Aspectos jurídicos da sustentabilidade da água

Resumo: Os problemas ambientais têm sido discutidos nos últimos dez anos de forma exacerbada, vez que as conseqüências da poluição ambiental são sentidas cada vez mais em nosso dia-a-dia. A água potável, líquido essencial à vida, vem, a cada momento, diminuindo absurdamente, de forma que várias nações já estão prestes a decretar estado de emergência por falta d’água. Através da análise bibliográfica e de alguns casos práticos, ressaltando a Agenda 21, demonstra-se como o desenvolvimento sustentável, em suas várias vertentes, transformou-se em forma de conciliar desenvolvimento econômico com o meio ambiente, evitando desperdícios e primando pela garantia dos recursos naturais necessários para a sobrevivência das gerações futuras. Sustentabilidade é sinônimo de vida saudável, ou seja, um país sustentável tem altos índices de qualidade de vida, nunca deixando sua população com menos do que o necessário para sua sobrevivência, tanto física, como psicológica, econômica e social. A água, sendo elemento vital, deve ser preservada, garantindo a todos o necessário para uma vida saudável; mas, acima de tudo, deve ser usada de forma racional, evitando desperdícios e poluição, utilizando técnicas avançadas para despoluição dos rios que podem fornecer água potável para os seres vivente. Destarte, este trabalho objetiva demonstrar e analisar os problemas atinentes ao uso irracional e à poluição da água, tentando desmistificar a visão negativa do desenvolvimento sustentável e trazendo à tona a necessidade de difusão da cultura da sustentabilidade hídrica no Brasil e no mundo, sendo oferecidas diversas sugestões de ações para a implementação e efetivação do ideal da sustentabilidade.


Palavras-Chave: Água, Direito das Águas, Sustentabilidade.


Abstract: Environmental problems have been discussed in the last ten years in an exaggerate way,as the consequences of environmental pollution are increasingly felt in our day-to-day. Drinking water, life essential liquid, come, every time, reducing absurdly, and several nations are already about to declare state of emergency for lack of water. Sustainable development, in many respects, appears as a way to reconcile economic development with the environment, avoiding waste and press for the guarantee of natural resources, the key for the survival of future generations. Sustainability is synonymous of healthy living, as a sustainable country has high rates of life quality, never leaving its population with less than necessary for their survival, both physical, and psychological, economic and social. The water,  a vital element, must be preserved, ensuring all the necessary for a healthy life, na most important of all, should be used in a rational manner, avoiding waste and pollution, using advanced techniques for cleaning up the rivers that could provide drinking water for living beings. Thus, this study demonstrates  the problems due to water irrational use and pollution, trying to dispel the negative view of sustainable development and showing the need to spread the hydropower sustainable culture in Brazil and abroad, as it offers several suggestions for the implementation and execution actions of sustainability  ideal.


Keywords: 1. Water; 2. Water Law; 3. Sustainability.


Sumário: Introdução. 1. Água no século 21 – escassez global. 1.1. Apanhado histórico sobre o uso da água. 2. Aspectos principais da água no ordenamento jurídico brasileiro. 2.1. Conceito de água. 2.1.1. Diferença entre água e recursos hídricos. 2.2. O direito das águas. 2.3. Competência para legislar sobre águas. 2.3.1. Conceito de competência. 2.3.2. Competência privativa da União. 2.3.3. Competências concorrentes. 2.3.4. Competências comuns. 2.4. Princípios aplicáveis à água. 2.4.1. Princípio da dignidade humana. 2.4.2. Princípio do meio ambiente ecologicamente equilibrado como direito fundamental da pessoa humana. 2.4.3. Princípio do direito à sadia qualidade de vida. 2.4.4. Princípio do controle do poluidor pelo Poder Público. 2.4.4.1. Poluidor-pagador. 2.4.4.2. Usuário-pagador. 2.4.5. Princípio da precaução. 2.4.6. Princípio da prevenção. 2.4.7. Princípio da reparação. 2.4.8. Princípio da informação. 2.5. A propriedade da água. 3. Ordem constitucional ambiental e a garantia do meio ambiente ecologicamente equilibrado. 3.1. Conceito de meio ambiente. 3.2. Proteção ao meio ambiente e garantia do meio ambiente ecologicamente equilibrado. 3.2.1. O meio ambiente ecologicamente equilibrado e sua tutela jurídico-constitucional. 3.2.2. Responsabilidade por danos ao meio ambiente. 3.3.3. Educação ambiental como forma de garantia de um meio ambiente ecologicamente equilibrado. 4. A sustentabilidade da água. 4.1. Conceito de sustentabilidade e desenvolvimento sustentável. 4.2. A sustentabilidade como princípio do direito ambiental e sua ligação com o princípio constitucional da dignidade da pessoa humana. 4.3. Aspectos da sustentabilidade no ordenamento jurídico brasileiro. 4.3.1. Controle do uso e da poluição. 4.3.2. Educação Ambiental e Ética Ambiental. 4.3.3. Política Nacional dos Recursos Hídricos. 4.3.4. A Agenda 21 brasileira 4.4. O desenvolvimento sustentável e o uso da água. 4.4.1. Objetivos norteadores do desenvolvimento sustentável da água estabelecidos pela Agenda 21. 4.4.2. Atitudes governamentais a serem tomadas em busca do desenvolvimento sustentável da água. 4.4.3. O que cada um de nós pode fazer para contribuir considerações finais. Referências. Anexo – Carta da Terra.


INTRODUÇÃO


Os problemas ambientais têm sido discutidos nos últimos dez anos de forma exacerbada, vez que as conseqüências da poluição ambiental são sentidas cada vez mais em nosso dia-a-dia. A água potável, líquido essencial à vida, a cada momento diminui de maneira absurda, levando várias nações a decretarem estado de emergência devido a sua falta.


Nesse contexto, inicia-se aqui um trabalho que objetiva conscientizar os leitores para os problemas ambientais atinentes à água, focando no desenvolvimento sustentável desse recurso, demonstrando a possibilidade de, com simples atitudes, senão mudar a situação atual, ao menos amenizar e garantir, por mais alguns anos, a sobrevivência do homem no planeta Terra.


Na primeira parte será exposto um breve contexto histórico, descrevendo o desperdício ocorrido ao longo da história humana e a preocupação existente nos dias atuais com sua conservação.


Em seguida, alguns aspectos jurídicos da água serão debatidos, de maneira a conceituar juridicamente a água e analisar o direito das águas como divisão do direito ambiental. Adentrar-se-á, também, nas competências legislativas acerca da água, explorando rapidamente o que compete aos três entes da federação em matéria normativa. Serão descritos os princípios aplicáveis ao direito das águas, com maior ênfase àqueles atinentes à sustentabilidade. Finalizando o capítulo, fala-se brevemente sobre a propriedade da água, demonstrando que ninguém a detém individualizadamente.


A terceira parte tratará da ordem constitucional ambiental, analisando brevemente os aspectos jurídico-ambientais trazidos ao ordenamento jurídico brasileiro pela Constituição Federal de 1988, adaptando as disposições constitucionais ao direito das águas.


O último ponto irá tratar especificamente da sustentabilidade hídrica. Serão discutidos, inicialmente, os conceitos de sustentabilidade e desenvolvimento sustentável, objetivando derrubar o argumento da impossibilidade de crescimento econômico numa sociedade que prima pelo desenvolvimento ambiental sustentável. Em seguida, será analisado o desenvolvimento sustentável como princípio, demonstrando a íntima relação entre este e a dignidade da pessoa humana. Serão explorados alguns pontos da sustentabilidade existentes no ordenamento jurídico brasileiro: controle do uso e da poluição dos recursos hídricos, educação e ética ambiental, política nacional de recursos hídricos e a Agenda 21 brasileira. Ao final, dissertar-se-á sobre o desenvolvimento sustentável da água no Brasil, comentando detalhadamente a Agenda 21 brasileira e sugerindo algumas ações para o Estado e para os cidadãos do país na busca da sustentabilidade da água no Brasil.


Por fim, serão esboçadas algumas conclusões, reforçando que não é necessário muito esforço para desenvolver um país de forma sustentável. A água, como bem vital para o homem, deve ser utilizada racionalmente, suprindo as necessidades de hoje e garantindo quantitativamente e qualitativamente o recurso amanhã.


1. ÁGUA NO SÉCULO 21 – ESCASSEZ GLOBAL


Nos últimos cinco anos, congressos, seminários e diversos eventos sobre os recursos ambientais surgiram mundialmente, contudo, em sua maioria discutiu-se sobre a escassez do elemento vital: a água.


Nesse primeiro momento discutir-se-á o histórico do uso da água, demonstrando que a preocupação com esse recurso infelizmente é nova, o que colaborou com a precária disponibilidade hídrica atual.


1.1. Apanhado histórico sobre o uso da água


A discussão em torno do recurso natural água tem se tornado freqüente, tendo em vista que sua escassez é visível. Países da África, se já não contavam com quantias de água suficientes para suas populações, atualmente vêem-se em situação desastrosa, não possuindo o mínimo para a sobrevivência de seus habitantes. O próprio Brasil, que possui a maior reserva de água doce potável do mundo, esta sentindo os efeitos da escassez desse líquido indispensável para a vida humana e animal.


Várias são as causas que dão azo a escassez, dentre elas, destacamos: o desperdício e a falta de responsabilidade ambiental da maioria da população mundial; o aquecimento global, que faz com que a taxa de evaporação seja maior que a de chuvas; a poluição provocada, principalmente, pelas indústrias que despejam detritos nos rios e lagos; falta de saneamento básico etc.


De forma mais radical, porém, não menos realista, Bertoldi (2001) explana:


Em 3.200 anos de história, somente conhecemos 300 de paz. Vivenciamos praticamente 15.000 guerras que nos deixaram um legado de mais de 3 bilhões de mortos. O século XX foi o mais mortífero devido principalmente ao aprimoramento das tecnologias de guerra e as sempre presentes questões religiosas. No entanto, muito sangue jorrou por conflitos ambientais. A escassez de água potável, sua distribuição, acesso e gestão foram, são e serão, motivos de grandes disputas internas e internacionais. […]


A água potável, componente básico da biosfera, se encontra em um movimento de diminuição tão acelerado que a previsão para 2050 é de 2.500 bilhões de pessoas sem acesso ao precioso líquido vital. Hoje, este número é de 1 bilhão. Segundo a FAO e o Banco Mundial, em 1990, 20 países – 9 no Oriente Médio e 11 na África – sofriam pela falta de água. Em 1996 já eram 26 e em 2020 serão 41. Apenas 2.5% da água existente em nosso planeta é doce e possivelmente já não contamos mais com este percentual.


A escassez dá-se principalmente pela sobre-exploração. Neste século, se multiplicou por seis a quantidade extraída. A explosão demográfica, a contaminação por errônea utilização, o desperdício e o câmbio climático influenciam diretamente na diminuição dos recursos hídricos.”


Precisas são as palavras de Benjamim (apud ALMEIDA, 2002) ao retratar a situação de crise ambiental que o mundo enfrenta:


“A crise ambiental […], que hoje ocupa a agenda dos políticos, dos economistas, dos juristas, dos meios de comunicação e principalmente da opinião pública, é fruto da revolução industrial, revolução esta que surgiu com a promessa de unidade universal, de paz e de bem estar para todos, sem se preocupar, contudo, com os seus efeitos no meio ambiente. De um lado, apesar do inegável crescimento econômico (desigual) e do processo tecnológico que trouxe, não cumpriu aquilo que prometeu; do outro, nos deixou um débito ambiental que dificilmente conseguiremos resgatar”.


Ante a tais fatos, vários países, junto à organizações internacionais não-governamentais realizam reuniões com o objetivo de firmar parcerias para o controle e o uso racional da água, visando um uso sustentável, primando pela conservação do meio ambiente e da qualidade de vida humana, não só no presente, como no futuro, pois este é o cerne da sustentabilidade.


Um importante evento ocorrido nos últimos anos foi a Eco 92, realizada no Rio de Janeiro, que contou com a participação de diversos países. Mais tarde, proveniente de metas estabelecidas naquela reunião, vieram a Agenda 21 e a Rio + 10, realizadas na cidade do Rio de Janeiro, primando pela discussão acerca do desenvolvimento sustentável do meio ambiente, dando forte ênfase ao uso racional e sustentável da água.


A mais importante conclusão surgiu junto ao documento Agenda 21: ações prioritárias (BRASIL, 2004a, p. 16), ao dizer que a


“[…] Agenda 21 Brasileira não é um plano de governo, mas um compromisso da sociedade em termos de escolha de cenários futuros. Praticar a Agenda 21 pressupõe a tomada de consciência individual dos cidadãos sobre o papel ambiental, econômico, social e político que desempenham em sua comunidade. Exige, portanto, a integração de toda a sociedade na construção desse futuro que desejamos ver realizado. Uma nova parceria, que induz a sociedade a compartilhar responsabilidades e decisões junto com os governos, permite maior sinergia em torno de um projeto nacional de desenvolvimento sustentável, ampliando as chances de implementação bem-sucedida.”


Não há como negar que muitos países ainda agem de forma demagógica, pregando a consciência ambiental, mas executando políticas totalmente contrárias aos ensejos do ambiente. Todavia, necessário se faz que cada cidadão consciente preserve o meio ambiente e, acima de tudo, use de forma sustentável a água.


Os objetivos fixados nas mais diversas reuniões, congressos e eventos não são difíceis de serem alcançados, bastando, para isso, força de vontade dos cidadãos, que, desta forma, irão, de um jeito ou de outro, forçar o governo de seus respectivos países a adotar políticas públicas de melhoria do meio ambiente, visando garantir o direito fundamental de um meio ambiente ecologicamente equilibrado a todos os cidadãos do mundo. A água, como bem fundamental para a vida,


“é uma questão ambiental que deve ocupar o primeiro lugar tanto em programas de governos, como de instituições internacionais e principalmente na consciência dos usuários. Em 2050 se estima que a maior parte do planeta sofrerá por razões de água. A avaliação dos recursos hídricos, a definição dos abastecimentos disponíveis, as projeções de uso no futuro e a apresentação de opções de desenvolvimento e seus possíveis efeitos, são a base para a gestão sustentável dos recursos mundiais de água no futuro. Com estas medidas talvez se possa prevenir conflitos e a conseqüente inseguridade internacional, que se intensificarão em um futuro muito próximo”. (BERTOLDI, 2001)


Observa Nalini (2003, p. 44), acerca da crise ambiental (com relação à água) que


“Ninguém parou para pensar que a água existente no planeta é a mesma, desde que a Terra existe. Não se produz água. Ela não vem de outros planetas, mas a sua conservação advém de um uso moderado. Só que a humanidade não quer mais saber de moderação. Tudo tem de ser consumido em abundância. A agressão desatinada do ambiente já alterou as condições climáticas globais. O desperdício anormal de água desequilibrou as reservas que pareciam intermináveis. Em virtude disso, o homem está, hoje, prestes a fixar o prazo para a cessação da vida no planeta. Sem água, a espécie não terá condições de realizar o seu ciclo vital.”


Necessário se faz a construção de uma cidadania ambiental, pautada pela ética no uso dos recursos naturais. No presente trabalho, como se demonstrará nos próximos capítulos, o uso da água deve ser feito de forma sustentável, de modo a usar apenas o necessário, evitando desperdícios e a poluição deste líquido de valor imensurável[1].


2. ASPECTOS PRINCIPAIS DA ÁGUA NO ORDENAMENTO JURÍDICO BRASILEIRO


2.1. Conceito de água


A água, mesmo sendo um recurso natural do qual usamos todos os dias para as mais diversas necessidades, possui, entre os vários ramos da ciência, variados conceitos. Interessa neste trabalho o conceito jurídico, todavia, sem deixar de lado alguns outros conceitos.


Segundo Laudelino Freire (apud GRANZIERA, 2006, p. 25), o vocábulo “água” advém do latim aqua e significa


“substância líquida, inodora e insípida, encontrada em grande abundância na natureza, em estado líquido nos mares, rios, lagos; em estado sólido, constituindo o gelo e a neve; em estado de vapor visível, na atmosfera, formando a neblina e as nuvens e em estado de vapor invisível sempre no ar.”


Juridicamente, a água é um bem ambiental patrimônio comum da humanidade, ou seja, trata-se de um bem de interesse difuso, do qual todos – Estado, sociedade e cidadão considerado individualmente – devem protegê-lo[2], [3].


A água é propriedade todos e propriedade de nenhum. Sendo bem difuso, todos podem usufruí-la, entretanto, deve ser um uso controlado, que vise ao desenvolvimento sustentável. É um bem de uso comum do povo, ou seja, todos têm direito à ela.


2.1.1. Diferença entre água e recursos hídricos


A água, considerada como recurso natural, muitas vezes confunde-se com o instituto recurso hídrico, porém, são diferentes, mas não se excluem, antes se completam. Água é um bem ambiental necessário à vida de todos os seres. É o gênero. Recurso hídrico nada mais é que a água, a partir do momento em que passa a ser valorada economicamente.


Granziera (2006, p. 28), em exemplo didático, confirma o entendimento:


A água constitui elemento natural de nosso planeta, assim como o petróleo. Como elemento natural, não é um recurso, nem possui qualquer valor econômico. É somente a partir do momento em que se torna necessário a uma destinação específica, de interesse para as atividades exercidas pelo homem, que esse elemento pode ser considerado como recurso. […]


O petróleo também é elemento natural, mas só se transformou em recurso a partir do momento em que se descobriu sua utilidade no funcionamento de motores. No que se refere à água, tais conceitos se confundem, pois a água sempre foi, além de elemento da natureza, um recurso fundamental para a sobrevivência do homem na Terra. A novidade do século XX, nesse aspecto, é que a água passou a ser um recurso escasso, passível de gerar conflito de interesses não só entre os homens, cidadãos de um mesmo país, mas entre Estados.”


Destarte, a água seria o gênero, o recurso natural considerado de per si, como bem fundamental à vida. O recurso hídrico surge quando a água passa a ter valor não só vital, mas econômico, de forma a ser necessária para, além das necessidades fisiológicas do homem, o desenvolvimento sócio-político-econômico da sociedade.


2.2. O direito das águas


O estudo do direito das águas pertence ao Direito Ambiental, não sendo aquele, atualmente, ramo didaticamente autônomo do Direito. Diz-se didaticamente pois o direito das águas possui ligação extrema com o Direito Ambiental, não tendo maturidade suficiente para desvencilhar-se deste, formando uma ciência didaticamente autônoma[4].


Feitas essas considerações, pode-se dizer que o direito das águas conceitua-se como o conjunto de princípios e normas jurídicas interligadas ao Direito Ambiental que disciplinam o domínio, uso, aproveitamento, a conservação e preservação das águas, assim como a defesa contra suas danosas conseqüências, tendo como fontes a legislação, a doutrina, a jurisprudência e o costume. (POMPEU, 2006, p. 22)


2.3. Competência para legislar sobre águas


Legislar sobre águas nada mais é que instituir normas sobre seu uso, determinando limites de qualidade e quantidade, especificando sanções àqueles que de qualquer forma provocarem danos à esse bem difuso, pois, como bem difuso, pertence à todos.


2.3.1. Conceito de competência


Ficamos com as palavras de Silva (1995, p. 455), que conceitua competência como


“[…] a faculdade juridicamente atribuída a uma entidade, ou a um órgão ou agente do Poder Público para emitir decisões. Competências são as diversas modalidades de poder de que se servem os órgãos ou entidades estatais para realizar suas funções.”


São espécies de competência: a) competência material – que são aquelas referentes às ações administrativas, ao poder-dever da Administração Pública de cuidar dos assuntos de suas competência (GRANZIERA, 2006, p. 72); e b) competência legislativa – aquela que estabelece normas jurídicas, edita regras e fixa princípios dominantes, de forma a disciplinar as atividades políticas e administrativas (FERREIRA apud GRANZIERA, 2006, p. 66).


2.3.2. Competência privativa da União


O inciso IV do art. 22 da Constituição Federal estatui que compete à União legislar privativamente sobre águas e energia, entre outros assuntos.


Todavia essa competência privativa da União não implica em sua indelegabilidade, pois, de acordo com o que dispõe o parágrafo único do art. 22, lei complementar poderá autorizar os Estados a legislar sobre questões específicas das matérias relacionadas.


É aparentemente privativa, pois, mesmo não havendo essa autorização, que pode ser conferida aos Estados por lei complementar


“os Estados podem dispor sobre o aproveitamento de seus bens e a utilização dos recursos hídricos sob seu domínio, nos termos da competência que lhes conferem o art. 25, § 1º, (competência remanescente) e 26, incisos I e II.” (BORGES apud GRANZIERA, 2006, p. 66)


Além disso, o art. 24, inciso VI, trata da competência concorrente para legislar sobre assuntos relativos ao meio ambiente.


Atente-se ao fato de que a competência da União em legislar sobre águas não deve ser confundida com a capacidade dos demais entes federativos em estabelecer regras administrativas sobre os bens de seus respectivos domínios.


“Assim, se não podem os Estados-Membros legislar sobre águas, com possíveis repercussões estratégicas ou geopolíticas, em detrimento do equilíbrio federativo da República, nada impede que instituam por lei sua política hídrica de natureza ambiental, para planejar o abastecimento e o saneamento e disciplinar a política administrativa das suas reservas hídricas, constitucionalmente reconhecidas como integrantes do seu patrimônio, quais sejam as explicitadas no art. 26, inc. I.” (GRANZIERA, 2006, p. 67-68)


Mesmo porque sobre a matéria de saneamento básico, que envolve, da mesma forma, o abastecimento de água, à União somente compete, nos termos do art. 21, XX, da Constituição Federal, instituir diretrizes básicas, a serem complementadas pela legislação dos Estados.


2.3.3. Competências concorrentes


As competências legislativas concorrentes entre a União, os Estados e o Distrito Federal encontram-se estabelecidas no art. 24 da Constituição Federal, sendo que, nos termos do parágrafo primeiro desse dispositivo, a competência da União limitar-se-á a estabelecer normas gerais.


Segundo Borges (apud GRANZIERA, 2006, p. 70)


“normas gerais são aquelas que, por alguma razão, convém ao interesse público sejam tratadas por igual, entre todas as ordens da Federação, para que sejam devidamente instrumentalizados e viabilizados os princípios constitucionais com que têm pertinência. A bem da ordem harmônica que deve manter coesos os entes federados, evitam-se, desse modo, atritos, colidências, discriminações, de possível e fácil ocorrência.”


A competência concorrente fixada no art. 24 dispõe sobre os seguintes temas ligados aos recursos hídricos: florestas, fauna, conservação da natureza, defesa do solo e dos recursos naturais, proteção do meio ambiente e controle da poluição (VI); proteção ao patrimônio histórico, cultural, turístico e paisagístico (VII); responsabilidade por dano ao meio ambiente (VIII), defesa da saúde (XII). Essas matérias, intrinsecamente relacionadas com a água, também fundamentam a competência do Estados para legislar sobre os recursos hídricos.


Quanto aos Municípios, Silva (1995, p. 478) ensina que


“a Constituição não os situou na área de competência concorrente do art. 24, mas lhes outorgou competência para suplementar a legislação federal e a estadual no que couber, o que vale possibilitar-lhes disporem especialmente sobre as matérias ali arroladas e aquelas a respeito das quais se reconheceu à União apenas a normatividade geral.”


Aos municípios cabe legislar sobre assuntos de interesse local (art. 30, I), assim como suplementar a legislação federal e a estadual no que couber (inciso II). Como nos informa Granziera (2006, p. 71) a expressão “interesse local” não se refere a um interesse exclusivo do Município. O termo “local” significa espaço territorial e não predominância.


Os Estados, dessa forma, têm competência para legislar sobre recursos hídricos, recursos que devem estar sob seu domínio (v. g. rios que tem seu curso exclusivamente dentro do Estado). Já os municípios, como afirmado acima, podem legislar sobre matérias de interesse local. Como não há rios exclusivamente locais (municipais) não há que se falar em fixação de regras de gestão de recursos hídricos no âmbito dos municípios.


2.3.4. Competências comuns


São competências comuns da União, Estados, Distrito Federal e Municípios, entre outras, cuidar da saúde (art. 23, II); proteger o meio ambiente, combater a poluição em qualquer de suas formas (art. 23, VI); preservar as florestas, a fauna e a flora (art. 23, VII); promover a melhoria das condições de saneamento básico (art. 23, IX) e registrar, acompanhar e fiscalizar as concessões de pesquisa e exploração de recursos hídricos e minerais em seus territórios (art. 23, XI).


A Constituição Federal estabelece ainda que ao Poder Público – União, Estados, Distrito Federal e Municípios – compete as ações para assegurar a efetividade do direito ao meio ambiente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida (art. 225, § 1º, I a VIII). Essas ações implicam na cooperação entre os entes políticos, garantindo a efetividade das normas.  (GRANZIERA, 2006, p. 72)


Sendo assim, o que busca a CF quando estabelece competências comuns é a maior integração entre os entes políticos da Federação, objetivando efetuar a proteção ambiental de maneira satisfatória, atingindo efetivamente o objetivo básico do Estado, que é a proteção de seus indivíduos.


2.4. Princípios aplicáveis à água


Nas palavras de Mello (2007, p. 932-933), princípio


“[…] é, por definição, mandamento nuclear de um sistema , verdadeiro alicerce dele, disposição fundamental que se irradia sobre diferentes normas compondo-lhes o espírito e servindo de critério para sua exata compreensão e inteligência exatamente por definir a lógica e a racionalidade do sistema normativo, no que lhe confere a tônica e lhe dá sentido harmônico. É o conhecimento dos princípios que preside a intelecção das diferentes partes componentes do todo unitário que há por nome sistema jurídico positivo”. (MELLO, 2007, p. 932-933)


Dessa forma, princípios são normas lineares de toda ciência. Estabelecem a premissa básica do conhecimento científico e são de obediência, via de regra, obrigatória.


2.4.1. Princípio da dignidade humana


Moraes (1998, p. 60-61), com toda sua experiência em Direito Constitucional e Direitos Humanos, assim conceitua a dignidade da pessoa humana:


“a dignidade é um valor espiritual e moral inerente a pessoa, que se manifesta singularmente na autodeterminação consciente e responsável da própria vida e que traz consigo a pretensão ao respeito por parte das demais pessoas, constituindo-se um mínimo invulnerável que todo estatuto jurídico deve assegurar, de modo que, somente excepcionalmente, possam ser feitas limitações ao exercício dos direitos fundamentais, mas sempre sem menosprezar a necessária estima que merecem todas as pessoas enquanto seres humanos. […] O princípio fundamental consagrado pela Constituição Federal da dignidade da pessoa humana apresenta-se em uma dupla concepção. Primeiramente, prevê um direito individual protetivo, seja em relação ao próprio Estado, seja em relação aos demais indivíduos. Em segundo lugar, estabelece verdadeiro dever fundamental de tratamento igualitário dos próprios semelhantes. Esse dever configura-se pela exigência do indivíduo respeitar a dignidade de seu semelhante tal qual a Constituição Federal exige que lhe respeitem a própria. A concepção dessa noção de dever fundamental resume-se a três princípios do direito romano: honestere vivere (viver honestamente), alterum non laedere (não prejudique ninguém) e suum cuique tribuere (dê a cada um o que lhe é devido). Ressalte-se, por fim, que a Declaração Universal dos Direitos Humanos, adotada e proclamada pela Resolução nº 217 da Assembléia Geral das Nações Unidas, em 10-12-1948 e assinada pelo Brasil na mesma data, reconhece a dignidade como inerente a todos os membros da família humana e como fundamento da liberdade, da justiça e da paz no mundo.” (MORAES, 1998, p. 60-61)


A dignidade da pessoa humana esta diretamente ligada à qualidade de vida do ser humano, considerado tanto individualmente como em comunidade. É um valor de difícil explicação, mas está no espírito de todos os homens, que o vivenciam no dia-a-dia.


2.4.2. Princípio do meio ambiente ecologicamente equilibrado como direito fundamental da pessoa humana


A Carta Magna de 1988 foi a primeira Constituição nacional a estabelecer, de forma expressa, a proteção do meio ambiente (aí inclusa a água), por ser bem essencial à sadia qualidade de vida, intrinsecamente ligado ao valor da dignidade humana. Na verdade, o reconhecimento à esse princípio veio apenas confirmar um valor maior, que dá base a todo Estado Democrático de Direito moderno: o direito à vida, direito fundamental de todo ser humano.


Milaré (2005, p. 159) destaca esse caráter fundamental do direito à vida e ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, demonstrando que o caráter fundamental do direito à vida torna “inadequados enfoques restritos do mesmo em nossos dias; sob o direito à vida, mas além disso encontram-se os Estados no dever de buscar diretrizes destinadas a assegurar o acesso aos meios de sobrevivência a todos os indivíduos e todos os povos”. Os Estados devem, por isso, evitar riscos ambientais sérios à vida.


2.4.3. Princípio do direito à sadia qualidade de vida


Depreende-se, como o princípio ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, do direito à vida. Não basta o mero direito à vida. Deve-se efetivá-lo, protegendo-o e dando qualidade à vida de todos os cidadãos de todo o mundo. O meio ambiente e, principalmente, a água, devem ser protegidos de tal forma que todos possuam o essencial à sua sadia qualidade de vida, conservando o recurso para que seja possível às gerações futuras aproveitá-los da mesma forma.


2.4.4. Princípio do controle do poluidor pelo Poder Público


Estabelece o art. 225 da Constituição Federal que “todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações”. As principais ações que o Estado deve fazer para garantir o estabelecido na CF quanto ao meio ambiente encontram-se nos §§ 1º e 4º do supracitado artigo, sendo que, efetivadas, serão suficientes para garantir a sadia qualidade de vida de todos os seres vivos.


Destacando a evolução constitucional brasileira quanto ao aspecto do meio ambiente, Silva (2005, p. 846) descreve que


“A Constituição […] toma consciência de que a qualidade do meio ambiente se transforma num bem, num patrimônio, num valor mesmo, cuja preservação, recuperação e revitalização se tornaram num imperativo do Poder Público, para assegurar a saúde, o bem-estar do homem e as condições de seu desenvolvimento. Em verdade, para assegurar o direito fundamental à vida.” (grifos do autor)


O princípio do controle do poluidor surge, então, como resultado das intervenções do Poder Público necessárias à manutenção, preservação e restauração dos recursos ambientais com vistas à sua utilização racional e disponibilidade permanente. A ação dos órgãos e entidades públicas se concretiza através do exercício do seu poder de polícia administrativa, isto é, daquela faculdade inerente à administração pública de limitar o exercício dos direitos individuais, visando a assegurar o bem-estar da coletividade[5]. Dá origem a dois sub-princípios: usuário-pagador e poluidor-pagador.


2.4.4.1. Poluidor-pagador


O princípio do poluidor-pagador, como o próprio nome diz, visa garantir à sociedade que aquele que polui deve pagar pela poluição. No entanto, muitos, de forma errônea, consideram que existe um direito à poluição, desde que se pague por ele. Milaré (2005, p. 164) considera absurdo esse entendimento, pois


“o princípio não objetiva, por certo, tolerar a poluição mediante um preço, nem se limita apenas a compensar os danos causados, mas sim, precisamente, evitar o dano ao ambiente. Nesta linha, o pagamento pelo lançamento de efluentes, por exemplo, não alforria condutas inconseqüentes, de modo a ensejar o descarte de resíduos fora dos padrões e das normas ambientais. A cobrança só poderá ser efetuada sobre o que tenha respaldo na lei, pena de se admitir o direito de poluir. Trata-se do princípio poluidor-pagador (poluiu, paga os danos), e não pagador-poluidor (pagou, então pode poluir). Esta colocação gramatical não deixa margens a equívocos ou ambigüidades na interpretação do princípio.”


Em síntese, o princípio do poluidor-pagador objetiva fazer com que aquele que polui, mesmo com autorização, controle o mau que está fazendo ao meio ambiente, seja limitando a quantidade de poluição produzida, seja fazendo o meio ambiente degradado voltar ao estado anterior (o que, muitas vezes, é impossível, justificando a indenização em pecúnia).


2.4.4.2. Usuário-pagador


Corolário do princípio controlador do meio ambiente pelo Poder Público (MILARÉ, 2005, p. 160), da mesma forma como o princípio do poluidor-pagador, o princípio do usuário-pagador objetiva fazer com que aqueles que consumam/utilizam recursos naturais paguem pelo uso efetivos dos mesmos. A medida visa evitar abusos, que são condutas inerentes ao ser humano, quando têm, de forma abundante, algo que considera inesgotável, quando, na verdade, não é.


Ressalte-se, porém, que


“O princípio usuário-pagador não é uma punição, pois mesmo não existindo qualquer ilicitude no comportamento do pagador ele pode ser implementado. Assim, para tornar obrigatório o pagamento pelo uso do recurso ou pela sua poluição não há necessidade de ser provado que o usuário e o poluidor estão cometendo faltas ou infrações. O órgão que pretenda receber o pagamento deve provar o efetivo uso do recurso ambiental ou a sua poluição. A existência de autorização administrativa para poluir, segundo as normas de emissão regularmente fixadas, não isenta o poluidor de pagar pela poluição por ele efetuada.” (MILARÉ, 2005, p. 60)


No mesmo sentido, Braga (2002), afirmando que “a cobrança pelo uso e/ou pela poluição dos recursos hídricos constitui instrumento de gestão a ser implantado para induzir o seu usuário e/ou poluidor a uma racionalização no uso desse recurso” (grifo nosso), mantendo o equilíbrio entre as disponibilidades e demandas, assim como a proteção ao meio ambiente.


2.4.5. Princípio da precaução


O Direito das Águas prima pela precaução no uso dos recursos hídricos (além da prevenção de eventuais danos, como se verá no ítem 2.4.6). Ou seja, deve-se, quando não há certeza de eventuais danos, precaver-se da ocorrência destes, utilizando todos os métodos possíveis para prevenção de quaisquer efeitos indesejados. Caso haja certeza, deve-se prevenir o dano. Não sendo certo, também devemos agir prevenindo. Esta é a idéia central do Direito Ambiental e do Direitos das Águas na atualidade. Contudo, controlar o risco não é aceitar qualquer risco. O bom senso deve ser utilizado. (MACHADO, 2005, p. 72-73)


2.4.6. Princípio da prevenção


Prevenir é agir antecipadamente. Intimamente ligado ao princípio da precaução, a prevenção busca conhecer eventuais danos que possam ocorrer ao meio ambiente. Buscam-se informações sobre a ação que poderá afetar o meio ambiente, conhecendo todos os efeitos que poderão advir do agir humano, precavendo-se dos danos futuros e agindo com as melhores técnicas de prevenção, evitando destruir os escassos recursos naturais do planeta Terra.


A informação é essencial para atingir o fim desse princípio, pois, nas palavras de Machado (1994, p. 36)


“Sem informação organizada e sem pesquisa não há prevenção. Por isso, “divido em cinco itens a aplicação do princípio da prevenção: 1º) identificação e inventário das espécies animais e vegetais de um território, quanto à conservação da natureza e identificação das fontes contaminantes das águas e do mar, quanto ao controle da poluição; 2º) identificação e inventário dos ecossistemas, com elaboração de um mapa ecológico; 3º) planejamento ambiental e econômico integrados; 4º) ordenamento territorial ambiental para a valorização das áreas de acordo com sua aptidão; e 5º) Estudo de Impacto Ambiental”.


Por conseguinte, prevenir é informar e ser informado, para, então, cobrar daqueles que utilizam de meios poluidores dos recursos hídricos a diminuição, com o respectivo ressarcimento dos prejuízos causados ou, se for possível, a cessação da degradação ambiental.


2.4.7. Princípio da reparação


Tendo o Direito das Águas, da mesma forma como o Direito Ambiental, adotado a responsabilidade objetiva para eventuais danos/prejuízos causados, deve aquele que causou dano ao meio ambiente, repará-los, deixando os recursos destruídos da mesma forma como eram anteriormente. (MACHADO, 2005, p. 83)


Nem sempre o pagamento de multas/indenizações é eficaz, haja vista que medir em pecúnia eventual impacto ambiental sofrido em alguma área é extremamente difícil. Por isso, o Direito das Águas prima pela restauração dos danos ao recurso água que, além de ser a melhor forma de trazer de volta aquilo que foi destruído, ajuda a prevenir, porquanto é muito mais difícil reparar o meio ambiente do que pagar pela sua reparação. (MACHADO, 2005, p. 83-84)


2.4.8. Princípio da informação


A informação é essencial para a educação ambiental, tanto que é princípio expresso na Lei de Educação Ambiental (Lei nº 9.795, de 27 de abril de 1999, arts. 1º e 4º)


Além do mais, é através da informação que formar-se-á a consciência ambiental em cada cidadão. Informação transmitida de forma certa e acessível, em pouco tempo, transforma uma nação destruidora de recursos ambientais em país protetor do verde[6]. (GRANZIERA, 2006, p. 51; MACHADO, 2005, p. 85 et seq)


2.5. A propriedade da água


Como já afirmado no início do capítulo, a água é propriedade de todos e propriedade de nenhum. Sendo bem difuso, todos podem usufruí-la, entretanto, deve ser um uso controlado, que vise ao desenvolvimento sustentável. É um bem de uso comum do povo, ou seja, todos têm direito à ela. Machado (2002, p. 14-15) é enfático ao dizer que


“A existência do ser humano – por si só – garante-lhe o direito a consumir água e ar. “água é direito à vida”. Portanto, correto afirmar-se que negar água ao ser humano é negar-lhe o direito à vida; ou, em outras palavras, é condená-lo à morte. O direito à vida é anterior aos outros direitos. “A relação que existe entre o homem e a água antecede o Direito. É elemento intrínseco à sua sobrevivência”.


Conforme o art. 225, da CF, a água é bem de uso comum do povo. Sendo assim, ninguém individualmente é considerado seu proprietário. Há privilégios de uso para algumas pessoas, entretanto, a água pertence à toda coletividade, a todos os seres considerados coletivamente.


Destarte, o uso da água não é de propriedade de uma só pessoa, seja física ou jurídica, com exclusão absoluta dos outros usuários em potencial; o uso da água não pode significar a poluição ou a agressão desse bem; o uso da água não pode esgotar o próprio bem utilizado; e a concessão ou a autorização (ou qualquer tipo de outorga) do uso da água deve ser motivada ou fundamentada pelo gestor público  (MACHADO, 2002, p. 25). Sendo um bem de uso comum do povo, todos têm direito ao seu uso, desde que de forma racional, primando pelo utilização do recurso para suprir as necessidades básicas do ser humano.


3. ORDEM CONSTITUCIONAL AMBIENTAL E A GARANTIA DO MEIO AMBIENTE ECOLOGICAMENTE EQUILIBRADO


3.1. Conceito de meio ambiente


Meio ambiente é todo o espaço que nos cerca, seja em casa, no trabalho, na rua, ou, como é mais conhecido dos homens, nas florestas, matas, bosques, etc. O âmbito que nos cerca, o local onde vivemos forma o que denomina-se meio ambiente. Nesse sentido, Silva (2006, p. 832) afirma


“A palavra “ambiente” indica a esfera, o círculo, o âmbito que nos cerca, em que vivemos. Em certo sentido, portanto, nela já se contém o sentido da palavra “meio”. Por isso, até se pode reconhecer que na expressão “meio ambiente” se denota certa redundância. O ambiente integra-se, realmente, de um conjunto de elementos naturais e culturais, cuja interação constitui e condiciona o meio em que se vive. Daí por que a expressão “meio ambiente” se manifesta mais rica de sentido (como conexão de valores) do que a simples palavra “ambiente”. Esta exprime o conjunto de elementos; aquela expressa o resultado da interação desses elementos. O conceito de meio ambiente há de ser, pois, globalizante, bem como os bens culturais correlatos, compreendendo, portanto, o solo, a água, o ar, a flora, as belezas naturais, o patrimônio histórico, artístico, paisagístico e arqueológico.”


Como discutido em capítulos anteriores, o constituinte, ao incluir o meio ambiente como um bem jurídico passível de tutela, delimitou a existência de uma nova dimensão do direito fundamental à vida e do próprio princípio da dignidade da pessoa humana. Sendo assim, os direitos e garantias fundamentais encontram seu fundamento na dignidade da pessoa humana, mesmo que de modo e intensidade variáveis. (MEDEIROS, 2004, p. 113)


3.2. Proteção ao meio ambiente e garantia do meio ambiente ecologicamente equilibrado


A Constituição Federal de 1988, diferentemente das demais Constituições Brasileiras, trouxe, de forma sistematizada, grande preocupação com o meio ambiente. Em seu art. 225 traz as diretrizes básicas da ordem ambiental constitucional, conceituando meio-ambiente e dispondo algumas regras para sua proteção efetiva. Não só no artigo 225, mas em diversos outros dispositivos a Constituição trata do meio ambiente, em alguns dando relevância maior à água, estabelecendo competências, direito e deveres dos cidadãos e entes públicos quanto ao meio ambiente. Traçaremos os principais aspectos constitucionais acerca do meio ambiente e suas garantias.


3.2.1. O meio ambiente ecologicamente equilibrado e sua tutela jurídico-constitucional


Meio ambiente ecologicamente equilibrado não é aquele meio que permanece  intocável, de forma a conservar todas as suas características originais. Como demonstrado alhures, tudo ao nosso redor faz parte do meio ambiente. O que o constituinte quis dizer com meio ambiente ecologicamente equilibrado, segundo Machado (2005, p. 119) foi, na realidade, que deve haver harmonia entre o ambiente e o homem, ou seja, este deve usar o necessário do meio ambiente, protegendo-o, garantindo, dessa forma, sua sobrevivência e a conservação do meio para as gerações futuras[7].


Silva (2006, p. 835-836) leciona


“O objeto de tutela jurídica não é tanto o meio ambiente considerado nos seus elementos constitutivos. O que o Direito visa proteger é a qualidade do meio ambiente, em função da qualidade de vida. Pode-se dizer que há dois objetos de tutela, no caso: um imediato – que é a qualidade do meio ambiente – e outro mediato – que é a saúde, o bem-estar e a segurança da população, que se vêm sintetizando na expressão “qualidade de vida”. […] o objeto do direito de todos não é o meio ambiente em si, não é qualquer meio ambiente. O que é objeto do direito é o meio ambiente qualificado. O direito que todos temos é à qualidade satisfatória, ao equilíbrio ecológico do meio ambiente. Essa qualidade é que se converteu em um bem jurídico. Isso é que a Constituição define como bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida. […] tudo isso significa que esses atributos do meio ambiente não podem ser de apropriação privada, mesmo quando seus elementos constitutivos  pertençam a particulares. Significa que o proprietário, seja pessoa pública ou particular, não pode dispor da qualidade do meio ambiente a seu bel-prazer, porque ela não integra sua disponibilidade.”


Discordamos em parte de seu entendimento pois, o Direito visa proteger o meio ambiente considerado de per si, mas prima pela sua qualidade, porquanto, conservando uma sadia qualidade ambiental, o meio ambiente estará sendo, conseqüentemente, preservado para as presente e futura gerações. Focar apenas na qualidade não é suficiente: o meio ambiente deve também ser considerado em si, para que sua proteção seja efetiva.


A interpretação do artigo 225 de nossa Constituição permite-nos afirmar que a proteção ao meio ambiente, para além de um direito fundamental do cidadão, é um dever fundamental. Isso porque


a afirmação de dever fundamental de proteção ao meio ambiente está alicerçada […] na pressuposição de que os deveres fundamentais, no caso específico, os voltados ao meio ambiente, remetem  à condição de nele incluir princípios sócio-humanos de convivência que, por sua vez, instruem e são instruídos pelas questões presentes no direito fundamental ao contemplar o direito à igualdade, à liberdade, à solidariedade.  […] mesmo que em oposição à idéia de deveres fundamentais, a condição de mandato de igualdade, direito geral de liberdade, a necessidade, como direito fundamental, de ordenar as ações a atender esses direitos. […]


Intrinsecamente ligado ao direito de proteção ambiental existe um dever fundamental. Esse dever fundamental caracteriza-se pela obrigação incumbida ao Estado e a cada um dos indivíduos partícipes de nossa sociedade em manter um ambiente saudável, sadio e equilibrado, seja por intermédio de cuidados básicos para com o meio, seja através de grandes participações na luta pela não-destruição do habitat natural”. (MEDEIROS, 2004, p. 102-124)


A proteção ambiental consiste, por fim, não em um direito/dever jurídico, mas, em verdade, num dizer moral, pois trata diretamente com os valores humanos de cada cidadão do mundo (retirar). Quando a Constituição fala em dignidade humana impõe a todos, sem exceção, que preservem não só suas vidas, mas o que existe ao redor delas, numa verdadeira regra “ideal”, que está acima de qualquer ditame jurídico.


3.2.2. Responsabilidade por danos ao meio ambiente


A responsabilidade por danos ao meio ambiente é objetiva (BULOS, 2007, p. 1409), ou seja, não é necessário a comprovação de dolo ou culpa. O que o Poder Público deve comprovar é a efetiva participação do agente no dano causado. Responderá civilmente e, caso a conduta seja penalmente punível, poderá responder, também, criminalmente[8].


Meirelles (apud NALINI, 2003, p. 26) demonstra que a responsabilidade do réu na ação civil pública é objetiva, pois independe da culpa no fato em que enseja bastando que o autor demonstre o nexo causal entre a conduta do réu e a lesão do meio ambiente a ser protegido e indique o dispositivo legal infringido. Se o fato argüido lesivo ao meio ambiente foi praticado com licença, permissão ou autorização da autoridade competente, deverá o autor da ação – Ministério Público ou pessoa jurídica – provar a ilegalidade de sua expedição, uma vez que todo ato administrativo traz a presunção de legitimidade, só invalidável por prova em contrário.


3.3.3. Educação ambiental como forma de garantia de um meio ambiente ecologicamente equilibrado


A educação é a melhor forma de garantir o desenvolvimento econômico, social, político e ambiental de uma país.


Notório é o fato de que, nos países onde a educação volta-se a discursos ecológicos, de forma a demonstrar a importância do meio ambiente e como protegê-lo, os índices de poluição e degradação ambiental caem ano a ano. Isso demonstra o papel essencial da educação ambiental na luta pela proteção do meio ambiente.


A ordem constitucional brasileira, no já citado art. 225, previu a educação ambiental como direito fundamental do homem, devendo ser viabilizado através de duas ações: promoção da educação ambiental e promoção da conscientização pública.


Promover a educação ambiental em (retirar) é inserir a transmissão dos conhecimentos sobre meio ambiente no ensino escolarizado. (MACHADO, 2005, p. 140 et seq)


A Lei nº 9.795/1999 dispõe sobre a educação ambiental e instituiu a Política Nacional de Educação Ambiental. Entre seus princípios básicos está a “concepção do meio ambiente em sua totalidade, considerando a interdependência entre o meio natural, o sócio-econômico e o cultural, sob o enfoque da sustentabilidade”. Um dos objetivos da lei é o incentivo à participação individual e coletiva. Todavia, para nossa infelicidade, ainda não se criou a disciplina “Educação Ambiental” no currículo de ensino, prevista pelo art. 10, § 2º da supracitada lei. (FIGUEIREDO, 2001)


O papel da educação ambiental é tão importante que Martins (2004) chega a afirmar que


“Os professores são a peça fundamental no processo de conscientização da sociedade dos problemas ambientais, pois buscaram desenvolver em seus alunos hábitos e atitudes sadios de conservação ambiental e respeito à natureza transformando-os em cidadãos conscientes e comprometidos com o futuro do país […]”.


Esse talvez seja o cerne da questão ambiental no mundo atual, como nos afirma Medeiros (2004, p. 34)


“[…] defendemos que somente através de uma conscientização da imperatividade de ações preservacionistas que o ambiente conseguirá manter-se, ou tornar-se, equilibrado e sadio para essa e para as próximas gerações. A força do direito manifesta-se a todo momento, proporcionando à proteção do meio ambiente uma posição nuclear em nosso ordenamento, como um direito fundamental alicerçado em dimensão solidária/fraternal. Mas para que esse direito se torne, para além do eficaz, efetivo, é necessária a participação da coletividade (já que titulares/destinatários) desse direito, para que despertem à consciência ecológica, a ética ambiental, ao exercício da cidadania”.


Destarte, só através de uma efetiva educação ambiental poderemos atingir o grau máximo de conscientização ecológica, fazendo com que o processo de degradação da Terra seja, ao menos, diminuído, garantindo às gerações futuras um mínimo necessário para a vida, primando pela dignidade humana.


4. A SUSTENTABILIDADE DA ÁGUA


A crise ambiental que assola o planeta fez com que as nações de todo o mundo voltassem os olhos para os recursos naturais indispensáveis a vida. A água, como elemento vital, tornou-se um dos núcleos da discussão, que pretende promover políticas de uso e desenvolvimento garantindo a continuidade desse recurso essencial aos seres vivos.


Narra Nunes Junior (2005), que a crise ambiental é


“Fruto do modelo desenvolvimentista de Estado Social, levado a cabo a partir da década de 60 e cujos sintomas mais agudos ocorreram na década de 70 com a crise do petróleo, obrigando os Estados à tomada de consciência sobre os limites do crescimento econômico e da esgotabilidade dos recursos naturais, a atual crise ambiental tornou indispensável assegurar o desenvolvimento sustentável, cuja principal característica reside na possível (e desejável) conciliação entre o desenvolvimento, a preservação do meio ambiente e a promoção da qualidade de vida humana.”


Destarte, necessário faz-se a discussão acerca de formas de garantir no futuro a quantidade necessária de recursos naturais para a sobrevivência humana no planeta. Dá-se o nome de desenvolvimento sustentável ao processo de desenvolvimento que visa utilizar os recursos naturais de forma suprir as necessidade presentes e garantir às futuras gerações o necessário para sua sobrevivência, instituto melhor analisado nos próximos itens.


4.1. Conceito de sustentabilidade e desenvolvimento sustentável


O conceito de desenvolvimento sustentável esta em construção, sendo, portanto, passível de erros, acertos e grandes controvérsias.


Primeiramente, deve-se conceituar o que seria a sustentabilidade. A idéia inicial de sustentabilidade surgiu a partir do momento em que o homem percebeu que nada no mundo é eterno. A escassez impera no Planeta Terra. Por isso, deveria prezar pela economia de todos os recursos, procurando desenvolver formas eficazes de preservação e renovação. (NALINI, 2003, p. 145 et seq)


A sustentabilidade, caracteriza-se pelo uso racional dos recursos disponíveis, de forma a possibilitar a sua renovação (quando possível) ou a sua preservação em quantidades razoáveis à conservação da vida. (MARTINS, 2004)


Conforme se analise um ou outro fator predominante, a sustentabilidade irá amoldar-se às condições específicas de cada caso, surgindo, então, conceitos de sustentabilidade diferenciados. Bezerra e Munhoz (2000, p. 15-16) identificam as principais formas de sustentabilidade:


Sustentabilidade ecológica – refere-se à base física do processo de crescimento e tem como objetivo a manutenção de estoques de capital natural, incorporados às atividades produtivas.


Sustentabilidade ambiental – refere-se à manutenção da capacidade de sustentação dos ecossistemas, o que implica a capacidade de absorção e recomposição dos ecossistemas em face das agressões antrópicas.


Sustentabilidade social – refere-se ao desenvolvimento e tem por objetivo a melhoria da qualidade de vida da população. Para o caso de países com problemas de desigualdade e de exclusão social, implica a adoção de políticas distributivas e a universalização de atendimento a questões como saúde, educação, habitação e seguridade social.


Sustentabilidade política – refere-se ao processo de construção da cidadania para garantir a incorporação plena dos indivíduos ao processo de desenvolvimento.


Sustentabilidade econômica – refere-se a uma gestão eficiente dos recursos em geral e  caracteriza-se pela regularidade de fluxos do investimento público e privado. Implica a avaliação da eficiência por processos macrossociais.”


Nesse trabalho enfatizar-se-á a sustentabilidade ecológica e ambiental, pois juntas serão a base do desenvolvimento sustentável da água.


Feitas essas considerações iniciais acerca da sustentabilidade, para que se conceitue o desenvolvimento sustentável, necessária a junção do conceito de desenvolvimento ao de sustentabilidade. Desenvolvimento nada mais é que crescer gradualmente, ascender (VIANA, 2002). Contudo, se considerarmos o desenvolvimento em seu conceito puro, na junção com a sustentabilidade, poderemos ter posições demasiadamente radicais. Deve-se ter cautela ao definir o que seja desenvolvimento sustentável. (VIANA, 2002)


Buscando conceituar o desenvolvimento sustentável, o mundo, em suas diversas reuniões acerca dos problemas ambientais, formulou o relatório Brundland, que definiu desenvolvimento sustentável como um desenvolvimento que satisfaz as necessidades do presente sem comprometer a capacidade das futuras gerações de satisfazerem as suas. Pode-se considerar, portanto, desenvolvimento sustentável como o desenvolvimento que tratando de forma interligada e interdependente as variáveis econômica, social e ambiental é estável e equilibrado garantindo melhor qualidade de vida para as gerações presentes e futuras.  (MARTINS, 2004)


É certo que a implementação do desenvolvimento sustentável passa necessariamente por um processo de discussão e comprometimento de toda a sociedade uma vez que implica em mudanças no modo de agir dos agentes sociais. No processo de implementação do desenvolvimento sustentável a educação ambiental torna-se um instrumento fundamental.


No Brasil, o desenvolvimento sustentável esta elevado ao status de princípio constitucional ambiental, expresso no art. 225 da Carta Magna Brasileira. O instrumento principal acerca da sustentabilidade no Brasil é a Agenda 21, que define as estratégias para a implementação do desenvolvimento sustentável no país. Segundo o documento Agenda 21: Ações Prioritárias (Brasil, 2004a, p. 113)


“As estratégias que compõem o processo de desenvolvimento sustentável da Agenda 21 Brasileira, sob a dimensão ambiental, definem o uso eficiente e racional dos recursos naturais, bem como sua valoração, orientando-se para a melhoria da qualidade de vida da população, desde que observado o imperativo moral de respeito pelas necessidades das gerações futuras”.  


O desenvolvimento sustentável, conforme entendimento de Bezerra e  Munhoz (2000, p. 17), possui quatro dimensões: a) dimensão ética, onde se destaca o reconhecimento de que no almejado equilíbrio ecológico está em jogo mais que um padrão duradouro de organização da sociedade; está em jogo a vida dos seres e da própria espécie humana (gerações futuras); b) dimensão temporal, que determina a necessidade de planejar a longo prazo, rompendo com a lógica imediatista, e estabelece o princípio da precaução (adotado em várias convenções internacionais de que o Brasil é signatário e que tem, internamente, força de lei, com a ratificação pelo Congresso); c) dimensão social, que expressa o consenso de que só uma sociedade sustentável – menos desigual e com pluralismo político – pode produzir o desenvolvimento sustentável e d) dimensão prática, que reconhece necessária a mudança de hábitos de produção de consumo e de comportamentos.


Essas dimensões irão mostrar os caminhos a serem perseguidos pela sociedade brasileira na busca do desenvolvimento sustentável.


Todavia, o movimento pelo desenvolvimento sustentável sofre com resistências, principalmente dos grandes detentores do poder, que argumentam ser estratégia inviável, pois contrária ao desenvolvimento econômico[9]. (VIANA, 2002; NALINI, 2003)


Não há razão alguma com os defensores dessas idéias. Não passa de demagogia, vez que os governantes e a classe mais alta que assim se manifestam não tem interesse algum na saúde e bem-estar de seu povo.


A finalidade do desenvolvimento sustentável não é cercear a economia, mas, ao contrário, busca equalizar, conciliar, encontrar um ponto de equilíbrio entre atividade econômica e uso adequado, racional e responsável dos recursos naturais, respeitando-os e preservando-os para a gerações atuais e subseqüentes. (VIANA, 2002)


Nesse sentido, sabias as palavras de Viana (2002)


Não se trata, portanto, de cercear a atividade econômica que tem como meta a satisfação das necessidades e aspirações humanas. Reconhece-se que no mundo contemporâneo milhares de pessoas ainda sofrem de males primários, como fome e analfabetismo, vindo, por vezes, a óbito quando lhes são negados o acesso à infra-estrutura básica na área da saúde. Muito ainda há a ser feito de forma a plasmar a dignidade do ser humano que se arvora no limiar do Século XXI, não sendo concebível o sobrestamento de novas tecnologias, ou a estagnação no desenvolvimento de uma sociedade estruturada em economia de mercado.


No entanto, esse “desenvolvimento” há de ser “sustentável”, vale dizer, deve ser implementado mediante uma visão holística e sistêmica, inserida no complexo indissociável que une homem e natureza, concretizando entre ambos um convívio sóbrio e saudável, ecologicamente equilibrado, propiciando ao homem de hoje e ao de amanhã, uma sadia qualidade de vida.”


Essa a razão de ser do desenvolvimento sustentável: não cinge-se apenas em conservar os recursos naturais garantindo-os para as gerações futuras. Exige muito mais, pois deve dar aos homens de hoje o necessário à sua sobrevivência e desenvolvimento, possibilitando crescimento em todos as áreas (econômica, inclusive) garantindo, contudo, o necessário às gerações futuras, de forma que possam usufruir na mesma intensidade, os recursos a nós disponíveis. (DINIZ; SILVA; VIANA, 2001, p. 44-68)


Nesse sentido a Agenda 21 (BEZERRA, MUNHOZ, 2001; BRASIL, 2004a; BRASIL 2004b) foi clara estabelecendo em seus objetivos métodos e estratégias, consolidando as melhores formas de satisfazer o real sentido do desenvolvimento sustentável.


4.2. A sustentabilidade como princípio do direito ambiental e sua ligação com o princípio constitucional da dignidade da pessoa humana


Esclarecidos os conceitos de desenvolvimento sustentável e sustentabilidade, convém, neste momento, ligá-los ao direito ambiental e à ordem constitucional brasileira.


Como descrito anteriormente, a sustentabilidade encontra-se garantida constitucionalmente no art. 225 da CF, sendo princípio fundamental. Ressalte-se que, na verdade, esse princípio está dentro de uma ordem maior, ligada intimamente ao ser humano: a dignidade humana.


A dignidade humana, como princípio norteador de qualquer Estado democrático, deve primar pela vida do homem, garantindo a este todos os meios necessários para  uma sadia qualidade de vida. O desenvolvimento sustentável e a sustentabilidade, levados ao campo do direito ambiental (e, principalmente, do direito das águas) vão consolidar o fim primeiro da dignidade humana, preservando os recursos naturais necessários à sobrevivência de qualquer vida no Planeta. (MORAES, 1998, p. 60 et seq; SILVA, 2005, p. 105)


Nas lições de Piva (2000, p. 111), sintetizando todo o exposto até o momento,


“a vida digna com qualidade representa, certamente, o fim maior a ser colimado pelo direito em benefício do ser humano, mas a proteção ambiental, sem a qual os outros interesses, é verdade, não terão onde sobreviver, não é a única proteção capaz de possibilitar a existência de um homem feliz e digno. A felicidade e a dignidade do ser humano também inserem-se no conceito de vida com qualidade, mas, por maior que seja a ubiqüidade do Direito Ambiental, esta realização humana não advém exclusivamente do cumprimento irrestrito das prescrições das normas ambientais. Trata-se de uma realização que também depende de poder econômico próprio capaz de proporcionar ao ser humano o seu sustento, a sua educação e o seu lazer, por exemplo.”


Logo, a ordem constitucional, ao garantir a dignidade da pessoa humana como princípio fundamental, e, também, o direito ao desenvolvimento sustentável, enfatizou a importância do meio ambiente na qualidade de vida humana, concretizando os anseios há tanto desejados: uma proteção constitucional ao meio ambiente de qualidade. (MACHADO, 2002, p. 13-18; 24-26)


4.3. Aspectos da sustentabilidade no ordenamento jurídico brasileiro


4.3.1. Controle do uso e da poluição


Para garantir-se qualquer forma de sustentabilidade, necessário se faz estabelecer regras base, que, na verdade, são princípios norteadores da sustentabilidade e do desenvolvimento sustentável.


No capítulo  2, discorreu-se sobre os princípios do Poluidor-Pagador e do Usuário-Pagador, contudo, resta fazer algumas breves considerações.


Os princípios em comento, aparentemente formas de sanção aos usufruidores do recurso água (e demais recursos naturais) são, na realidade, formas de controle do uso desse recurso. Isso porque, como já afirmado, todo recurso natural tem um limite devendo, desta forma, ser utilizado de forma racional, a fim de preservá-lo.


Para garantir um desenvolvimento sustentável num país com tantos desperdícios como o nosso, a aplicação dos princípios do poluidor e usuário-pagador mostra-se de relevante importância, haja vista serem formas iniciais de conscientização ambiental dos cidadãos brasileiros. Diga-se inicial porque o ideal seria a desnecessidade de aplicação de tais princípios. Entretanto, esse ideal só poderá ser alcançado quando todos tiverem consciência de que o mundo está morrendo e precisa ser preservado.


4.3.2. Educação Ambiental e Ética Ambiental


Para a realização do ideal analisado acima (conscientização ambiental) necessário se faz promover políticas de educação ambiental objetivando demonstrar os benefícios da sustentabilidade e prejuízos decorrentes do desperdício e mau uso dos recursos naturais.


A educação ambiental é garantida expressamente em lei, porém, não é efetivada, principalmente pelo descaso dos governantes e falta de vontade da população.


Contudo, se cada cidadão consciente fizer sua parte, poder-se-á difundir uma cultura de sustentabilidade a nível nacional, despertando todos ao ideal do desenvolvimento sustentável.


Nalini (2003, p. 146), demonstra quais os elementos principais de uma cultura da sustentabilidade, ao dizer que


“a disseminação dessa cultura da sustentabilidade residiria em alguns elementos constitutivos, quais sejam: uma sólida consciência social em relação ao direito a um ambiente saudável e produtivo; o reconhecimento universal quanto ao valor da diversidade biológica, da heterogeneidade cultural e do pluralismo político; o respeito a uma ética inter e intrageracional; a ênfase especial às prioridades voltadas para as necessidades básicas, a elevação da qualidade de vida e a inclusão social; o reconhecimento da eficácia de práticas de descentralização econômica e gestão participativa; a incorporação de uma dialética que não apenas opõe, mas aproxima o particular do universal, o local do global”.


Se atingir-se um nível razoável de conscientização ambiental, pode-se então “produzir” o que muitos chamam de ética ambiental – a ética voltada ao meio ambiente.


Na melhor obra nacional sobre o assunto, o Prof. Nalini (2003, p. XXXV-XXXVI) assim discorre sobre a consciência ambiental ética:


“Formar um consciência ambiental ética, contudo, mostra-se como única alternativa para viabilizar a vida num planeta sujeito a tantas degradações. Uma ética ambiental que inverta a pretensiosa concepção de que a natureza é apenas um meio e os objetivos do homem o único fim. Mostra-se urgente a revitalização de valores éticos quais a bondade e a solidariedade, com incidência também sobre a natureza. Bondade para descobrir que cada criatura, por ser oriunda do Amor de Deus, reflete um ser bom, belo e amoroso. Solidariedade para descobrir que, nas diversificadas manifestações de inúmeras formas de vida, existe uma relação de tudo com todos, reeducando assim a pessoa para interagir melhor com o mundo circundante, capacitando-a a ser solidária na harmonia e na oposição inerentes no seio da natureza e da sociedade. […] O desafio é sensibilizar as consciências, fazer com que todos sejam alertados sobre as conseqüências de seus atos, pois somente sujeitos conscientes das conseqüências dos seus atos é que fazem a diferença na sociedade e no ambiente.”


E conclui, no decorrer de sua obra, aproveitando-se das palavras de Leonardo Boff (apud NALINI, 2003, p. 151), que o cuidado essencial é a ética de um planeta sustentável[10].


4.3.3. Política Nacional dos Recursos Hídricos


A gestão dos recursos hídricos no Brasil é regulamentada pela Lei nº 9.433/1997, que institui a Política Nacional dos Recursos Hídricos.


Em seu art. 1º, I, descreve-se a água como sendo um bem de domínio público e de uso comum do povo, demonstrando que todos têm direito à água, não pertencendo sua propriedade a ninguém considerado individualmente: a água é um bem de toda a humanidade. (MACHADO, 2002, p. 25)


Nos incisos I e II do art. 2º da Lei nº 9.433/1997 estão explicitados os princípios do desenvolvimento sustentável dos recursos hídricos. Assim, são objetivos da Política Nacional de Recursos Hídricos: “I – assegurar à atual e às futuras gerações a necessária disponibilidade de água, em padrões de qualidade adequados aos respectivos usos; II – a utilização racional e integrada dos recursos hídricos, incluindo o transporte aquaviário, com vistas ao desenvolvimento sustentável”.


Machado (2002, p. 39) afirma


A Lei nº 9.433/1997 demarca concretamente a sustentabilidade dos recursos hídricos em três aspectos: disponibilidade de água, utilização racional e utilização integrada.


Disponibilidade de água de boa qualidade – isto é, não poluída – para as gerações presentes e futuras. Essa a finalidade prioritária, através de uma utilização racional e integrada. Disponibilidade eqüitativa de água, que facilite o acesso de todos a este bem, ainda que em quantidade diferente. Os institutos jurídicos hão de ser aplicados no sentido de evitar o monopólio das águas, seja por órgãos públicos, seja por particulares.


A racionalidade dessa utilização deverá ser constatada nos atos de outorga dos direitos de uso e nos Planos de Recursos Hídricos. A utilização integrada dos recursos hídricos será reiterada no sistema de gestão constante das diretrizes gerais de ação do art. 3º.


A ética da sustentabilidade das águas ganhou respaldo legal, e não deve ser deixada como enfeite na legislação, podendo, por isso, ser invocado o Poder Judiciário quando as outorgas, planos e ações inviabilizarem a disponibilidade hídrica para as presentes e futuras gerações.


A gestão dos recursos hídricos abrange como objetivos principais: “abordagem multissetorial, planejamento da utilização e da gestão racional; concepção, implantação e avaliação de projetos economicamente rentáveis e socialmente adaptados; definição, criação ou apoio a mecanismos institucionais, jurídicos e financeiros com o fim de assegurar-se o progresso social e o crescimento sustentado.”


Ao governo incumbe a proteção e a outorga dos direitos de uso dos recursos hídricos, ações que irão realizar os objetivos da política hídrica brasileira (CF, art. 21, XIX, regulamentado pela Lei nº 9.433/97). Esses são os principais pontos da política nacional de recursos hídricos.


Conforme o art. 11 da supracitada lei, o regime de outorga de direitos de uso de recursos hídricos tem como objetivos assegurar o controle quantitativo e qualitativo dos usos da água e o efetivo exercício dos direitos de acesso à água. Ressalte-se que se outorga o direito de uso da água, e não sua propriedade (GRANZIERA, 2006, p. 193-194).


Por ser um recurso natural limitado, a outorga poderá ser concedida mediante pagamento de determinada quantia, o que irá caracterizá-la como bem econômico. Todavia, isso não quer dizer que aquele que paga pelo seu uso possa usufruí-la ao seu bel-prazer. O pagamento não tem como objetivo uma “compra” da água. Na verdade, a política de recursos hídricos, ao estabelecer a possibilidade da cobrança pela outorga, teve como escopo garantir a conservação, recuperação e melhor distribuição desse bem ambiental, ações que são financiadas com esses pagamentos[11]. (MACHADO, 2002, p. 32)


A proteção promovida pelos órgão governamentais vai desde a fiscalização até o estabelecimento de sanções. Instrumento de grande valia nessa ação tem sido a Ação Civil Pública, promovida diversas vezes pelo Ministério Público, sempre com o objetivo de preservar o patrimônio natural necessário a sadia qualidade de vida da população (MEIRELLES apud NALINI, 2003, p. 26). Também destacam-se o órgão regulador de águas no Brasil: a Agência Nacional de Águas – ANA, que, atuando na fiscalização e regulamentação de outorgas de recursos hídricos, garante qualidade e quantidade suficientes para o uso de todos os que necessitam, além de promover políticas de desenvolvimento sustentável da água, junto ao Ministério do Meio Ambiente (MACHADO, 2002, p. 99-103).


4.3.4. A Agenda 21 brasileira


A Agenda 21 Brasileira surgiu para suprir uma lacuna, pois, não havia instrumento que traçasse um caminho para o desenvolvimento sustentável no Brasil.


Esse instrumento, formalizado em diversos manuais e livros resultantes de palestras, congressos, seminários sobre o tema, “é uma proposta realista e exeqüível de desenvolvimento sustentável, desde que se leve em consideração às restrições econômicas, político-institucionais e culturais que limitam sua implementação”. (BRASIL, 2004a, p. 14)


Para a implementação das estratégias delimitadas na Agenda 21 (BRASIL, 2004a, p. 10-16), são necessários diversos fatores, dentre os quais: a) o nível de consciência ambiental e de educação para a sustentabilidade avance; b) o conjunto do empresariado se posicione de forma proativa quanto às suas responsabilidades sociais e ambientais; c) a sociedade seja mais participativa e que tome maior número de iniciativas próprias em favor da sustentabilidade; d) a estrutura do sistema político nacional apresente maior grau de abertura para as políticas de redução das desigualdades e de eliminação da pobreza absoluta; e) o sistema de planejamento governamental disponha de recursos humanos qualificados, com capacidade gerencial, distribuídos de modo adequado nas diversas instituições públicas responsáveis; f) as fontes possíveis de recursos financeiros sejam identificadas em favor de programas inovadores estruturantes e de alta visibilidade.


Continuando, o documento ainda sugere que


“para tornar realidade tantos e diversos objetivos, sejam ampliados os instrumentos de intervenção, por meio de negociação entre as instituições públicas e privadas, ou de mecanismos efetivos de mercado, ou ainda com as conhecidas estruturas regulatórias de comando e controle.” (BRASIL, 2004a, p. 16)


Por fim, faz-se necessária a seguinte observação: a Agenda 21 Brasileira não é um plano de governo, mas um compromisso da sociedade em termos de escolha de cenários futuros. Trata-se de um documento norteador, não vinculando ninguém aos seus ditames. Praticar a Agenda 21 pressupõe a tomada de consciência individual dos cidadãos sobre o papel ambiental, econômico, social e político que desempenham em sua comunidade. Exige, portanto, a integração de toda a sociedade na construção desse futuro que desejamos ver realizado. Uma nova parceria, que induz a sociedade a compartilhar responsabilidades e decisões junto com os governos, permite maior sinergia em torno de um projeto nacional de desenvolvimento sustentável, ampliando as chances de implementação bem-sucedida. (BRASIL, 2004a, p. 17)


4.4. O desenvolvimento sustentável e o uso da água


A água, assim como qualquer recurso natural, é limitada. Por isso, há a necessidade premente de métodos de utilização desse elemento com vistas a garanti-lo para o futuro. Não estamos, aqui, censurando o uso da água, de forma a mantê-la intocável, mas, como analisado de forma geral anteriormente, deve-se dar racionalidade ao uso dos recurso hídricos.


Logo abaixo serão analisadas as estratégias da Agenda 21 para o desenvolvimento sustentável da água. Demonstrar-se-á, ao final, que pequenas ações podem mudar o mundo, garantindo vida para várias gerações futuras.


4.4.1. Objetivos norteadores do desenvolvimento sustentável da água estabelecidos pela Agenda 21


Como já afirmado diversas vezes durante este trabalho, (retirar) A Agenda 21 Brasileira é o documento que estabelece as diretrizes para um desenvolvimento sustentável do país. Nesse documento, vários objetivos são elencados, tendo por fim dar ao cidadãos diretrizes básicas para que, junto ao governo, possam desenvolver todos os setores do Brasil de forma sustentável.


Sendo escopo do trabalho comentar os aspectos do desenvolvimento sustentável da água, comentaremos apenas os objetivos que diretamente possam influenciar na criação de políticas públicas e legislação que tratem da sustentabilidade do recurso água.


Primeiramente, e, talvez, o mais importante objetivo com relação a água, tem-se a diretriz número 1: produção e consumo sustentáveis contra a cultura do desperdício. (BRASIL, 2004a, p. 33)


Como a própria Agenda 21 afirma, vive-se vinte e quatro horas por dia na cultura do desperdício, decorrente tanto dos novos hábitos, quanto de velhas práticas de uma sociedade tradicional acostumada à fartura dos recursos naturais e a hábitos ingênuos de generosidade e esbanjamento.


O consumismo é a infeliz regra que rege a sociedade capitalista (NALINI, 2003, p. 44). Não afirma-se que isso é um mal total, contudo, devem todos limitar seu consumo ao necessário, de forma a preservar os recursos escassos. A água encontra-se entre os recursos mais desperdiçados e mais escassos do planeta hoje. Ao levar em consideração que esta é a base da vida na Terra, pode-se dizer que o ser humano está fadado à extinção, caso não mude, e rápido, seus hábitos de desperdício.


Exigir contenção e sobriedade de nossas elites, aí incluindo a alta classe média, é tão importante quanto superar o paradoxo que envolve os mais pobres: muitas vezes, falta comida na mesa, mas mesmo na pobreza, o desperdício continua. A solução para esse e outros problemas semelhantes é mudar os padrões de consumo e combater a cultura do desperdício. (BRASIL, 2004, p. 33)


Para que a cultura do desperdício seja, ao menos, diminuída, e o consumo da água possa atingir um patamar de sustentabilidade razoável, algumas ações são trazidas pela Agenda 21 como prioritárias:


“- desencadear uma campanha nacional contra o desperdício envolvendo os três níveis de governo, as empresas, a mídia, o terceiro setor e as lideranças comunitárias para tomada de consciência e mudança de hábitos;


– mobilizar os meios de comunicação – televisão, rádio e jornal – para serem usados em seu papel relevante de pedagogia social. Enquanto concessão de interesse público, devem em seus horários obrigatórios de veiculação de informação de interesse social, produzir campanhas voluntárias de esclarecimento, gerando notícias capazes de conscientizar a opinião pública sobre a necessária mudança de comportamentos;


– iniciar com uma campanha contra o desperdício de água e energia, que deve adquirir feição específica e diferenciada para as diferentes regiões brasileiras, bem como para os diferentes setores produtivos;


– definir uma legislação de resíduos sólidos, com claras definições de obrigações e responsabilidades para os diferentes atores sociais, com base no reaproveitamento e na redução da geração de lixo;


– divulgar experiências inovadoras para que, em nível local, se adotem formas criativas de destinação dos resíduos.” (BRASIL, 2004a, p. 34)


Obedecido esse primeiro objetivo, um grande passo será dado rumo à sustentabilidade da água e, por conseguinte, à sadia qualidade de vida das presentes e futuras gerações.


Em segundo lugar, o objetivo dois sugere a ecoeficiência e responsabilidade social das empresas como forma de se atingir resultados satisfatórios na preservação da água. (BRASIL, 2004a, p. 35)


Isso porque, após a ECO 92, foi surpreendente a assimilação dos desafios e compromissos pelos empresários. Criou-se uma posição proativa de resolver problemas e encontrar soluções, seja adotando novas tecnologias menos poluidoras, seja aperfeiçoando o modelo de gestão empresarial. (BRASIL, 2004a, p. 35)


Como ações para implementação da ecoeficiência e conscientização da responsabilidade social das empresas, sugere a Agenda 21 (BRASIL, 2004a, p. 35-36):


“- criação de condições para que as empresas brasileiras adotem os princípios de ecoeficiência e de responsabilidade social, que aumentam a eficiência pela incorporação de valores éticos e culturais ao processo de decisão;


– promover parcerias entre empresas de diferentes portes como forma de disseminar o acesso aos padrões de qualidade dos mercados nacional e internacional, buscando processos menos poluentes;


– promover parcerias entre as grandes, médias e pequenas empresas para a difusão do conceito de ecoeficiência, como sinônimo de aumento da rentabilidade, para a redução de gastos de energia, água e outros recursos e insumos de produção;


– incentivar a ecoeficiência empresarial por meio dos mecanismos de certificação, em complementação aos instrumentos tradicionais de comando e controle. Cada empresa deve ser, voluntariamente, um agente de controle ambiental;


– adotar os procedimentos adequados para minimizar efeitos adversos na saúde e no meio ambiente com a utilização de: i) desenvolvimento de padrões mais seguros de embalagem e rotulagem; ii) consideração dos conceitos de ciclo de vida dos produtos pelo uso de sistemas de gestão ambiental, técnicas de produção mais limpa e sistema de gerenciamento de resíduos; e iii) desenvolvimento de procedimentos voluntários de auto-avaliação, monitoramento e relatórios de desempenho e medidas corretivas;


– prover a capacitação, a conscientização e a educação dos empregados, para que eles se tornem agentes promotores da ecoeficiência em suas empresas;


– integrar as empresas brasileiras à ação internacional pelo desenvolvimento sustentável, criando oportunidades de negócios favoráveis ao seu crescimento e sua inovação.”


O mais importante de tudo é despertar em todas as empresas que produzam ou usem de processos que degradem a água, seja direta ou indiretamente, uma consciência ético-ambiental, estimulando-as a adotarem processos que não agridam o meio ambiente, educando até mesmos seus funcionários a trabalharem e viverem o dia-a-dia preservando o máximo possível dos recursos naturais existentes e a disposição, livre e sem custos, de todos.


Em seguida, importa-nos comentar o objetivo cinco: informação e conhecimento para o desenvolvimento sustentável. (BRASIL, 2004a, p. 42)


A educação ambiental sagrou-se como princípio constitucional-ambiental no art. 225 da Carta Maior. Como já ressaltado, sem educação não há conscientização dos males que existem na degradação dos recursos naturais. Dessa forma, o conhecimento é a base para um processo de sustentabilidade da água. Informar sobre os males do desperdício e da poluição, demonstrando os pequenos atos que devem ser realizados pelos cidadãos é o primeiro passo da formação de uma consciência ambiental em qualquer país. Além disso, deve-se levar, aos setores empresariais, informações sobre novas técnicas que preservem o meio ambiente, demonstrando que não há perdas com o uso dessas novidades tecnológicas. (MACHADO, 2005, p. 86; NALINI, 2003, p. 151)


São ações prioritárias para se atingir esse objetivo:


“- prover incentivos, inclusive financeiros, para as pesquisas relacionadas ao desenvolvimento sustentável, especialmente nas áreas em que o Brasil já tem investido e em outras que possui vocação natural conferida por sua base de recursos naturais;


– promover a alfabetização científica e tecnológica em todos os níveis do ensino, estimulando, inclusive por meio da mídia, a curiosidade e o desejo de saber sempre mais;


– assegurar a adequada formação e capacitação de recursos humanos em ciência, tecnologia e inovação para o desenvolvimento sustentável, considerando as especificidades e necessidades regionais;


– democratizar a distribuição dos recursos humanos em ciência e tecnologia no espaço regional brasileiro e envolver diretamente os centros de pesquisas e as universidades, assim como os fundos setoriais, na promoção e na execução dos planos de desenvolvimento sustentável regionais, mesorregionais e microrregionais.;


– prover recursos financeiros e materiais para a manutenção de pesquisadores e cientistas no Brasil;


– fortalecer os mecanismos de educação para a ciência e tecnologia e de disseminação da informação científica e tecnológica para o desenvolvimento sustentável, promovendo integração entre os produtores do conhecimento e seus usuários;


– promover a geração e a disseminação de conhecimentos sobre a utilização sustentável dos recursos naturais renováveis e não-renováveis;


– estimular a pesquisa e o desenvolvimento de tecnologias e práticas de produção agrícola sustentáveis, buscando associar aumento de produtividade com formas de produção apoiadas em técnicas que contemplem a conservação e a reconstituição da diversidade biológica;


– fortalecer o desenvolvimento tecnológico e apoiar a utilização de fontes energéticas alternativas que sejam ambientalmente seguras e limpas, de forma a ampliar sua participação na matriz energética brasileira;


– contribuir para a criação de um ambiente favorável à inovação, prevendo mecanismos de transferência dos conhecimentos gerados para os setores público e privado e apoiando incubadoras de empresas, formação de redes de inovação, projetos cooperativos, arranjos locais, plataformas tecnológicas e a propriedade intelectual.” (BRASIL, 2004a, p. 42)


Continuando, tem-se como complementação da diretriz acima o objetivo seis, que prima pela educação permanente para o trabalho e a vida. (BRASIL, 2004a, p. 143)


Sendo a educação, como dito alhures, direito do cidadão, e a educação ambiental princípio do Estado Ambiental de Direito, nada mais justo que a educação seja permanente para o trabalho e, acima de tudo, para a vida. Com esse objetivo, quer a Agenda 21 afirmar que a educação deve ser um processo constante no ciclo vital de cada cidadão: seja em casa ou no trabalho, todos estão passando por um processo contínuo de aprendizado, que sempre se renovará. (BRASIL, 2004a, p. 43)


É nessa fase inicial onde os valores ético-ambientais serão formados e, se consolidados na consciência do cidadão, através do processo de educação permanente, serão repassados e aprimorados no decorrer da vida. (NALINI, 2003)


Complementando as ações do objetivo cinco, tem-se como prioritário:


“- instituir a Agenda 21 da escola e do bairro, buscando enfrentar em cada unidade escolar, seus múltiplos problemas, concentrando a energia coletiva em favor de mudanças que melhorem as condições de trabalho e de ensino;


– universalizar o sistema de ensino em tempo integral e combater o analfabetismo funcional;


– transformar a escola em centro de excelência e cidadania, integrando-a ao bairro e à cidade;


– desenvolver planos de capacitação intensivos para qualificar professores, mobilizando as universidades e os mais diversos segmentos;


– incentivar a participação de pais de alunos na gerência da escola, ajudando no aproveitamento escolar e contribuindo para captar recursos externos, públicos ou privados, para melhoria da qualidade do ensino e aproveitamento escolar;


– desburocratizar a escola, evitando excessivas especializações funcionais e reduzir os seus custos quando e onde houver indícios de desperdício;


– valorizar, por todos os meios, o ensino profissionalizante que irá oferecer mão-de-obra qualificada para as múltiplas tarefas que se desenham na nova sociedade da informação;


– converter os campi universitários em centros de referência, pesquisa e desenvolvimento, voltados para a capacitação em desenvolvimento sustentável, estimulando seus vínculos com os projetos de desenvolvimento regional, de combate à pobreza, de fortalecimento da identidade cultural e de implantação de projetos de interesse local.” (BRASIL, 2004a, p. 45)


Logo em seguida, estabelece a Agenda 21 um objetivo não só relativo ao meio ambiente e a água, mas, principalmente, atinente à saúde da população. No número nove, estabelece como linha mestra: a universalização do saneamento ambiental protegendo o ambiente e a saúde. (BRASIL, 2004a, p. 51)


O Brasil, país de grandes recursos naturais, que possui a maior reserva de água potável pronta para consumo no mundo, peca, e muito, no aspecto do saneamento ambiental.


É sabido que em regiões como o Nordeste, a porcentagem de domicílios que não possui nenhum tipo de saneamento básico é extremamente alta. Sendo o saneamento uma forma de prevenção de males como doenças e desperdícios, a realidade deveria ser outra completamente diversa. Sendo assim, o saneamento básico deve ser promovido de forma efetiva na totalidade dos domicílios do país, objetivando a preservação da saúde e dos recursos naturais existentes, uma vez que, com saneamento básico[12], as pessoas de determinada comunidade ficarão distantes dos detritos resultantes do viver do homem e estes detritos serão tratados, evitando, assim, a poluição dos rios e lagos, principal local de despejo de resíduos decorrentes do lixo produzido pelo homem. (BRASIL, 2004a, p. 51)


Como ações/recomendações para implementação desse objetivo:


“- priorizar os investimentos em infra-estrutura urbana, especialmente os destinados à universalização do saneamento básico, nos próximos dez anos. Estima-se serem necessários US$ 20 bilhões para abastecimento de água e coleta e tratamento primário e secundário de esgoto;


– promover a universalização do acesso à água e ao esgoto, ampliando para 60% o tratamento secundário de esgoto na próxima década;


– atuar em conjunto com organizações não-governamentais e governos para divulgação das boas práticas de saneamento ambiental;


– estimular as comunidades a fiscalizar a correta e completa execução das obras de saneamento ambiental, abrindo-lhes canais que permitam a apresentação de reclamações e a formulação de denúncias;


– priorizar a proteção dos corpos hídricos poluídos, em bacias hidrográficas críticas e nas baías e zonas costeiras densamente povoadas, por exemplo, em trechos das bacias do Paraíba do Sul, do Tietê, do São Francisco e da Baía da Guanabara;


– eliminar os lixões, até o final desta década, promovendo o tratamento adequado em aterros sanitários, evitando a contaminação das águas pluviais e subterrâneas;


– promover hábitos de redução do lixo e a implantação da coleta seletiva voltada para reciclagem e aproveitamento industrial;


– promover programas de geração de renda para população mais pobre dos grandes centros urbanos, por meio da coleta e reciclagem do lixo;


– inserir a drenagem urbana como questão de saúde pública e desenvolver programas de combate à impermeabilização excessiva do solo urbano, causa de inundações potencialmente geradoras de doenças e deseconomias urbanas;


– divulgar técnicas seguras e higiênicas de obtenção e consumo de água na zona rural, bem como métodos corretos de disposição de esgotos e de lixo;


– adotar medidas de incentivo à redução da impermeabilização do solo das cidades, o que agrava os efeitos das enchentes nas áreas urbanas, por meio de adoção de medidas compensatórias, redução de imposto predial em função da área permeável remanescente, ou punitivas, cobrança por impermeabilização proporcional à área impermeabilizada do imóvel;


– criar um sistema de saneamento ambiental no país com forte controle social.” (BRASIL, 2004a, p. 52)


Como objetivo diretamente relacionado a água, expressa o de número quinze: preservar a quantidade e melhorar a qualidade da água nas bacias hidrográficas. (BRASIL, 2004a, p. 65)


O Brasil está em posição privilegiada no mundo, pois possui imensas reservas de água potável. Entretanto, sendo esta um recurso escasso, deve-se primar pela conservação de sua quantidade e, acima de tudo, melhorar, sempre, sua qualidade.


Para efetivação desse objetivo, estabelece o diploma do desenvolvimento sustentável no Brasil a necessidade de:[13]


“- difundir a consciência de que a água é um bem finito, espacialmente mal distribuído no nosso país, sendo muito farto na Amazônia despovoada e muito escasso no semi-árido nordestino;


– implementar a Política Nacional de Gestão dos Recursos Hídricos, implantando de forma modelar e prioritária, os Comitês e Agências de Bacias Hidrográficas dos rios Paraíba do Sul, São Francisco, Paraná-Tietê e Araguaia-Tocantins, nos próximos cinco anos.;


– desencadear um programa de educação ambiental no Nordeste, mobilizando grandes produtores, empresas públicas, governos locais e as comunidades, especialmente as ribeirinhas, em torno dos pontos críticos do rio São Francisco, desenvolvendo na população a percepção da estreita relação entre desmatamento, perda de água e desertificação;


– promover a educação ambiental, principalmente das crianças e dos jovens nos centros urbanos, quanto às conseqüências do desperdício de água. As escolas e a mídia são parceiros privilegiados para implementação dessa ação.


– assegurar a preservação dos mananciais, pelo estabelecimento de florestas protetoras e proteger as margens dos rios e os topos das chapadas do Brasil Central, recuperando com prioridade absoluta suas matas ciliares;


– implantar um sistema de gestão ambiental nas áreas portuárias, de forma a assegurar sua competitividade internacional controlando rejeitos, derramamento de óleo e melhoria da qualidade dos serviços;


– promover a modernização da infra-estrutura hídrica de uso comum e de irrigação associado ao agronegócio no marco do desenvolvimento sustentável;


– estimular e facilitar a adoção de práticas agrícolas e de tecnologias de irrigação de baixo impacto sobre o solo e as águas;


– desenvolver e difundir tecnologias de reutilização da água para uso industrial;


– impedir, nos centros urbanos, a ocupação ilegal das margens de rios e lagoas, o que implica, além do cumprimento da legislação o desenvolvimento e a execução de políticas habitacionais para população de baixa renda;


– combater a poluição do solo e da água e monitorar os seus efeitos sobre o meio ambiente nas suas mais diversas modalidades, especialmente resíduos perigosos, de alta toxidade e nocivos aos recursos naturais e à vida humana.” (BRASIL, 2004a, p. 66)


Por fim, cabe tecer comentários sobre o objetivo vinte e um: pedagogia da sustentabilidade – ética e solidariedade. (BRASIL, 2004a, p. 85)


O principal fundamento da boa governança é o compromisso com a ética, entendida como um código de valores partilhados por toda a sociedade, que objetivam a proteção do conjunto de seus cidadãos contra os interesses de uma minoria, detentora de interesses, nas mais variadas vezes, exclusivamente econômicos. Ao fixar limites para o comportamento individual, a ética, em realidade, estabelece condições de previsibilidade necessárias ao bom funcionamento do corpo social, inclusive no mundo privado e dos negócios. (BRASIL, 2004a, p. 85)


A ética ambiental trouxe valores específicos com relação ao meio ambiente. Pouco (ou nunca) havia se falado tanto em preservação do patrimônio natural da humanidade pois, até alguns anos atrás, todos os recursos eram “infinitos”. No momento atual, muito mais que preocupações com a criminalidade ou problemas econômicos, os aspectos ambientais são colocados em primeiro lugar, haja vista serem base da vida. A água, até então desperdiçada das mais diversas formas, em muitos países é motivo para declarações de guerra, imposições de multas altíssimas pelo desperdício e/ou poluição. Os recursos ambientais são, na atualidade, o recurso mais valiosos que a sociedade possui. (NALINI, 2003)


Para a implementação da diretriz vinte e um, deve-se agir da seguinte forma:


“- divulgar a Carta da Terra[14] e debater os seus princípios inovadores e interdependentes nas instituições de governo, da sociedade organizada, nas escolas, universidades e empresas;


– estabelecer códigos de ética profissionais que se empenhem no cumprimento de normas e preceitos morais e éticos e que garantam a transparência de suas ações e o controle social do cidadão sobre os serviços que o afetam;


– fortalecer o Conselho de Ética do setor público;


– incentivar o maior número possível de empresas, para a adoção do princípio da responsabilidade social cooperativista;


– adotar o princípio da precaução em relação às novas tecnologias, e demais ações que não se conheçam previamente os impactos socioambientais decorrentes de sua adoção;


– combater a corrupção, a propina ou qualquer forma de cumplicidade que prejudique o bem público e o interesse legítimo dos cidadãos”. (BRASIL, 2004a, p. 85)


A Agenda 21 Brasileira surgiu não para ser mero documento com cunho sócio-ambiental. Apesar de não possuir coatividade, de forma a obrigar o poder público a agir em conformidade com o estabelecido, o documento da sustentabilidade no Brasil impõe aos governantes que adotem posturas ético-ambientais mais fortes, preservando, com relação aos recursos hídricos, a qualidade e disponibilidade da água. As ações estabelecidas são simples, bastando a boa vontade de cada governante e da sociedade como um todo para sua implementação.


4.4.2. Atitudes governamentais a serem tomadas em busca do desenvolvimento sustentável da água


A Agenda 21 Brasileira infelizmente não é um diploma normativo, ou seja, não possui caráter vinculante ao poder público. Todavia, serve como um esboço das atuações estatais em busca do desenvolvimento sustentável da água.


A principal forma de atuação do governo na busca da sustentabilidade da água é a efetivação da Agenda 21 Brasileira. Esta efetivação deverá ser realizada através de três medidas principais:


a) Alterações sobre o marco legal em vigor – a base legal e constitucional em vigor no país fornece algumas condições para impulsionar a transição para a sustentabilidade, mas a Agenda 21 Brasileira deve propor alterações nessa mesma base legal (federal, estadual e municipal) necessárias à construção da sociedade sustentável, valendo-se, inclusive, das instituições existentes no processo legislativo (MILARÉ, 2005, p. 65).


Além disso, mesmo o Brasil possuindo uma das mais avançadas legislações ambientais do mundo (SILVA, 2005, p. 845; BULOS, 2007, p. 1400), esta carece de efetividade, seja pelo desprezo dos órgãos de fiscalização ou mesmo pela falta de denúncias relatando os ilícitos cometidos. Fora isso, a população desconhece a lei que rege seu país. Diante de tal situação, o governo deve atuar de forma a dar maior efetividade a sua legislação, informando a população sobre o inteiro teor das normas ambientais relativas a água e, por fim, demonstrando onde denunciar as degradações desse recurso natural, para que as providências cabíveis sejam tomadas (BULOS, 2007, p. 1401).


b) Pacto federativo para a sustentabilidade e integração de Agendas – políticas e estratégias de ação de desenvolvimento sustentável têm como compromisso a afirmação da soberania nacional (MILARÉ, 2005, p. 65). A promoção desse desenvolvimento requer políticas públicas e a atuação harmônica por parte da União, dos Estados e Municípios, de modo a propiciar a adequada integração e abrangência das ações resultantes nas diferentes esferas de competência e sua repercussão territorial. (BRASIL, 2004b, p. 37)


c) Fortalecimento das instituições públicas – As instituições públicas devem voltar-se aos seus destinatários: a população. Estes devem exigir a implementação de políticas públicas voltadas ao desenvolvimento sustentável da água. A Agência Nacional de Águas, os Comitês de Bacias Hidrográficas e demais órgãos incumbidos da defesa da água devem atuar de forma forte e efetiva, atendendo aos anseios da sociedade em geral, primando pela conservação da água e sadia qualidade de vida da população. (BRASIL, 2004b, p. 37-38)


Por fim, estabelece a Agenda 21 Brasileira algumas estratégias para implementação de todas as medidas necessárias ao desenvolvimento sustentável dos recursos naturais, inclusa a água:


Estratégia 1 Regular o uso e a ocupação do solo por meio de métodos e técnicas de planejamento ambiental, incluindo as diversas formas de zoneamento, a articulação e o gerenciamento de unidades espaciais de importância para a biodiversidade e para a conservação dos recursos naturais, tais como corredores ecológicos, unidades de conservação, ecossistemas terrestres, costeiros e marítimos e as bacias hidrográficas.


Estratégia 2  Desenvolver e estimular procedimentos voltados à proteção e à conservação das espécies, envolvendo técnicas in situ e ex situ, proteção de ecossistemas e habitats, manejo sustentável e ações de combate ao tráfico de espécies, incidentes sobre a flora e a fauna e, no que couber, aos microorganismos.


Estratégia 3  Propor e aperfeiçoar a pesquisa e o desenvolvimento de estudos voltados ao aumento do conhecimento científico sobre a biodiversidade, incluindo  a definição de indicadores, a realização de inventários e a formação de bases de informação e disseminação do conhecimento sobre os recursos naturais.


Estratégia 4  Estabelecer medidas de controle da qualidade ambiental tendo em vista a proteção e o disciplinamento do uso dos recursos naturais e de proteção da atmosfera global, ressaltando a necessidade de promoção da eficiência na produção e no consumo de energia. A implementação dessa estratégia implicará o desenvolvimento de atividades de monitoramento e fiscalização e a adoção de ações de comando e controle, de instrumentos econômicos e de mecanismos de certificação.


Estratégia 5 Estabelecer, desenvolver e estimular o apoio aos diferentes aspectos da gestão de recursos naturais, por meio da implementação de medidas estruturais que envolvam o fortalecimento institucional, a capacitação e o treinamento dos recursos humanos, a educação ambiental e a cooperação internacional.” (BEZERRA; MUNHOZ, 2000, p. 28-30, grifo nosso)


Tais estratégias, como se observa, são de simples implementação, bastando a vontade de governantes e governados em garantir um meio ambiente equilibrado e saudável, usando apenas o necessário para a sobrevivência das gerações presentes.


4.4.3. O que cada um de nós pode fazer para contribuir


Resta traçar alguns comentários sobre as atitudes de cada indivíduo e o que se deve fazer para alcançar o desenvolvimento sustentável da água.


O conhecimento da Agenda 21 é o primeiro passo para alcançar o desenvolvimento sustentável da água. Através das campanhas estatais, todo cidadão, que assim se considerar, deverá ler sua proposta e examiná-la de forma minuciada, refletindo sobre seus princípios e objetivos.


Em segundo lugar, deve-se parar e pensar: o que estamos fazendo com a água?


É certo que, quase a totalidade das pessoas irão perceber, ao responderem a indagação acima, que o uso da água é feito de forma desidiosa, seja desperdiçando ou poluindo esse líquido tão precioso para a vida. Apesar de tudo, ao refletir mais um pouco, nota-se que pequenas atitudes podem salvar a vida humana no planeta (NALINI, 2003, p. 56). Dessa forma, tendo por base as lições de Nalini (2003, p. 56-58), aliadas aos fatos notórios do cotidiano, elencam-se como principais medidas para um consumo sustentável da água, de forma a preservá-la e garanti-la no futuro:


a) Atitudes cidadãs – ter consciência de que água é recurso finito; denunciar o mau uso e o abuso na utilização da água; denunciar a ligações clandestinas; reclamar políticas conseqüentes para a racionalização no uso dos mananciais, investimento nas bacias hidrográficas e na recuperação da qualidade das águas; exigir o controle de emissão de resíduos, o tratamento dos detritos industriais e dos esgotos; fiscalizar a observância do princípio do pagamento do poluído.


b) Atitudes Individuais – lembrar que água desperdiçada custa para o próprio bolso; utilizar apenas a quantidade necessária, não mais do que isso.


c) Atitudes singelas (são as mais importantes e fáceis de fazer) – regar as plantas pela manhã no verão com o sol ainda fraco, ou à noite. Isso evita a evaporação. No inverno, a rega pode ser alternada, dia sim, dia não. Para os vasos, não use esguicho, mas regador. Com isso, pode-se economizar 96 litros de água por dia; banhos longos devem ser evitados. Um banho de quinze minutos com o chuveiro ligado gasta 144 litros. Fechando-se o registro enquanto se ensaboa, o consumo cai para 48 litros; feche as torneiras ao escovar os dentes, pois, se com ela aberta se gasta 12 litros de água, fechando-a e utilizando um copo de água para molhar a escova e enxaguar a boca, o consumo diminui em 11,5 litros, gastando-se, ao final, apenas 0,5 litros de água; sempre que a conta de água subir de forma inesperada, sem motivo que justifique essa alta, chame o técnico, já que isso pode ser sinal de vazamento; quando se lava louça durante quinze minutos com a torneira meio aberta, consome-se 243 litros de água. O volume pode ser reduzido a 20 litros se houver prévia limpeza dos restos dos pratos, utilização de uma cuba de água para mergulhar as peças e ensaboá-las com torneira fechada; Utilizar vassoura para varrer e não esguicho. Para varrer as folhas soltas e o pó que se acumula na estrada das casas, utilize uma vassoura. Depois, jogue apenas a água necessária para lavar, não deixando que o líquido tratado seja objeto de desperdício; não se deve ligar a máquina de lavar para poucas peças. Deixe acumular roupa e louça antes de acioná-la. Sempre que possível, prefira lavagem curta. Uma lava-louças gasta 40 litros a cada funcionamento, enquanto a lavadoura de roupas utiliza 76 litros. Prefira também as marcas que se preocupem com a economia, seja de água, seja de energia elétrica; carro não é gente, sendo assim, não necessita de lavagem diária. Lavando-se o carro com mangueira semi-aberta, gasta-se até 560 litros de água em 30 minutos. Usando-se um balde de 10 litros para molhar e ensaboar e outros 3 para enxaguar, reduz-se para módicos 40 litros. Servir-se de lavadores automáticos não deve atenuar sua responsabilidade. Eles se servem da mesma água tratada, hoje conseguida a custos cada vez mais altos e que seriam mais bem destinados a garantir a sobrevivência de outros seres humanos.


Milaré (2005, p. 65-68) elenca, também, uma série de princípios que devem ser levados em conta quando se quer viver de forma sustentável:


1) Respeitar e cuidar da comunidade dos seres vivos […];


2) Melhorar a qualidade da vida humana […];


3) Conservar a vitalidade e a diversidade do planeta Terra: o desenvolvimento baseado na conservação deve incluir providências no sentido de proteger a estrutura, as funções e a diversidade dos sistemas naturais do Planeta, dos quais temos absoluta dependência;


4) Minimizar o esgotamento dos recursos naturais não-renováveis […];


5) Permanecer nos limites da capacidade de suporte do planeta Terra […];


6) Modificar atitudes e práticas pessoais: para adotar a ética de vida sustentável, as pessoas têm de reexaminar seus valores e alterar seu comportamento. A sociedade deve promover valores que apóiem esta ética, desencorajando aqueles que são incompatíveis com um modo de vida sustentável. Deve-se disseminar informação por meio da educação formal e informal, de modo que as atitudes necessárias sejam amplamente compreendidas e conscientemente adotadas;


7) Permitir que as comunidades cuidem de seu próprio meio ambiente: a ação comunitária no cuidado com o meio ambiente deve ser favorecida. […];


8) Gerar uma estrutura nacional para a integração de desenvolvimento e conservação: todas as sociedades precisam de um alicerce de informação e conhecimento, de uma estrutura de leis e instituições políticas econômicas e sociais sólidas para poder progredir de forma racional. […];


9) Construir uma aliança global […].


Agir de forma sustentável é uma tarefa simples e fácil, todavia, construir uma sociedade e um Estado pautados pelo desenvolvimento sustentável, não só da água, mas do meio ambiente, é extremamente difícil, mas não impossível. Isso porque, a consciência dos cidadãos deve ser mudada, haja vista estarem dominados pela cultura consumista do século XXI. Contudo, se cada cidadão com mente aberta der início, em sua casa, no seu trabalho, a práticas sustentáveis, de pessoa em pessoa o país irá mudar, transformando-se em um verdadeiro Estado Sustentável.


CONSIDERAÇÕES FINAIS


No decorrer do trabalho, percebeu-se que sustentabilidade e desenvolvimento sustentável são conceitos novos, ainda em formação que, todavia, estão em discussão perante todo o mundo, principalmente quando o assunto central é o meio ambiente, enfatizando a água.


O Brasil, país com a maior reserva de água doce potável do mundo, deve ser o principal alvo das grandes potências quando a água começar a acabar em seus territórios. Desta forma, deve o país ser o mediador na discussão sobre os rumos tomados pelo planeta com relação ao meio ambiente, agindo de forma a concretizar os ideais da sustentabilidade no país e difundir essa cultura perante o mundo inteiro.


Não são necessárias enormes quantias de dinheiro para garantir o desenvolvimento sustentável de um país. Mudanças efetivas devem ser realizadas. A primeira delas diz respeito ao ordenamento jurídico nacional. Deve-se, por meio dos governantes e dos órgãos fiscalizadores, dar efetividade às leis que regem os recursos hídricos no país, fazendo valer os princípios do poluidor e usuário-pagador.


Como afirmado durante todo o texto, a educação é o principal meio de difundir uma cultura de sustentabilidade. Deve-se demonstrar que, com pequenas ações, v.g. como desligar a torneira ao escovar os dentes ou ao lavar a louça, apesar da pouca economia, se levada em consideração com a economia realizada conjuntamente por todos, poderá garantir um, dois dias a mais de água para uma família.


Deve-se, também, efetivar a Agenda 21, documento de memoráveis intenções que, entretanto, é letra morta no país até os dias de hoje. Colocar em prática as sugestões da Agenda 21 Brasileira, unidas à educação ambiental, com conseqüente implementação de uma cultura de sustentabilidade e efetivação do ordenamento jurídico ambiental trará, em pouco tempo, um país melhor para viver e, acima de tudo, que garanta aos cidadãos de hoje o necessário para sua sobrevivência, e não menos importante, deixar aos cidadãos de amanhã a possibilidade de viver com todas as suas necessidades asseguradas.


 


Referências

ALMEIDA, Caroline Corrêa de. Evolução histórica da proteção jurídica das águas no Brasil. Jus Navigandi, Teresina, ano 7, n. 60, nov. 2002. Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=3421>. Acesso em: 30 jul. 2008.

BARROS, Felipe Luiz Machado. Biodiversidade e desenvolvimento sustentável. Aspectos teóricos da proteção legal brasileira ao patrimônio genético. Jus Navigandi, Teresina, ano 4, n. 44, ago. 2000. Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=1691>. Acesso em: 30 jul. 2008.

BERTOLDI, Marcia Rodrigues. Hidroguerras: o líquido cobiçado deixa de ser o petróleo. Jus Navigandi, Teresina, ano 5, n. 49, fev. 2001. Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=1701>. Acesso em: 09 maio 2008.

BEZERRA, Maria do Carmo de Lima e MUNHOZ, Tania Maria Tonelli (coord. geral). Gestão dos Recursos Naturais: subsídios à elaboração da Agenda 21 brasileira. Brasília: Ministério do Meio Ambiente; Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis; Consórcio TC/BR/FUNATURA, 2000.

BRAGA, Edson Tavares. Poluidor-pagador, uma necessidade ambiental. Jus Navigandi, Teresina, ano 6, n. 53, jan. 2002. Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=2494>. Acesso em: 09 maio 2008.

BRASIL. Comissão de Políticas de Desenvolvimento Sustentável e da Agenda 21 Nacional. Agenda 21 brasileira: ações prioritárias. 2. ed. Brasília: Ministério do Meio Ambiente, 2004.

__________. Agenda 21 brasileira: resultado da consulta nacional. 2. ed. Brasília : Ministério do Meio Ambiente, 2004.

BULOS, Uadi Lammego. Constituição Federal anotada. 7. ed. São Paulo: Saraiva, 2007.

DINIZ, Nilo; SILVA, Marina; VIANA, Gilney (org.). O desafio da sustentabilidade – um debate socioambiental no Brasil. São Paulo: Fundação Perseu Abramo, 2001.

FIGUEIREDO, Rodolfo Antônio de. A Lei nº 9.795/99 reveste-se de importância para os educadores ambientais brasileiros? Jus Navigandi, Teresina, ano 6, n. 52, nov. 2001. Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=2312>. Acesso em: 03 out. 2008.

GRANZIERA, Maria Luiza Machado. Direito das águas: disciplina jurídica das águas doces. 3. ed. São Paulo: Atlas, 2006.

GSCHWENDTNER, Loacir. O princípio constitucional do direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado. A efetividade das normas infra-constitucionais. Jus Navigandi, Teresina, ano 5, n. 51, out. 2001. Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=2276>. Acesso em: 09 maio 2008.

MACHADO, Paulo Affonso Leme. Direito ambiental brasileiro. 13. ed. São Paulo: Malheiros, 2005.

__________. Recursos hídricos: direito brasileiro e internacional. São Paulo: Malheiros, 2002.

MARTINS, Tais. O conceito de desenvolvimento sustentável e seu contexto histórico: algumas considerações. Jus Navigandi, Teresina, ano 8, n. 382, 24 jul. 2004. Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=5490>. Acesso em: 09 maio 2008.

MEDEIROS, Fernanda Luiza Fontoura de. Meio ambiente: direito e dever fundamental. Porto Alegra: Livraria do Advogado, 2004.

MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de direito administrativo. 24. ed. São Paulo : Malheiros, 2007.

MILARÉ, Édis. Direito do ambiente. 4. ed. São Paulo : Revista dos Tribunais, 2005.

MORAES, Alexandre de. Direitos humanos fundamentais: teoria geral, comentários aos arts. 1º a 5º da Constituição da República Federativa do Brasil, doutrina e jurisprudência. São Paulo: Atlas, 1998 – (Coleção temas jurídicos ; 3).

MUSETTI, Rodrigo Andreotti. Bacias hidrográficas no Brasil: aspectos jurídico-ambientais. Jus Navigandi, Teresina, ano 3, n. 35, out. 1999. Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=1700>. Acesso em: 09 maio 2008.

NALINI, José Renato. Ética ambiental. 2, ed. Campinas: Millenium, 2003.

NOGUEIRA, Rândala. Constituição e meio ambiente. Revista Jurídica da Presidência da República, Brasília, volume 7, n. 77, fev/mar 2006, p. 17-23.

NUNES JUNIOR, Amandino Teixeira. O Estado ambiental de Direito. Jus Navigandi, Teresina, ano 9, n. 589, 17 fev. 2005. Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=6340>. Acesso em: 09 maio 2008.

OLIVEIRA, Marcus Vinícius Xavier de. Considerações em torno do princípio da dignidade da pessoa humana. Jus Navigandi, Teresina, ano 6, n. 58, ago. 2002. Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=3087>. Acesso em: 09 maio 2008.

PIVA, Rui Carvalho. Bem ambiental. São Paulo : Max Limonad, 2000.

POMPEU, Cid Tomanik. Direito de águas no Brasil. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2006.

SANTOS, Fabiano Pereira dos. Meio ambiente e poluição. Jus Navigandi, Teresina, ano 8, n. 201, 23 jan. 2004. Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=4753>. Acesso em: 09 maio 2008.

SILVA, José Afonso. Comentário contextual à Constituição. 2. ed. São Paulo : Malheiros, 2006.

VIANA, José Ricardo Alvarez. O Direito Ambiental e o princípio do desenvolvimento sustentável. Jus Navigandi, Teresina, ano 6, n. 57, jul. 2002. Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=2974>. Acesso em: 30 jul. 2008.

WOLFF, Simone. Meio Ambiente x Desenvolvimento + Solidariedade = Humanidade… Revista Jurídica da Presidência da República, Brasília, volume 6, n. 67, dez 2004.


Anexo

A CARTA DA TERRA

PREÂMBULO

Estamos diante de um momento crítico na história da Terra, numa época em que a humanidade deve escolher o seu futuro. À medida que o mundo torna-se cada vez mais interdependente e frágil, o futuro enfrenta, ao mesmo tempo, grandes perigos e grandes promessas. Para seguir adiante, devemos reconhecer que, no meio da uma magnífica diversidade de culturas e formas de vida, somos uma família humana e uma comunidade terrestre com um destino comum. Devemos somar forças para gerar uma sociedade sustentável global baseada no respeito pela natureza, nos direitos humanos universais, na justiça econômica e numa cultura da paz. Para chegar a este propósito, é imperativo que nós, os povos da Terra, declaremos nossa responsabilidade uns para com os outros, com a grande comunidade da vida, e com as futuras gerações.

Terra, Nosso Lar

A humanidade é parte de um vasto universo em evolução. A Terra, nosso lar, está viva com uma comunidade de vida única. As forças da natureza fazem da existência uma aventura exigente e incerta, mas a Terra providenciou as condições essenciais para a evolução da vida. A capacidade de recuperação da comunidade da vida e o bem-estar da humanidade dependem da preservação de uma biosfera saudável com todos seus sistemas ecológicos, uma rica variedade de plantas e animais, solos férteis, águas puras e ar limpo. O meio ambiente global com seus recursos finitos é uma preocupação comum de todas as pessoas. A proteção da vitalidade, diversidade e beleza da Terra é um dever sagrado.

A Situação Global

Os padrões dominantes de produção e consumo estão causando devastação ambiental, redução dos recursos e uma massiva extinção de espécies. Comunidades estão sendo arruinadas. Os benefícios do desenvolvimento não estão sendo divididos eqüitativamente e o fosso entre ricos e pobres está aumentando. A injustiça, a pobreza, a ignorância e os conflitos violentos têm aumentado e são causa de grande sofrimento. O crescimento sem precedentes da população humana tem sobrecarregado os sistemas ecológico e social. As bases da segurança global estão ameaçadas. Essas tendências são perigosas, mas não inevitáveis.

Desafios Para o Futuro

A escolha é nossa: formar uma aliança global para cuidar da Terra e uns dos outros, ou arriscar a nossa destruição e a da diversidade da vida. São necessárias mudanças fundamentais dos nossos valores, instituições e modos de vida. Devemos entender que, quando as necessidades básicas forem atingidas, o desenvolvimento humano será primariamente voltado a ser mais, não a ter mais. Temos o conhecimento e a tecnologia necessários para abastecer a todos e reduzir nossos impactos ao meio ambiente. O surgimento de uma sociedade civil global está criando novas oportunidades para construir um mundo democrático e humano. Nossos desafios ambientais, econômicos, políticos, sociais e espirituais estão interligados, e juntos podemos forjar soluções includentes.

Responsabilidade Universal

Para realizar estas aspirações, devemos decidir viver com um sentido de responsabilidade universal, identificando-nos com toda a comunidade terrestre bem como com nossa comunidade local. Somos, ao mesmo tempo, cidadãos de nações diferentes e de um mundo no qual a dimensão local e global estão ligadas. Cada um compartilha da responsabilidade pelo presente e pelo futuro, pelo bem-estar da família humana e de todo o mundo dos seres vivos. O espírito de solidariedade humana e de parentesco com toda a vida é fortalecido quando vivemos com reverência o mistério da existência, com gratidão pelo dom da vida, e com humildade considerando em relação ao lugar que ocupa o ser humano na natureza. Necessitamos com urgência de uma visão compartilhada de valores básicos para proporcionar um fundamento ético à comunidade mundial emergente. Portanto, juntos na esperança, afirmamos os seguintes princípios, todos interdependentes, visando um modo de vida sustentável  como critério comum, através dos quais a conduta de todos os indivíduos, organizações, empresas, governos, e instituições transnacionais será guiada e avaliada.

PRINCÍPIOS

I. RESPEITAR E CUIDAR DA COMUNIDADE DA VIDA

1. Respeitar a Terra e a vida em toda sua diversidade.

a. Reconhecer que todos os seres são interligados e cada forma de vida tem valor, independentemente de sua utilidade para os seres humanos.

b. Afirmar a fé na dignidade inerente de todos os seres humanos e no potencial intelectual, artístico, ético e espiritual da humanidade.

2. Cuidar da comunidade da vida com compreensão, compaixão e amor.

a. Aceitar que, com o direito de possuir, administrar e usar os recursos naturais vem o dever de impedir o dano causado ao meio ambiente e de proteger os direitos das pessoas.

b. Assumir que o aumento da liberdade, dos conhecimentos e do poder implica responsabilidade na promoção do bem comum.

3. Construir sociedades democráticas que sejam justas, participativas, sustentáveis e pacíficas.

a. Assegurar que as comunidades em todos níveis garantam os direitos humanos e as liberdades fundamentais e proporcionem a cada um a oportunidade de realizar seu pleno potencial.

b. Promover a justiça econômica e social, propiciando a todos a consecução de uma subsistência significativa e segura, que seja ecologicamente responsável.

4. Garantir as dádivas e a beleza da Terra para as atuais e as futuras gerações.

a. Reconhecer que a liberdade de ação de cada geração é condicionada pelas necessidades das gerações futuras.

b. Transmitir às futuras gerações valores, tradições e instituições que apóiem, em longo prazo, a

prosperidade das comunidades humanas e ecológicas da Terra.

Para poder cumprir estes quatro amplos compromissos, é necessário:

II. INTEGRIDADE ECOLÓGICA

5. Proteger e restaurar a integridade dos sistemas ecológicos da Terra, com especial preocupação pela diversidade biológica e pelos processos naturais que sustentam a vida.

a. Adotar planos e regulamentações de desenvolvimento sustentável em todos os níveis que façam com que a conservação ambiental e a reabilitação sejam parte integral de todas as iniciativas de desenvolvimento.

b. Estabelecer e proteger as reservas com uma natureza viável e da biosfera, incluindo terras selvagens e áreas marinhas, para proteger os sistemas de sustento à vida da Terra, manter a biodiversidade e preservar nossa herança natural.

c. Promover a recuperação de espécies e ecossistemas ameaçadas.

d. Controlar e erradicar organismos não-nativos ou modificados geneticamente que causem dano às espécies nativas, ao meio ambiente, e prevenir a introdução desses organismos daninhos.

e. Manejar o uso de recursos renováveis como água, solo, produtos florestais e vida marinha de forma que não excedam as taxas de regeneração e que protejam a sanidade dos ecossistemas.

f. Manejar a extração e o uso de recursos não-renováveis, como minerais e combustíveis fósseis de forma que diminuam a exaustão e não causem dano ambiental grave.

6. Prevenir o dano ao ambiente como o melhor método de proteção ambiental e, quando o conhecimento for limitado, assumir uma postura de precaução.

a. Orientar ações para evitar a possibilidade de sérios ou irreversíveis danos ambientais mesmo quando a informação científica for incompleta ou não conclusiva.

b. Impor o ônus da prova àqueles que afirmarem que a atividade proposta não causará dano significativo e fazer com que os grupos sejam responsabilizados pelo dano ambiental.

c. Garantir que a decisão a ser tomada se oriente pelas conseqüências humanas globais, cumulativas, de longo prazo, indiretas e de longo alcance.

d. Impedir a poluição de qualquer parte do meio ambiente e não permitir o aumento de substâncias radioativas, tóxicas ou outras substâncias perigosas.

e. Evitar que atividades militares causem dano ao meio ambiente.

7. Adotar padrões de produção, consumo e reprodução que protejam as capacidades regenerativas da Terra, os direitos humanos e o bem-estar comunitário.

a. Reduzir, reutilizar e reciclar materiais usados nos sistemas de produção e consumo e garantir que os resíduos possam ser assimilados pelos sistemas ecológicos.

b. Atuar com restrição e eficiência no uso de energia e recorrer cada vez mais aos recursos energéticos renováveis, como a energia solar e do vento.

c. Promover o desenvolvimento, a adoção e a transferência eqüitativa de tecnologias ambientais saudáveis.

d. Incluir totalmente os custos ambientais e sociais de bens e serviços no preço de venda e habilitar os consumidores a identificar produtos que satisfaçam as mais altas normas sociais e ambientais.

e. Garantir acesso universal à assistência de saúde que fomente a saúde reprodutiva e a reprodução responsável.

f. Adotar estilos de vida que acentuem a qualidade de vida e subsistência material num mundo finito.

8. Avançar o estudo da sustentabilidade ecológica e promover a troca aberta e a ampla aplicação do conhecimento adquirido.

a. Apoiar a cooperação científica e técnica internacional relacionada a sustentabilidade, com especial atenção às necessidades das nações em desenvolvimento.

b. Reconhecer e preservar os conhecimentos tradicionais e a sabedoria espiritual em todas as culturas que contribuam para a proteção ambiental e o bem-estar humano.

c. Garantir que informações de vital importância para a saúde humana e para a proteção ambiental, incluindo informação genética, estejam disponíveis ao domínio público.

III. JUSTIÇA SOCIAL E ECONÔMICA

9. Erradicar a pobreza como um imperativo ético, social e ambiental.

a. Garantir o direito à água potável, ao ar puro, à segurança alimentar, aos solos nãocontaminados, ao abrigo e saneamento seguro, distribuindo os recursos nacionais e internacionais requeridos.

b. Prover cada ser humano de educação e recursos para assegurar uma subsistência sustentável, e proporcionar seguro social e segurança coletiva a todos aqueles que não são capazes de manter-se por conta própria.

c. Reconhecer os ignorados, proteger os vulneráveis, servir àqueles que sofrem, e permitir-lhes desenvolver suas capacidades e alcançar suas aspirações.

10. Garantir que as atividades e instituições econômicas em todos os níveis promovam o desenvolvimento humano de forma eqüitativa e sustentável.

a. Promover a distribuição eqüitativa da riqueza dentro das e entre as nações.

b. Incrementar os recursos intelectuais, financeiros, técnicos e sociais das nações em desenvolvimento e isentá-las de dívidas internacionais onerosas.

c. Garantir que todas as transações comerciais apóiem o uso de recursos sustentáveis, a proteção ambiental e normas trabalhistas progressistas.

d. Exigir que corporações multinacionais e organizações financeiras internacionais atuem com transparência em benefício do bem comum e responsabilizá-las pelas conseqüências de suas atividades.

11. Afirmar a igualdade e a eqüidade de gênero como pré-requisitos para o desenvolvimento sustentável e assegurar o acesso universal à educação, assistência de saúde e às oportunidades econômicas.

a. Assegurar os direitos humanos das mulheres e das meninas e acabar com toda violência contra elas.

b. Promover a participação ativa das mulheres em todos os aspectos da vida econômica, política, civil, social e cultural como parceiras plenas e paritárias, tomadoras de decisão, líderes e beneficiárias.

c. Fortalecer as famílias e garantir a segurança e a educação amorosa de todos os membros da família.

12. Defender, sem discriminação, os direitos de todas as pessoas a um ambiente natural e social, capaz de assegurar a dignidade humana, a saúde corporal e o bem-estar espiritual, concedendo especial atenção aos direitos dos povos indígenas e minorias.

a. Eliminar a discriminação em todas suas formas, como as baseadas em raça, cor, gênero, orientação sexual, religião, idioma e origem nacional, étnica ou social.

b. Afirmar o direito dos povos indígenas à sua espiritualidade, conhecimentos, terras e recursos, assim como às suas práticas relacionadas a formas sustentáveis de vida.

c. Honrar e apoiar os jovens das nossas comunidades, habilitando-os a cumprir seu papel essencial na criação de sociedades sustentáveis.

d. Proteger e restaurar lugares notáveis pelo significado cultural e espiritual.

IV.DEMOCRACIA, NÃO VIOLÊNCIA E PAZ

13. Fortalecer as instituições democráticas em todos os níveis e proporcionar-lhes transparência e prestação de contas no exercício do governo, participação inclusiva na tomada de decisões, e acesso à justiça.

a. Defender o direito de todas as pessoas no sentido de receber informação clara e oportuna sobre assuntos ambientais e todos os planos de desenvolvimento e atividades que poderiam afetá-las ou nos quais tenham interesse.

b. Apoiar sociedades civis locais, regionais e globais e promover a participação significativa de todos os indivíduos e organizações na tomada de decisões.

c. Proteger os direitos à liberdade de opinião, de expressão, de assembléia pacífica, de associação e de oposição.

d. Instituir o acesso efetivo e eficiente a procedimentos administrativos e judiciais independentes, incluindo retificação e compensação por danos ambientais e pela ameaça de tais danos.

e. Eliminar a corrupção em todas as instituições públicas e privadas.

f. Fortalecer as comunidades locais, habilitando-as a cuidar dos seus próprios ambientes, e atribuir responsabilidades ambientais aos níveis governamentais onde possam ser cumpridas mais efetivamente.

14. Integrar, na educação formal e na aprendizagem ao longo da vida, os conhecimentos, valores e habilidades necessárias para um modo de vida sustentável.

a. Oferecer a todos, especialmente a crianças e jovens, oportunidades educativas que lhes permitam contribuir ativamente para o desenvolvimento sustentável.

b. Promover a contribuição das artes e humanidades, assim como das ciências, na educação para sustentabilidade.

c. Intensificar o papel dos meios de comunicação de massa no sentido de aumentar a sensibilização para os desafios ecológicos e sociais.

d. Reconhecer a importância da educação moral e espiritual para uma subsistência sustentável.

15. Tratar todos os seres vivos com respeito e consideração.

a. Impedir crueldades aos animais mantidos em sociedades humanas e protegê-los de sofrimentos.

b. Proteger animais selvagens de métodos de caça, armadilhas e pesca que causem sofrimento extremo, prolongado ou evitável.

c. Evitar ou eliminar ao máximo possível a captura ou destruição de espécies não visadas.

16. Promover uma cultura de tolerância, não violência e paz.

a. Estimular e apoiar o entendimento mútuo, a solidariedade e a cooperação entre todas as pessoas, dentro das e entre as nações.

b. Implementar estratégias amplas para prevenir conflitos violentos e usar a colaboração na resolução de problemas para manejar e resolver conflitos ambientais e outras disputas.

c. Desmilitarizar os sistemas de segurança nacional até chegar ao nível de uma postura não provocativa da defesa e converter os recursos militares em propósitos pacíficos, incluindo restauração ecológica.

d. Eliminar armas nucleares, biológicas e tóxicas e outras armas de destruição em massa.

e. Assegurar que o uso do espaço orbital e cósmico mantenha a proteção ambiental e a paz.

f. Reconhecer que a paz é a plenitude criada por relações corretas consigo mesmo, com outras pessoas, outras culturas, outras vidas, com a Terra e com a totalidade maior da qual somos parte.

O CAMINHO ADIANTE

Como nunca antes na história, o destino comum nos conclama a buscar um novo começo. Tal renovação é a promessa dos princípios da Carta da Terra. Para cumprir esta promessa, temos que nos comprometer a adotar e promover os valores e objetivos da Carta.

Isto requer uma mudança na mente e no coração. Requer um novo sentido de interdependência global e de responsabilidade universal. Devemos desenvolver e aplicar com imaginação a visão de um modo de vida sustentável aos níveis local, nacional, regional e global. Nossa diversidade cultural é uma herança preciosa, e diferentes culturas encontrarão suas próprias e distintas formas de realizar esta visão. Devemos aprofundar expandir o diálogo global gerado pela Carta da Terra, porque temos muito que aprender a partir da busca iminente e conjunta por verdade e sabedoria.

A vida muitas vezes envolve tensões entre valores importantes. Isto pode significar escolhas difíceis. Porém, necessitamos encontrar caminhos para harmonizar a diversidade com a unidade, o exercício da liberdade com o bem comum, objetivos de curto prazo com metas de longo prazo. Todo indivíduo, família, organização e comunidade têm um papel vital a desempenhar. As artes, as ciências, as religiões, as instituições educativas, os meios de comunicação, as empresas, as organizações não-governamentais e os governos são todos chamados a oferecer uma liderança criativa. A parceria entre governo, sociedade civil e empresas é essencial para uma governabilidade efetiva.

Para construir uma comunidade global sustentável, as nações do mundo devem renovar seu compromisso com as Nações Unidas, cumprir com suas obrigações respeitando os acordos internacionais existentes e apoiar a implementação dos princípios da Carta da Terra com um instrumento internacional legalmente unificador quanto ao ambiente e ao desenvolvimento.

Que o nosso tempo seja lembrado pelo despertar de uma nova reverência face à vida, pelo compromisso firme de alcançar a sustentabilidade, a intensificação da luta pela justiça e pela paz, e a alegre celebração da vida.


Notas:

[1] Nesse sentido, cf. WOLFF, 2004.

[2] É um patrimônio comum da humanidade, um “fideicomisso planetário” (expressão utilizada na Declaração de Amsterdam – 1991). O Código de Alfonso X, “As Sete Partidas”, compilação legislativa realizada entre 1256 e 1265, considerava a água como um bem comum, res communis, não suscetível de apropriação privada. Este conceito no Direito Romano significava que o ar, as águas correntes, o mar e suas praias eram comuns a todos. Hodiernamente a Declaração de Estocolmo de 1972 em seu 5º Princípio considera as águas como “patrimônio comum da humanidade”. Entretanto o regime suicida de mercado no qual estamos mergulhados, a trata como um recurso privado e apenas respinga ou goteja o líquido aos menos abundados – leia-se descriminados. Nascem conflitos, insegurança, apropriação indevida, etc.  (BERTOLDI, 2001)

[3] Bem ambiental é um valor difuso, imaterial ou material, que serve de objeto mediato a relações jurídica de natureza ambiental. […] Trata-se de um bem difuso, um bem protegido por um direito que visa assegurar um interesse transindividual, de natureza indivisível, de que sejam titulares pessoas indeterminadas e ligadas por circunstâncias de fato. (PIVA, 2000,  p. 114)

[4] Nesse sentido, cf. GRANZIERA, 2006, p. 23-24; MACHADO, 2002, p. 22. Contra: CARVALHO, 2007, p. 10 et seq.

[5] Nesse sentido, cf. MILARÉ, 2005, p. 160-161.

[6] A informação ambiental não tem o fim exclusivo de formar a opinião pública. Valioso formar a consciência ambiental, mas com canais próprios, administrativos e judiciais, para manifestar-se. O grande destinatário da informação – o povo, em todos os seus segmentos, incluindo o científico não-governamental tem o que dizer e opinar. (MACHADO, 2005, p. 88)

[7] O equilíbrio ecológico não significa uma permanente inalterabilidade das condições naturais. Contudo, a harmonia ou a proporção e a sanidade entre os vários elementos que compõem a ecologia – populações, comunidades, ecossistemas e a biosfera – hão de ser buscadas intensamente pelo Poder Público e por todas as pessoas. (MACHADO, 2005, p. 119)

[8] Constituição Federal:

Art. 225. Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá- lo para as presentes e futuras gerações. […]

§ 3º – As condutas e atividades consideradas lesivas ao meio ambiente sujeitarão os infratores, pessoas físicas ou jurídicas, a sanções penais e administrativas, independentemente da obrigação de reparar os danos causados.

[9] […] a grande divergência entre economia e meio ambiente consiste no fato de que a natureza é estruturada em eventos cíclicos, ao passo que a economia em comportamentos lineares. Enquanto no meio ambiente um determinado comportamento humano pode gerar um impacto ambiental, seguindo-se-lhe um efeito em cascata passível de afetar o próprio ser humano, ante a interdependência e interconexão dos seres e elementos que compõem o globo terrestre; na economia o que importa é a lei da oferta e da procura, a busca de novos mercados. Enfim, o lucro, mesmo que à custa de danos ao meio ambiente, considerados, invariavelmente, como externalidades na visão do empresário desavisado e descompromissado socialmente. (VIANA, 2002)

[10] A ética de cuidados se aplica tanto em nível internacional como em níveis nacionais e individual; nenhuma nação é auto-suficiente; todos lucrarão com a sustentabilidade mundial e todos estarão ameaçados se não conseguirmos atingi-la. (BOFF apud NALINI, 2003, p. 151)

[11]  Nesse sentido, cf. GRANZIERA, 2006, p. 60 et seq.

[12] Cada um real investido em saneamento básico propicia a economia de cinco reais em atendimento médico. Com algumas pequenas variações, é essa a conta feita pelos estudiosos do assunto para reivindicar a ampliação dos investimentos nesse setor vital para a economia e a saúde de uma nação. Além do mais, eticamente é inaceitável que expressiva parcela da população brasileira não disponha de coleta de esgotos e lixo.

Na conta da falta de saneamento ambiental, deve ser incluído o custo de despoluição de rios e baías. Os corpos d’água, contaminados, têm sua produtividade reduzida, o que representa mais um prejuízo econômico, seja de forma direta, pela indisponibilidade, ou pela conseqüência sobre a saúde da população, diminuindo sua produtividade e sobrecarregando a rede hospitalar.

Deve-se ter em mente que “universalizar o saneamento” implica divulgar técnicas e prover recursos para o abastecimento de água e a disposição de esgoto e lixo, também, nas zonas rurais. Torna-se necessária, portanto, uma ação coordenada que ultrapasse os limites do espaço urbano. Nas zonas rurais, é importante que dejetos de animais sejam adequadamente dispostos e/ou tratados, pois, não são raros os casos em que contaminam rios, riachos e lençóis subterrâneos de água, contribuindo para o surgimento de doenças de veiculação hídrica. (BRASIL, 2004a, p. 51)

[13] As ações do Objetivo nº 15 são as mais importantes da Agenda 21 com relação a água, pois tratam exatamente da grande problemática atinente ao Brasil: a não aceitação pelo povo brasileiro de que a água é um bem escasso e que poderá um dia acabar.

[14] Conferir ao final do trabalho o texto integral da Carta da Terra.

Informações Sobre os Autores

Diogo de Sousa Lemos

Bacharel em Direito pela Fundação Universidade do Tocantins. Servidor do Ministério Público do Estado do Tocantins

Thais Rodrigues Mariano de Sousa Lemos

Bacharel em Direito pela Fundação Universidade do Tocantins. Servidora da Fundação Universidade Federal do Tocantins.


Equipe Âmbito Jurídico

Recent Posts

TDAH tem direito ao LOAS? Entenda os critérios e como funciona o benefício

O Benefício de Prestação Continuada (BPC), mais conhecido como LOAS (Lei Orgânica da Assistência Social),…

4 horas ago

Benefício por incapacidade: entenda como funciona e seus aspectos legais

O benefício por incapacidade é uma das principais proteções oferecidas pelo INSS aos trabalhadores que,…

4 horas ago

Auxílio reclusão: direitos, requisitos e aspectos jurídicos

O auxílio-reclusão é um benefício previdenciário concedido aos dependentes de segurados do INSS que se…

4 horas ago

Simulação da aposentadoria: um guia completo sobre direitos e ferramentas

A simulação da aposentadoria é uma etapa fundamental para planejar o futuro financeiro de qualquer…

4 horas ago

Paridade: conceito, aplicação jurídica e impacto nos direitos previdenciários

A paridade é um princípio fundamental na legislação previdenciária brasileira, especialmente para servidores públicos. Ela…

4 horas ago

Aposentadoria por idade rural

A aposentadoria por idade rural é um benefício previdenciário que reconhece as condições diferenciadas enfrentadas…

4 horas ago