Resumo: Embora constitua um fenômeno natural inevitável e comum a todo ser vivo, a morte aparece como um dos acontecimentos mais discutidos pelo homem, sempre caracterizado com certo misticismo e mistério. O direito tenta controlar e prever as conseqüências desse evento natural, estatuindo, dentre outros, o dever do juiz determinar a apuração dos haveres do sócio de sociedade não anônima em caso de seu falecimento, nomeando-se, dentro do processo de inventário, um perito para esse fim. Porém, entendendo o julgador que a apuração de haveres, nos moldes pretendidos nos autos do inventário, revela controvérsia de difícil resolução, configurando uma situação fática de alta indagação, ele está autorizado a remeter a questão (apuração) às vias ordinárias, na qual os haveres serão apurados em consonância com os artigos 655 a 674 do CPC de 1939. E essa apuração, por envolver aspectos das ciências contábeis e marcos temporais muitas vezes não estabelecidos de forma expressa na legislação pátria, merece uma análise mais detida, mormente qual seria o momento contábil que deve ser considerado como termo a quo para apuração dos valores devidos aos herdeiros do sócio falecido. É isso que será exposto.
Palavras Chave: Falecimento do Sócio. Apuração de Haveres.
Abstract: Although it is an unavoidable and natural phenomenon common to all living beings, death appears as one of the most discussed themes by man, always featured with mysticism and mystery.The Law tries to control and predict the consequences of this natural event by stating, among others, the duty of the judge to determine the verification of the assets linked to a member of a non-anonymous society in the event of his death, naming himself in the the inventory an expert for this purpose. However, understanding the judge that this verification, in the manner intended in the inventory, reveals dispute difficult to resolve, configuring a factual situation of high inquiry, he is authorized to refer the matter to the ordinary way in which the assets will be calculated in accordance with articles 655-674 of the CPC, 1939. And that determination that involves aspects of accounting sciences and timeframes often do not set out explicitly in homeland legislation deserves a more detailed analysis, especially what would be the time frame that should be considered as the initial term for calculating the amounts owed to the heirs of the deceased partner. That is what will be exposed.
Keywords: Death of Partner. Verification of Assets.
Sumário: Introdução; 1 O Falecimento de sócio de sociedade não anônima e seus desdobramentos no processo de inventário; 2 Apuração de haveres; 2.1 Regulação legal da apuração de haveres; 2.2 Critérios de apuração; Análise crítica – Momento contábil da apuração; Referências.
INTRODUÇÃO
O óbito do sócio de uma sociedade empresária por quotas de responsabilidade limitada, doravante denominada sociedade limitada, não gera, necessariamente, a dissolução da sociedade, como já o admitiu algumas vezes a doutrina. A continuação da sociedade fica a cargo dos sócios remanescentes, os quais decidirão o destino da sociedade.
O artigo 1.028 do Código Civil Brasileiro[1] positiva a questão e deixa a cargo da vontade dos sócios remanescentes, seja através das disposições do contrato social ou de disposições post mortem dos sócios e dos herdeiros, o destino da sociedade.
Obviamente, independentemente do futuro escolhido para a sociedade, não é possível fugir das regras sucessórias sobre as quotas sociais do falecido titular, pois em que pese haver discussão doutrinária sobre sua real natureza jurídica, as mesmas geram efeitos relevantes na sucessão e devem integrar o inventário dos bens do de cujus.
Destaque-se que caso os sócios remanescentes decidam realizar eventual acordo com os herdeiros para substituição do falecido (inciso III do artigo em epígrafe), qualquer tipo de avença só será juridicamente legítima depois de encerrado o inventário dos bens, ou seja, depois que os herdeiros possam dispor das quotas sociais, mediante encerramento do processo e homologação da partilha pelo Juízo competente.
O que se quer dizer é que não estando encerrado o inventário e conseqüente partilha das quotas sociais do falecido, os eventuais haveres devem permanecer em nome da sociedade, mas à disposição dos herdeiros até posterior decisão judicial e homologação da partilha proposta nos autos do processo de inventário.
O inventário é, destarte, pressuposto essencial para perfeição de qualquer ato entre herdeiros e sociedade limitada.
Com a abertura do inventário, o Código de Processo Civil vigente impõe ao Juiz o dever de determinar a apuração de haveres, se o autor da herança era sócio de sociedade que não anônima. Trata-se de imposição do inciso II do parágrafo único do artigo 993 do CPC[2].
A fim de realizá-la, caberá ao Juiz nomear um contador (perito) para efetuar essa apuração, nos termos do parágrafo único do artigo 1.003 do CPC[3]·. Porém, cediço que essa apuração muita vezes não é um trabalho simples e rápido.
Depende de levantamento contábil para reavaliação do valor de mercado da sociedade, dos bens componentes do patrimônio social, inclusive incorpóreos, passivo da pessoa jurídica, sendo projetado o valor do acervo remanescente caso fosse a sociedade dissolvida naquele momento (COELHO, 2003, p.469).
Como demonstra Frans Martins (2011, p.226), encontrado o patrimônio líquido da sociedade, sob parcela desse incidirá o reembolso, proporcionalmente à quota do sócio.
Registra-se que em muitos casos tal apuração gera enormes divergências, seja pela necessidade de uma dilação probatória mais especializada, seja por envolverem bens de difícil localização, seja pela própria ausência de consenso dos envolvidos sobre determinado aspecto da avaliação, principalmente se o contrato social for omisso sobre o tema.
E caso essa factível hipótese ocorra, ensejando controvérsia entre os sócios remanescentes e espólio ou herdeiro, a questão deve ser remetida para as vias ordinárias, apurando-se os haveres na forma dos arts. 655 a 674 do CPC, a teor do que dispõe o art. 1.218, inciso VII, do atual Código de Processo Civil (FISCHMANN, 2000, p. 82-83).
Assim, mostra-se indispensável para a finalização do inventário a realização da apuração de haveres do sócio falecido, seja através de levantamento específico de contador nomeado para tanto ou através das vias ordinárias, apurando-se os haveres na forma dos artigos 655 a 674 do CPC de 1939.
Dentro desta proposta, o presente artigo buscará, mesmo que não esgotando o tema, apresentar alguns conceitos e premissas básicas sobre a apuração de haveres necessariamente instituída pelo juízo do inventário em razão do falecimento de sócio de sociedade não anônima.
2 O FALECIMENTO DE SÓCIO DE SOCIEDADE NÃO ANÔNIMA E SEUS DESDOBRAMENTOS NO PROCESSO DE INVENTÁRIO
Atualmente, a ocorrência da morte do sócio de uma sociedade limitada, nos termos do caput do artigo 1.028 do atual Código Civil Brasileiro, gera a transferência de suas quotas a seus herdeiros e sucessores, independentemente do consentimento dos demais sócios, não mais sendo aceitável a dissolução total da sociedade.
A regra geral é, então, a não transmissão da qualidade de sócio do falecido e o surgimento de verdadeiro direito de crédito dos herdeiros representado pela participação societária deixada pelo de cujus, apurada mediante procedimento específico de apuração dos haveres para pagamento.
De qualquer forma, independentemente da saída adotada (resilição parcial do contrato com a redução do capital social, entrada dos herdeiros na sociedade ou aquisição das quotas pelos sócios remanescentes), é inevitável que haja apreciação do valor da quota do falecido.
Em outras palavras, não é possível fugir das regras sucessórias sobre as quotas sociais do falecido titular, pois as mesmas geram efeitos relevantes na sucessão e devem integrar o inventário dos bens do de cujus, sendo que a apuração do seu valor pecuniário é indispensável.
O Código de Processo Civil vigente impõe ao Juiz o dever de determinar a apuração de haveres se o autor da herança era sócio de sociedade que não anônima. Trata-se de imposição do inciso II do parágrafo único do artigo 993 do CPC.
Referida norma dispõe sobre uma das medidas postas ao alcance do julgador, que devem suceder às primeiras declarações do inventariante, caso o autor da herança fosse empresário individual ou sócio de sociedade que não anônima.
Autoriza, assim, o inciso II do parágrafo único do referido dispositivo que, dentro do próprio processo de inventário, se proceda a apuração de haveres do falecido por sua participação em sociedades limitadas, mediante nomeação de contador (perito) para efetuar essa apuração, nos termos do parágrafo único do artigo 1.003 do CPC, o qual merece transcrição:
“Art. 1.003. Findo o prazo do art. 1.000, sem impugnação ou decidida a que houver sido oposta, o juiz nomeará um perito para avaliar os bens do espólio, se não houver na comarca avaliador judicial.
Parágrafo único. No caso previsto no art. 993, parágrafo único, o juiz nomeará um contador para levantar o balanço ou apurar os haveres”.
Porém, entendendo o julgador que a apuração de haveres, nos moldes pretendidos nos autos do inventário, revela controvérsia de difícil resolução, configurando uma situação fática de alta indagação, ele está autorizado a remeter a questão (apuração) às vias ordinárias, na forma dos artigos 655 a 674 do CPC de 1939, autorizado pelo artigo 1.218 inciso VII do CPC de 1974, in verbis:
“Art. 1.218. Continuam em vigor até serem incorporados nas leis especiais os procedimentos regulados pelo Decreto-lei no 1.608, de 18 de setembro de 1939, concernentes:
(omissis)
Vll – à dissolução e liquidação das sociedades (arts. 655 a 674) (grifo do autor)”
Cediço que existem questões de fato que demandam dilação probatória e exigem, por isso, processo à parte, onde possam ser dirimidas. Em outras palavras, nem sempre os elementos fáticos apresentam-se ao juiz do inventário de forma pacífica ou de fácil resolução, o que exige um processo à parte, com rito próprio.
Nas palavras de Nelson Nery Júnior e Rosa Maria Andrade Nery (1999, p. 1317), essas devem tramitar perante o juízo competente, em rito próprio, com ampla cognição. Também assim devem ser processadas as questões de fato e de direito estranhas à ação de inventário e partilha.
No entendimento de Humberto Theodoro Júnior (1998, p.106), a apuração do valor da participação em sociedade empresária do sócio falecido representa bem de difícil liquidação:
“Bens de liquidação difícil ou morosa são aqueles que se encontram em zonas remotas, longe da sede do inventário, e que, por isso, dependem de diligências e precatória de cumprimento demorado. São, ainda, aqueles que, por sua própria natureza, reclamam operações complexas, como, por exemplo, a liquidação de sociedade ou a apuração de haveres do morto em pessoa jurídica de que era sócio. (grifo do autor)”
A liberdade do magistrado entender pela remessa às vias ordinárias é albergada, inclusive, pelo artigo 984 do CPC, o qual é categórico ao permitir a remessa para os meios ordinários caso a lide envolva questões de alta indagação ou dependerem de outras provas, in verbis:
“Art. 984. O juiz decidirá todas as questões de direito e também as questões de fato, quando este se achar provado por documento, só remetendo para os meios ordinários as que demandarem alta indagação ou dependerem de outras provas”.
A jurisprudência do TJMG lida com a questão de forma pacífica, sem muitas divergências, podendo-se citar a título de exemplo:
“INVENTÁRIO – QUESTÃO DE ALTA INDAGAÇÃO – REMESSA PARA AS VIAS ORDINÁRIAS. O inventário é um processo com contornos próprios, não havendo como nele serem discutidas questões de alta indagação. O art. 984 do CPC autoriza a remessa às vias ordinárias das questões que, em autos de INVENTÁRIO, demandarem alta indagação ou dependerem de outras provas, que é a hipótese dos autos. (AGRAVO N° 1.0514.05.017907-6/001 – COMARCA DE PITANGUI – RELATOR: EXMO. SR. DES. GERALDO AUGUSTO – ACÓRDÃO DE 06/10/2006)”
Desta forma, entendendo o julgador que a apuração de haveres do sócio de sociedade limitada denota complicada controvérsia que envolve questões de alta indagação, como por exemplo, a avaliação de inúmeros bens imóveis distribuídos em várias comarcas, avaliação de marcas, patentes etc, ele pode e deve remeter a questão às vias ordinárias.
2 APURAÇÃO DE HAVERES
A apuração de haveres pode ser conceituada como instituto aplicado às hipóteses de resilição parcial do contrato societário, aplicável quando um dos sócios se retira (recesso, retirada, morte, exclusão, dissidência) para apuração de sua quota parte na sociedade e posterior pagamento, seja ao próprio sócio, seja a seus herdeiros.
Apurar os haveres do sócio significa buscar a determinação concreta da quota cujo credor (sujeito ativo) é o sócio que se retira[4]. De acordo com Hernani Estrela (2010, p. 114) “é o conjunto de atos de natureza técnica e jurídica, por via dos quais se determinam e liquidam os cabedais do sócio que se desliga da sociedade, continuando esta com os membros remanescentes”. Referido crédito corresponde exatamente ao valor patrimonial da participação societária.
De forma similar, Martinho Maurício Gomes de Ornelas (2001, p.23) define que a apuração de haveres importa em “procedimento judicial ordenado pelo magistrado, desenvolvido por perito em contabilidade, que tem por meta a avaliação das quotas societárias, ou seja, a mensuração da participação societária de sócio dissidente, excluído, ou pré-morto em sociedades contratuais”.
A apuração de haveres busca a definição do montante devido pela sociedade ao sócio dissidente, excluído ou aos herdeiros do sócio pré-morto. Nesse sentido, esclarece Fábio Ulhoa Coelho (1999, p.160-161):
“(…) os objetivos da apuração dos haveres não são os mesmos que os da liquidação. Por ela, não se busca a solução das pendências obrigacionais da sociedade, mas a definição do quantum devido pela sociedade ao sócio desvinculado. Tem ele direito de crédito contra a pessoa jurídica no importe equivalente ao que teria se a hipótese fosse de dissolução total. Ou seja: o sócio tem direito ao valor patrimonial de sua cota social, não ao valor nominal, nem o de mercado, ou outro que se lhe atribua. A sociedade deve apurar os haveres do sócio desvinculado e pagar-lhe – nos prazos contratualmente previstos ou à vista em caso de omissão do contrato -, ou aos seus sucessores, a parte do seu patrimônio líquido que corresponder à proporção da cota liberada em relação ao capital social. Neste sentido é que se afirma que, sob o ponto de vista econômico, não há diferença entre a liquidação e a apuração de haveres. Somente assim é que se evita o enriquecimento ilícito do sócio desvinculado ou dos sócios que permanecem na sociedade”
Nelson Abrão (1998, p.184), não necessariamente conceituando o instituto, mas apontando seu caráter essencial, aponta que a apuração de haveres é requisito indispensável para a validade do ato de retirada do sócio. Cita-se:
“Decerto, quando se propaga a exclusão do sócio minoritário é de rigor a apuração de haveres da quota-parte como condicio sine qua nom da validade do ato, pela forma de pagamento da proporção cabente ao antigo sócio, sendo certo que a normalidade da atividade empresarial se hospeda na transparência dos atos, na modalidade regular, no aspecto principal do cumprimento obrigacional”
A própria jurisprudência também buscou conceituar o instituto em epígrafe, podendo-se citar o entendimento do Desembargador Hermenegildo Gonçalves do TJDF:
“a apuração de haveres é procedimento que se segue à dissolução parcial, colimando a identificação do quantum devido pela sociedade ao sócio desvinculado, ao qual assiste direito à percepção de valor equivalente ao que receberia se versasse a hipótese de dissolução total, correspondendo essa importância ao valor patrimonial de suas cotas, e não o nominal ou o de mercado, ou seja, calca-se no patrimônio liquido da empresa e não no preço que o titular da cota lograria na sua alienação (valor de mercado) ou que resultaria da divisão do valor do capital social pelo número de cotas (valor nominal)”. (TJ/DF – 1ª T. Cív., Ap. Cív. nº 20010110604050, Rel. Des. Hermenegildo Gonçalves, DJ 05.08.2004, p. 26)”
Desta forma, a apuração de haveres importa em constatações objetivas acerca do patrimônio da sociedade empresária, bem como suas alterações qualitativas e quantitativas, a fim de alcançar o valor pecuniário devido ao sócio ou herdeiros.
No que tange à apuração do valor devido pela sociedade aos herdeiros do sócio falecido, importante a lição de Marcelo Fortes Barbosa Filho (2007, p.957):
“Pretende-se, portanto, preservar a sociedade e, mais ainda, em benefício da coletividade, possibilitar a continuação da atividade empreendida e a correspondente geração de riquezas. Assim, morto o sócio, impõe-se, como regra geral, o empreendimento de uma resolução parcial do contrato celebrado, provocando, na forma do disposto no art.1.031, a liquidação isolada e singular de sua quota social. Aos herdeiros é atribuído, mediante redução do capital social, o valor correspondente à quota do de cujus, preservado o restante”.
Porém, uma ressalva deve ser feita. Embora o conceito proposto possa indicar uma falsa simplicidade do instituto, a determinação da quota do sócio retirante apresenta critérios complexos e regras teórico-práticas que muitas vezes influem no decorrer procedimental e causam verdadeiro tumulto processual, variáveis caso a caso de acordo com os motivos da saída, a forma ou critérios de apuração, os aspectos técnico-contábeis aplicáveis etc.
Controvérsias à parte, a apuração de haveres deve obedecer aos eventuais comandos previstos no contrato social de cada sociedade empresária, o qual é livre para estipular qual a forma de apuração, seja pelo balanço anterior, se o afastamento se der dentro de tal ou qual período; seja resultante de balanço especial que então se levante; seja um valor antecipadamente fixado com base no valor nominal de sua parte no capital, com ou sem abatimento, e certa percentagem sobre o resultado provável das operações em curso, correspondente a determinado período; seja fixado anualmente, ao fim de cada exercício por deliberação majoritária (ESTRELA, 2010, p.88).
Neste sentido, a orientação do Superior Tribunal de Justiça:
“Dissolução parcial. Sociedade por cotas de responsabilidade limitada. Reconvenção. Pagamento dos haveres. Previsão contratual. Precedentes da Corte. A ausência de intimação para oferecer contestação à reconvenção não ensejou qualquer prejuízo ao autor reconvindo, isto porque o pedido formulado na reconvenção foi atendido na própria ação de dissolução proposta pelo reconvindo, decretada a dissolução, apenas, parcial da sociedade. Não há, portanto, ofensa ao artigo 316 do Código de Processo Civil. Conforme jurisprudência desta Corte, a regra geral é a de que os haveres do sócio que se retira da sociedade devem ser pagos na forma prevista no contrato, salvo se existente alguma peculiaridade com força para afastar este entendimento, o que não ocorre no presente caso. Os paradigmas que servem de apoio ao dissídio devem estar no especial, apresentados de forma regular, não servindo, para tanto, paradigma posteriormente juntado." (REsp nº450129/MG, rel. Min. Carlos Alberto Menezes Direito, Terceira Turma, julgado em 8.10.2002)” (grifo do autor);
“COMERCIAL. SOCIEDADE POR QUOTAS DE RESPONSABILIDADE ILIMITADA. DISSOLUÇÃO PARCIAL. A apuração dos haveres na dissolução parcial da sociedade por quotas de responsabilidade limitada segue as regras da retirada do sócio previstas no contrato social. Recurso especial conhecido, mas não provido." (REsp 83031/RS, rel. Min. Ari Pargendler, Terceira Turma, julgado em 19.11.1999)”. (grifo do autor)
Ressalva-se que, em determinados casos, sobrevindo divergência, seja por ausência de previsão no contrato social, seja por ausência de acordo entre as partes, somente judicialmente poderá a apuração ser realizada, sendo proferida sentença regulamentando a forma de sua realização.
Nesse ínterim, observar-se-á a jurisprudência consolidada sobre o tema, bem como as disposições legais existentes, mormente as previsões do artigo 1.031 do Código Civil de 2002, in verbis:
“Art. 1.031. Nos casos em que a sociedade se resolver em relação a um sócio, o valor da sua quota, considerada pelo montante efetivamente realizado, liquidar-se-á, salvo disposição contratual em contrário, com base na situação patrimonial da sociedade, à data da resolução, verificada em balanço especialmente levantado.
§ 1o O capital social sofrerá a correspondente redução, salvo se os demais sócios suprirem o valor da quota.
§ 2o A quota liquidada será paga em dinheiro, no prazo de noventa dias, a partir da liquidação, salvo acordo, ou estipulação contratual em contrário”.
Tais disposições devem ser interpretadas em conjunto com as normas do Código de Processo Civil de 1939, ex vi artigo 668, plenamente em vigor por disposição expressa do artigo 1.218, inciso VII do Código de Processo Civil vigente.
De qualquer modo, a apuração de haveres do sócio que se desliga da sociedade constitui instituto andrógeno no ordenamento brasileiro, atraindo a incidência de normas jurídicas e contábeis, podendo estar previsto no contrato social ou em posterior acordo entre as partes, visando a retribuição do sócio que, por algum motivo, se afasta da sociedade empresária.
2.1 Regulação Legal da Apuração de Haveres
A apuração de haveres não encontra uma regulamentação específica, própria e condensada em apenas um diploma jurídico. Ao revés, encontra algumas menções em dispositivos legais esparsos, cujo limite, alcance, aplicabilidade e legitimidade têm sido gradualmente consolidados pela jurisprudência e doutrina nacional.
A primeira referência legislativa que abordava a apuração de haveres do sócio que se retirava foi o Decreto nº. 3.708/19, cujo artigo 15 possuía a seguinte redação, in verbis:
“Art. 15. Assiste aos sócios que divergirem da alteração do contracto social a faculdade de se retirarem da sociedade, obtendo o reembolso da quantia correspondente ao seu capital, na proporção do ultimo balanço approvado. Ficam, porém, obrigados ás prestações correspondentes ás quotas respectivas, na parte em que essas prestações forem necessarias para pagamento das obrigações contrahidas, até á data do registro definitivo da modificação do estatuto social”.
A exegese deste artigo foi questionada pela doutrina ao longo do tempo, já que, segundo pesquisa de Priscila Maria Pereira Corrêa da Fonseca (2003, p.199), o último balanço não refletia o valor real do patrimônio da sociedade empresária, sob o qual a apuração seria realizada. Isso poderia acarretar prejuízo ao sócio retirante ou propiciar a realização de balanços fraudulentos exatamente para lesar o sócio retirante.
Tanto é assim que atualmente, como abaixo será exposto, a jurisprudência e doutrina vêm afastando a possibilidade de utilização do último balanço aprovado.
O Novo Código Civil Brasileiro adotou essa tendência e estipulou no artigo 1.031, como acima transcrito, que nos casos da sociedade se resolver em relação a um sócio, o valor da sua quota, salvo disposição contratual em contrário, será apurada com base na situação patrimonial da sociedade, à data da resolução, verificada em balanço especialmente levantado.
Esse dispositivo é também perfeitamente aplicável às sociedades limitadas, em consonância com remissão do artigo 1.077, cujo teor merece ser transcrito:
“Art. 1.077. Quando houver modificação do contrato, fusão da sociedade, incorporação de outra, ou dela por outra, terá o sócio que dissentiu o direito de retirar-se da sociedade, nos trinta dias subseqüentes à reunião, aplicando-se, no silêncio do contrato social antes vigente, o disposto no art. 1.031”.
Já no âmbito das proposições processuais, devem ser observados os artigos ainda vigentes do Código de Processo Civil de 1939, relativos à apuração de haveres, os quais permanecem em vigor por disposição expressa do já citado artigo 1.218, inciso VII do Código de Processo Civil vigente. O Diploma Processual de 1939 possui alguns artigos específicos sobre o assunto, merecendo destaque:
“Art. 363. Dissolvida a sociedade comercial por morte de um dos sócios, proceder-se-á à liquidação para apurar os haveres do morto, ficando o sócio sobrevivente subrogado, de pleno direito, nos benefícios da lei, desde que continue a explorar o mesmo ramo de negocio”.
“Art. 668. Si a morte de qualquer dos sócios não causar a dissolução da sociedade, serão apurados exclusivamente os haveres do falecido, e seus herdeiros ou sucessores serão pagos pelo modo estabelecido no contrato social, ou pelo proposto e aceito”.
A Nova Lei de Falência (Lei nº. 11.101/05) também possui regulamentação acerca da matéria, podendo-se citar o artigo 123, o qual dispõe expressamente:
“Art. 123 – Se o falido fizer parte de alguma sociedade como sócio comanditário ou cotista, para a massa falida entrarão somente os haveres que na sociedade ele possuir e forem apurados na forma estabelecida no contrato ou estatuto social.
Parágrafo primeiro – Se o contrato ou o estatuto social nada disciplinar a respeito, a apuração far-se-á judicialmente, salvo se, por lei, pelo contrato ou estatuto, a sociedade tiver de liquidar-se, caso em que os haveres do falido, somente após o pagamento de todo o passivo da sociedade, entrarão para a massa falida.
Parágrafo segundo – Nos casos de condomínio indivisível de que participe o falido, o bem será vendido e deduzir-se-á do valor arrecadado o que for devido aos demais condôminos, facultada a estes a compra da quota-parte do falido nos termos da melhor proposta obtida”. (grifo do autor).
No âmbito das Sociedades Anônimas, o artigo 45 da Lei de S.A. (Lei nº. 6.404/76) prevê a hipótese de ‘apuração de haveres’, no qual a companhia paga aos acionistas dissidentes de deliberação da assembléia geral o valor de suas ações. Nesse sentido:
“Art. 45. O reembolso é a operação pela qual, nos casos previstos em lei, a companhia paga aos acionistas dissidentes de deliberação da assembléia-geral o valor de suas ações.
§ 1º O estatuto pode estabelecer normas para a determinação do valor de reembolso, que, entretanto, somente poderá ser inferior ao valor de patrimônio líquido constante do último balanço aprovado pela assembléia-geral, observado o disposto no § 2º, se estipulado com base no valor econômico da companhia, a ser apurado em avaliação (§§ 3º e 4º). (Redação dada pela Lei nº 9.457, de 1997)(…)
§ 3º Se o estatuto determinar a avaliação da ação para efeito de reembolso, o valor será o determinado por três peritos ou empresa especializada, mediante laudo que satisfaça os requisitos do § 1º do art. 8º e com a responsabilidade prevista no § 6º do mesmo artigo. (Redação dada pela Lei nº 9.457, de 1997)
§ 4º Os peritos ou empresa especializada serão indicados em lista sêxtupla ou tríplice, respectivamente, pelo Conselho de Administração ou, se não houver, pela diretoria, e escolhidos pela Assembléia-geral em deliberação tomada por maioria absoluta de votos, não se computando os votos em branco, cabendo a cada ação, independentemente de sua espécie ou classe, o direito a um voto. (Redação dada pela Lei nº 9.457, de 1997)”.
O que se pretende com essas transcrições é demonstrar que não há apenas um conjunto condensado de normas atinentes capazes de instruir de forma coerente o atuar do jurista face à apuração de haveres.
O mesmo deve buscar na legislação, inclusive no Código de Processo Civil de 1939, as normas pertinentes ao tema, sempre conjugando-a com as novéis orientações doutrinárias e jurisprudenciais sobre o assunto.
2.2 Critérios de Apuração
Ao analisar contratos sociais e o próprio desiderato dos sócios ao dar início aos trabalhos de criação de uma sociedade empresária, é nítido que a última preocupação dos sócios é estabelecer de forma completa e inteligível o modo pelo qual eventual apuração de haveres irá ocorrer.
Preocupam-se em demasia com a delimitação do capital social, sua alteração, a sede, duração, objeto, administração, exercício, transferência de quotas, exclusão de sócios etc, sendo raro encontrar um contrato social que aborde de forma clara e completa os critérios pelos qual eventual apuração irá ocorrer.
Inúmeros litígios poderiam ser evitados caso o contrato social (ou posterior acordo entre sócio/herdeiros e sócios remanescentes) fosse claro e completo. Enriquecimento ilícito, lesão ou abuso de direito são problemas comumente relacionados e discutidos no Judiciário com relação à apuração de haveres (ESTRELA, 2010). E isso, em decorrência de uma técnica inadequada na redação dos contratos sociais e acordos posteriores.
Não obstante, feita essa ressalva, é também verdade que por mais claro que seja o contrato social ou acordo formalizado entre os interessados, a mais simples apuração de haveres reclama necessariamente a prática de vários atos, desdobrando-se em alguns especificamente técnico-contábeis e outros de índole essencialmente jurídica.
São vastos os critérios de apuração, tanto é que se mostra extremamente difícil encontrar um doutrinador ou livro que consiga enumerá-las de forma exaustiva.
Como dito acima, o critério de apuração é livremente escolhido, seja pelo balanço anterior, se o afastamento se der dentro de tal ou qual período; seja resultante de balanço especial que então se levante; seja um valor antecipadamente fixado com base no valor nominal de sua parte no capital, com ou sem abatimento, e certa percentagem sobre o resultado provável das operações em curso, correspondente a determinado período; seja fixado anualmente, ao fim de cada exercício por deliberação majoritária (ESTRELA, 2010, p.88).
Tal situação é corroborada pela própria abertura legislativa propiciada pelo artigo 668 do CPC de 1939, o qual concedeu ampla autonomia à regulamentação da apuração, in verbis:
“Art. 668 – Se a morte ou a retirada de qualquer dos sócios não causar a dissolução da sociedade, serão apurados exclusivamente os seus haveres fazendo-se o pagamento pelo modo estabelecido no contrato social, ou pelo convencionado, ou, ainda, pelo determinado na sentença”.
O professor Waldecy Lucena (2011, p.828), ao comentar a exegese do artigo acima, com propriedade afirma que embora referido dispositivo se reporte apenas ao caso de more e retirada, o mesmo deve ser estendido às outras causas de dissolução parcial (rectius: resilição unilateral do contrato).
Dentro dos critérios de apuração, o último balanço foi constantemente adotado como lastro para calcular o valor da quota do sócio retirante, tanto é que doutrina e jurisprudência seguiam e adotavam as disposições do artigo 15 do Decreto nº. 3.708/19, alhures exposto.
Como dito, a aplicabilidade deste artigo foi questionada pela doutrina ao longo do tempo, já que chegou-se ao entendimento de que o último balanço não refletia o valor real do patrimônio da sociedade empresária, sob o qual a apuração seria realizada, o que poderia gerar prejuízos para o sócio retirante ou propiciar fraudes.
Para prevenir os sócios contra essa possibilidade, costume fazer-se a apuração mediante balanço especialmente levantado para a ocasião, denominado balanço de determinação, o qual é especialmente realizado para determinar o valor da quota reembolsável ao sócio desligado da sociedade.
Partindo das demonstrações contábeis, o profissional responsável, normalmente um contador, elabora o balanço de determinação em obediência às determinações judiciais que comandam a resolução de sociedade, procedendo a ajustes técnicos e avaliatórios extra-contábeis, de modo que os elementos patrimoniais reflitam os respectivos valores líquidos de realização na data do evento (ORNELAS, 2001). A metodologia utilizada na elaboração do balanço de determinação está prevista na NBC-T-4 (Resolução 732 do CFC).
A jurisprudência do STF, ciente da situação temerária que a apuração através do último balanço estava gerando nas sociedades empresárias, mormente o prejuízo ao sócio retirante ou seus herdeiros, assentou que deve ser assegurado ao sócio retirante situação de igualdade na apuração de haveres, fazendo-se este como se dissolução total fosse, mediante balanço de determinação.
Trata-se do julgamento do Recurso Extraordinário nº. 89.464/SP, Relator Ministro Cordeiro Guerra, cuja ementa transcreve-se:
“COMERCIAL. DISSOLUÇÃO DE SOCIEDADE LIMITADA. PEDIDA A DISSOLUÇÃO TOTAL POR SOCIO DISSIDENTE, NÃO E POSSIVEL, EM PRINCÍPIO, DECRETAR A DISSOLUÇÃO PARCIAL, COM SIMPLES APURAÇÃO CONTABIL DOS HAVERES DO AUTOR. ADMITIDA QUE SEJA A DISSOLUÇÃO PARCIAL EM ATENÇÃO A CONVENIENCIA DA PRESERVAÇÃO DO EMPREENDIMENTO, DAR-SE-A ELA MEDIANTE FORMA DE LIQUIDAÇÃO QUE A APROXIME DA DISSOLUÇÃO TOTAL. NESSE CASO, DEVE SER ASSEGURADA AO SOCIO RETIRANTE SITUAÇÃO DE IGUALDADE NA APURAÇÃO DE HAVERES, FAZENDO-SE ESTA COM A MAIOR AMPLITUDE POSSIVEL, COM A EXATA VERIFICAÇÃO, FÍSICA E CONTABIL, DOS VALORES DO ATIVO” (grifo do autor).
O voto do Ministro Décio Miranda tratou com profundidade a questão, no sentido de que o artigo 15 do Decreto nº. 3.708/19 não autoriza uma forma conveniente de liquidação dos bens sociais, mas sim a apuração de haveres segundo o último balanço. Porém, nas palavras do Ministro, o último balanço pode ter sido feito no momento em que a desavença entre os sócios não existisse, sendo que o balanço poderia exprimir valores contábeis sem a reavaliação que a situação monetária exigia.
Nesse sentido, dentro do raciocínio proposto pelo Ministro Décio Miranda, referido artigo concederia ao sócio uma faculdade, podendo ele aceitar e utilizar caso lhe pareça adequada a forma de reembolso prevista. Mas essa faculdade não poderia obrigar sua aceitação, motivo pelo qual o sócio pode pedir a dissolução total da sociedade conversível em dissolução parcial (rectius: resilição parcial do contrato), hipótese em que seu reembolso será apurado segundo valores reais do patrimônio social.
Perfilando esse entendimento, parece que a jurisprudência atual consolidou tal posicionamento, no sentido de que o critério de apuração dos haveres há de ser a utilização do balanço de determinação, como se dissolução total fosse. Citam-se os precedentes a título de exemplo:
“Dar-se-á apuração de haveres do sócio dissidente de maneira que a aproxime do resultado que poderia ele obter com a dissolução total, de forma ampla, com plena verificação, física e contábil, dos valores do ativo, e atualizados os ditos haveres, em seu valor monetário, até a data do pagamento. (STF. Recurso extraordinário nº. 91.044 – RS, por sua 2ª Turma)”.
“Na sociedade constituída por sócios diversos, retirante um deles, o critério de liquidação dos haveres, segundo a doutrina e a jurisprudência, há de ser, utilizando-se o balanço de determinação, como se tratasse de dissolução total. (STJ. Recurso Especial nº 35.702-0 – SP)”.
Pode suceder que muitas vezes o contrato social prefira estipular formas mais simples de apuração, como por exemplo, considerar o balanço aprovado, computando-se os lucros auferidos posteriormente até a data da retirada, ou fixar o valor do reembolso anualmente através de deliberação coletiva, ou predeterminar um valor fixo, pelo qual se fará o reembolso, qualquer que seja a situação patrimonial da empresa na ocasião etc.
Para ocorrer a intervenção do Judiciário, é necessário não haver consenso no desligamento do sócio ou inexista eventual consenso no acordo com os herdeiros do sócio falecido. Mais que isso, para afastar a intervenção do Judiciário na imposição da forma de apuração de haveres, faz-se necessária a total concordância dos herdeiros e sócios remanescentes, tanto em relação à resilição parcial propriamente dita, quanto no que tange à apuração e partilha dos haveres sociais.
Acerca do assunto, mutatis mutandis, pertinentes as considerações de José Waldecy Lucena (2001, p. 838):
“Calha observar, ainda a propósito da dissolução consensual, que o consenso deve abranger também a liquidação e a partilha, sob pena de, embora acordes os sócios na dissolução, a discordância na liquidação e partilha determinar a intervenção judicial. Vale dizer, para que o procedimento consensual de extinção de sociedade se dê sem interferência judicial, é preciso o mútuo consenso tanto na dissolução extrajudicial como na liquidação extrajudicial. (…)
Insista-se no ponto: a dissolução por mútuo consenso não afasta a intervenção judicial, se os sócios discordarem quanto a forma de liquidação ou quanto à partilha do acervo social remanescente”.
Oportuno citar os seguintes precedentes jurisprudenciais, devidamente negritados e destacados:
“Dissolução parcial. Sociedade por cotas de responsabilidade limitada. Reconvenção. Pagamento dos haveres. Previsão contratual. Precedentes da Corte. A ausência de intimação para oferecer contestação à reconvenção não ensejou qualquer prejuízo ao autor reconvindo, isto porque o pedido formulado na reconvenção foi atendido na própria ação de dissolução proposta pelo reconvindo, decretada a dissolução, apenas, parcial da sociedade. Não há, portanto, ofensa ao artigo 316 do Código de Processo Civil. Conforme jurisprudência desta Corte, a regra geral é a de que os haveres do sócio que se retira da sociedade devem ser pagos na forma prevista no contrato, salvo se existente alguma peculiaridade com força para afastar este entendimento, o que não ocorre no presente caso. Os paradigmas que servem de apoio ao dissídio devem estar no especial, apresentados de forma regular, não servindo, para tanto, paradigma posteriormente juntado." (REsp nº450129/MG, rel. Min. Carlos Alberto Menezes Direito, Terceira Turma, julgado em 8.10.2002.)” (grifo do autor).
"COMERCIAL. SOCIEDADE POR QUOTAS DE RESPONSABILIDADE ILIMITADA. DISSOLUÇÃO PARCIAL. A apuração dos haveres na dissolução parcial da sociedade por quotas de responsabilidade limitada segue as regras da retirada do sócio previstas no contrato social. Recurso especial conhecido, mas não provido. (REsp 83031/RS, rel. Min. Ari Pargendler, Terceira Turma, julgado em 19.11.1999)” (grifo do autor).
Obviamente, caso seja omisso o contrato social e a apuração determinada judicialmente, a mesma será realizada levando-se em conta a realização de um balanço que reavalia, a valor de mercado, os bens corpóreos e incorpóreos do patrimônio social, descontando-se o passivo, para projetar o quanto seria o acervo remanescente caso a sociedade fosse naquele momento dissolvida (COLEHO, 2003. p.160).
ANÁLISE CRÍTICA – MOMENTO CONTÁBIL DA APURAÇÃO NO CASO DE MORTE DO SÓCIO DE SOCIEDADE NÃO ANÔNIMA
Qual seria, então, o momento contábil que os critérios e métodos de apuração, sejam eles quais forem, devem considerar como termo a quo para apuração dos valores devidos aos herdeiros do sócio falecido? Não há comando legislativo que responda essa indagação, mas apenas posicionamentos doutrinários e jurisprudenciais.
Analisando de maneira superficial a questão acima exposta, a resposta lógica que vem à mente do jurista é a de que o termo inicial deve ser a data do óbito do sócio. O óbito é a regra.
Entendimento corroborado por maioria esmagadora da doutrina e jurisprudência, podendo-se citar a título de exemplo os ensinamento de Waldírio Bulgarelli em sua obra “O novo Direito Empresarial”, bem como julgamento pelo Tribunal de Justiça do Distrito Federal da Apelação interposta no processo 2003.07.5.009545-4, cujo relator foi Relator o Desembargador Roberval Casemiro Belinati.
Porém, alguns critérios fáticos devem ser analisados, já que dependendo da intenção dos sócios remanescentes e posterior atitude dos herdeiros do sócio falecido, esse marco temporal pode ser alterado, o que também tem sido analisado com cautela pela jurisprudência pátria.
É possível que os herdeiros do sócio falecido pretendam integrar o quadro social da sociedade empresária na condição de “substitutos” do falecido, praticando atos de sócio, desde que o contrato social não faça restrições e os sócios remanescentes não apresentem entraves justificados para tanto. Tal possibilidade é prevista no já citado artigo 1.028 do Novo Código Civil Brasileiro.
Nesse caso, o termo a quo para posterior apuração de haveres será aquele em que os herdeiros pleitearem a resilição parcial do contrato social, momento em que será apurada a quebra da affectio societatis e que será legítimo falar-se em resilição parcial e apuração de haveres.
O consenso alcançado é de que caso os herdeiros integrem a sociedade empresária e atuem como sócios da mesma, o momento para levantamento dos haveres será a data da extinção do vínculo, o que dependendo do posicionamento adotado, varia entre a data do envio da Notificação Extrajudicial que informa a intenção do desligamento, data do ajuizamento da ação própria ou mesmo a data da citação válida ocorrida no processo.
Sempre oportuno lembrar que o contrato social é o primeiro documento a ser analisado para averiguação acerca de eventual marco temporal para levantamento dos haveres, pois pode ocorrer ter sido estipulada cláusula específica a respeito do prazo para levantamento de valores devido ao sócio retirante. Tal possibilidade é legítima e possível, embora possa ocasionar posteriores discussões judiciais.
Exemplo prático disso é o julgamento do REsp nº. 282300/RJ, Relator Ministro Antônio de Pádua Ribeiro, no qual o Ministério Público Federal opinou e Tribunal Superior determinou a observância de cláusula no contrato social que previa o lapso de 30 (trinta) dias da morte para início da apuração de haveres.
De qualquer forma, com o falecimento do sócio, a regra geral é de que o termo a quo para apuração dos valores devidos aos herdeiros do sócio falecido é a data do óbito. Caso os herdeiros recusem-se a ingressar na condição de sócio ou não ocorrer o consenso necessário para a sua entrada nos quadros societários, a data a ser considerada para a apuração é o óbito do sócio pré-morto. A jurisprudência consolidou-se nesse sentido.
Porém, se ocorrer o ingresso como sócio e, posteriormente, o interesse no desligamento da sociedade, seja pelo motivo que for, a contagem do prazo para apurar haveres será a partir do seu efetivo afastamento, o que também se encontra consolidado pela doutrina e jurisprudência nacionais.
Mestrando em Direito Empresarial pela Faculdade de Direito Milton Campos/MG; Pós-Graduado em Direito Constitucional pela PUC Minas (IEC); Advogado
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