Atento às movimentações ocorridas no
mundo, o Estado brasileiro vem aos poucos modificando suas formas de atuação. O
modelo que está sendo adotado é intitulado “Estado Regulador” e situa-se entre
os modelos de estado intervencionista e liberal. Sua aplicação pode ser
assistida através das recentes concessões e permissões de serviços públicos à
iniciativa privada e a criação de agências reguladoras que monitoram estes
setores, como é o caso da energia elétrica, com a ANEEL, das telecomunicações
com a ANATEL e do setor de petróleo, com a ANP. Este é um modelo novo, pois até
pouco tempo o Brasil vivia em um modelo de Estado interventor, onde o governo
financiava o desenvolvimento. Entretanto, a entrada do país na economia de
mercado deve ser extremamente cuidadosa, pois o Brasil não possui tradição em
um ponto crucial de todo este mecanismo: a concorrência.
Dentro desta nova concepção, está
tomando forma àquela que é uma das agências de maior importância no Brasil, a
agência nacional do consumidor e da concorrência. A importância de uma agência
que visa preservar uma concorrência sadia é fundamental para um país que está
entrando em um regime de mercado. O projeto da nova agência, que deverá ser uma
autarquia especial com autonomia administrativa e financeira, deve ser remetido
ainda em março para apreciação do Congresso Nacional. Como deve correr em
caráter de urgência, a previsão é que seja aprovado ainda antes de agosto.
Hoje, a preservação da concorrência é
regulada por dois órgãos complementares: a SDE – Secretaria de Direito
Econômico e o CADE – Conselho Administrativo de Defesa Econômica, ambos parte da estrutura do Ministério da Justiça. O
primeiro investiga e instaura o procedimento administrativo que será remetido
para julgamento no segundo. A tendência é que a nova agência abrigue as
competências destes dois órgãos, além de parte de um terceiro, a SEAE –
Secretaria de Acompanhamento Econômico do Ministério da Fazenda. O novo órgão,
muito provavelmente, contará com duas diretorias relativas a assuntos de
natureza concorrencial, duas de assuntos relativos ao
consumidor e uma quinta que terá a incumbência de realizar estudos relativos a
ambas as áreas. Além das diretorias deverão existir o conselho nacional de
defesa do consumidor e o tribunal da concorrência.
A existência de um novo órgão que
regule a concorrência nos parâmetros de uma agência vem em boa hora para o
Brasil. Como resultado da abertura do mercado brasileiro, somente no último ano
foi possível observar uma expansão de atos de concentração na ordem de 600%. A
onda de fusões que iniciou nos Estados Unidos na década de 90 e se espalhou
rapidamente no mundo, justifica plenamente a criação de um novo órgão
antitruste adequado ao novo paradigma regulatório
brasileiro.
Muito tem se discutido acerca da união
dos órgãos que atuarão em assuntos relativos a
concorrência e consumidor em uma mesma agência. Vale lembrar que hoje estes
órgãos já atuam em conjunto no Ministério da Justiça. Além disto, vale lembrar
a experiência de outros países, como os Estados Unidos, com o FTC e a
Inglaterra, com o Office of Fair
Trading, que tratam destes assuntos conjuntamente.
Entretanto, o argumento que justifica esta união está na sua própria
finalidade, pois um órgão antitruste eficaz serve, dentre outras coisas, para
preservar os interesses dos consumidores. De outro lado, a defesa da
concorrência é também um meio de defesa de empresários que se sintam lesados
por atos de concentração e abuso de posição dominante no mercado. Ainda neste
último caso, está sendo analisada a possibilidade de adoção da “reparação
tripla” que consiste em o empresário lesado buscar compensação no valor de três
vezes a importância do dano sofrido.
No que tange a concorrência, a agência
deverá atuar tanto na área relativa a repressão,
quanto naquela relativa a prevenção. Esta provavelmente tomará contornos muito
interessantes quando atuar nos casos de avaliação do impacto de fusões e
possibilidades de lesões econômicas através do abuso de posição dominante no
mercado. Além destes, merecerão especial atenção os inúmeros casos de indícios
de cartel, que vão desde postos de gasolina até a indústria farmacêutica.
Em resumo, a agência deverá zelar pelo “fair play” no
mercado, coibindo abusos que afetem tanto os consumidores, quanto outros
empresários, visando aumentar a produtividade, respeitando os ditames da
concorrência, competição e livre-mercado. Seu papel, juntamente com as outras
agências, além da convivência harmônica entre todas, é fundamental diante do
novo modelo de Estado que está sendo desenhado no Brasil.
advogado, sócio da Governale – Políticas Públicas e Relações Institucionais (www.governale.com.br). Habilitado em Direito Mercantil pela Unisinos. Professor de Direito Constitucional e Internacional do UniCEUB – Centro Universitário de Brasília. PIL pela Harvard Law School. MBA em Direito Econômico pela Fundação Getúlio Vargas. Especialista em Direito Internacional pela UFRGS. Mestrando em Relações Internacionais pela UnB.
Vice-Presidente do Conil-Conselho Nacional dos Institutos Liberais pelo Distrito Federal. Sócio do IEE – Instituto de Estudos Empresariais. É editor do site Parlata (www.parlata.com.br) articulista semanal do site www.diegocasagrande.com.br e www.direito.com.br. Tem artigos e entrevistas publicadas em diversos sites nacionais e estrangeiros (www.urgente24.tv) e jornais brasileiros como Jornal do Brasil, Gazeta Mercantil, Zero Hora, Jornal de Brasília, Correio Braziliense, O Estado do Maranhão, Diário Catarinense, Gazeta do Paraná, O Tempo (MG), Hoje em Dia, Jornal do Tocantins, Correio da Paraíba e A Gazeta do Acre. É autor do livro “A Recuperação da Empresa: Regimes Jurídicos brasileiro e norte-americano”, Ed. Síntese – IOB Thomson (www.sintese.com).
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