão
Do exposto, verifica-se que só com a Carta de 1988 foi possível se incluir pelo menos potencialmente toda a população ao abrigo da seguridade social, fundada no tripé saúde-assistência-previdência. A despeito disso, a proteção pretendida não é razoavelmente efetiva.
A principal dificuldade pode ser traduzida na escassez dos recursos ante a premência das necessidades humanas, estas ainda mais realçadas no Brasil frente à notória má distribuição de rendas. Daí a dicotomia já famosa nos meios acadêmico e forense entre a “reserva do possível” e o “mínimo existencial”.
Bem por isso, a despeito hodiernamente do repúdio às denominadas normas programáticas, é de se inferir que aquela insculpida no art. 196, da CF/88 – “a saúde é direito de todos e dever do Estado” – carece de concreção no mundo dos fatos, o que se constata diante da visível precariedade da estrutura do SUS para fazer face à demanda da população, especialmente a mais carente, e da procura por planos privados de saúde, pelas classes alta e média. Não se pode olvidar também do excesso de demandas judiciais, notabilizadas especialmente através das denominadas “ações afirmativas”, por meio das quais se busca desesperadamente acesso a tratamentos e medicamentos de uso continuado, geralmente não disponíveis na rede pública.
Embora louvável a constitucionalização da assistência social, fica ela restrita a pouquíssimos benefícios e, tal como posta na LOAS, direcionada praticamente aos indigentes. Daí a necessidade de revisão do parâmetro de renda familiar per capita que vem sendo feito pelo legislador e pelos tribunais ou mesmo da verificação de outros indícios acerca do estado de miserabilidade, ainda que não constantes da lei.
Quanto à previdência social, é sem dúvida um dos meios mais eficazes de distribuição de renda. Todavia, em vista da criação de vários benefícios sem a concomitante fonte de custeio, da promiscuidade entre os orçamentos fiscal e da seguridade (situações agora vedadas pela atual Constituição), dos desvios de verbas amplamente divulgados pela mídia, do desaceleramento do crescimento demográfico, do aumento da expectativa de vida da população, do aumento da informalidade no mercado de trabalho, entre outros fatores, os segurados vêm sendo obrigados a contribuírem mais e por mais tempo a fim de poderem usufruir de suas aposentadorias, o que gera descontentamento e insegurança.
Tudo isso vem levando os mais previdentes e de maiores posses a procurarem planos de previdência privada aberta, quando não possuem já algum vinculo com a previdência fechada, tal como ocorre com os empregados de algumas empresas públicas ou sociedades de economia mista.
Concui-se, pois, que, embora tendente a concretizar o princípio da dignidade da pessoa humana, o fato é que os três segmentos ainda estão longe de atingir o ideal de alcançar efetivamente todas as camadas da população.
Mestra em Direito Público pela Universidade de Franca, Pós-graduanda em Direito Tributário pela Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais, Procuradora da Fazenda Nacional, Ex-Auditora da Receita Federal do Estado de Minas Gerais
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