Apesar do tributo ser o combustível que movimenta a máquina estatal, a desoneração de certos produtos em face das imunidades tributárias surgiu com o fito de proteger valores maiores contidos em princípios constitucionais, como o da livre divulgação de idéias, de conhecimentos e da proteção da cultura. Devido a isso que os livros, jornais, periódicos e o papel destinado à impressão seriam imunes a toda e qualquer espécie de imposto. Logo, as imunidades tributárias, por serem protetoras de bens maiores, deveriam ser interpretadas extensivamente, incluindo os livros eletrônicos, também chamados de disquetes ou CD-Roms, pois a imunidade estaria num patamar acima do papel, não vinculada a ele. Através da indução, dedução e da compilação de dados, foi traçado no trabalho monográfico um conteúdo essencialmente científico, focando a imunidade tributária contida no artigo 150, inciso VI, letra “d” da Constituição sob uma perspectiva inovadora. Tal instituto seria aplicado, até mesmo, às revistas pornográficas, embora certa corrente não admita tal extensão, estando também o software e as redes de computadores afastados do benefício imunitório.
INTRODUÇÃO
Esta monografia pretendeu analisar, de uma maneira abrangente e completa, o instituto jurídico das imunidades tributárias previstas no artigo 150, inciso VI, letra “d”, da Constituição, qual seja, a incidente sobre os livros, jornais, periódicos e do papel destinado a sua impressão.
A pesquisa contida neste trabalho monográfico teceu alguns comentários gerais sobre as imunidades tributárias, atribuindo uma visão ampla ao assunto, para depois se centrar no estudo aprofundado das imunidades dos livros, jornais, periódicos e do papel destinado a sua impressão, bem como a possibilidade de sua extensão em relação aos livros e periódicos eletrônicos.
Pelo trabalho apresentado, extraiu-se a essência das imunidades tributárias previstas no artigo 150, inciso VI, letra “d” da Constituição, pois tal matéria ancora-se em vários princípios, tais como a liberdade de expressão, a divulgação de idéias e conhecimentos, dentre outros. Motivo este ensejou a necessidade do estudo e da produção deste trabalho científico acerca do tema aludido.
Foi identificado que a importância do estudo das imunidades tributárias dos livros, jornais, periódicos e do papel destinado a sua impressão centra-se em valores econômicos, culturais e políticos que fazem parte de um contexto social e filosófico. Logo, a pesquisa foi tratada com carinho e responsabilidade tremenda para não extrapolar ou dilapidar tais valores.
Como objetivo geral foram caracterizadas as imunidades tributárias a fim de um maior conhecimento sobre o tema, elencando alguns fatos históricos que corroboraram para o surgimento delas, partindo-se, logo após, para o objetivo específico que foi o estudo da espécie de imunidade tributária contida no inciso VI, letra “d”, do artigo 150, da Constituição Federal.
Em relação aos disquetes e CD-Roms, a matéria foi abordada com subsistência, sendo tecidos vários pontos de vistas doutrinários acerca da extensão das imunidades àqueles objetos, que, hoje, são considerados pela maioria como livros.
A pesquisa foi embasada em obras doutrinárias, jurisprudências do Supremo Tribunal Federal e Internet, utilizando-se os métodos compilativos, indutivos, dedutivos e bibliográficos científicos para a elaboração da monografia, que está disposta em capítulos divididos, elencando-se os aspectos amplos das imunidades tributárias, sua aplicabilidade aos livros, jornais, periódicos e do papel destinado a sua impressão e, por último, no que concerne à extensão de tal instituto aos chamados livros eletrônicos.
1. ASPECTOS GERAIS SOBRE AS IMUNIDADES TRIBUTÁRIAS
1.1. Etimologia, Evolução e Aspectos Sociais
Para adentrarmos na síntese do estudo do instituto das imunidades tributárias dos livros, jornais, periódicos e do papel destinado a sua impressão, faz-se necessário abordar a matéria de uma forma ampla. Logo, traçaremos algumas observações genéricas sobre as imunidades como um todo, para uma melhor compreensão do tema.
Etimologicamente, o vocábulo imunidade procede do latim immunitas, immunitate. Trata-se de palavra que indica negação de munus (cargo, função ou encargo), sendo que o prefixo in oferece a sua verdadeira conotação (sem encargo, livre de encargos ou munus) (MORAES, 1998, p. 105).
Em princípio, pois, o vocábulo remete à noção de desobrigação de se suportar uma condição onerosa (FARIA, 2002, p. 117).
Munus é também empregado, no latim, como sinônimo de imposto e, também, como dádiva ou favor (FARIA, 2002, p. 117).
Ainda, no que tange a etimologia da palavra imunidade, faz-se necessário observar-se que a sílaba latina in, que antecede o radical, além de negação, assume também o significado de “em para dentro de” e o termo munitus, que obedece a mesma raiz de munus, que, por sua vez, tem o mesmo sentido de “algo protegido por uma barreira” (FARIA, 2002, p. 118).
Tal instituto em estudo deve ser entendido como uma espécie de privilégio, pois as imunidades tributárias protegem valores sociais e políticos abarcados na Magna Carta, tais como a liberdade de expressão e a difusão de conhecimentos através das fronteiras internas e externas de nosso país (FARIA, 2002, p. 118).
No direito romano, muito embora houvesse uma estrutura tributária mais complexa, a situação não era diversa em relação a outras sociedades da Antigüidade. Também em Roma, “[…] com freqüência, as isenções eram concedidas, mais ou menos caprichosamente, como graça ou favor, aos seguidores ou amigos dos senhores e soberanos” (FARIA, 2002, p. 118).
Logo, infere-se que, nos tempos remotos, a imunidade tributária constituía privilégio para os que eram beneficiados por ela, pois os governantes pouco importavam com valores sociais, culturais e políticos da população como um todo, tendendo a proteger seus próprios interesses.
Neste sentido, Maria Cristina Neubern de Faria preceitua que é curiosa a constatação de que a noção subliminar de imunidade relacionada como sendo uma “benesse fiscal” a uns poucos privilegiados, remonta a Antigüidade. A desoneração de tributos
Baseava-se precipuamente, na diferenciação das classes sociais, sendo concedida indiscriminadamente como graça ou favor aos amigos e protegidos do soberano. O privilégio tributário era decorrente do domínio político inicialmente, para, em seguida, manifestar-se em favor dos povos invasores e conquistadores em relação aos conquistados, como também em favor das classes tidas como superiores diante dos menos privilegiados desprovidos de direitos de direitos civis e políticos. Todavia, com o passar dos tempos, não mais havendo razão para a distinção de classes, os privilégios fiscais foram sofrendo radical transformação, dando lugar à fundamentação jurídica com base nos supremos interesses sociais (FARIA, 2002, p. 118).
Na Idade Média esse privilégio se fundamenta nas diferenciações de classes, castas ou estamentos sociais, privilegiando certas pessoas. Com o passar dos anos, a imunidade passou a repousar em bases diferentes calcadas no interesse social e político do Estado (FARIA, 2002, p. 118).
Destarte, analisando as imunidades tributárias sob uma perspectiva histórica, elencaremos alguns fatos sociais ocorridos que corroboraram com a implantação do instituto das imunidades tributárias no Brasil.
Primeiramente citamos o principal movimento de independência política do Brasil Colônia em relação ao domínio de Portugal, que se fundou em vários fatores, dentre eles, a tributação (FARIA, 2002, p. 118).
Em um segundo plano, temos a Conjuração Mineira de 1789 que eclodiu a partir de uma revolta contra a opressão portuguesa, exigindo o pagamento dos impostos que estavam em atraso, terminando violentamente sufocada pela metrópole, mantendo-se os privilégios das classes e a cobrança abusiva de impostos (FARIA, 2002, p. 123).
Um século depois da Inconfidência Mineira, com a Proclamação da República Federativa do Brasil e com a instauração do Regime Federativo do Brasil é que se fixaram regras e princípios jurídicos do Estado de Direito que passariam a estruturar a ordem tributária, incluindo as hipóteses da imunidade (FARIA, 2002, p. 123).
Através da primeira Constituição Republicana de 1891 foram instituídas as primeiras imunidades tributárias no Brasil, estando a permanecer até os dias atuais no texto da atual Magna Carta (FARIA, 2002, p. 123).
Não há como separar a História do Brasil em relação aos tributos, pois ele foi, é e será o responsável pela engrenagem da máquina estatal.
Atualmente, também como no período antigo, várias classes são privilegiadas em detrimento de outras.
Percebe-se, através da imprensa, verdadeiros absurdos ocorridos em pleno século XXI. O perdão das dívidas contraídas pelos grandes fazendeiros, realizadas por deliberação do Congresso Nacional constitui-se num ato repugnante que não deve prevalecer num Estado cheio de desigualdades sociais como esse em que vivemos.
Se o governo Brasileiro fizesse valer seu direito, exigindo as propriedades rurais que se encontram em posse de vários fazendeiros, essas terras poderiam ser utilizadas para a implantação de uma Reforma Fundiária realizada de forma correta.
Mas, deixemos a indignação de lado e voltemos ao assunto em questão.
Através da imunidade tributária, pessoas, bens, coisas, fatos ou situações, deixam de ser alcançados pela tributação.
O rol das imunidades tributárias está previsto em nosso ordenamento jurídico no artigo 150, inciso VI, alíneas “a” a “d”, da Constituição Federal de 1988, protegendo o patrimônio, a renda ou os serviços uns dos outros; os templos de qualquer culto; o patrimônio, renda ou serviços dos partidos políticos, inclusive suas fundações, das entidades sindicais dos trabalhadores, das instituições de educação e de assistência social, sem fins lucrativos, atendendo os requisitos da lei; e, por último, os livros, jornais, periódicos e o papel destinado a sua impressão.
1.2. CONCEITO
Diversos são os conceitos trazidos pelos tributaristas no que tange ao instituto das imunidades, tendo todos um certo grau de coerência ao prescrever sobre o assunto.
Devido a isso, elencaremos alguns conceitos traduzidos por alguns doutrinadores.
José Augusto Delgado conceitua a imunidade como sendo uma entidade jurídica tributária consagrada na Constituição Federal. Ela está, portanto, subordinada aos princípios que norteiam a Magna Carta. Tais princípios, expressos ou tácitos, são mais do que simples normas jurídicas e formam, de modo conjunto, um sistema denominado de ordenamento submetido a uma hierarquia axiológica (DELGADO, 2001, p. 54).
O pagamento do tributo é um dever imperativo de todos os segmentos da população, pois corresponde a uma necessidade vital. Logo, podemos definir o tributo como o combustível que move a máquina estatal, pois sem sua arrecadação seria impossível fornecer assistência médica, moradia, saneamento básico, programas de redução de miséria e educação pública e gratuita à população que realmente necessita e que estaria desamparada e em condições piores do que a realidade atual, se não houvesse arrecadação.
Entendemos que, se a saúde, por exemplo, é fornecida de forma precária à população, há de se apurar a aplicação do capital arrecadado, não fazendo o cidadão pensar que o que pesa no seu bolso é o valor dos tributos e não os atos de improbidades administrativas praticados por entes que integram a Administração Pública.
Neste sentido, Ives Gandra da Silva Martins aduz que, apesar do tributo ser elemento essencial para a movimentação da máquina estatal, nosso ordenamento jurídico prevê o instituto da imunidade consagrado em fundamentos extrajurídicos, atendendo a orientação do poder constituinte em função das idéias políticas vigentes, preservando, dessa forma, os valores políticos, religiosos, educacionais, sociais, culturais e econômicos, todos eles fundamentais à sociedade brasileira. Daí a correta afirmação de que a imunidade é antologicamente constitucional (MARTINS, 2001, p. 209).
A imunidade tributária é uma limitação constitucional ao poder de tributar, vez que está contida de forma expressa pela Constituição Federal. Logo, tal observância, significa dizer que a pessoa ou o bem descrito pela Magna Carta não podem sofrer tributação, pois, ressalta-se novamente que, as imunidades, resguardam o equilíbrio federativo, a liberdade política, religiosa, associativa, intelectual, da expressão, da cultura e do desenvolvimento econômico.
Logo, não se deve considerar a imunidade tributária como um benefício ou como um favor fiscal, uma renúncia à competência tributária ou um privilégio, mas sim, uma forma de resguardar e garantir os valores da comunidade e do indivíduo (MARTINS, 2001, p. 209).
Sendo assim, preceitua-se que, apesar da necessidade que o Estado tem de cobrar impostos, o legislador entendeu que os objetos eivados e protegidos pelo instituto das imunidades devem merecer um tratamento diferenciado em relação àqueles suscetíveis à tributação, pelos valores que aqueles disseminam numa sociedade política e democraticamente organizada.
2. AS IMUNIDADES TRIBUTÁRIAS DOS LIVROS, JORNAIS, PERIÓDICOS E DO PAPEL DESTINADO A SUA IMPRESSÃO
2.1. HISTÓRICO
As imunidades tributárias dos livros, jornais, periódicos e do papel destinado a sua impressão foram introduzidas no ordenamento jurídico brasileiro através do artigo 31, letra “c”, da Magna Carta de 1946.
Em 1965, com a elaboração do Código Tributário Nacional, através da Emenda Constitucional n. 18, o mesmo considerou imune, em seu artigo 9°, inciso IV, alínea “d”, “o papel destinado exclusivamente à impressão de jornais, periódicos e livros”.
Na Constituição de 1967, tanto em sua redação original, como na decorrente da Emenda Constitucional n. 1, de 1969, consideraram-se imunes os livros e os periódicos, assim como o papel destinado a sua impressão, em seu artigo 19, inciso III, letra “d”.
A Constituição de 1988 manteve o instituto das imunidades tributárias dos livros, jornais, periódicos e papel destinado a sua impressão no inciso VI, letra “d” do artigo 150.
Vejamos o dispositivo aludido no parágrafo anterior:
Art. 150. Sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao constituinte, é vedado a União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios:
VI – instituir impostos sobre:
d) livros, jornais, periódicos e o papel destinado a sua impressão.
2.2. Natureza Jurídica
Ricardo Lobo Torres preceitua acerca da Natureza Jurídica das imunidades tributárias dos livros, jornais, periódicos e do papel destinado à impressão de forma descrente, aludindo que a proteção do artigo 150, inciso VI, letra “d” da Constituição não é vera imunidade tributária, pois falta-lhe o traço característico que é ser atributo dos direitos fundamentais e constituir numa plena garantia da liberdade de expressão, tendo como fundamento a idéia de justiça ou de utilidade, categorizando-se melhor como um privilégio constitucional, podendo em alguns casos, como no dos jornais, assumir o aspecto de “privilégio odioso” (TORRES, 1999, p. 282).
Adiante, o referido doutrinador citado no parágrafo anterior, afirma que não se encontra no direito comparado exemplo de imunidade nem de incidência constitucional para jornais e livros. Nos Estados Unidos há algumas isenções concedidas pela legislação ordinária estadual para os órgãos da imprensa; inexistindo, entretanto, vedação constitucional ou imunidade genérica, muito menos ancorada na 1ª Emenda, embora os tribunais americanos controlem a legislação que ofenda a liberdade pela tributação punitiva ou pelos discrimes nos favores concedidos aos jornais (TORRES, 1999, p. 283).
Logo, se a não-tributação dos livros e jornais tem a natureza de não-incidência constitucional ou de mero privilégio, não se lhe estendem as conseqüências das verdadeiras imunidades, entre as quais a irrevogabilidade.
O Supremo Tribunal Federal, em julgamento à Ação Direta de Inconstitucionalidade 939-7, publicado pelo Diário de Justiça na data de 18 de março de 1994, classificou no rol das imunidades os jornais e livros e a declarou insuscetível de alteração por Emenda Constitucional, considerando-a norma imunizante.
Logo, atribui-se um caráter assemelhado ao de uma cláusula pétrea (1), pois, se tal dispositivo não pode ser alterado via Emenda Constitucional, logicamente, também não poderá ser modificado por nenhum outro tipo de norma, tendo em vista o princípio da hierarquia.
2.3. Conteúdo
Ricardo Lobo Torres preceitua que o entendimento majoritário da vedação do artigo 150, inciso VI, letra “d”, prevalece apenas quanto aos impostos, dela se excluindo, portanto, as taxas e contribuições (TORRES, 1999, p. 304).
O Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI), o Imposto sobre Serviços (ISS) e o Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS), por serem impostos objetivos, têm a sua incidência afastada pelos jornais, livros e periódicos (TORRES, 1999, p. 305).
Em contrapartida, inexiste imunidade para os tributos subjetivamente incidentes, como o imposto de renda, que recai sobre as disponibilidades financeiras de autores, editores, empresas jornalísticas e outras pessoas envolvidas com o mundo das publicações (TORRES, 1999, p. 305).
Através desse entendimento citado, entende-se que o artigo 150, inciso VI, letra “d”, não diz respeito às imunidades tributárias, mas sim a imunidades de impostos, pois, em nenhum momento, a Constituição se refere a tributos. Mesmo assim, iremos dissertar tal instituto referindo-se a ele como imunidades tributárias, pois é como os tributaristas denominam o assunto em questão.
2.4. Finalidade ou Destinação Social
Os valores protegidos com essa espécie de imunidade protegem a desoneração de todos os impostos, envolvem a livre manifestação do pensamento, a divulgação da cultura e da informação e sua acessibilidade ao maior número possível de indivíduos, devendo considerar que a norma teve em vista universalizar o conhecimento, o que serviria de parâmetro para a interpretação da regra inscrita na Constituição.
O doutrinador Ricardo Lobo Torres preceitua que o fundamento precípuo da intributabilidade ou não-tributação dos livros, jornais e periódicos é baseado na idéia de justiça fiscal, nela incluída a de utilidade social, consubstanciada na necessidade de baratear o custo dos livros e das publicações. Dessa forma, em um país com gravíssima crise de educação e com a necessidade premente de se ampliar o número de pessoas alfabetizadas e instruídas, torna-se vital diminuir o custo da produção dos seus instrumentos os mais importantes – os livros e os periódicos (TORRES, 1999, p. 283).
As imunidades tributárias, previstas no artigo 150, inciso VI, alínea “d”, da Constituição Federal, fundam-se no aspecto teleológico ou finalístico, pois a finalidade da dispensa constitucional do imposto é a proteção da cultura e a divulgação de informações em todo o território brasileiro, protegendo de forma peculiar, a livre expressão do pensamento, que é a base, a viga mestra ou o alicerce utilizado na construção de um autêntico regime democrático de um Estado de direito (BALEEIRO, 2000, p. 148).
O douto doutrinador e professor Aliomar Baleeiro dispôs de forma brilhante acerca do tema, preceituando que a imunidade tributária, constitucionalmente assegurada aos livros, jornais, periódicos e papel destinado a sua impressão, nada mais é que uma forma de viabilização de outros direitos e garantias fundamenteis expressos no artigo 5°, da Magna Carta, como a livre manifestação do pensamento, a livre manifestação da atividade intelectual, artística, científica e de comunicação, independente de censura ou licença (inciso IV e IX), artigo 206, II (a liberdade de aprender, ensinar, pesquisar e divulgar o pensamento, a arte e o saber), artigo 220, § 1° e 6° (a proibição da criação de embaraço, por lei, à plena liberdade de informação jornalística em qualquer veículo de comunicação social e inexistência de licença de autoridade para a publicação do veículo impresso de comunicação), dentre outros. Mais do que isso, a imunidade há de ser invocada como instrumento imprescindível à realização do Estado Democrático de Direito, do qual o pluralismo político, a crítica e a oposição são requisitos essenciais (BALEEIRO, 2000, p. 148).
Somente através do contraditório que a sociedade acha seus próprios caminhos para atingir um desenvolvimento satisfatório. Percebe-se que, do ponto de vista histórico, até mesmo as guerras, apesar de sangrentas, acabam por estabelecer novos parâmetros de vida da população. O vencedor geralmente se eleva em relação ao vencido. Como exemplo disso, podemos citar o auge dos Estados Unidos da América e da antiga União das Repúblicas Socialistas Soviéticas após a 2ª Guerra Mundial.
Isso não significa que somos favoráveis ao derramamento de sangue como meio para alcançar o desenvolvimento. Mas fatos são realidades e, somente através da contradição e confronto de idéias, que se pode chegar a conclusões mais próximas do “dever ser”, como faziam os filósofos gregos em seus diálogos intermináveis chamados de retóricas.
Logo, a imunidade tributária filia-se aos dispositivos constitucionais que amparam a liberdade de expressão e opinião e partejam o debate de idéias em prol da cidadania, simpatizando com o desenvolvimento da cultura e da informação, contribuindo na formação de cidadãos para nossa sociedade.
Contudo, pode-se afirmar que, as imunidades dos livros, jornais, periódicos e do papel destinado a sua impressão, trata-se de um instituto jurídico que protege valores superiores, amparados pela ordem jurídica, que revelam, de forma inequívoca, que as situações nele contidas são representativas de tais valores.
Esse é o entendimento adotado por Hugo de Brito Machado Segundo, ao preceituar que, sobre livros e jornais não incidem impostos, pois a Constituição assegura que o Governo não utilizará a tributação como forma de prejudicar direitos fundamentais, que não contribuirá para que tais produtos sejam caros, que não utilizará o imposto para dificultar sua produção e consumo, garantindo, assim, a liberdade de expressão, a difusão da cultura e do conhecimento (SEGUNDO, 2004, p. 65).
Desta forma, podemos constatar que a liberdade de expressão pode ser utilizada como argumento subalterno, eis que ao se baratear o custo das publicações se estará facilitando a manifestação do pensamento, tendo em vista que a justiça e a liberdade integraram a mesma equação valorativa (TORRES, 1999, p. 284).
Sendo assim, constata-se a importância das imunidades tributárias elencadas no artigo 150, inciso VI, alínea “d” da Constituição Federal, pois, se não fosse o barateamento do custo dos livros, jornais e periódicos ocasionados por ela, estaria ferindo de uma forma injustificada grande parte do texto constitucional que protege a liberdade de expressão.
2.5. Interpretação
A doutrina e a jurisprudência divergem acerca do assunto em tela, no que se refere à interpretação das imunidades tributárias.
Alguns afirmam que, a interpretação das imunidades tributárias dos livros, jornais, periódicos e do papel destinado a sua impressão, deve ser feita de forma objetiva e literal, diferentemente de outros que advogam a tese de que tal instituto deve ser interpretado de maneira ampla.
Uma corrente liderada pelos doutrinadores Sérgio Pinto Martins, Sacha Calmon Navarro Coêlho e José Eduardo Soares, afirmam que a imunidade é objetiva, ou seja, o livro, o jornal, o periódico e o papel destinado a sua impressão estão livres de tributação, independentemente do assunto, da moralidade do assunto ou da finalidade perseguida dos objetos imunes, mediante a desoneração de impostos, pois o princípio da isonomia não consente qualquer efeito discriminatório (MARTINS, 2002, p. 242; COELHO, 2000, p. 292; MELO, 1997, p. 95).
Adotando uma linha de pesquisa voltada para uma interpretação ampla acerca do tema, Hugo de Brito Machado, Vittorio Cassone e Aires Fernandino Barreto preceituam que a imunidade para ser efetiva, abrange todo o material necessário à confecção do livro, do jornal ou do periódico. Não apenas o material considerado, mas o conjunto e, devido a isso, nenhum imposto pode incidir sobre qualquer insumo, ou mesmo sobre qualquer dos instrumentos, ou equipamentos, que sejam destinados exclusivamente para a produção desses objetos. Logo, não se interpretará corretamente o artigo 150, inciso VI, letra “d”, se em vez de valorizar os princípios constitucionais em que a imunidade se assenta, se der ênfase, seja a literalidade desse preceito, seja à cláusula final “e o papel destinado a sua impressão”, como se esta tivesse o condão de restringir a imunidade ao livro, ao jornal e aos periódicos impressos em papel (MACHADO, 2002, p. 227; CASSONE, 2000, p. 123; BARRETO, 2001).
Intermediando as duas linhas de pensamento citadas, entendemos que as imunidades tributárias previstas no artigo 150, inciso VI, letra “d” da Constituição Federal, devem ser interpretadas extensivamente, mas como um certo grau de razoabilidade, analisando a substância e os interesses protegidos pela Constituição.
O Supremo Tribunal Federal cometeu, a nosso ver, uma incoerência ao reconhecer no julgamento ao Recurso Extraordinário 221.239, ser aplicada a imunidade tributária dos livros, jornais, periódicos e do papel destinado a sua impressão aos álbuns de figurinhas.
É certo que tais álbuns trazem alguma dose de informação científica ao público infanto-juvenil, mas não passam de meros instrumentos propagandísticos utilizados no mercado capitalista em que vivemos.
Ventila-se a idéia de que tal decisão deve ter sido meramente política, pois envolveu a Editora Globo como pólo ativo da ação, e, em julgamento ao Recurso Extraordinário 325.334, o mesmo Tribunal não concedeu a extensão da imunidade em tela às capas duras utilizadas na encadernação de livros.
Em sentido contrário, Ricardo Lobo Torres afirma que as sobrecapas e as ferragens destinadas à encadernação de folhas soltas impressas, por serem acessórias dos livros, também hão de ser compreendidas pelo instituto das imunidades tributárias (TORRES, 1999, p. 296).
Também entendemos desta forma, pois as capas são onerosas para os fabricantes dos livros. Podem ocasionar a elevação do preço, tendo como conseqüência o empecilho da população em adquiri-los.
As aparentes desconsonâncias ocasionadas pelas decisões do Supremo Tribunal Federal não param por aqui. Em julgamento ao Recurso Extraordinário 324.600, o responsável pela guarda da Constituição decidiu que a imunidade prevista no artigo 150, inciso VI, letra “d”, da Carta citada, não é estendida a outros insumos que não seja o papel destinado a sua impressão, suprimindo, dessa forma, a extensão de tal instituto aos livros eletrônicos chamados de CD-Roms, que trazem informações como os feitos de papel, ferindo, de forma abrupta o princípio da divulgação de idéias.
No mercado capitalista em que estamos a viver, os empresários procuram várias formas de obter um aumento das receitas de suas empresas, utilizando-se de vários métodos. Dentre eles, o ingresso de ações com pedidos de liminares, requerendo a aplicabilidade do instituto da imunidade tributária através da interpretação extensiva aos produtos que fabricam.
O Supremo Tribunal Federal decidiu em julgamento ao Recurso Extraordinário 208.638, decidiu com firmeza que, a imunidade objeto da pesquisa deste trabalho, não alcança as tiras plásticas para amarração de jornais, pois estas já fazem parte de um setor diverso, não se enquadrando como periódicos.
Já, consagrando a proteção do princípio da divulgação de conhecimento, o Pretório Excelso, em julgamento ao Recurso Extraordinário 265.025, estendeu a imunidade tributária prevista no artigo 150, inciso VI, letra “d”, da Magna Carta aos filmes fotográficos utilizados na elaboração de livros, jornais e periódicos.
Ainda, deve-se ressaltar a importante lição jurídica trazida no julgamento do Recurso Extraordinário 183.403, que teve como relator o Ministro Marco Aurélio de Melo, que preceitua a aplicabilidade das imunidades tributárias dos livros, jornais, jornais, periódicos e do papel destinado a sua impressão às chamadas apostilas, visto que se constituem em veículo de cultura simplificado.
2.6. Aplicação das Imunidades aos Periódicos
Ricardo Lobo Torres define os periódicos como sendo as revistas, técnicas ou não, e os impressos que se editam repetidamente dentro de certo intervalo de tempo, tendo o seu conceito amplo, abrangendo até mesmo as revistas pornográficas, tendo em vista que a acusação de pornografia sempre serviu de base à opressão da livre manifestação do pensamento e às discriminações no campo da literatura. Logo, tal doutrinador firma o entendimento de que o privilégio das imunidades às publicações de fins meramente comerciais, de propaganda ou de interesse interno de empresas, sem nenhum objetivo cultural ou político, não devem ser abarcadas pelo instituto da imunidade (TORRES, 1999, p. 294).
A nosso ver, a imunidade tributária não deve abranger as revistas pornográficas, pois o teor das mesmas não se refere a conteúdos educativos, tanto que é proibida sua venda a menores de 18 (dezoito) anos.
A pornografia utilizada como manifesto de reprovação na época da ditadura militar foi um meio de fazer com que publicassem tais conteúdos. Hoje, estamos a viver num país democrático, logo, tal benesse não pode ser estendida a tais objetos.
Embora muitas vezes seja fácil identificar a figura de um livro, nem sempre é possível caracterizá-lo de forma precisa, o mesmo ocorrendo com o periódico, tendo em vista as diferenciadas situações que se apresentam.
José Eduardo Soares Melo preceitua que os periódicos são aqueles objetos que cuidam apenas e tão somente de informações genéricas ou específicas, sem caráter noticioso, discursivo, poético, literário ou filosófico (MELO, 1997, p. 95).
Já o ilustre professor tributarista Yoshiaki Ichihara afirma que dentre o conceito de periódicos se incluem as revistas técnicas, os boletins e os semanários, desde que sejam utilizados na veiculação de informações técnicas, como os referentes a direito, economia, administração, medicina, matemática e física (ICHIHARA, 2000, p. 227).
Alguns doutrinadores entendem que os anúncios vinculados aos periódicos são também afetos pela imunidade tributária.
O professor Sérgio Pinto Martins cita como exemplo de periódico, os folhetos distribuídos nas missas, pois circulam toda a semana, sendo que, os anúncios nele incluídos estão imunes ao ISS (Imposto sobre Serviços) (MARTINS, 2002, p. 242).
Logo, percebe-se o sentido finalístico, conferido pelo doutrinador citado no parágrafo anterior, ao instituto da imunidade tributária dos livros, jornais, periódicos e do papel destinado a sua impressão.
Aliomar Baleeiro preceitua que o boletim distribuído regularmente por empresas privadas, para difusão de seus negócios, propaganda, orientação de agentes e empregados, não é periódico no sentido conferido pela Constituição Federal. Admitir-se-á que o livro didático, para distribuição gratuita e colaboração com os serviços públicos de educação, possa conter discreta propaganda do ofertante ou de terceiro, como meio de prover-lhe o custo (BALEEIRO, 2000, p. 148).
Várias são as discussões no que tange à extensão das imunidades tributárias dos periódicos às listas telefônicas.
O Supremo Tribunal Federal já entendeu, em julgamento ao Recurso Extraordinário 17.804/67, que não é imune o papel utilizado na impressão de guia telefônico.
Como o direito é uma disciplina dinâmica e se modifica quotidianamente, o referido tribunal entendeu, em julgamento aos Recursos Extraordinário 101.441-5 e 111.960, que as listas telefônicas, vieram a ser alcançadas pelas imunidades, sob o fundamento de que não estão excluídos da imunidade os periódicos que cuidam apenas e tão somente de informações genéricas ou específicas, sem caráter noticioso, discursivo, literário, poético ou filosófico, o mesmo se verificando com os catálogos ou guias telefônicos, mesmo que neles haja publicidade paga, tendo em vista a inegável utilidade pública atribuída a eles.
Hugo de Brito Machado entende que a Jurisprudência dos Tribunais Superiores evoluiu no sentido de estender a imunidade a todo o periódico que, como os catálogos telefônicos, prestam serviços essenciais de informação à coletividade, independentemente do fato de conterem publicidade paga (MACHADO, 1997, p. 11-39).
Entende-se que seria por este e outros motivos que a maioria dos juristas são contra a adoção das súmulas vinculantes, pois o caráter dinâmico do direito foi, a nosso ver, benéfico no que tange ao princípio da livre informação protegido pela Magna Carta.
Ainda, sobre o assunto, Hugo de Brito Machado entende que a imunidade há de ser interpretada amplamente e objetivamente, sem possibilidade de censura quanto ao seu conteúdo, ao sabor dos pendores subjetivos, morais e religiosos do intérprete. Logo, até mesmo as revistas pornográficas ou eróticas seriam protegidas pelo artigo 150, inciso VI, letra “d” da Constituição Federal (MACHADO, 1997, p. 11-39).
2.7. A Imunidade dos Jornais
Segundo Ricardo Lobo Torres, os jornais gozam de amplo privilégio fiscal e, não só o preço da venda de exemplar é insuscetível de tributação, como também a propaganda por ele vinculada, como reconheceu o Supremo Tribunal Federal em Julgamento ao Recurso Extraordinário 87.049-SP, por constituir parcela substancial para a sobrevivência do jornal. Excluem-se do campo de privilégio do princípio constitucional os veículos de radiodifusão, neles compreendidos os “jornais da tela” ou os “jornais da televisão”, que apenas metaforicamente podem ser considerados jornais (TORRES, 1999, p. 295).
O doutrinador Ricardo Lobo Torres entende que as imunidades tributárias não podem prevalecer para os jornais, pois em uma estrutura liberal de poder, devem eles ser mantidos pelos seus leitores e anunciantes, sem apoio estatal permanente, o que evidencia o parentesco entre a vedação constitucional e os privilégios injustificados (TORRES, 1999, p. 283).
Entende-se que tal ponto de vista aludido no parágrafo acima não merece prosperidade dentro do universo jurídico, pois as revistas também contêm grande quantidade de anúncios e não foram citadas na crítica feita pelo respeitável doutrinador.
A imprensa não pode ser tratada de forma isolada. Não devemos discriminar as formas de comunicação como os jornais, em detrimento das revistas.
Se até mesmo as revistas pornográficas são abrangidas pelas imunidades, porque não estendê-las aos jornais?
É de notório saber popular que várias redações foram fechadas no período ditatorial. Logo, tal discriminação em relação à aplicabilidade do artigo 150, inciso VI, letra “d”, da Constituição aos jornais, seria ferir vários valores alcançados pelo Estado Democrático de Direito, retrocedendo à fase obscura e negra do autoritarismo.
Se um doutrinador ou outro defender a tese da extinção das imunidades tributárias para “os jornais”, deverá também apoiar os fins das imunidades tributárias aos partidos políticos, livros, periódicos, CD-Roms, e também em relação aos tempos religiosos, pois, a Constituição não estabeleceu hierarquia entre elas.
2.8. O Papel de Imprensa
O ilustre tributarista Ricardo Lobo Torres preceitua que a intributabilidade protege o papel destinado à impressão de livros, jornais e periódicos, mas só o papel de imprensa se beneficia da franquia, dela se incluindo o papel como outra destinação industrial ou comercial, como o papel de embrulho (TORRES, 1999, p. 295).
3. A EXTENSÃO DA IMUNIDADE TRIBUTÁRIA AOS LIVROS, JORNAIS E PERIÓDICOS ELETRÔNICOS
3.1. O Conceito de Livro
Devido ao crescente e constante desenvolvimento tecnológico, diminuta é a distância entre o livro tradicional, feito de papel e os livros informatizados, pois as tecnologias de informação e da comunicação suscitam o aparecimento de condições inteiramente novas na vida pessoal, profissional, social e cultural dos cidadãos, criando desafios importantes porque, de regra, a evolução tecnológica não é acompanhada por uma evolução e uma adaptação em termos de organização da sociedade.
O ilustre Ricardo Lobo Torres, num primeiro momento, conceitua o livro como sendo o resultado da impressão, em papel, de idéias, doutrinas ou informações com finalidade cultural. Aproxima-se, em acepção ampla do conceito que o senso comum admite e os dicionários registram (TORRES, 1999, p. 199).
A noção clássica que se tem de livro é a de uma reunião de folhas de papel, impressos, presas a uma capa que pode ser flexível ou rígida, cujo conteúdo varia, podendo ser de caráter didático, científico, como também destinado ao lazer: romances e estórias infantis.
Ainda, complementando a idéia de conceito de livro, Ângela Maria da Mota Pacheco, preceitua que o livro é um veículo que divulga informações, ciência, ficção, arte, idéias e cultura, no vasto domínio do conhecimento humano. A matéria, na qual o livro se impregna, se identifica, completa-o, mas não o define. (PACHECO, 2001, p. 388).
Logo, na realidade, o conceito necessário e suficiente de livro, diz respeito ao seu conteúdo, finalidade e publicidade.
Ressalta-se que, nem tudo que está escrito é livro, na acepção traduzida no artigo 150, inciso VI, letra “d”, da Constituição, pois há os anúncios, notícias, grafites, cartazes, informações, periódicos e revistas.
Neste sentido, Ricardo Lobo Torres acrescenta que a Constituição não distingue, nem pode o intérprete distinguir, os processos tecnológicos de elaboração dos livros, jornais e periódicos, embora vincule ao papel como elemento material de seu fabrico, excluindo, de igual forma, outros processos de comunicações do pensamento, como radiodifusão, a TV, os aparelhos de som e a cinematografia que não tem por veículo o papel. (TORRES, 1999, p. 199).
3.2. Cultura Tipográfica e Cultura Eletrônica
Várias são as discussões acerca da aplicação da imunidade prevista no artigo 150, inciso VI, letra “d” da Constituição Federal, no que tange à sua vinculação ao papel.
Ricardo Lobo Torres traça algumas observações, afirmando que a fronteira centra-se na existência ou não, de texto impresso em papel, característica essencial para a fruição da imunidade. A garantia constitucional se insere na “cultura impressa” ou na “cultura tipográfica” e não na “cultura eletrônica”, isto é, a vedação de incidência de impostos visa a proteger a expressão de idéias em papel (este também imune) e não aquele que aparece em programa de computador ou no espaço cibernético (TORRES, 1999, p. 286).
Logo, infere-se que, na interpretação do sentido e alcance da imunidade é necessário que se evitem a banalização do seu conceito, o comprometimento do futuro da fiscalidade na informática e a analogia ingênua entre a cultura tipográfica e a eletrônica, não podendo comprometer o futuro da fiscalidade, fechando-se a possibilidade de incidências tributárias pela extrapolação da vedação constitucional para os produtos da cultura eletrônica; tanto mais que a nova tecnologia pode digitalizar tudo o que antes aparecia impresso no papel, sendo a recíproca verdadeira em boa parte (TORRES, 1999, p. 316).
3.3. Entendimento Doutrinário
Preceitua Francisco de Assis Alves que, através de uma interpretação puramente literal, poder-se-á chegar à conclusão errônea de que os livros eletrônicos não são alcançados pela imunidade. Errônea porque tal ilação estaria em desconformidade com os valores que o texto constitucional quis proteger (ALVES, 2001, p. 272).
O tema referente à extensão da imunidade tributária prevista no artigo 150, inciso VI, letra “d” da Constituição, aos livros e periódicos eletrônicos não é assunto pacífico na doutrina, como quase todas as teorias jurídicas.
José Eduardo Soares Mello dispõe que os processos tecnológicos para a elaboração dos livros, jornais e periódicos são totalmente irrelevantes, como é o caso de programas de computador (CD-Rom), disquetes, fitas cassete e demais elementos de informática, que também se encaixam no âmbito imunitório, uma vez que atendem às mesmas finalidades dos apontados veículos de comunicação. Trata-se de novos instrumentos que também transmitem idéias e conhecimentos e que, numa interpretação tecnológica, inserem-se na mesma moldura cultural veiculada aos livros (MELO, 1997, p. 96).
Considera-se que o CD-Rom e o disquete, desde que sejam permeados com o mesmo conteúdo dos livros feito de papel, devem ser protegidos pelo instituto da imunidade prevista no artigo 150, inciso VI, letra “d”, da Constituição, pois, desnecessário citar a importância da educação, da instrução, do aperfeiçoamento, da cultura, mormente no mundo cada vez mais globalizado, onde a tecnologia de produção é elemento desempatador na prática do comércio internacional, e pela qual a própria pessoa pode desfrutar da cidadania, contribuindo decididamente com seu saber.
Adotando a mesma linha de pesquisa, Ives Gandra da Silva Martins aduz que a extensão da imunidade prevista no artigo 150, inciso VI, letra “d”, da Magna Carta, deverá ser estendida aos livros e periódicos eletrônicos pelo fato da evolução da tecnologia mundial tornar os meios de informação, formação e cultura antiquados, substituindo-os por meios mais modernos e eletrônicos, à nitidez, pois o princípio que agasalha esta proteção da cidadania deve ser alargado, em sua exegese, às novas formas de comunicação. Logo, o livro eletrônico está protegido pela imunidade tributária como o estão os livros impressos em papel, que, em duas ou três gerações, deverão ter desaparecido ou estar reduzida sua edição aos colecionadores e bibliógrafos (MARTINS, 2001, p. 38).
O entendimento consagrado na doutrina, acerca da extensão das imunidades tributárias aos livros eletrônicos, abarca-se no princípio da liberdade de pensamento que abrange todas as formas de comunicação entre as pessoas e, como é assegurada amplamente na Constituição, pode ser transmitida por qualquer meio que se revele idôneo à sua divulgação.
Neste sentido, José Augusto Delgado preceitua que, na época atual, não pode entender como livro, apenas o editado em papel, pois, ao ser elaborada a Constituição de 1988, o mundo contemporâneo já conhecia uma realidade imposta pela ciência da informática e consistente na transmissão de idéias por vias eletrônicas, no caso o CD-Rom e o disquete. Logo, se a vontade do constituinte fosse de restringir a imunidade, apenas ao livro tradicional, isto é, ao livro lançado ao conhecimento do público pelo método tradicional, teria ele, explicitamente, declarado que a vedação de instituir impostos se limitava a livros formados pela reunião de folhas ou cadernos de papel, soltos, cosidos ou por qualquer outra forma, presos por um dos lados, e enfaixados ou montados em capa flexível ou rígida (DELGADO, 2001, p. 58).
A doutrina tem entendido que a imunidade tributária prevista no artigo 150, inciso VI, alínea “d”, da Constituição não só é estendida aos livros eletrônicos, como também aos CDs e disquetes virgens.
Neste sentido, José Augusto Delgado dispõe que o livro de qualquer espécie é também uma forma de educar gerações. A educação, em termos constitucionais, é um direito de todos e um dever do Estado e da família, que deverá incentivá-la por várias formas (artigo 205 da Constituição Federal), logo, a imunidade alcança todas as operações, tanto com os disquetes virgens, como com os conteúdos destes. Os disquetes virgens equivalem, para todos os efeitos ao papel destinado à impressão dos livros, jornais e periódicos (DELGADO, 2001, p. 59).
Entende-se que tal tese defendida pelo referido doutrinador citado no parágrafo anterior, no que tange à extensão da imunidade ao disquete e CD virgens, não nos parece viável, pois, não se sabe qual o conteúdo poderá vir a ser gravado no corpo destes.
Sábias as lições trazidas por Celso Ribeiro de Bastos acerca do tema, quando preceitua que o CD-Rom e o disquete constituem-se em instrumentos de divulgação e exteriorização de informações, cultura e educação, e, como tais, devem ser abrangidos pela imunidade tributária, pois eles são o reflexo da evolução tecnológica dos meios de comunicação. O livro a que faz alusão a Carta Magna de 1988 é o meio através do qual se comunicam as idéias, as informações e os conhecimentos, não importando se o processo tecnológico, em vez de ser a impressão de caracteres de papel, seja a fixação dos mesmos em CD-Rom ou disquete. O que tem de ser levado em conta nesse caso, é o conteúdo do livro, usa as informações, e não o meio pelo qual se exterioriza. O fenômeno da evolução da informática vem tomando tamanhas proporções que não é exagero dizer que num futuro próximo, os livros, os jornais e periódicos serão editados em papel. Ademais, a referência ao papel destinado a sua impressão, outro sentido não tem senão de exemplificar um dos itens que entram na produção de revistas, jornais e periódicos (BASTOS, 2001, p. 243).
Complementando a idéia do citado doutrinador no parágrafo acima, Luciano Amaro e Maria Tereza de Carvalho acrescentam que, se, por longo estágio da ciência, o papel foi o mais importante meio físico para registro, preservação e divulgação de obras literárias, artísticas e científicas, e nesse contexto histórico, se firmou a expressão da imunidade constitucional. Não se pode esvaziar o conteúdo deste, diante da evolução tecnológica, que leva o mesmo bem protegido pela imunidade (a obra) a expressar-se através de outra estrutura física. A imunidade, portanto, deve ser referida à obra e não ao meio físico que a contenha. Em síntese, no conceito de livro, jornal e periódico tem necessariamente, que abranger todas as formas de expressão de informações e informações de comunicação decorrentes das modernas tecnologias e não, apenas, obviamente, as que se apresentam fisicamente sob a forma de “paper print” (AMARO, 2001, p. 146; CARVALHO, 2001, p. 98).
Yoshiaki Ichihara traça considerações acerca do tema, preceituando que sendo o livro instrumento de expressão e de comunicação, não importa seja de caráter técnico, didático, informativo ou cultural, nesta última categoria não importa que sejam pornográficos, permeados por fotografias, figuras e desenhos. Logo, não reconhecer a imunidade tributária dos livros eletrônicos é o mesmo que parar no tempo e no espaço, preso a uma interpretação literal e retrógrada, sem enxergar a realidade atual e do futuro, pois em termos de conteúdo, função, objetividade, recursos para pesquisas, copiagem, transporte, divulgação, rapidez na localização dos textos, os CD-Roms superam em muito os tradicionais livros, jornais e periódicos (ICHIHARA, 2001, p. 326).
Os tributaristas Bernardo Ribeiro de Moraes e Sacha Calmon Navarro Coelho entendem que a imunidade tributária não deve ser estendida aos livros eletrônicos, ressaltando que embora se reconheça que “livros” no passado foram executados em barro, argila, pedra, papiro, cascas de árvore ou com embasamento em outros materiais; embora existam outros veículos essenciais de transmissão e difusão do pensamento, conhecimentos e informação, com a mesma natureza e essência quando em outra base que não o papel; para efeitos de imunidade tributária consagrada na letra “d” do inciso VI, do artigo 150 da Constituição, não se pode imunizar o denominado “livro eletrônico”, com suporte em disquetes ou CD-Rom, ou disponível na internet por não ser livro, com base na escrita e no papel de impressão, pois é “livro eletrônico”, seria um eufemismo. O CD-Rom, disquetes, “slides” e outros equipamentos eletrônicos (informática) são entes diversos do livro, pois esta imunidade é vetusta da era pré-liberal. Logo, seria objetiva, imuniza a coisa, abrangendo impostos de repercussão para barateá-la (MORAES, 2001, p. 138; NAVARRO, 2001, p. 223).
Tal posicionamento contrário é também defendido por Ricardo Lobo Torres, preceituando que o chamado “livro eletrônico”, comercializado sob a forma de CD-Rom, é um hipertexto que, lógica, operacional e finalisticamente, difere do texto do livro impresso em papel; há possibilidade de obtê-lo diretamente na rede de informática, eis que a publicação originariamente impressa em papel pode ser transportada diretamente para a “network”, como acontece com outros dicionários disponíveis na Internet, que são os baixados para que funcionem como hipertexto; é produto de consumo conspícuo, que, não fica ao sabor do intervencionismo estatal. Motivo que não ensejaria à extensão da imunidade contida no artigo 150, inciso VI, alínea “d” da Constituição Federal aos livros eletrônicos (TORRES, 1999, p. 303).
3.4. OS PROGRAMAS DE COMPUTADOR
O programa de computador, geralmente expresso em CD-Rom ou disquete para ser lido por máquina, recebeu o mesmo tratamento legal reservado aos direitos autorais, conforme previsto no artigo 1°, da Lei n. 9609/98. Vejamos o dispositivo aludido:
Art. 1°. Programa de computador é a expressão de um conjunto organizado de instruções em linguagem natural ou codificada, contida em suporte físico de qualquer natureza, de emprego necessário em máquinas automáticas de tratamento de informação, dispositivos, instrumentos ou equipamentos periféricos, baseados em técnica digital ou análogo, para fazê-los funcionar de modo e para fins determinados.
Art. 2°. O regime de proteção à propriedade intelectual de programas de computador é o conferido às obras literárias pela legislação de direitos autorais e conexos vigentes no País, observado o disposto nesta Lei.
Segundo o jurista Ricardo Lobo Torres, quanto à tributação, a doutrina e as legislações vêm admitindo a incidência do ICMS (Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços) sobre o programa de computador de prateleira ou fechado, que é produto acabado colocado no comércio, e o ISS (Imposto sobre Serviço) sobre a prestação de serviço consubstanciada na realização de encomenda ou contrato de cessão (TORRES, 1999, p. 299).
Ricardo Lobo Torres entende que os programas de computador não são abrangidos pelo instituto da imunidade prevista no artigo 150, inciso VI, letra “d” da Magna Carta, pois não tem, a mesma natureza e finalidade dos livros (TORRES, 1999, p. 301).
A nosso ver, não há que se falar em estender o benefício das imunidades aos programas de computador, pois seria uma forma de desoneração injusta para o Estado Brasileiro que tanto necessita de recursos, a serem revertidos em forma de justiça social para a população carente.
3.5. REDES DE COMPUTADORES
O doutrinador Ricardo Lobo Torres tece alguns comentários sobre as redes de computadores, aduzindo que a comunicação entre computadores ligados em redes por intermédio de telefones e satélites traz interessantíssimos problemas de fiscalidade. As compras efetuadas através da Internet caem no campo da incidência dos impostos sobre o valor acrescido. Mas, em contrapartida, afirma seu posicionamento contrário à extensão da imunidade às redes de computadores (TORRES, 1999, p. 302).
No que concerne a este tópico, firma-se o entendimento de que não há o porquê aplicação das imunidades às redes de computadores.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Por intermédio deste trabalho monográfico foi apresentado todo o conteúdo pertinente ao tema referente às imunidades tributárias dos livros, jornais, periódicos e do papel destinado a sua impressão.
Na pesquisa ficou caracterizado a posição da maioria dos doutrinadores entendendo que o instituto em análise não deve ser interpretado de maneira literal, pois as imunidades tributárias remontam a valores maiores protegidos pela Constituição Federal, como o princípio da livre divulgação do conhecimento. Logo, deveria ser aplicado sempre que houvesse o cerceamento da divulgação do saber em virtude dos altos preços dos objetos que trouxessem consigo informações.
Utilizando-se a indução e a dedução foram respondidas todas as hipóteses de extensão das imunidades, inclusive no que tange a sua aplicabilidade aos periódicos eletrônicos, que são objetos de discussão dentro do direito tributário.
Percebe-se que grande parte dos doutrinadores não se atreve a escrever sobre o tema das imunidades tributárias previstas no artigo 150, inciso VI, alínea “d” da Magna Carta, reservando apenas poucas linhas sobre o assunto nas obras de direito tributário, não se sabendo, na realidade, qual o motivo de tal esquivamento ou resistência na produção de tal assunto.
Sendo assim, demonstrada a importância das imunidades tributárias dos livros, jornais, periódicos e do papel destinado a sua impressão, espera-se que este instituto, que surgiu na Constituição de 1946, perdure eternamente, enquanto houver democracia neste país.
Advogado Especialista em Direito Processual e Professor Universitário da Faculdade Unida de Campinas – FacUnicamps
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