Resumo: A proposta deste artigo é colaborar na análise da controvérsia doutrinária acerca da natureza jurídica do artigo 63 do CPC, pois segundo o Código de Processo civil esse mesmo artigo é capitulado como um caso de Nomeação à Autoria e parte da doutrina, amparada no Código Civil de 2002, entende ser um caso de Chamamento ao Processo. Dependendo da natureza jurídica definida haverá consequências jurídicas diversas, como por exemplo, redução ou ampliação do polo passivo da demanda.
Palavras-chave: artigo 63 do CPC; controvérsia doutrinária; nomeação à autoria ou chamamento ao processo.
Abstract: The purpose of this article is to collaborate in the analysis of doctrinal about the legal nature of article 63 of the CPC controversy, because according to the Code of Civil Procedure that article is capitulated as a case of appointment to the authorship and part of the doctrine, based on the Civil Code 2002, considers it a case of calling the procedure. Depending on the legal nature will set different legal consequences, such as reduction or enlargement of the defendant's demand.
Keywords: article 63 of the CPC; doctrinal controversy; appointment to authorship or call to process.
Sumário: considerações iniciais. 1. Art. 63 do CPC interpretado como nomeação à autoria. 2. Artigo 63 do CPC: um caso de chamamento ao processo para a doutrina. 3. Artigo 63 do CPC após o código civil de 2002. Conclusão. Referências.
Considerações iniciais
Antes de analisar-se a controvérsia doutrinária acerca da natureza jurídica do artigo 63 do CPC, faz-se necessário rever conceitos básicos da seguintes intervenções de terceiros:
Nomeação à autoria: “gera, em princípio, a substituição do podo passivo da demanda de um sujeito ilegítimo por outro legítimo.”(Marinone, 2013, pág. 180). O objetivo é a correção do polo passivo do processo, evitando relações de subordinação disfarçadas ou camufladas, que fazem o autor da ação trazer para o polo passivo um réu ilegítimo.
Trata-se de uma intervenção provocada pelo réu, obrigatória e que, se não cumprida o réu sofrerá perdas e danos cumulada com custas processuais por tratar-se de uma ilicitude processual.
Chamamento ao Processo: “é uma modalidade de criar litisconsórcio passivo facultativo por vontade do réu e não pela iniciativa do autor” (Marinone, 2013, pág. 187). O réu originário passa a dividir as responsabilidades com o outro réu chamado ao processo por ele. Ao contrário da Nomeação à Autoria, embora sempre provocada pelo réu, não é obrigatória e o chamado responde no polo passivo da ação de forma solidaria com o chamante. É o caso do fiador que, estando como réu, pode chamar os outros eventuais cofiadores; também, do devedor que pode chamar codevedores.
1. Art. 63 do CPC interpretado como nomeação à autoria
Para o Código de Processo Civil brasileiro que é de 1973, o seu artigo 63 é, em sua natureza jurídica, um caso de Nomeação a Autoria e destina-se a aplicação do artigo 62, CPC para caso específico.
Pois bem, o que o artigo 62 do CPC faz, é prevê a Nomeação à Autoria em Ações possessórias ou reivindicatórias propostas contra o detentor da coisa. Ou seja, de forma obrigatória sob pena de perdas e danos, o réu (detentor) considerando-se parte ilegítima nomeia à autoria o proprietário ou o possuidor da coisa litigiosa para que ele(s) substitua(m) o referido réu no polo passivo da ação.
Já, no artigo 63 do CPC que prevê Nomeação à Autoria em ações indenizatórias propostas contra o réu, a determinação é de aplicação da mesma regra do artigo 62. O réu defende ou justifica que praticou os atos em cumprimento de determinações ou instruções de terceiro e nomeia à autoria o mandante para que substitua-o no polo passivo da lide.
“Art. 62, CPC. Aquele que detiver a coisa em nome alheio, sendo-lhe demandada em nome próprio, deverá nomear à autoria o proprietário ou o possuidor.
Art. 63, CPC. Aplica-se também o disposto no artigo antecedente à ação de indenização, intentada pelo proprietário ou pelo titular de um direito sobre a coisa, toda vez que o responsável pelos prejuízos alegar que praticou o ato por ordem, ou em cumprimento de instruções de terceiro”.
Contudo, como será visto a seguir, existe entendimento doutrinário interpretando o art. 63 do CPC como um caso de Chamamento ao Processo, fazendo com que haja a possibilidade da demanda possuir réus solidários legítimos na demanda.
2. Artigo 63 do CPC: um caso de chamamento ao processo para a doutrina
Como visto, segundo o CPC de 1973, o art. 63 é capitulado como caso específico de Nomeação à Autoria onde um réu ilegítimo é substituído por outro com legitimidade para figurar no polo passivo da demanda.
Contudo, parte da doutrina entendia que o referido artigo não era uma aplicação do art. 62 do CPC, mas uma situação amparada pelo art. 77, III do CPC, ou seja, um caso de Chamamento ao Processo para devedores solidários onde o credor exigi apenas de um ou de alguns uma dívida que na verdade é comum.
“Art. 77. É admissível o chamamento ao processo:
III — de todos os devedores solidários, quando o credor exigir de um ou de alguns deles, parcial ou totalmente, a dívida comum”
O fundamento é que no artigo 63 do CPC, há ocorrência de um réu legítimo como verdadeiro preposto, alegando ter praticado o dano a mando de um terceiro que na verdade é seu preponente (mandatário). Nestes casos tem-se um litisconsórcio facultativo devido ao liame solidário existente na responsabilidade pelos prejuízos e com ampliação do polo passivo.
Posicionamento neste sentido pode ser encontrado em (Didier apud Flávio Cheim Jorge, 2008, p. 339)..:
“O mais importante quando se analisa esse art. 63 do código de Processo civil é que o mesmo, ao contrário do artigo 62, acaba por prever uma situação em que o demandado possui inegavelmente legitimidade para figurar no polo passivo da ação. Cuida-se precisamente da existência de litisconsorte facultativo, advindo da solidariedade existente entre nomeante e nomeado. (…) Isso denota que a nomeação a autoria, na hipótese prevista no art. 63, não visa, propriamente, a correção da legitimidade passiva, mas sim a inclusão de outro réu também responsável pelo causamento de determinado dano. (…) cuida-se de situação onde seria cabível o chamamento ao processo.”
3. Artigo 63 do CPC após o código civil de 2002
Para os defensores da interpretação do artigo 63 do Código de Processo Civil brasileiro com um caso de Chamamento ao Processo, o Código Civil de 2002 que é posterior ao CPC de 1973, veio ratificar e reforçar o embasamento legal desse entendimento. Ocorre que, de acordo com o artigo 932, III do Código civil/2002 o preposto é também responsável por uma reparação civil.
“Art. 932. São também responsáveis pela reparação civil:
III — o empregador ou comitente, por seus empregados, serviçais e prepostos, no exercício do trabalho que lhes competir, ou em razão dele;”
Já, segundo o artigo 942, Parágrafo único, do CC/2002 os prepostos referidos no artigo 932 do CC/2002 respondem de forma solidária pelos danos causados à vitima, dividindo às responsabilidades.
“Art. 942. Os bens do responsável pela ofensa ou violação do direito de outrem ficam sujeitos à reparação do dano causado; e, se a ofensa tiver mais de um autor, todos responderão solidariamente pela reparação.
Parágrafo único. São solidariamente responsáveis com os autores os co-autores e as pessoas designadas no art. 932.”
Para (Didier, 2008, p. 339) o caso do art. 63, CPC seria de chamamento ao Processo obrigatório a contrário sensu da essência do instituto que é uma faculdade.
“Discute-se se o caso é realmente de nomeação a Autoria. É que todo aquele que concorre para o dano, praticando o ato ilícito, é por ele responsável, na forma do parágrafo único do art. 942 do CC-2002. Sendo assim, o réu originário seria também parte legítima, na medida em que é responsável solidário. Ao nomear à autoria, na verdade estaria o preposto indicando um outro co-responsável, também parte legítima, em situação que encaixa à perfeição à hipótese do chamamento ao processo. Seria, então, um chamamento ao processo obrigatório (porquanto obrigatória é a nomeação à autoria).”
No Código de Processo Civil comentado de Nelson Nery Jr. e Rosa Maria de Andrade Nery analisando a questão do art. 63 do CPC, afirmam no sentido de poder ser a ação de indenização proposta contra o réu (preposto) e o preponente (mandante) em conjunto formando um litisconsorte facutativo.
“A rigor, ambos respondem pelos prejuízos: a) o réu, preposto, porque causador direto do dano; b) o preponente, de foma objetiva responde pelos prejuízos causados pelo preposto. A ação poderia ter sido proposta contra os dois, em litisconsórcio facultativo. O ajuizamento apenas contra o preposto se dá, normalmente, pelo fato desconhecido do autor, de que agira a mando de outrem. A extensão da nomeação à autoria a esses casos é medida que favorece o autor, pois o preponente geralmente tem melhores condições econômicas de arcar com a indenização do que seu preposto.” (Cód. Proc. Civil coment., 203, p. 432).
Conclusão
Em que pese não existir unanimidade, após a vigência do Código Civil de 2002 especificamente no que diz respeito aos seus artigos 932, III c/c 942, Parágrafo único, tem-se por fortalecido o entendimento técnico jurídico de ser o artigo 63 do Código de Processo Civil vigente um caso de Chamamento ao Processo. Como consequência temos a existência de um litisconsórcio facultativo devido ao liame solidário existente na responsabilidade pelos prejuízos com eventual ampliação do polo passivo da demanda. Assim, em ação de indenização proposta, o responsável pelos prejuízos deve ser interpretado como um preposto e réu legítimo que responde pelos prejuízos; mas, através do instituto do Chamamento ao Processo, poderá trazer para a demanda o seu mandatário (mandante) como legitimado passivo solidário para dividir as responsabilidades de eventual condenação.
Por fim, faz-se necessário acrescentar que, tratando-se de concursos públicos a interpretação da natureza jurídica do artigo 63 do CPC depende de qual fase do concurso seja questionado a esse respeito. Na fase objetiva do concurso público deve-se ficar com a letra da lei. Ou seja, o artigo 63 do CPC é um caso de Nomeação à Autoria com substituição do polo passivo da lide; nas fases seguintes (subjetivas, orais, sentenças, pareceres etc) deve-se mostrar o conhecimento técnico jurídico apresentando a divergência doutrinária existente e posicionar-se, preferencialmente, conhecendo a linha doutrinária seguida pela banca examinadora.
Advogado, Especialista em Direito Processual Civil e Professor
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