Aspectos relevantes e controversos da Lei nº 6.368/76

-Por política criminal pode ser
admitida tentativa de auxílio por alguém que leva entorpecente para ser usado
para parente ou amásio preso? Em alguns casos, tem sido possibilitada a
concessão de sursis até o livramento condicional.(art.12-par.2º, inciso I).

Primeiramente antes de adentrarmos ao
problema focado acima, mister se faz trazer a baila o disposto no art.12 da lei
6.368/76.

Vejamos:

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Art. 12.

Importar ou exportar, remeter,
preparar, produzir, fabricar, adquirir, vender, expor à venda ou oferecer, fornecer
ainda que gratuitamente, ter em depósito, transportar, trazer consigo, guardar,
prescrever, ministrar ou entregar, de qualquer forma, a consumo substância
entorpecente ou que determine dependência física ou psíquica, sem autorização
ou em desacordo com determinação legal ou regulamentar;

Pena – Reclusão, de 3 (três) a
15 (quinze) anos, e pagamento de 50 (cinqüenta) a 360 (trezentos e sessenta)
dias-multa.

§ 1º Nas mesmas penas incorre
quem, indevidamente:

I – importa ou exporta, remete,
produz, fabrica, adquire, vende, expõe à venda ou oferece, fornece ainda que
gratuitamente, tem em depósito, transporta, traz consigo ou guarda
matéria-prima destinada a preparação de substância entorpecente ou que
determine dependência física ou psíquica;

II – semeia, cultiva ou faz a
colheita de plantas destinadas à preparação de entorpecente ou de substância
que determine dependência física ou psíquica.

§ 2º
Nas mesmas penas incorre, ainda, quem:

I – induz, instiga ou auxilia
alguém a usar entorpecente ou substância que determine dependência física ou
psíquica;

II – utiliza local de que tem a
propriedade, posse, administração, guarda ou vigilância, ou consente que outrem
dele se utilize, ainda que gratuitamente, para uso indevido ou tráfico ilícito
de entorpecente ou de substância que determine dependência fisica ou psíquica.

III – contribui de qualquer
forma para incentivar ou difundir o uso indevido ou o   tráfico ilícito de
substância entorpecente ou que determine dependência física ou psíquica.

Divergências há entre eminentes
juristas, bem como em relação ao posicionamento jurisprudencial, quanto a
admissibilidade de tentativa na configuração do delito de tráfico de
entorpecentes.

Para os que entendem ser inadmissível,
aduzem que, mesmo que esse delito venha a ser praticado por alguém em auxílio
do usuário parente ou amásio, recolhido ou não, uma vez iniciada a ação,
considera-se o delito consumado, vez que o tipo do art.12 da Lei de Tóxicos
constitui-se de múltiplas modalidades de conduta, bastando o cometimento de
qualquer uma delas para tipificar o crime.

Basta, pois, o simples fato de trazer
consigo substância entorpecente destinada ao fornecimento a terceiro, já
estaria caracterizado o delito.

E ainda, se o mesmo for praticado
dentro de Estabelecimento Penal, incidirá na qualificadora do art.18, inciso IV
da lei nº 6.368/76.

Vejamos entendimento jurisprudencial a
respeito:

“TÓXICO – TRÁFICO INTERNACIONAL DE
ENTORPECENTES (LEI Nº 6.368/76) – PROVAS – AUTORIA E MATERIALIDADE COMPROVADAS
– DESCLASSIFICAÇÃO PARA O DELITO DE USO DESCABÍVEL – PROGRESSÃO DO REGIME
PRISIONAL – IMPOSSIBILIDADE – TENTATIVA INADMISSÍVEL – SEMI IMPUTABILIDADE
RECONHECIDA – PENAS RESTRITIVAS DE DIREITOS – INAPLICABILIDADE – 1 – A
materialidade delitiva resta comprovada quando o Laudo de Constatação resulta
positivo para cocaína. 2 – Há de ser afastada a desclassificação para o delito
de uso (art. 16, da Lei nº 6.368/76), haja vista que ninguém sai de outro
extremo do continente para vir até o Brasil a fim de suprir sua dependência
toxicológica ingerindo 992,0 g de cocaína camuflada em cápsulas revestidas com
fita isolante. 3 – É de rigor o reconhecimento da traficância internacional, em
face das provas contundes de que a droga ingerida pelo acusado se destina ao
comércio exterior. 4 – Não há que se falar em inconstitucionalidade do § 1º do
art. 2º da Lei nº 8.072/90 eis que o crime em tela ocorreu em plena vigência da
mencionada lei, a qual reservou uma punição mais severa para aqueles que
praticam tal delito, vedando a progressividade para um regime mais favorável. 5
– Não há que se falar em desclassificação do delito para a forma tentada uma
vez que para a configuração do delito tipificado no art. 12 da Lei nº 6.368/76,
basta que a conduta do agente esteja subsumida numa das ações expressas no
referido dispositivo legal. 6 – Comprovado por perícia médica que o acusado, ao
tempo da ação, possuía sua capacidade de discernimento obstruída pelo uso da
droga, é facultado ao julgador a redução da pena com fulcro no art. 19,
parágrafo único da Lei nº 6.368/76. 7 – Descabível a aplicação das penas
restritivas de direitos ao presente caso, pois tal modalidade de pena é
reservada somente à pequena criminalidade não alcançando crimes de intensa
relevância como o tráfico internacional de drogas, uma vez que se trata de
crime hediondo, o qual já traz em si, a violência presumida jure et jure. 8.
Recurso parcialmente provido. (TRF 3ª R. –
ACr 98.03.090789-1 – SP – 1ª T. – Rel. Des. Fed. Roberto Haddad – DJU 15.06.1999
– p. 709)”

“SUBSTÂNCIA ENTORPECENTE -TRÁFICO
ILÍCITO NO INTERIOR DE ESTABELECIMENTO PENAL- TENTATIVA-
INADMISSIBILIDADE-ART.18-INC.IV- LEI DE TÓXICOS.
(TJRJ-Acr15/97-(reg.211197)-Cód.97.050.00015-ªC.Crim.-Rel.Des.Joaquim
Mouzinho-j.09.09.1997)”

“SUBSTÂNCIA ENTORPECENTE-TRÁFICO
ILÍCITO NO INTERIOR DE ESTABELECIMENTO PENAL- CAUSA ESPECIAL DE AUMENTO DA
PENA-ART.18-INC.IV- LEI DE TÓXICOS- Penal. Lei Antitóxicos. Visita íntima.
Busca regulamentar. Posse de substância entorpecente para uso de terceiro no
interior de estabelecimento penal. 1. Opera com dolo abrangente a companheira
do apenado que se vê surpreendida na posse de substância entorpecente, quando
da busca pessoal, ao se dirigir ao interior do estabelecimento penal para a
realização da visita íntima com seu parceiro; 2. Configuração típica no art.12
da Lei nº 6.368/76, na modalidade de trazer consigo para uso de terceiro; 3.
Olvidada a aplicação da causa especial de aumento de pena de natureza auTônoma
inscrita no artigo 18, IV do citado diploma legal, que incide no obrar típico,
abrangendo todo e qualquer lugar da unidade prisional. 4. recuro
improvido.(TJRJ-Acr 808/97-(reg.141197)-Cod. 97.050.00808-3ª
C.Crim.-Rel.Des.Álvaro Mayrink da Costa-j. 16.09.1997)”.

Jurisprudência a favor da tentativa:

“TÓXICO – ENTREGA DA DROGA AO PRÓPRIO
FILHO – MEDIAÇÃO DE TERCEIROS – INTERCEPTAÇÃO POR POLICIAL – TENTATIVA –
CONFIGURAÇÃO – CO-RÉUS – TRANSPORTE DE ENTORPECENTE – CONDENAÇÃO – MERA
SUSPEITA – INADMISSIBILIDADE –

Se a entrega da droga ao filho, através
de terceiros, não se efetivou, em face da interceptação do policial à pessoa
que a portava, configurada restou a tentativa. Situações de mera suspeita não
podem conduzir à condenação, que deve ter por suporte prova firme e segura da
realização de uma conduta positiva ou negativa. (TJMG – ACr 137.473/5 – 2ª
C.Crim. – Rel. Des. José Arthur –
J. 04.03.1999)”

“ENTORPECENTE – TRÁFICO – CONFISSÃO
EXTRAJUDICIAL E RETRATAÇÃO EM JUÍZO – PEQUENA QUANTIDADE DE DROGA –
CARACTERIZAÇÃO DE DELITO PREVISTO NO ART. 12 DA LEI ANTITÓXICOS – Finalidade
específica do transporte da droga. Fornecimento a preso. Singularidade do fato.
Crime não consumado. Não descaracteriza o delito de tráfico de entorpecentes o
fato de ter sido apreendida pequena quantidade do tóxico. Se a ré transporta a
droga com a finalidade de fornecê-la a condenado preso, e a entrega não se
efetiva em razão de revista policial no presídio, a figura típica é a da
tentativa. (TJMG – ACr 114.642/2 – 2ª C.Crim. – Rel. Des. Herculano Rodrigues –
J. 25.06.1998)”

“TÓXICO – TRÁFICO – DESCLASSIFICAÇÃO –
NÃO CABIMENTO – ART. 16 DA LEI ESPECÍFICA – TENTATIVA – TIPICIDADE – PENA –
FIXAÇÃO – REGIME INTEGRALMENTE FECHADO – CONSTITUCIONALIDADE – PROGRESSÃO –
IMPOSSIBILIDADE – “Se resultou suficientemente provado que o acusado
trazia consigo a droga para fazer entrega dela ao amigo preso que lhe
solicitara, torna-se inteiramente descabida a desclassificação por ele
pretendida”. “O crime previsto no art. 16 da Lei 6.368/76, na ação de
adquirir, embora pesem respeitáveis opiniões em contrário, admite a forma
tentada. Realmente, na modalidade em exame, o delito é instantâneo, que se
consuma com o recebimento do tóxico. Ora, se o entorpecente não chega às mãos
do destinatário, é evidente que o crime não se aperfeiçoou, ficando na forma
tentada”. “Compete ao juiz, na fixação da pena, atender às
circunstâncias judiciais, conforme seja necessário e suficiente para reprovação
e prevenção do crime. Assim, impõe-se a pena necessária para atender ao grau de
reprovação da conduta. E ela deve ser suficiente para prevenir o crime
(prevenção genérica e específica)”. “O cumprimento da pena no regime
fechado já teve sua constitucionalidade reconhecida pela Suprema Corte (HC
69.657-1), não sendo mais possível dizer-se contrário à Carta Magna o art. 2º,
§ 1º, da Lei nº 8.072/90, que assim estabelece. Esse posicionamento não é
abalado pela Lei nº 9.455/97, que trata da prática de tortura, conforme também
já decidido pelo plenário do Pretório Excelso, por expressiva maioria (HC
76.371/SP, Rel. Sydney Sanches)”. (Acórdão e ass. no verso). (TJMG – ACr 141.870/6
– 2ª C.Crim. – Rel. Des. José Arthur –
J. 10.06.1999)”

“SUBSTÂNCIA ENTORPECENTE – TRÁFICO
ILÍCITO NO INTERIOR DE ESTABELECIMENTO PENAL – RETRATAÇÃO EM JUÍZO – CONFISSÃO
POLICIAL – PREVALÊNCIA – DESCLASSIFICAÇÃO PARA USO – INADMISSIBILIDADE – INDIVIDUALIZAÇÃO
DA PENA – CRITÉRIO DE FIXAÇÃO – Crime contra a saúde pública. Entorpecente.
Autoria. Confissão policial. Ressonância no processo. Retratação judicial
escoteira. Prevalência da confissão. Sistema do livre convencimento.
Testemunhas de visu. Depoimentos seguros e coerentes. Negativa irrelevante.
Tráfico ilícito. Maconha. Trazer consigo. Falta de autorização legal ou
regulamentar. Conduta comum ao uso indevido. Pesquisa do dolo específico.
Princípio da exclusão. Delito caracterizado. Desclassificação do delito.
Tráfico ilícito para uso indevido. Prova da exclusividade do uso próprio. Ônus
da defesa. Lição de Greco Filho. Ausência de prova. Pretensão descartada.
Majorante ou agravante especial da pena. Crime de entorpecente no interior de
estabelecimento penal. Crime impossível por ineficácia absoluta do meio.
Omissão de vigilância da autoridade. Presídio de segurança máxima. Guarda
absoluta do Estado. Presidiário como tutelado do Estado. Condições em que o
preso não perde o juízo de responsabilidade e nem se inscreve como inimputável.
Pena. Individualização. Estatura constitucional. Reforma penal, de 1984.
Critério de aplicação. Necessidade e suficiência para reprovação e prevenção do
crime. Circunstâncias judiciais, legais e causas de aumento bem apenadas.
Redução descartada. A retratação, segundo a jurisprudência, somente pode ser
admitida quando embasada em elementos probatórios, suficientemente fortes, que
elidam a confissão. A confissão policial, ressonante no processo, prevalece
sobre escoteira retratação judicial. O Juiz formará sua convicção pela livre
apreciação da prova. A autoria do delito, evidenciada por depoimentos de
testemunhas de visu, seguros e coerentes, não se queda, no sistema do livre
convencimento, diante de simples e obstinada negativa do agente. Adquirir,
guardar ou trazer consigo, sem autorização legal ou regulamentar, substância
entorpecente, são condutas comuns aos delitos de tráfico ilícito e de uso
indevido, do que resulta, pelo princípio da exclusão, quando não se tratar de
uso indevido, reconhecer o narcotráfico. Caracteriza o delito de tráfico
ilícito de substância entorpecente, trazer consigo, sem autorização legal ou
regulamentar, maconha, em doses unitárias, de pequenos sacos, embalagem usual
do varejo da droga. O ônus da prova da exclusividade de uso próprio, escreve
Greco Filho, é da defesa.

Não cabe a desclassificação do delito
de tráfico ilícito de substância entorpecente, para o de uso indevido, quando
ausente a prova, a cargo da defesa, de exclusividade do uso próprio. Não se
pune a tentativa quando, por ineficácia absoluta do meio ou por absoluta
impropriedade do objeto, é impossível consumar-se o crime. O meio é
absolutamente ineficaz, escreve Delmanto, quando totalmente inadequado ou
idôneo para alcançar o resultado criminoso. É infausto o argumento da
ocorrência do fato criminoso, em se tratando de presídio de segurança máxima,
por omissão de vigilância das autoridades responsáveis pela guarda do preso,
que não impediram a entrada do tóxico no estabelecimento penal. A culpa da
autoridade, por omissão na vigilância, mesmo comprovada, não exclui a
responsabilidade penal do acusado, interno ou não, pelo crime que cometer no
interior do presídio. O preso, embora privado de sua liberdade individual,
preserva a capacidade de entender e querer, pelo que não perde o juízo de
responsabilidade e nem se inscreve entre os inimputáveis. Em face da Reforma
Penal, de 1984, preponderá, na aplicação da pena, o que seja necessário e
suficiente para reprovação e prevenção do crime. Não merece censura, a apenação
assentada em aprofundada apreciação das circunstâncias judiciais, legal e causa
especial de aumento, a demonstrar no seu raciocínio operativo sintonia com o
princípio individualizador da pena, hoje de estatura constitucional. (TJRJ –
ACr 229/96 – (Reg. 260398) – Cód. 96.050.00229 – RJ – 2ª C.Crim. – Rel. Des.
Enéas Cotta – J. 02.09.1997)”

“TÓXICO – Pena-base. Tráfico
internacional. Tentativa. Art. 2º, § 1º, da L. 8.072/90. Constitucionalidade.
Se as circunstâncias judiciais não são totalmente favoráveis ao réu, não deve a
pena-base ser a pena mínima prevista. Para caracterização da circunstância da
internacionalidade basta que o tóxico seja introduzido no país com o fim de
comercialização. O fato de o réu ter sido pego no Posto de Fiscalização não
caracteriza tentativa de tráfico, pois o crime consuma-se pelo “trazer consigo
e transportar” o tóxico. O art. 2º, § 1º, da L. 8.072/90, que prevê seja a pena
cumprida integralmente no regime fechado, não é inconstitucional. (TRF 4ª R. –
ACr. 97.04.20626-7 – PR – 1ª T – Rel. Juiz Fábio B. da Rosa – DJU 29.10.1997)”

-Quanto
à aplicação da Lei 8.072/90, no caso em tela, a reforma da parte geral do CP
(Lei 7.209, de 11.07.1984) e a LEP (Lei 7.210/84) consagram, respectivamente,
no art. 33, § 2º e 112, um sistema progressivo de execução das penas privativas
de liberdade, baseado, principalmente, no mérito do apenado e no tempo de
cumprimento da pena no regime anterior.

Ignorando esta moderna sistemática
adotada pelo nosso direito penal, a Lei 8.072/90 – que dispõe sobre os crimes
hediondos -, num retrocesso lamentável, proibiu a progressão na execução das
penas corporais, ao estabelecer no seu art. 2º, § 1º, que a pena aplicada aos
condenados por crimes hediondos, tortura, tráfico ilícito de entorpecentes e
drogas afins e terrorismo, será cumprida integralmente em regime fechado.

Algumas decisões judiciais sustentam a
incompatibilidade entre o sursis e a norma do § 1º, do art. 2º, da L. 8.072/90,
tendo em vista a imposição do cumprimento total da pena no regime mais gravoso.

O equívoco nos parece manifesto. Seja
do ponto de vista hermenêutico, seja do ponto de vista lógico, essa
interpretação não merece subsistir.

É regra primária de hermenêutica que as
normas que restringem direitos individuais devem ser interpretadas
restritivamente. Se a Lei. 8.072/90 não vetou expressamente a suspensão
condicional da pena, o hermeneuta não pode lançar mão de interpretação
dilatória ou ampliativa, para fazer incluir no rol de proibições de direitos e
garantias, elencadas no referido texto legal, mais esta restrição.

Inexiste, outrossim, incompatibilidade
de natureza lógica entre a norma do art. 2º, § 1º e a concessão de sursis, já
que não há nenhuma correlação entre regime de cumprimento de pena e este
instituto.

Regime penitenciário está relacionado
com o local em que se dará o cumprimento da sanção penal, referindo-se também
às regras a que ficará sujeito o apenado durante a execução da pena privativa
de liberdade.

De acordo com o disposto na Lei dos
Crimes Hediondos ele não poderá, durante a execução, avançar para um regime
menos rigoroso (passar do fechado para o semi-aberto e deste para o regime
aberto).

Por outro lado, o sursis é modo
especial de cumprimento da pena privada de liberdade, que nada tem a ver com
sistema de progressão de penas.

Instituto com disciplina própria, para
a concessão da suspensão condicional da pena o que importa é o preenchimento de
certos requisitos legais de natureza objetiva (pena privada de liberdade não
superior a 02 anos e inaplicabilidade de penas restritivas de direito) e
subjetiva (não reincidência em crime doloso e prognose de não voltar a
delinqüir), independentemente do regime prisional imposto.

Uma vez satisfeitos os requisitos, o
condenado terá a execução da sua pena suspensa sob determinadas condições e
durante um certo lapso de tempo, denominado período de prova, findo o qual
ser-lhe-á decretada a extinção da punibilidade.

Observe-se que, se no curso do período
probatório, o condenado por crime hediondo ou equiparado vier a dar causa à
revogação da suspensão, estará obrigado a cumprir integralmente em regime
fechado a pena suspensa, independentemente do tempo de sursis decorrido.

Fosse o sursis um benefício concedido
no curso da execução penal, fosse ele uma resultante da progressão prisional,
poderia falar-se, neste caso, em incompatibilidade.

Mas não é. O sursis situa-se
completamente fora da progressão das penas; é justamente o cumprimento da pena
em regime nenhum.

Não resta dúvida de que a norma da L.
8.072/90, ao dispor sobre o cumprimento da pena integralmente em regime
fechado, refere-se às hipóteses em que o sentenciado irá, efetivamente,
cumprí-la na prisão, e não aos casos em que couber a suspensão da sua execução.

Em duas palavras: se o réu preenche os
requisitos do sursis terá direito a que sua pena seja suspensa; caso contrário,
a cumprirá integralmente em regime fechado, sendo-lhe vedado a progressão.

Em conclusão, é perfeitamente cabível a
suspensão da pena imposta pela prática de crime hediondo, uma vez que inexiste
norma expressa proibindo a sua concessão, não havendo também qualquer
incompatibilidade lógica entre esta e a norma do § 1º do art. 2º da L.
8.072/90, pelo que se aplicam, subsidiariamente, as disposições do CP à lei
especial.

A Lei atual, de nº 8.072/90,
estabelece, em seu art. 2º, § 1º, que a pena pelos crimes considerados
hediondos será cumprida integralmente em regime fechado; a única exceção a este
princípio está no art. 5º do mesmo Diploma Legal: o criminoso, que cometer um
dos delitos previstos nas Leis 8.072/90 ou 8.930/94, poderá  obter livramento condicional, depois de
cumprir 2/3 (dois terços) da pena no regime fechado, se não for reincidente
específico em crimes hediondos e se preencher os demais requisitos subjetivos
do livramento (bom comportamento na execução da pena, etc.)

Distinção entre os artigos 14 e 18-
III. Seria semelhante à existente entre os crimes de Quadrilha ou
bando(art.288,CP) e furto qualificado por concurso de agentes(art.155,
parágrafo 4º,IV,CP)?

Na lei especial que trata das medidas
de prevenção e repressão ao tráfico ilícito e uso indevido de substâncias
entorpecentes ou que determinem dependências físicas ou psíquicas (Lei 6.368,
de 21 de outubro de 1976), foi criado, no art. 14, um delito autônomo de
quadrilha ou bando, diferentemente daquele já previsto no art. 288 do CP.

De acordo com aquele dispositivo,
constitui crime associarem-se duas ou mais pessoas para o fim de praticar,
reiteradamente ou não, qualquer dos crimes previstos nos arts. 12 e 13 da
citada lei, ou seja, o tráfico ilícito de substância entorpecente ou que
determine dependência física ou psíquica.

O delito de que se trata (o do art. 14)
não é, evidentemente, igual ao previsto no art. 288 do CP. Neste, o tipo
objetivo é a associação de mais de três pessoas, em quadrilha ou bando, para o
fim de cometer crimes. Quaisquer crimes.

A Lei 8.072, de 25 de julho de 1990,
que dispôs sobre os crimes hediondos, contudo, no seu art. 8º, estipulou pena
de três a seis anos de reclusão para o crime do art. 288 do CP, quando se
tratar de crimes hediondos, prática da tortura, tráfico ilícito de
entorpecentes e drogas afins ou terrorismo .

Alguns autores pregam uma solução
interpretativa híbrida, quanto a problemática, se o art.14 da Lei nº 6.368/76
teria sido revogada ou não, entendendo que permanece o preceito descritivo
contido na Lei de Entorpecentes combinado com o cominatório estabelecido no
art. 8º da Lei 8.072, de 1990.

De outra parte, estão doutrinadores que
acham que tal combinação fere princípios científicos de interpretação das
normas. Segundo estes últimos, o crime autônomo constante da legislação
especial teria sido ab-rogado, desaparecendo para dar lugar apenas ao do art.
288 do CP que, se for cometido com o fim de praticar tráfico de entorpecentes,
será apenado com a pena do citado art. 8º da Lei de Crimes Hediondos.

Essa interpretação derradeira é a mais
correta, sem dúvida.

Não obstante já passados mais de dez
anos, a doutrina e a jurisprudência até hoje ainda não chegaram a um consenso.
Não são poucos os juízes que condenam com base no art. 14 da Lei de
Entorpecentes. E quase sempre apenas porque a infração foi cometida em concurso
de pessoas. O assunto, portanto, é atual e continua merecendo reflexões.

O que se verifica é que se criou uma
forma qualificadora do crime já tipificado no Código Penal.

Seria, então, impossível conciliar-se à
existência de uma forma qualificada de crime de quadrilha ou bando (quando a
associação fosse para a prática de tráfico ilícito de entorpecentes e drogas
afins) com uma figura delitiva autônoma de associação para o mesmo fim.

A questão se resolve, assim, pela regra
de aplicação da lei no tempo, considerando-se revogada a norma legal anterior
que se mostra incompatível com a posterior. Desse modo, o art. 14 da Lei nº
6.368, de 1976, não deve mais ser considerado.

A associação de mais de três pessoas,
em quadrilha ou bando, para o fim de cometer o crime de tráfico de
entorpecentes ou drogas afins, é figura qualificada, prevista no art. 8º da Lei
8.072, de 1990, do tipo previsto no art. 288 do Código Penal.

Decorre, daí, que não basta mais a
associação de duas pessoas para a configuração do crime. São necessárias, no
mínimo, quatro (mais de três). Além disso, com a exclusão da expressão
“reiteradamente ou não”, ficou definitivamente afastada a idéia de
que se pune a aliança criminosa mesmo com a finalidade de cometimento de um
único crime.

O núcleo “associarem-se” traz
consigo a concepção de estabilidade, não bastando, portanto, a reunião
ocasional de delinqüentes para a prática de um determinado delito.

Por outro lado, como adverte FRAGOSO,
os vocábulos “quadrilha ou bando”, empregados como sinônimos,
definem-se como associação estável ou permanente, com o fim, no caso, de
praticar reiteradamente crime de tráfico ilícito de entorpecentes.

Não se deve confundir, também, o delito
autônomo de que se cuida com a simples co-autoria. O fato de o tráfico haver
sido cometido por várias pessoas, em concurso, não significa que sejam punidas,
cumulativamente, com as penas previstas para o crime de quadrilha. Para tanto,
há necessidade de prova da existência da efetiva associação e, principalmente,
do dolo referido pelo especial fim de agir, ou seja, para praticar o tráfico de
entorpecentes ou drogas afins. Caso contrário, haverá apenas co-autoria,
sujeita ao aumento de pena previsto no art. 18, da Lei nº 6.368/76.

-Competência
para o processo e julgamento quando o tráfico de substância entorpecente a ser
realizado no país, apesar de sua procedência do exterior, seria da justiça
estadual ou federal?(artigo 27)

art. 27. O processo e o julgamento do
crime de tráfico com exterior caberão à justiça estadual com interveniência do
Ministério Público respectivo, se o lugar em que tiver sido praticado, for
município que não seja sede da vara da Justiça Federal, com recurso para o
Tribunal Federal de Recursos.

O tráfico com o exterior é crime
internacional. Porém será da competência da Justiça Federal se tiver conotações
internacionais e da Justiça Estadual se não extravasar o território nacional.

A simples origem estrangeira do
entorpecente é insuficiente para que a competência seja da Justiça Federal.
Necessita-se de uma unidade na cooperação internacional entre agentes ou um
agente único, estendendo-se os efeitos da ação em mais de um país.

A conduta do agente se desvinculado do
plano internacional, a competência do delito isolado será da justiça Estadual,
ainda que originariamente a substancia tenha vindo do exterior.

Na lei anterior (nº 5.726/71), a
matéria vinha regulada no art.20, aliás, declarado
inconstitucional(RT.480/255). A prevenção e a repressão ao tráfico, de um modo
geral, de entorpecentes e drogas afins, são mandamento constitucional e
competem a União. Normalmente a repressão ao tráfico internacional de
entorpecentes tem sido objeto de tratados e convenções internacionais, porque
esta modalidade criminosa não conhece, além do mais, fronteiras. Assim, o
tráfico com o exterior está sujeito á Jurisdição da Justiça Federal, nos termos
do inciso VI do art.10 da Lei nº 5.010.

A Constituição Federal diz competir aos
juízes federais processar e julgar em primeira instância os crimes previstos em
tratados ou convenção internacional. O assunto já era controvertido ao tempo da
Constituição Federal de 1967, que o regulava no seu art.119, inciso V,
lembrando Magalhães Noronha, que havia vacilação e dúvida sobre a competência
da Justiça Estadual e da Federal, tendo o Pretório Excelso confirmado decisão
da justiça de São Paulo dando-se por competente e, arrematando, afirma o
eminente mestre: “ Dita exegese, afastando-se do liberalismo do texto
constitucional,, concilia-o com as exigências de uma repressão eficaz e não se
opõe ao nosso compromisso de combate ao tráfico.”

Vejamos alguns julgados a respeito do
assunto vertente:

“JCP.62.I JCP.307 JCPP.81 JCPP.386.III
JCPP.386.VI TÓXICO – TRÁFICO DE ENTORPECENTES – ASSOCIAÇÃO CRIMINOSA – FALSA
IDENTIDADE – FALTA DE RAZÕES DA APELAÇÃO DA DEFESA – COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA
FEDERAL – INTERNACIONALIDADE – CUSTÓDIA CAUTELAR – VÍCIOS – INTERCEPTAÇÃO
TELEFÔNICA – TENTATIVA – VEÍCULO APREENDIDO – 1. Na falta de razões da apelação
da Defesa, que foi devidamente intimada a apresentá-las e não o fez,
considera-se impugnada toda a sentença recorrida. 2. No caso, o tráfico deve
ser desclassificado de internacional para interno, por não possuir caráter
forâneo. Nada obstante, a Justiça Federal também é competente para julgar os
delitos de tráfico interno quando, na denúncia, formulada pelo Ministério
Público Federal, o fato típico era descrito como tráfico internacional de drogas,
como na espécie. Aplicação analógica do art. 81, caput, do CPP, que consagra o
Princípio da perpetuatio jurisdictiones. Precedentes deste Tribunal. Em
conseqüência, deixa de incidir a majorante fixada no art. 18, III, da Lei nº
6.368/76. 3. Os vícios acaso existentes na prisão em flagrante não possuem o
condão de interferir na higidez da ação penal subseqüente. Inexistência de
defeitos na fixação da prisão preventiva, cuja decretação configurou excesso de
zelo por parte do Juízo a quo, já que, na dicção do STJ, a prisão em flagrante,
por si só, teria força de manter os Réus reclusos até a sentença condenatória.
4. É válido e tem valor probatório o laudo resultante de interceptação
telefônica autorizada por Autoridade Judicial, em decisão fundamentada, e cuja
realização cumpriu o rito estabelecido na Lei nº 9.296/96. 5. Materialidade e
autoria do tráfico de entorpecentes estão comprovadas à saciedade, por conjunto
probatório que sustenta, de forma ampla e suficiente, a condenação de todos os
Réus apelantes. 6. Como os réus Perdigon e Arturo não chegaram a adquirir a
droga, pois não houve a tradição dela, o tráfico não se consumou em relação a
eles. Afigura-se admissível a tentativa com relação à modalidade de adquirir,
pois se trata de figura instantânea, que não possui como pressuposto anterior
nenhuma das outras ações tipificadas nas hipóteses do art. 12, da Lei nº
6.368/76. 7. Deve ser retirada da condenação dos réus Maria Armanda, Soligo e
Perdigon, a aplicação da agravante fixada no art. 62, I, do CP, referente à
organização da cooperação criminosa, pois não há prova de que esses Réus
coordenassem a participação dos demais. 8. O réu Vaz deve ser absolvido (art.
386, III, do CPP) da acusação de prática do delito de falsa identidade (art.
307, do CP), porque o preso em flagrante não pode ser obrigado a falar a
verdade, produzindo prova contra si mesmo. 9. Os Apelantes devem ser absolvidos
(art. 386, VI, do CPP) da acusação de prática do delito de associação criminosa
(art. 14, da Lei nº 6.368/76), porque não há prova acerca do necessário animus
associativo. A prova coligida basta para a comprovação de mero concurso de
agentes, mas não tem o poder de ir além, para demonstrar a existência de
estabilidade criminosa. Por corolário lógico, aplica-se a todos os Condenados a
majorante estabelecida no art. 18, III, da Lei nº 6.368/76, a qual agrava a
pena dos delitos de tráfico cometidos em concurso de agentes. 10. Em relação ao
delito de tóxico, mantidas as penas-base e as penas pecuniárias dosadas na
sentença. 11. Mantido o cumprimento das penas privativas de liberdade no regime
fechado, bem como a decisão que determinou o uso, pela Autoridade policial, dos
veículos utilizados na prática do tráfico (art. 34, § 1º, da Lei nº 6.368/76). (TRF 4ª R. – ACr 1998.04.01.062154-7 – RS – 2ª T. –
Rel. Juiz
Élcio Pinheiro de Castro – DJU 15.09.1999 – p. 659)”

“JCP.14.II TÓXICO – TRÁFICO
INTERNACIONAL – TENTATIVA – DESCLASSIFICAÇÃO – ART. 14, II, DO CP – Não se
consumou o tráfico internacional se a res não ultrapassou a fronteira, nem o
agente teve a posse tranqüila da coisa em território brasileiro. Está
caracterizada, neste caso, uma tentativa, um início de execução de um crime de
tráfico, para o qual o legislador previu pena menor, a ser calculada mediante o
auxílio da regra amplificadora da tipicidade, que pune a tentativa. Se o réu
importou, na forma tentada, uma das condutas permutáveis da enumeração legal,
excluído ficou o transporte, na forma consumada, até mesmo porque solução mais
favorável ao réu, que limita a descricionariedade judicial. Assim,
calculando-se a pena mínima acrescida da majorante de internacionalidade – 04
anos -, diminuindo-se de um terço – uma vez que a quantidade da res era
significativa – perfazem-se 03 anos em regime fechado, mantida a pena de multa.
(TRF 4ª R. – ACr. 95.04.09512.7/PR – 2ª T – Rel. Juiz Dória Furquim – DJU
25.10.1995)”

“CRIMINAL – CONFLITO DE COMPETÊNCIA –
ENTORPECENTES – TRÁFICO INTERNO X TRÁFICO INTERNACIONAL – INTERNACIONALIDADE
NÃO-DEMONSTRADA – COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA COMUM ESTADUAL –  I . O fato de a substância entorpecente ter
sido adquirida de um Boliviano não permite a presunção do caráter internacional
do delito, salientando-se que, nos termos do inquérito e da denúncia, a origem
da droga seria a cidade brasileira de Guarajá-Mirim/RO, tendo havido sua
apreensão na cidade de São Marcos/RS. II – Na ausência de demonstração da
internacionalidade do tráfico de entorpecentes, firma-se a competência da
justiça estadual para o processo e julgamento do feito. III – Conflito conhecido
para declarar a competência do e. Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande
do Sul, o Suscitado. (STJ – CC 26094
– RS – 2ª S. – Rel. Min. Gilson Dipp – DJU 21.08.2000 – p. 00091)”

“PENAL E PROCESSUAL PENAL – HABEAS
CORPUS – TRÁFICO DE ENTORPECENTES E ASSOCIAÇÃO PARA O TRÁFICO INTERNACIONAL DE
DROGAS – COMPETÊNCIA – ART. 109, §3º, CF – EVENTUAL RECURSO ESTARÁ INSERIDO NA
COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA FEDERAL – PROGRESSÃO DE REGIME – POSSIBILIDADE IN CASU
–  I – O processo e julgamento dos
delitos de tráfico de entorpecentes e de associação para o tráfico
internacional de drogas competem à Justiça Federal, podendo, ainda, por força
do preceito contido no art. 109, §3º, da Lex Maxima, ser processados e julgados
na Justiça Estadual, sempre que a Comarca não for sede de Vara do Juízo
Federal, situação que se verifica in casu. Destarte, eventual recurso estará
inserido na competência da Justiça Federal, no caso, do egrégio Tribunal
Regional Federal da 1ª Região. II – A oitiva do acusado por meio de carta
precatória não vicia ou causa qualquer irregularidade no processo em que restou
condenado. III – Ainda que pacífica a jurisprudência a respeito da
obrigatoriedade de cumprimento da pena em regime integralmente fechado para o
tráfico ilícito de entorpecente, verifico que os documentos acostados (guia de
recolhimento às fls. 148 e r. sentença condenatória às fls. 152/222) apontam
que o regime prisional aplicado ao paciente foi o inicialmente fechado, e que o
Ministério Público não interpôs recurso contra a tal decisão. Sendo assim,
mostra-se possível a progressão do paciente para regime menos severo, desde que
atendidos os pressupostos objetivos e subjetivos. Ordem parcialmente concedida,
a fim de que os autos baixem ao Juízo da Execução para que seja analisada a
possibilidade de progressão de regime. (STJ – HC 12146 – TO – 5ª T. – Rel. Min. Felix Fischer – DJU 04.09.2000
– p. 00173)”

Em
qualquer hipótese poderia haver o confisco de veículo utilizado para o
transporte de entorpecente? O uso esporádico de veículos , embarcações ou
aeronaves justificaria essa medida? Quando seria cabível a alienação cautelar
dos bens apreendidos?(artigo 34 e parágrafos)

A Medida Provisória n. 1.713, de
01.09.98, deu nova redação ao art. 34 da Lei de Tóxicos, referido artigo dispõe
sobre a apreensão de “veículos, embarcações, aeronaves, e quaisquer
outros meios de transporte, assim como os maquinismos, utensílios, instrumentos
e objetos de qualquer natureza, utilizados para a prática dos crimes definidos
nesta Lei”
(art. 34, caput), devendo sua interpretação ser
restritiva segundo amplo entendimento jurisprudencial e doutrinário, ou seja,
só podem ser apreendidos os bens que são usados costumeiramente para o fim da
prática de ilícitos previstos nesta lei (RJTJSP 138/451; RT 559/319). Não
devendo ser confiscados os objetos materiais “ocasionalmente ou
casualmente ligados à conduta delituosa”
(TJSP, RT 577/352; 592/321).

O dispositivo supramencionado é mais
amplo quanto aos objetos passíveis de apreensão que a regra prevista no art.
91, inc. II, do Código Penal, uma vez que este autoriza a perda dos “instrumentos
do crime, desde que consistam em coisa cujo fabrico, alienação, uso, porte ou
detenção constitua fato ilícito
“(alínea b), enquanto aquele permite a
perda dos bens ainda que não constitua fatos ilícitos sua fabricação, uso,
porte ou detenção, v.g., o confisco de “um caminhão previamente
destinado e especialmente utilizado para o transporte de ópio, até uma rede de
distribuição de droga”.
(CAPEZ, Fernando. Tóxicos. 4ª ed. São
Paulo: MPM – Curso Preparatório aos Concursos de Ingresso nas Carreiras
Jurídicas, 1997, p. 88).

As hipóteses legais de apreensão não
foram alteradas pela Medida Provisória ora tratada, todavia, inúmeras foram as
modificações de ordem procedimental que valem ser discutidas.

Com efeito, já no próprio caput do art.
34 da Lei de Tóxicos a Medida Provisória n. 1.713, sem deixar margem a
quaisquer dúvidas existentes a respeito de qual autoridade ficará com a
custódia dos objetos apreendidos, determina que os mesmos fiquem com a polícia
judiciária, salvo as armas que serão, “após elaboração do laudo
pericial, recolhidas ao Ministério do Exército, que se encarregará de sua
destinação”
(art. 14 da Lei 9.437/97).

Ato contínuo à apreensão, tendo esta
recaído sobre dinheiro ou cheques emitidos como ordem de pagamento, o delegado
de polícia deverá, imediatamente, requerer ao juízo competente a intimação do
Ministério Público que deverá requerer a conversão do apreendido em moeda
nacional (caso sejam apreendidos dólares ou outra moeda estrangeira), a
compensação de cheques, devendo antes serem levadas ao inquérito cópias dos
mesmos para fins de instrução, e o depósito das correspondentes quantias em
conta judicial, juntando-se aos autos recibo.

Caso sejam apreendidos bens diversos de
dinheiro ou cheques, o Ministério Público requererá a alienação destes,
mediante petição autônoma que conterá a relação completa dos bens apreendidos,
com todas as suas especificações, onde e com quem se encontram custodiados.

Por certo que, quando a medida provisória
determina que o Ministério Público “deverá” requerer a compensação
dos cheques, a conversão do dinheiro de moeda estrangeira para nacional e a
alienação de outros bens apreendidos pela autoridade policial e seus agentes,
não está tirando do “parquet”, sob pena de violação ao princípio da
independência funcional (art. 127, § 1º, CF), a possibilidade de discordar da
autoridade policial e entender que algum ou vários dos objetos apreendidos não
tenham relação direta e necessária com a prática dos delitos da Lei de Tóxicos,
caso em que poderá requerer ao juiz a devolução dos mesmos ao seu proprietário.
Caso a autoridade judicial discorde do entendimento do Ministério Público
deverá aplicar analogicamente o art. 28 do CPP, e não determinar a alienação ex
officio, sob pena de igualmente violar o princípio acima defendido.

Uma vez autuado o requerimento do
Ministério Público, os autos deverão ir ao juiz que, verificada a presença do
nexo de instrumentalidade entre o delito e o objeto (fumus boni iuris) e o
risco de perda de valor econômico pelo decurso do tempo (periculum in mora),
determinará a avaliação dos bens apreendidos, devendo ser intimados a União
(que tem interesse direto no valor da avaliação, pois será, em caso de confisco
definitivo por sentença judicial transitada em julgado, o ente político que
incorporará ao seu patrimônio os bens apreendidos), o Ministério Público
(custus legis) e o interessado (investigado ou terceiro de boa-fé).

Por outro lado, data venia, parece-nos
que o procedimento adotado pela presente medida não foi o mais correto. Isso
porque pela interpretação teleológica da redação dos §§ 8º, 9º e 12, do art. 34
da Lei de Tóxicos, chegamos à conclusão que o investigado e o terceiro de
boa-fé somente poderão se manifestar nesse incidente a respeito do valor dos
bens aprendidos, mas não poderão discutir se são ou não esses bens relacionados
direta e necessariamente com o crime (investigado) ou, ainda, se não estavam na
posse do investigado mas pertenciam a terceiro de boa-fé.  Com efeito, diz o § 12 do dispositivo em
tela que o juiz na sentença de mérito, nos autos de conhecimento, decidirá
sobre o perdimento dos bens e dos valores mencionados nos § § 4º e 5º.

Ao remeter esta decisão para a sentença
de mérito dos autos principais, para que não se viole o preceito constitucional
previsto no art. 5º, LIV (“ninguém será privado da liberdade ou de seus
bens sem o devido processo legal
“), deverá o réu, no processo de
conhecimento, ter o direito de produzir provas e praticar todos os atos decorrentes
do contraditório e ampla defesa para ver seus bens livres do confisco, o que
poderá gerar tumulto indesejado pelo bom andamento do processo principal.

Mais complicada será a posição do
terceiro de boa-fé, que ficou vinculado à decisão final no processo de
conhecimento para ter de volta bens injustamente tomados de si.

Mais prática teria sido a solução de
deixar o debate sobre este assunto (perdimento ou não dos bens) juntamente com
a discussão dos valores dos bens apreendidos nos autos em apartado, não só pela
maior facilidade de produção de provas sem tumultuar o processo principal, mas,
outrossim, por assegurar mais amplamente o direito de propriedade do terceiro
de boa-fé, que, mantida a redação atual da medida provisória, só poderá defender
seus bens após iniciado o processo de conhecimento, diferentemente da hipótese
desta discussão ficar sediada nos autos incidentais, não havendo necessidade de
se iniciar o processo principal para ver restituído objetos que lhe foram
tomados indevidamente.

Vale, ademais, ressaltar que, salvo
melhor juízo, não será cabível o procedimento de restituição de coisa
apreendida previsto nos arts. 118 e ss. do Código de Processo Penal, uma vez
que foi determinado que o juiz decidisse na sentença de conhecimento nos autos
principais sobre a perda ou não dos bens.

Quanto as MEDIDAS ASSECURATÓRIAS, o
Código de Processo Penal, nos arts. 125 a 144, regula as chamadas medidas
assecuratórias, como o seqüestro e a hipoteca legal. São medidas destinadas a
arrecadar os bens adquiridos pelo criminoso com os proventos da infração,
destinando-se o dinheiro apurado ao ofendido ou terceiro de boa-fé, ou, ainda,
ao Tesouro Nacional, conforme for o caso. Para a decretação da primeira medida,
basta a existência de indícios veementes da proveniência ilícita dos bens;
enquanto que para a hipoteca são imprescindíveis os requisitos da certeza de
infração e indícios suficientes da autoria.

A Lei. 9.613, de 1998, no seu art. 4º,
prevê: O juiz, de ofício, a requerimento do MP, ou representação da autoridade
policial, ouvido o MP, em 24 horas, havendo indícios suficientes, poderá
decretar, no curso do inquérito ou da ação penal, a apreensão ou o seqüestro de
bens, direitos ou valores do acusado, ou existentes em seu nome, objeto dos
crimes previstos nesta Lei, procedendo-se na forma dos arts. 125 a 144 do DL.
nº 3.689, de 03.10.1941 – CPP.

A primeira constatação que se faz da
leitura desse dispositivo é que foi excluída a hipoteca legal como medida
assecuratória, muito embora, ao fazer alusão ao procedimento a ser adotado, o
texto incluiu artigos a ela referentes. Parte, então, o legislador do princípio
de que o crime de lavagem não tem outro ofendido que não o próprio Estado, de
vez que a hipoteca legal é providência cuja legitimidade pertence à vítima, com
o escopo de garantir-lhe a responsabilidade civil, surgida com a prática do
delito. Por sua vez, surge a apreensão como medida cautelar. A apreensão, na
sistemática do CPP, constitui prova (arts. 140 a 250) e não medida
assecuratória. No entanto, no art. 132, o CPP admite o seqüestro de bens
móveis, se não for cabível a busca e apreensão, o que não deixa dúvida de que
esta última medida pode surtir o mesmo efeito daquela outra.

Tratando-se, porém, de bens imóveis,
proceder-se-á o seqüestro, o qual, uma vez realizado, será inscrito no Registro
competente, admitindo embargos de terceiro e do próprio acusado, sob a alegação
de não terem os bens sido adquiridos com os proventos da infração. Ao
contrário, se cuidar de bens móveis, incluindo direitos e valores,
dar-se-lhes-á a apreensão, com vistas à decretação de perda a favor da União,
como efeito da condenação, ressalvado o direito do lesado ou de terceiro de
boa-fé.

Mas, uma vez provada a licitude da
origem dos bens, o juiz deverá determinar a sua liberação. O pedido de
restituição, entretanto, só será conhecido com o comparecimento pessoal do
acusado. Sendo revel, o juiz determinará a prática de atos necessários à
conservação dos bens, direitos ou valores, nomeando-lhes administrador. Tanto o
seqüestro como a apreensão será levantada se a ação penal não for iniciada no
prazo de 120 dias, contados da data em que for concluída a diligência. Como a
Lei fala em ação penal iniciada, acreditamos que não basta a simples denúncia,
porém o recebimento desta pelo juiz.

 


 

Informações Sobre o Autor

 

Soraia Castellano

 

Bacharel em Direito pela UNISANTOS , Mestre em Direitos Difusos e Coletivos pela UNIMES, Advogada militante na Baixada Santista e Vale do Ribeira, Professora de Direito Comercial e Empresarial.

 


 

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Equipe Âmbito Jurídico

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