Resumo: Este artigo visa analisar o instituto da retificação de registro imobiliário, disciplinado na Lei n.º 6.015, de 31 de dezembro de 1973, notadamente após a alteração legislativa advinda no ano de 2004, pela Lei n.º 10.931/2004, que conferiu maiores poderes ao Oficial de Cartório e proporcionou maior agilidade e eficiência no procedimento na via administrativa. Além dessa abordagem geral, o presente estudo intenta explicitar que a inovação trazida pela Lei de 2004 não excluiu a apreciação da retificação de registro imobiliário pelo Poder Judiciário, seja pela atuação do Juiz Corregedor no curso do procedimento extrajudicial, seja diretamente, em casos específicos ou caso assim pretenda o interessado, diretamente, hipótese em que sua pretensão será objeto de ação ordinária, sujeita à jurisdição contenciosa. Dessa forma, o artigo em questão demonstrará as vantagens advindas com aludida novidade, para benefício da população interessada e melhor conformidade com princípios constitucionais e gerais do direito.
Palavras-chave: retificação. registro. imobiliário. procedimentos. 2004.
Abstract: This article aims to analyze the institution of rectification of real estate registration, governed by Law n.º 6,015, dated December 1973, notably after the legislative changes arising in the year 2004, by Law 31. 10.931/2004, which gave greater powers to the Official Registry and provided greater flexibility and efficiency in the administrative procedure. Besides this general approach, this study tries to explain that innovation brought about by the 2004 Act did not exclude the consideration of rectification property registration by the judiciary, whether through the action of the Magistrate Judge in the course of court proceedings, either directly, or in specific cases if the person so wishes, directly, in which case your claim will be subject to ordinary share, subject to the contentious jurisdiction. Thus, the article in question demonstrates the advantages derived alluded to novelty, for the benefit of interested and better compliance with constitutional and general principles.
Keywords: rectification. record. real state. procedures. 2004.
Sumário: Introdução. 1. Das observações iniciais sobre o procedimento de retificação de registro imobiliário. 2. Do procedimento extrajudicial de retificação de registro imobiliário. 3. Do procedimento judicial de retificação de registro imobiliário. Conclusão. Referências.
Introdução
O presente artigo busca apresentar as vantagens da relevante inovação trazida em 2004, por meio da publicação da Lei n.º 10.931, de 02 de agosto, a qual modificou dispositivos da Lei n.º 6.015, de 31 de dezembro de 1973, a fim de conferir-lhe maior celeridade, eficácia e redução de despesas e tempo, além de estar em conformidade com o ideal de pacificação social, sem, contudo, preterir o princípio constitucional que garante a inafastabilidade do acesso ao poder Judiciário em caso de lesão ou ameaça de direito. Entre os avanços trazidos pela novel legislação, encontra-se a simplificação e a otimização do procedimento extrajudicial de retificação imobiliária. Outrossim, a abordagem em comento visa apresentar os principais aspectos do procedimento judicial de retificação de registro imobiliário e expor que, a despeito de desenvolver-se em sua maior parte em face do Oficial do Cartório, o procedimento extrajudicial também se submete ao controle jurisdicional, indiretamente através da supervisão do Juiz Corregedor, ou diretamente, em casos específicos ou se for o intento do interessado, quando sua pretensão será objeto de ação ordinária, sujeita à jurisdição contenciosa.
1. Das observações iniciais sobre o procedimento de retificação de registro imobiliário.
O registro público desempenha várias funções, sendo de grande relevância para alguns assuntos, como assentamentos civis, de nascimento, casamento ou óbito e para registro de bens imóveis.
Nesse prisma, ensina o civilista Sílvio de Salvo Venosa[1]:
“o direito positivo regula o registro civil das pessoas naturais e das pessoas jurídicas, registro de títulos e documentos, além do registro de imóveis. O Código Civil de 1916 fortaleceu o sistema do registro público ao introduzir a transcrição como forma de aquisição da propriedade imobiliária, estabelecendo sua presunção relativa. Atualmente, a matéria registrária é regulada pela Lei nº 6.015, de 31 de dezembro de 1973, com várias alterações. O Código Civil apenas traça lineamentos gerais do registro imobiliário. A escrituração e ordenação dos assentos são ordenadas pela lei específica.”
Particularmente acerca do registro imobiliário, Sílvio de Salvo Venosa[2] destaca que é norteado por alguns princípios próprios, que são a publicidade[3], a conservação[4] e a responsabilidade dos oficiais de registro[5]. Outro princípio fundamental do direito imobiliário é a continuidade, com respaldo no artigo 236 da Lei n.º 6.015, de 31 de dezembro de 1973, conhecida como a Lei dos Registros Públicos (LRP), que tem a seguinte redação: “Nenhum registro poderá ser feito sem que o imóvel a que se referir esteja matriculado.”
Ainda quanto ao registro de imóveis, note-se que a matrícula é o núcleo deste registro e cada imóvel deve ter matrícula própria, com a averbação posterior de alterações que ocorram na titularidade ou divisas desses bens, a fim de conversar a continuidade da cadeia condominial e proporcionar maior certeza e segurança jurídica a toda sociedade, em virtude de sua oponibilidade erga omnes. O registro deve ser feito no cartório correspondente ao local onde está localizado o imóvel.
Aliás, é imperioso ressaltar que o registro é tão importante que serve como título translativo da propriedade, consoante a disciplina trazida pelo Código Civil de 2002, que, no mesmo caminho do estatuto anterior, prevê que: “Enquanto não se registrar o título translativo, o alienante continua a ser havido como dono do imóvel” (artigo 1.245, parágrafo 1º).
O jurista Sílvio de Salvo Venosa[6] observa a importância desse princípio, ao esclarecer que:
“O registro imobiliário estabelece presunção relativa de titularidade do direito real (artigo 859 do código de 1916). O artigo 1.247 do corrente código estabelece, por sua vez, que "se o teor do registro não exprimir a verdade, poderá o interessado reclamar que se retifique ou anule". Todo registro público, imobiliário ou não, deve espelhar a realidade. Por essa razão sempre existirá a possibilidade de retificação. No mesmo sentido o artigo 860 do velho código: "Se o teor do registro de imóveis não exprimir a verdade, poderá o prejudicado reclamar que se retifique." O processo de retificação do registro imobiliário é disciplinado nos artigos 212 e 213 da Lei dos Registros Públicos. Na redação original da lei, a retificação processava- se exclusivamente perante o juízo corregedor do cartório imobiliário.”
Feita essa breve introdução sobre atividade de Cartórios no recente direito pátrio, o presente estudo visa analisar o instituto da retificação de registro imobiliário, disciplinado na Lei n.º 6.015/1973, notadamente após a alteração legislativa advinda no ano de 2004.
Com efeito, a lei em questão, qual seja, a Lei n.º 10.931, de 02 de agosto de 2004, dispôs sobre o patrimônio de afetação de incorporações imobiliárias, Letra de Crédito Imobiliário, Cédula de Crédito Imobiliário, Cédula de Crédito Bancário, alterou o Decreto-Lei n.º 911, de 1o de outubro de 1969, as Leis n.ºs 4.591, de 16 de dezembro de 1964, no 4.728, de 14 de julho de 1965, e no 10.406, de 10 de janeiro de 2002, entre outras providências.
Entre os dispositivos modificados na LRP, inserem-se os artigos 212 e 231, os quais visaram conferir mais rapidez e praticidade ao instituto de registro imobiliário.
Nesse diapasão, em sucinta análise, aludido artigo 212, em sua última redação, passou a permitir que, na hipótese de o registro ou a averbação serem omissos, imprecisos ou não exprimirem a verdade, o requerimento de retificação e o respectivo procedimento podem ser efetuados perante o Oficial do Registro de Imóveis competente. Ademais, situações simples de retificação de registro serão decididas pelo registrador, o qual, se tiver dúvidas, consultará o Juiz Corregedor. Todavia, caso haja impugnação fundamentada, ou não ocorra transação entre os interessados, ou o pedido em tela envolva direito de terceiros, a retificação deverá ser decidida pelo juiz ainda em sede correcional, o Juiz Corregedor. Se a controvérsia versar sobre direito de propriedade das partes, a matéria será objeto de processo judicial. Ou, desde o início, se assim quiser o interessado, poderá acionar diretamente o Poder Judiciário.
Vejamos melhor essas situações.
Nesses termos, a nova disposição da Lei n.º 6.015/1973 prevê os seguintes meios para retificação de registro imobiliário: 1) voluntariamente pelas partes; 2) administrativamente, que pode se dar por iniciativa do próprio Oficial do Registro, de ofício, ou, a requerimento do interessado, com ou sem notificação de terceiros, e com ou sem decisão judicial, ou, ainda, a requerimento dos confrontantes; 3) judicialmente, em processo contencioso (ação ordinária) conforme previsto no art. 216 da LRP, não alterado pela Lei n.º 10.931/2004, que ocorre mediante pedido de qualquer interessado[7].
Note-se que a alteração promovida em 2004 na LRP foi de grande importância para o meio jurídico e a própria sociedade, haja vista que concedeu maiores poderes ao Oficial do Registro de Imóveis, com o intuito de simplificar e agilizar o procedimento de retificação do registro e desonerar o Poder Judiciário de questões como essas, as quais podem perfeitamente ser solucionadas na via administrativa pelos Cartórios extrajudiciais, de modo a otimizar o procedimento e obter redução de custos dos serviços públicos. Há hipóteses, inclusive, em que o Oficial poderá atuar de ofício, de modo a retirar tanto quanto possível a intervenção do Juiz nesse processo.
A respeito, Sílvio de Salvo Venosa defende que:
“Muito se ganhará em tempo e desburocratização com essa nova orientação, que deve ser estendida a todas modalidades de registros públicos. É essencial que toda a matéria que não seja tipicamente judicial seja subtraída da pletora de feitos que assola o Judiciário, na busca de sua reforma. Essa nova possibilidade de retificação de registro imobiliário afina-se com esse desiderato, sendo apenas o começo. Muito ainda há de ser feito nesse sentido, mormente naquilo que se entende como jurisdição voluntária, sobre a qual o saudoso Frederico Marques dizia que não era nem jurisdição, nem voluntária.”
Sob esse novo cenário, a regra hodierna é a de que o procedimento de retificação, agora administrativo e simplificado, seja promovido pelo Oficial do Registro, ex officio ou sob provocação de qualquer interessado ou confrontante, por simples requerimento. Por outro lado, o que era principal virou exceção, isto é, o Juiz Corregedor ou a via judicial somente serão utilizados diante de casos específicos e excepcionais.
Cabe, neste momento, tecer alguns comentários acerca de ambos procedimentos de retificação de registro imobiliário, quais sejam, o judicial e o extrajudicial.
2. Do procedimento extrajudicial de retificação de registro imobiliário.
Da leitura dos dispositivos supratranscritos, a primeira conclusão que se tem é a de que o inciso I do artigo 213 da LRP cuida das situações em que a correção do erro, omissão ou equívoco não ofereça risco de prejuízos a terceiros, enquanto que as hipóteses tratadas no inciso II do artigo 213 da LRP versam sobre casos em que a correção poderá vir a acarretar prejuízos a terceiro.
A retificação extrajudicial deverá ser intentada com a apresentação de pedido simples, através de petição feita pelo próprio interessado ou de formulário que pode ser oferecido pelo próprio Oficial do Registro de Imóveis, ambos acompanhados da documentação demonstrativa da necessidade da retificação.
Nesse diapasão, depreende-se que o Oficial do Registro procederá à retificação ou averbação de registro: 1) de ofício ou a requerimento dos interessados, consoante as hipóteses elencadas nas alíneas “a” a “g” do inciso I do precitado art. 213, ou 2) a requerimento do interessado, quando houver inserção ou alteração de medida perimetral de que resulte, ou não, a alteração da área, sendo que este pedido deverá ser instruído com planta e memorial descritivo assinado por profissional legalmente, habilitado com prova de anotação de responsabilidade técnico no competente Conselho regional de Engenharia e Arquitetura (CREA), e pelos confrontantes, nos termos do inciso II deste dispositivo.
Na situação do inciso II do art. 213, caso algum confrontante não tenha aposto sua assinatura na planta em questão, ele será notificado pelo Oficial de Registro de Imóveis competente, a requerimento do interessado. Essa notificação pode ser pessoal ou pelos Correios, com aviso de recebimento, ou, ainda, por meio do Oficial de Registro de Títulos e Documentos da Comarca da situação do imóvel ou de quem deva recebê-la, para se manifestar no prazo de 15 (quinze) dias, consoante prevê o § 2º do art. 213, com redação dada pela Lei n.º 10.931/2004.
No silêncio do confrontante, presume-se sua anuência com o pleito retificatório (§ 4º) e, em seguida, o Oficial averbará a retificação pretendida (§ 5º)[8].
Entretanto, o pedido retificatório poderá ser indeferido mesmo que não haja impugnação, desde que não esteja instruído com a documentação exigida. O processo administrativo não comporta dilação probatória, de forma que, havendo dúvidas acerca da retificação o requerimento deve ser indeferido ou encaminhado ao Juiz Corregedor.
Por outro lado, caso haja impugnação fundamentada, o Oficial notificará o requerente e o profissional que assinou a planta e o memorial descritivo, para que, em 5 (cinco) dias, manifestem-se sobre a impugnação (§ 5º). Inexistindo solução amigável, o Oficial remeterá o processo ao Juiz Corregedor competente, que decidirá de plano ou após instrução sumária. Todavia, caso a controvérsia verse sobre o direito de propriedade de alguma das partes, o Juiz encaminhará o interessado às vias ordinárias, nos termos do § 6º do art. 213 da LRP.
Note-se que, da decisão do Oficial que indefira o pedido de retificação pelo Oficial do Registro, não cabe qualquer recurso administrativo, cabendo apenas ao interessado aforar o pedido judicial para retificação do Registro Imobiliário[9].
Por outro lado, a conclusão que se tem é a de que, não sendo formulada impugnação devidamente fundamentada, não há lide, mas um procedimento meramente administrativo, ainda que desenvolvido perante órgão judicial. Apenas se houver aludida impugnação, ter-se-á um litígio e, assim, necessidade de instauração de procedimento contencioso, de natureza judicial[10].
Como se vê, o procedimento disciplinado pela LRP após 2004 é, de regra, administrativo, feito perante o Oficial de Justiça, que é imbuído de poderes para tanto[11]. Previamente, somente havia a hipótese de retificação judicial do registro, mesmo que o procedimento fosse tratado como de jurisdição voluntária[12].
3. Do procedimento judicial de retificação de registro imobiliário.
Com a promulgação da Lei n.º 10.931/2004, o Judiciário será provocado a se manifestar basicamente apenas sobre questões em que houver litígio entre os interessados, sem possibilidade de conciliação, ou quando se verificar possível lesão a patrimônio alheio[13].
Frise-se, por oportuno, que a modificação legal advinda em 2004 foi bem recepcionada pelo meio doutrinário e pelo Judiciário, já que a retificação extrajudicial do registro visa justamente desburocatrizar o procedimento retificatório e se presta à melhor realização do serviço cartorário, além de auxiliar a minorar os efeitos na morosidade do Poder Judiciário.
Nesse prisma, é cediço enfatizar que, na atualidade, a regra é o procedimento extrajudicial, mais eficiente e ágil, que busca a pacificação social e ajuda a desobstruir o Judiciário.
Nada obstante, é bom ressaltar que esse aumento de poderes conferido ao Tabelião não o deixou incólume de eventuais responsabilizações e das cautelas que, já de per si, é obrigado a tomar em suas atribuições.
De fato, o Tabelião deverá atuar com cautela quando agir de ofício, adstrito às hipóteses em que a LRP lhe permite assim o fazer e, ainda assim, sob a ótica da cautela e atenção que lhe são imprescindíveis.
A respeito, transcrevem-se excertos de interessante artigo disponibilizado na via eletrônica, de autoria de Daniela Fernanda Maciel Aparício[14], Tabeliã de Notas e Oficial Registradora, a saber:
“Não há dúvidas que a intenção do legislador foi o de simplificar o procedimento para a retificação dos registros imobiliários, entretanto, foram criados mecanismos para garantir a licitude do procedimento e evitar o mau uso deste serviço público.
Embora a lei tenha facilitado a retificação, não se descuidou da segurança jurídica que
sempre deve estar presente em matéria de Registro Públicos. Verificado a qualquer tempo não serem verdadeiros os fatos constantes do memorial descritivo e dos demais documentos apresentados, responderão os requerentes e o profissional que elaborou o memorial pelos prejuízos causados, independentemente das sanções disciplinares e penais. [23]
O Oficial do Registro tem o dever de zelar pelo cumprimento da lei e deverá denunciar à autoridade competente qualquer fraude nos documentos apresentados com o pedido de retificação, sob pena de responder pela omissão.
Os responsáveis pela fraude, como os requerentes e profissionais que elaboraram a planta e/ou o memorial descritivo, responderão civil e criminalmente pelos eventuais prejuízos, independentemente das sanções disciplinares que couberem ao caso.”
De outra parte, o procedimento judicial de retificação de registro imobiliário está brevemente previsto no art. 216 da LRF, que assim estatui:
“Art. 216 – O registro poderá também ser retificado ou anulado por sentença em processo contencioso, ou por efeito do julgado em ação de anulação ou de declaração de nulidade de ato jurídico, ou de julgado sobre fraude à execução. (Renumerado do art. 217 com nova redação pela Lei nº 6.216, de 1975).”
Por conseguinte, com as mudanças introduzidas pela Lei n.º 10.931/2004, na atualidade estão disponíveis os seguintes meios para promover as retificações: 1) por escritura pública lavrada entre as partes, levada depois a registro; 2) por ato do Oficial, de ofício; 3) por processo administrativo simplificado, tanto a requerimento do interessado como dos confrontantes ou de ofício, com ou sem decisão judicial; e 4) por processo judicial contencioso (ação ordinária)[15].
Optando pela jurisdição contenciosa, a ação deverá tramitar, de regra, perante a Justiça Comum[16][17], na Comarca onde se situa o imóvel objeto da pretensão de retificação de registro.
Sobre o assunto, citem-se outros trechos do artigo precitado da Tabeliã de Notas e Oficial Registradora Daniela Fernanda Maciel Aparício[18], senão vejamos:
“(…) A terceira hipótese é o foro judicial, ou seja, quando existe a necessidade ou a opção pela intervenção do Poder Judiciário. O artigo 212 da Lei n. 6.015/1973 inverteu a antiga sistemática, como já mencionado anteriormente, e transformou em facultativo o foro judicial para retificação do registro imobiliário.
Se houver impugnação fundamentada, se não ocorrer transação entre os interessados ou se o pedido envolver direito de terceiros, a retificação deverá ser decidida pelo juiz ainda em sede correcional. Se a controvérsia versar sobre direito de propriedade das partes, a matéria deverá ser objeto de processo judicial. No mais, situações comezinhas de retificação de registro serão decididas pelo registrador, o qual, se tiver dúvidas, consultará o juiz corregedor. [45]
Além dos procedimentos em que o interessado requerer a retificação por via judicial por opção própria, haverá necessidade de intervenção judicial quando a controvérsia levantada por um dos interessados versar sobre direito de propriedade das partes, quando então a controvérsia somente se resolverá por processo judicial.
A retificação pela via judicial segue o rito ordinário, previsto nos artigos 282 e seguintes do CPC, e tem palco sempre que houver conflito de interesses no objeto da retificação, como, por exemplo, no caso de o interessado não conseguir anuência de qualquer das pessoas que a pôr o seu consentimento para a retificação pretendida. […] Dessa forma, não sendo possível a retificação por via administrativa, a ação contenciosa ordinária poderá ser proposta: pelo proprietário com título não registrado contra titular aparente do direito real; pelo proprietário com título registrado contra beneficiário de direito real indevidamente registrado; pelo proprietário, nas hipóteses de registro injustificado de um direito pessoal; no caso de não-cancelamento de um direito real já extinto; na circunstância de ter havido alienação do imóvel por quem o recebeu indevidamente; pelo titular de um direito real sobre coisa alheia, se terceiro sem causa legítima o registrar em lugar do verdadeiro titular; se o direito real for cancelado sem fundamento jurídico; se fizer registro indevido de uma restrição ao direito real; se conferir prioridade indevida a um outro direito real; pelo titular de direitos distintos. [46][19].” (sem destaques no original)
Em continuidade, a Oficiala[20] ensina que, com a pretensão retificatória submetida ao crivo do Judiciário, seja diretamente ou em não sendo possível a retificação pelo procedimento administrativo, a ação judicial, contenciosa e ordinária, poderá ser proposta pelo: 1) proprietário do imóvel com título não registrado contra titular aparente do direito real ou pelo proprietário com título registrado contra beneficiário de direito real indevidamente registrado; 2) proprietário, nas hipóteses de registro injustificado de um direito pessoal; no caso de não-cancelamento de um direito real já extinto; na circunstância de ter havido alienação do imóvel por quem o recebeu indevidamente; 3) titular de um direito real sobre coisa alheia quanto: terceiro o registrar em lugar do verdadeiro titular; for feito registro de uma restrição indevida ao direito real; for conferido prioridade a um outro direito real de forma indevida; e/ou quanto o direito real for cancelado sem fundamento jurídico; e 4) titular de direitos distintos.
A corroborar os argumentos acima expostos, seguem alguns julgados do Egrégio Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo (TJ/SP):
“Ementa: Retificação de registro imobiliário. Impugnação por parte de um dos confrontantes – Questões a serem decididas nas vias ordinárias, em jurisdição contenciosa – Recurso improvido, vencido o Revisor que fará declaração de voto. 994030717750
“Ementa: Registro imobiliário – Retificação de área – Existência de impugnação fundamentada – Remessa dos interessados às vias ordinárias – Conversão para o rito ordinário – Inadmissibilidade – Recurso improvido. A controvérsia deve ser solucionada em procedimento de jurisdição contenciosa, a fim de possibilitar às partes a produção de provas e ao juiz exame aprofundado das questões de fato, o que não pode ocorrer nos estreitos limites de cognição deste procedimento de jurisdição voluntária. 9103321-93.2003.8.26.0000 Apelação / Retificação de Área de Imóvel.
“Ementa: APELAÇÃO – AÇÃO DE RETIFICAÇÃO DE ÁREA – Julgamento de extinção do processo, sem análise de mérito – Ausência de condição da ação – Falta de interesse processual – Inadequação do meio eleito – Direcionamento da pretensão às vias ordinárias – Condenação em honorários advocatícios fixados em 15% sobre o valor atribuído à causa atualizado desde o ajuizamento da ação – Inconformismo recursal calcado na isenção da verba honorária – Inaplicabilidade decorrente da natureza do procedimento especial de jurisdição voluntária – Razões desprovidas de amparo legal – Princípio da causalidade – Aplicação subsidiária do procedimento ordinário à jurisdição voluntária – Caráter litigioso e necessidade de imposição de sucumbência – Efetivo exercício de atividade da advocacia pelo Procurador Municipal (Lei n° 8.906/94 – artigo 3o, § Io) que merece ser recompensado – Decisão mantida – Recurso desprovido.” 0101212-65.2003.8.26.0000 Apelação Com Revisão / Retificação de Área de Imóvel.”
No mesmo sentido é a recente decisão do Egrégio Tribunal Regional Federal da 3ª Região (TRF 3ª R), a saber:
“AGRAVO DE INSTRUMENTO. RETIFICAÇÃO DE REGISTRO IMOBILIÁRIO. PRETENSÃO RESISTIDA. UNIÃO FEDERAL. COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA FEDERAL. CONVERSÃO DE RITO. 1. Na ação de retificação de registro imobiliário, dirigida ao Juiz de Direito, nos moldes dos artigos 212 e 213 da Lei 6.015/73, quando impugnado o pedido, fundamentadamente, remeterá os interessados para as vias jurisdicionais, segundo normas de serviços da Corregedoria-Geral de Justiça do TJSP (artigo 124.1). 2. Diante da pretensão resistida da União verifica-se que a medida requer a conversão para o contencioso, nos termos do artigo 216 da Lei n.º 6.015/73. 3. Agravo de instrumento provido para determinar a competência da Justiça Federal para processamento da ação, pelo rito ordinário.” (grifos nosso) (AI 00506967920044030000, JUIZ CONVOCADO WILSON ZAUHY, TRF3 – JUDICIÁRIO EM DIA – TURMA Y, e-DJF3 Judicial 1 DATA:20/06/2011 PÁGINA: 88 ..FONTE_REPUBLICACAO:.)
Do exposto, conclui-se que a regra pela nova sistemática da LRP é o procedimento administrativo de retificação de registro imobiliário. Por sua vez, a via excepcional é a participação nesse procedimento do Juiz Corregedor e do Juiz em processo judicial, restrita somente para casos mais complexos ou, nesta última hipótese, quando assim diretamente pleiteada pelo interessado, pois nos demais o Oficial do Registro é competente para realizar a retificação de forma administrativa.
Desse modo, caso seja da vontade do interessado, este pode optar por utilizar o procedimento judicial, sem necessidade de esgotar a via administrativa. Assim sendo, é o interessado quem decide se preferirá utilizar apenas o procedimento administrativo, apenas o judicial, ou ambos na hipótese do indeferimento ou judicial ou do registrador. Ademais, a opção pode ser exercida pelo interessado a qualquer momento, seja no antes, no início, no curso ou após esgotar o procedimento extrajudicial, esgotando a possibilidade no momento em que for deferido o seu pedido de retificação. A retificação judicial somente será obrigatória quando ocorrer a impugnação fundamentada[21].
Outrossim, mister notar que “A retificação, administrativa ou contenciosa, julgada por sentença judicial tem efeito declaratório, e retroage à data da prenotação do título que originou o registro, sendo averbada à margem da transcrição ou da matrícula do imóvel, observando-se os artigos 246 e seguintes da LRP[22].”
Logo, de qualquer forma, havendo controvérsia fundamentada na pretensão retificatória inicialmente deduzida perante o Cartório de Registro de Imóveis ou, desde o início, pleiteando a parte a tutela jurisdicional para tal requerimento, a lide deverá se adequar ao procedimento/rito ordinário, disciplinado pelo CPC, com as prerrogativas e exigências daí decorrentes e a plena observância dos princípios constitucionais do devido processo legal, notadamente o contraditório e a ampla defesa.
Conclusão.
Como exposto, a Lei n.º 10.931/2004 trouxe importantes modificações no cenário jurídico, com impactos relevantes na vida prática e em outros setores, ao veicular novas disposições sobre o patrimônio de afetação de incorporações imobiliárias, Letra de Crédito Imobiliário, Cédula de Crédito Imobiliário, Cédula de Crédito Bancário.
Ademais, com o advento dessa mudança normativa e a alteração subsequente do art. 212 da LRP, inverteu-se a ordem de procedimento até então adotada. Dessa maneira, a regra no sistema pátrio vigente é a retificação extrajudicial de registro imobiliário, desde que o registro ou a averbação sejam omissos, imprecisos ou não exprimam a verdade. Por conseguinte, tem-se um Oficial cuja atuação goza de maior importância, bem como um procedimento mais moderno, rápido e eficiente, além, é claro, de restringir o acionamento do Poder Judiciário apenas para casos excepcionais (restrita para as hipóteses de fundada impugnação no procedimento iniciado na via administrativa ou de possível lesão a patrimônio alheio), ou, se assim preferir o interessado, poderá procurar desde logo as vias ordinárias, pela jurisdição contenciosa.
Portanto, as mudanças em comento foram positivas e estão afinadas com os princípios que regem o Poder Judiciário e um Estado Democrático de Direito, já que, numa boa relação custo-benefício, o particular regulariza sua situação imobiliária e obtém sua pretensão de modo mais ágil e simples do que ter que movimentar toda a máquina judiciária, reservando-a para casos em que realmente há litígio a demandar a intervenção de um julgador. Portanto, com o aprimoramento do serviço público e a desburocratização, tem-se a melhor forma de conciliar os interesses público e privado e a pacificação social, a segurança jurídica e a força erga omnes do registro de imóveis.
Bacharel em Direito pela Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo 2006. Pós-Graduada em Direito Tributário pela Universidade Anhanguera-Uniderp Rede LFG 2010. Procuradora Federal
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