Resumo: Tema de destaque na atual doutrina ambiental e que tem sido alvo de ajuizamento de ações judiciais diz respeito à aplicação do art. 72, § 4º, da Lei nº 9.605/1998, com a regulamentação trazida pelo Decreto nº 6.514/2008. Tal dispositivo previu a possibilidade de conversão de penalidade de multa aplicada em razão da prática de infração administrativa ambiental em prestação de serviços de preservação, melhoria e recuperação da qualidade do meio ambiente. Trata-se de medida de caráter restritivo que deve ser aplicada nos limites do interesse da Administração Ambiental, não se confundindo com direito subjetivo do autuado.
Palavras-chave: Direito ambiental. Conversão de multa administrativa em prestação de serviço. Caráter restritivo. Interesse da Administração Pública. Inexistência de direito subjetivo do autuado.
Sumário: 1. Considerações iniciais; 2. Da legalidade do auto de infração e da penalidade de multa simples aplicada em razão de infração administrativa ambiental. 3. Da discricionariedade da decisão que analisa pedido de conversão de multa simples em prestação de serviço; 4. Dos serviços que podem ser considerados de preservação, melhoria e qualidade do meio ambiente; 5. Do procedimento a ser seguido no pedido de conversão: prazos, exigências e vedações legais aplicáveis; 6. Das considerações finais; 7. Das referências bibliográficas.
1. DAS CONSIDERAÇÕES INICIAIS
A conversão da multa ambiental em prestação de serviço tem atualmente previsão legal, mas exige cautela na sua aplicação. O assunto, na medida em que interfere nos direitos dos administrados e que representa renúncia de verbas públicas, representa certa complexidade, sendo tema tratado pela doutrina e jurisprudência pátrias.
As considerações que se seguem têm o objetivo de analisar, sob uma perspectiva de quem atua na área ambiental e na Administração Pública Federal, que a previsão legal de conversão requer uma interpretação restritiva e focada exclusivamente no interesse público e na efetivação do direito difuso ao meio ambiente ecologicamente equilibrado.
Insubsistente, portanto, entendimento que defende se tratar de direito subjetivo do administrado, a quem foi aplicada multa decorrente de infração ambiental. O interesse a ser atendido pela legislação é exclusivamente o público, a ser regido pela aplicação incondicional das normas procedimentais vigentes, não havendo espaço para revisões pelo Poder Judiciário de decisões administrativas, proferidas em total atendimento à lei e aos critérios de conveniência e oportunidade aplicáveis.
2. DA LEGALIDADE DO AUTO DE INFRAÇÃO E DA PENALIDADE DE MULTA SIMPLES APLICADA EM RAZÃO DE INFRAÇÃO ADMINISTRATIVA AMBIENTAL
Inicialmente, importa registrar que o Poder de Polícia Ambiental encontra-se amparado pela Carta Magna de 1988, que em seu art. 225, estabelece:
“Art. 225. Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações.
(…)
§ 3º As condutas e atividades consideradas lesivas ao meio ambiente sujeitarão os infratores, pessoas físicas ou jurídicas, a sanções penais e administrativas, independentemente da obrigação de reparar os danos causados.”G.N.
Como se vê, o Poder Constituinte Originário outorgou à coletividade o direito fundamental a um meio ambiente ecologicamente equilibrado, sendo certo afirmar que, para preservar a efetividade desse direito, concedeu ao Poder Público o poder-dever de fiscalizar a conduta daqueles que se apresentem como potenciais ou efetivos poluidores.
Objetivando implementar concretamente essa fiscalização, o legislador infraconstitucional criou o Ibama, conferindo-lhe o poder de polícia necessário à consecução deste fim, como se depreende da regra contida no art. 2º da Lei nº 7.735/1989:
“Art. 2o É criado o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis – IBAMA, autarquia federal dotada de personalidade jurídica de direito público, autonomia administrativa e financeira, vinculada ao Ministério do Meio Ambiente, com a finalidade de:
I – exercer o poder de polícia ambiental; (…)”
Com efeito, o Ibama tem o chamado “poder-dever” de aplicar penalidades administrativas aos que cometem infrações administrativas ambientais, por força do disposto nos arts. 70 e 72 da Lei n° 9.605/1998 e de acordo com as tipificações previstas no Decreto nº 6.514/98. Dentre as penalidades administrativas existentes, encontra-se a multa simples:
“Lei n° 9.605/1998
Art. 70. Considera-se infração administrativa ambiental toda ação ou omissão que viole as regras jurídicas de uso, gozo, promoção, proteção e recuperação do meio ambiente. (…)
Art. 72. As infrações administrativas são punidas com as seguintes sanções, observado o disposto no art. 6º:
I – advertência;
II – multa simples;
III – multa diária;
IV – apreensão dos animais, produtos e subprodutos da fauna e flora, instrumentos, petrechos, equipamentos ou veículos de qualquer natureza utilizados na infração;
V – destruição ou inutilização do produto;
VI – suspensão de venda e fabricação do produto;
VII – embargo de obra ou atividade;
VIII – demolição de obra;
IX – suspensão parcial ou total de atividades;
X – (VETADO)
XI – restritiva de direitos. G.N.”
Assim, como órgão integrante do SISNAMA e no exercício de suas atribuições institucionais, que a lei lhe obriga a defender, o Ibama aplica penalidade administrativa de multa simples, prevista na legislação aplicável como penalidade a ser aplicada em razão da constatação da infração tipificada no Decreto nº 6.514/2008.
As penalidades administrativas impostas em função de infrações ambientais têm por finalidade coibir as condutas e atividades nocivas ao meio ambiente, dado que a consagração do direito previsto no caput do art. 225 da CF/1988 trouxe para o Poder Público a exigência de uma ação estatal eficiente na gestão ambiental.
Sob o enfoque da legalidade (art. 37, caput, da CF/1988), não se pode deixar de reconhecer que a atuação da Administração Pública, ao lavrar auto de infração ambiental e aplicar a penalidade de multa, está pautada no devido processo legal.
3. DA DISCRICIONARIEDADE DA DECISÃO QUE ANALISA PEDIDO DE CONVERSÃO DE MULTA SIMPLES EM PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS
Segundo a Lei nº 9.605/1998:
“Art. 72. (…)
§ 4º A multa simples pode ser convertida em serviços de preservação, melhoria e recuperação da qualidade do meio ambiente.’
Regulamentando o dispositivo legal acima transcrito, o Decreto nº 6.514/2008 estabelece que:
“Art. 139. A autoridade ambiental poderá, nos termos do que dispõe o § 4o do art. 72 da Lei no 9.605, de 1998, converter a multa simples em serviços de preservação, melhoria e recuperação da qualidade do meio ambiente. (…)
Art. 145. Por ocasião do julgamento da defesa, a autoridade julgadora deverá, numa única decisão, julgar o auto de infração e o pedido de conversão da multa.
§ 1o A decisão sobre o pedido de conversão é discricionária, podendo a administração, em decisão motivada, deferir ou não o pedido formulado, observado o que dispõe o art. 141.”
Vê-se, assim, que além de uma série de exigências a serem atendidas, quem serão adiante analisadas, o pedido de conversão de multa é discricionário, podendo a Administração, desde que motive sua decisão, deferi-lo ou não.
Nesse contexto, depara-se com certa margem de discricionariedade conferida ao aplicador da norma, propiciando-lhe sopesar todos os elementos necessários à análise do pedido, sendo certo que se trata de decisão de competência exclusiva da autoridade administrativa e não do Poder Judiciário.
Assim, a conversão da multa em prestação de serviço não figura direito subjetivo do autuado, tendo que ser deferido mediante a demonstração do interesse e oportunidade da Administração e no benefício ambiental direto gerado pela prestação do serviço de preservação, melhoria e recuperação da qualidade ambiental.
Em face da incontestável natureza discricionária do pleito, não cabe ao Poder Judiciário se imiscuir na esfera de competência da Administração Federal, aplicando solução diversa à encontrada pela Autarquia.
Nesse sentido, inclusive, decidiu o Superior Tribunal de Justiça:
“PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. DANO AMBIENTAL. VIOLAÇÃO DO ART. 50 DA LEI N. 9.784/99. NÃO OCORRÊNCIA. APLICAÇÃO MOTIVADA DA MULTA. ALEGADA VIOLAÇÃO DO ART. 6º DA LEI N. 9.605/98. NÃO VERIFICADA. OBSERVÂNCIA DOS REQUISITOS PARA APLICAÇÃO DA PENALIDADE. PODER DISCRICIONÁRIO DO ADMINISTRADOR PÚBLICO. INTERVENÇÃO DO PODER JUDICIÁRIO. IMPOSSIBILIDADE. REVISÃO DO VALOR DA MULTA APLICADA. INCURSÃO NO ACERVO FÁTICO-PROBATÓRIO DOS AUTOS. IMPOSSIBILIDADE. INCIDÊNCIA DA SÚMULA 7/STJ. (…)
4. Cabe ao administrador público, em virtude do seu poder discricionário, aferir a gravidade das condutas e a culpabilidade do agente, bem como a razoabilidade da sanção imposta, sendo, portanto, inviável que o Poder Judiciário venha a reduzir ou substituir a penalidade aplicada.
5. A alteração do entendimento exarado pelo acórdão recorrido, a fim de acolher a irresignação do recorrente, é inviável em sede de recurso especial, tanto pelas razões já expostas, como também por demandar, necessariamente, o revolvimento das circunstâncias fático-probatórias da causa, o que é vedado pela Súmula 7 desta Corte.
6. Agravo regimental não provido.”G.N.
(STJ; AgRg no Ag nº 1.261.699/SC, Rel. Ministro Benedito Gonçalves, Primeira Turma, DJe 26/11/2010)
Mais especificamente quanto à decisão judicial que, de forma contrária ao entendimento do Poder Executivo, converteu a multa simples em prestação de serviço, o STJ também deu razão à Autarquia Ambiental, julgando recentemente que:
“(…) Com razão o recorrente quanto a revisão nos critérios para
aplicação da multa, bem como da possibilidade de convertê-la em prestação de serviços de preservação, melhoria e recuperação da qualidade do meio ambiente.
É que, uma vez respeitados os parâmetros mínimo e máximo estabelecidos na legislação de regência para fixação da multa, o que, ao que se tem, ocorreu na espécie, não cabe ao Poder Judiciário substituir o administrador no exercício de seu poder discricionário acerca da conveniência e oportunidade da escolha da sanção a ser aplicada.” G.N.
(STJ; Resp nº 1.233.484-RS; Rel. Ministro Hamilton Carvalhido; Data de julgamento: 09/02/2011).
Assim, deverá exercer o órgão do SISNAMA, no caso, um grau de discricionariedade técnica, que lhe é privativo, em virtude do conhecimento que possui sobre a melhor forma de aplicar sanções administrativas, de modo a inibir condutas infracionais e a estimular a preservação ambiental. Ao Poder Judiciário, conseqüentemente, seria vedado interferir nessas opções de ordem administrativa e técnica inerente ao poder de polícia ambiental, sob pena de invadir competência própria do Poder Executivo e de ferir o art. 2º da Constituição Federal, para o qual:
“Art. 2º São poderes da União, independentes e harmônicos entre si, o Legislativo, o Executivo e o Judiciário.”
Em idêntica linha argumentativa, a renomada doutrina defende:
“A valoração de conduta que configura o mérito administrativo pode alterar-se, bastando para tanto imaginar a mudança dos fatores de conveniência e oportunidade sopesados pelo agente da Administração. Na verdade, o que foi conveniente e oportuno hoje para o agente praticar o ato pode não sê-lo amanhã. O tempo, como sabemos, provoca alteração das linhas que definem esses critérios.
Com tal natureza, vemos que o agente pode mudar sua concepção quanto à conveniência e oportunidade da conduta. Desse modo, é a ele que cabe exercer esse controle, de índole eminentemente administrativa. (…)
O Judiciário, entretanto, não pode imiscuir-se nessa apreciação, sendo-lhe vedado exercer controle judicial sobre o mérito administrativo. Como bem aponta SEABRA FAGUNDES, com apoio em RENELLETTI, se pudesse o juiz fazê-lo, “faria obra de administrador, violando, dessarte, o princípio de separação e independência dos poderes[1]”. (…)”
Ainda sobre a conversão de multa em prestação de serviço ambiental, respeitável doutrinador da área sabiamente defende que:
“O § 1º esclarece que a concessão do benefício é discricionária, podendo a autoridade competente deferir ou não o pedido formulado pelo autuado. Isto deixa claro, em perfeita harmonia com o que estabelece o art. 139, que a conversão da multa está longe de representar um direito do autuado, mas uma possibilidade para o gestor público.
Quanto à motivação exigida para o indeferimento do pedido, entendemos que o § 3º do art. 225 da Constituição Federal, que estabelece a independência entre as sanções penais, civis e administrativas, é suficiente. Para fundamentar o deferimento do pedido de conversão da multa teriam que ser comprovadas as vantagens para o meio ambiente e para a coletividade, pois mesmo as mais sólidas convicções pessoais do agente público não podem sobrepor interesses individuais a interesses coletivos, por contrariar o espírito das leis que defendem direitos coletivos difusos.
Portanto, como não existem critérios objetivos para o acatamento ou não do pedido de conversão da multa, considerando que o § 1º do art. 145 do Decreto estabelece claramente a discricionariedade da administração, só nos resta aconselhar aos gestores públicos que observem a máxima cautela, pois assim como o indeferimento deve ser fundamentado também o deve ser o acatamento[2].” G.N.
Assim, com base na doutrina e na jurisprudência sobre o assunto, o Judiciário não pode contrariar decisão administrativa que entendeu, motivadamente, inaplicável ao caso a pretendida conversão da penalidade de multa em prestação de serviço. Ademais, como se verá adiante, são inúmeros os critérios e procedimentos, aos quais a legislação impõe obediência, e que devem subsidiar a decisão do Ibama, Autarquia que detém, de forma exclusiva, os necessários conhecimento técnico e discricionariedade para avaliação do pedido.
4. DOS SERVIÇOS QUE PODEM SER CONSIDERADOS DE PRESERVAÇÃO, MELHORIA E QUALIDADE DO MEIO AMBIENTE
Segundo dispõe o Decreto nº 6.514/2008:
“Art. 140. São considerados serviços de preservação, melhoria e recuperação da qualidade do meio ambiente:
I – execução de obras ou atividades de recuperação de danos decorrentes da própria infração;
II – implementação de obras ou atividades de recuperação de áreas degradadas, bem como de preservação e melhoria da qualidade do meio ambiente;
III – custeio ou execução de programas e de projetos ambientais desenvolvidos por entidades públicas de proteção e conservação do meio ambiente; e
IV – manutenção de espaços públicos que tenham como objetivo a preservação do meio ambiente.”
É fato que o objetivo do legislador, ao prever a conversão da penalidade pecuniária em análise, foi garantir a prevalência do direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, fazendo-se reverter, a este, projetos que efetivamente contribuam para a melhoria da qualidade ambiental e para a reparação de área ambientalmente degradada.
Assim, sem nenhum sentido apresentação de projeto ou proposta que não guarde relação direta ou indireta com a defesa do meio ambiente. Sobre o assunto, o Tribunal de Contas da União se posicionou, entendendo que a legislação não permite a conversão de multa em prestação de serviços não ambientais. Inclusive, houve determinação para responsabilização do gestor público que anuiu com conversão indevida, motivo pelo qual se impõe cautela ao Administrador Público no deferimento dos projetos que permitam a conversão da multa. Transcreve-se trecho do TCU a respeito da matéria:
“Com efeito, o art. 72, § 4º, da mencionada Lei nº 9.605/1998, ao disciplinar que “…A multa simples pode ser convertida em serviços de preservação, melhoria e recuperação da qualidade do meio ambiente”, não pretendeu, em nenhum momento, autorizar o recebimento de carros (termos de compromisso nº 04 e 06/2002), móveis (termo de compromisso nº 02/2002), objetos eletrônicos e computadores (termos de compromisso nº 02, 03 e 05/2002), cursos pós-graduação para servidores área ambiental (termo de compromisso nº 01/2002). Como ressalta o Senhor Secretário, a mencionada Lei “busca engajar os infratores na preocupação pelo meio ambiente, possibilitando que a multa imposta possa ser convertida em atuação nos projetos e serviços que visem a preservação, melhoria e recuperação da qualidade do meio ambiente.”
Mesmo as disposições da Instrução Normativa nº 10/2003, posteriormente editada pelo IBAMA, com o objetivo de estabelecer procedimentos para a aplicação da conversão da multa administrativa em serviços de preservação, melhoria e recuperação da qualidade do meio ambiente, não enseja autorizar essa prática, uma vez que as duas formas de conversão de multas em prestação de serviços ali estabelecidas apontam para a necessidade de as atividades serem dirigidas a projetos ou programas ambientais”
(TCU; Acórdão 275/2004; Processo nº 003.788/2003-6; DOU nº 20/03/2004).
Também defendendo a impossibilidade de conversão em prestação de serviços não ambientais, Édis Milaré ensina que:
“Não obstante a clareza desta disposição, não raras vezes os órgãos públicos têm celebrado termos de compromisso em que a prestação do serviço pelo autuado é transformada no fornecimento de bens ou serviços ao Poder Público, como. V. g., doação de carros ou computadores, realização ou custeio de reformas nas unidades dos órgãos públicos etc., o que foge não somente ao espírito do decreto 6.514/2008, mas também a própria Constituição Federal[3].”
Ainda no que tange aos serviços que podem dar margem à conversão, não se pode esquecer a exigência de que os mesmos estejam especificados em projeto a ser apresentado ao órgão ambiental e por ele aprovado, determinando o Decreto nº 6.514/2008 que:
“Art. 144. A conversão de multa destinada à reparação de danos ou recuperação da áreas degradadas pressupõe que o autuado apresente pré-projeto acompanhando o requerimento.
§ 1o Caso o autuado ainda não disponha de pré-projeto na data de apresentação do requerimento, a autoridade ambiental, se provocada, poderá conceder o prazo de até trinta dias para que ele proceda à juntada aos autos do referido documento.
§ 2o A autoridade ambiental poderá dispensar o projeto de recuperação ambiental ou autorizar a substituição por projeto simplificado quando a recuperação ambiental for de menor complexidade.
§ 3o Antes de decidir o pedido de conversão da multa, a autoridade ambiental poderá determinar ao autuado que proceda a emendas, revisões e ajustes no pré-projeto.
§ 4o O não-atendimento por parte do autuado de qualquer das situações previstas neste artigo importará no pronto indeferimento do pedido de conversão de multa.”
É forçoso reconhecer, portanto, que o indeferimento do pedido de conversão será medida necessária, quando não restarem atendidas as exigências acima, mais ainda nas situações em que o interessado, sequer, tenha apresentado qualquer projeto de preservação, melhoria e qualidade do meio ambiente.
5. DO PROCEDIMENTO A SER SEGUIDO NO PEDIDO DE CONVERSÃO: PRAZOS, EXIGÊNCIAS E VEDAÇÕES LEGAIS APLICÁVEIS
O pedido de conversão de multa em prestação de serviço, além de discricionário, deve obedecer a uma série de requisitos, alguns próprios da admissibilidade da análise, outros aplicáveis ao seu deferimento. O descumprimento do procedimento a seguir delineado e/ou das exigências legais próprias acarretam o não conhecimento ou indeferimento do pedido, em âmbito administrativo.
O primeiro requisito de admissibilidade do pedido diz respeito ao prazo em que ele deve ser apresentado. Como se sabe, o decurso do tempo faz decair direitos da Administração e do Administrado, o que implica, no caso, a necessidade de obediência do momento oportuno para apresentação do pleito. Nesse sentido, estabelece o Decreto nº 6.514/08:
“Art. 142. O autuado poderá requerer a conversão de multa de que trata esta Seção por ocasião da apresentação da defesa. (…)
Art. 145. Por ocasião do julgamento da defesa, a autoridade julgadora deverá, numa única decisão, julgar o auto de infração e o pedido de conversão da multa.
§ 1o A decisão sobre o pedido de conversão é discricionária, podendo a administração, em decisão motivada, deferir ou não o pedido formulado, observado o que dispõe o art. 141.
§ 2o Em caso de acatamento do pedido de conversão, deverá a autoridade julgadora notificar o autuado para que compareça à sede da respectiva unidade administrativa para a assinatura de termo de compromisso.
§ 3o O deferimento do pedido de conversão suspende o prazo para a interposição de recurso durante o prazo definido pelo órgão ou entidade ambiental para a celebração do termo de compromisso de que trata o art. 146.”
Assim, o momento adequado e único possível para manifestação de interesse pela conversão é na ocasião da apresentação da defesa ao auto de infração, que aplicou ao administrado a penalidade de multa a ser possivelmente convertida. O rito do processo administrativo aplicável não permite outra fase para manifestação de vontade do autuado, tendo em vista que isso implicaria necessário tumulto processual e desrespeito ao procedimento legal a ser seguido. Assim, a apresentação do pedido em ocasião diversa a da realização da defesa administrativa acarreta, motivadamente, o seu não conhecimento e conseqüente indeferimento.
Ademais, nenhum sentido teria a norma se interpretada de forma diversa. As duas manifestações devem ser apresentadas tempestivamente, ou seja, no prazo legal concedido para defesa administrativa, que, segundo a Lei nº 9.605/1998, é de 20 (vinte) dias (art. 71, inciso I). Do mesmo modo, entende a doutrina pátria:
“O requerimento da conversão de multa deverá ser protocolado por ocasião da apresentação da defesa, portanto no prazo de vinte dias após a ciência da autuação. Temos, assim, que qualquer processo em tramitação em que não tenha sido requerida a conversão neste prazo, o pedido deve ser indeferido de plano, por intempestivo[4].”
Com efeito, se o próprio legislador estabeleceu prazo para apresentação de defesa ao auto de infração e se há também norma estabelecendo a necessidade de apresentação concomitante das duas manifestações, a interpretação sistemática dos dispositivos traz a conclusão de que o pedido de conversão de multa há de ser, necessariamente, apresentado no mesmo prazo de 20 (vinte) dias a contar do recebimento da notificação para defesa.
Quanto aos critérios de apreciação do pedido, para os casos em que positivo o juízo de admissibilidade, deve-se observar, de início, que o Decreto nº 6.514/08, com muita razão, definiu casos em que a conversão não poderá ser concedida, quando se tratar de projeto que vise à recuperação de danos da própria infração. Parece óbvio que o intuito do legislador, ao prever essa espécie de conversão, foi estimular medidas reparatórias do dano ambiental efetivamente causado, em detrimento do recolhimento de penalidade pecuniária, que muitas vezes, não se reverte ao meio ambiente. Assim, sem nenhuma razão autorizar a dita conversão em prestação de serviço para recuperar o dano causado pela própria infração, quando esta não tiver causado, diretamente, dano ao meio ambiente ou nas hipóteses em que a recuperação da área ocorrer naturalmente, não demandando execução de nenhum projeto humano específico. Nesse sentido, o citado Decreto estabeleceu, de forma objetiva, que:
“Art. 141. Não será concedida a conversão de multa para reparação de danos de que trata o inciso I do art. 140, quando:
I – não se caracterizar dano direto ao meio ambiente; e
II – a recuperação da área degradada puder ser realizada pela simples regeneração natural.
Parágrafo único. Na hipótese do caput, a multa poderá ser convertida nos serviços descritos nos incisos II, III e IV do art. 140, sem prejuízo da reparação dos danos praticados pelo infrator.”
Assim, em se tratando de pedido de conversão que esbarre nas objeções acima, o ato administrativo encontra impedimento legal para ser realizado, sendo vedado o deferimento do pedido.
De igual forma, o pleito de conversão só poder ser atendido se, após cumpridos todos os demais requisitos e mostrando-se a medida oportuna, por ser favorável ao meio ambiente, o valor dos custos envolvidos no projeto sejam, comprovadamente, igual ou superior ao valor da multa convertida, a qual poderá corresponder a 60% do valor da multa consolidada. É que o Decreto nº 6.514/08 estabelece:
“Art. 143. O valor dos custos dos serviços de preservação, melhoria e recuperação da qualidade do meio ambiente não poderá ser inferior ao valor da multa convertida.
§ 1o Na hipótese de a recuperação dos danos ambientais de que trata do inciso I do art. 140 importar recursos inferiores ao valor da multa convertida, a diferença será aplicada nos outros serviços descritos no art. 140.
§ 2o Independentemente do valor da multa aplicada, fica o autuado obrigado a reparar integralmente o dano que tenha causado.
§ 3o A autoridade ambiental aplicará o desconto de quarenta por cento sobre o valor da multa consolidada”. (Redação dada pelo Decreto nº 6.686, de 2008).
Conclui-se que, se o projeto apresentado à Administração, com o fim de conversão de multa, não especificar o valor dos custos dos serviços, ou se tal custo for inferior ao mínimo legal, não haverá cumprimento de requisito exigível, o que constitui mais uma fundamentação válida para a negativa do pedido de conversão, por parte do órgão ambiental.
Ademais, o pedido de conversão deve se fazer acompanhar de pré-projeto, especificando o serviço de preservação, melhoria e qualidade do meio ambiente a ser executado, com exceção de casos em que a recuperação ambiental for de menor complexidade, o que deve ser avaliado pela autoridade ambiental. Portanto, a dispensa de pré-projeto ou a sua substituição por projeto simplificado constitui exceção, cuja avaliação é de competência exclusiva do órgão ambiental e não do administrado. É o que estabelece o Decreto nº 6.514/08:
“Art. 144. A conversão de multa destinada à reparação de danos ou recuperação da áreas degradadas pressupõe que o autuado apresente pré-projeto acompanhando o requerimento.
§ 1o Caso o autuado ainda não disponha de pré-projeto na data de apresentação do requerimento, a autoridade ambiental, se provocada, poderá conceder o prazo de até trinta dias para que ele proceda à juntada aos autos do referido documento.
§ 2o A autoridade ambiental poderá dispensar o projeto de recuperação ambiental ou autorizar a substituição por projeto simplificado quando a recuperação ambiental for de menor complexidade.
§ 3o Antes de decidir o pedido de conversão da multa, a autoridade ambiental poderá determinar ao autuado que proceda a emendas, revisões e ajustes no pré-projeto.
§ 4o O não-atendimento por parte do autuado de qualquer das situações previstas neste artigo importará no pronto indeferimento do pedido de conversão de multa”
Vê-se, assim, que a norma é expressa ao dispor que será indeferido o pedido se não atendida qualquer das situações dispostas no artigo transcrito, sendo certo que a não apresentação de projeto que demonstre o objeto da medida de recuperação e as suas vantagens para o meio ambiente impossibilita o deferimento do pedido, por falta de elementos mínimos que subsidiem a decisão administrativa.
Por fim, há que se reconhecer uma hipótese objetiva de indeferimento do pedido de conversão, previsto no art. 148 do Decreto nº 6.514/08, segundo o qual:
“Art. 148. A conversão da multa não poderá ser concedida novamente ao mesmo infrator durante o período de cinco anos, contados da data da assinatura do termo de compromisso.”
Na opinião do já citado e respeitável doutrinador Curt Trennepohl:
“O mesmo infrator não poderá pactuar nova conversão de multa num período de cinco anos. Por conseguinte, resta claro que também não poderá ser objeto de conversão mais de um auto de infração num mesmo acordo[5].”
Assim, o descumprimento de qualquer das condicionantes aqui expostas, seja no tange ao prazo, seja em relação ao procedimento e aos requisitos mínimos aplicáveis, enseja a decisão administrativa de indeferimento, a qual, estando definitivamente motivada e de acordo com os parâmetros legais, não admite revisão pelo Poder Judiciário.
6. DAS CONSIDERAÇÕES FINAIS
O espírito do legislador, ao confeccionar as normas legais e infra-legais, deve ser objeto de análise do intérprete, na aplicação dos comandos postos. As razões que justificaram a previsão de conversão da multa administrativa ambiental, certamente, não buscaram concretizar o interesse particular do infrator, mas sim a necessidade de tornar efetivo o direito de todos ao meio ambiente sadio.
Somente o interesse público, envolvido na consecução de projeto ambiental, conveniente e oportuno na avaliação do órgão competente, pode justificar o ato administrativo de deixar de recolher aos cofres públicos penas pecuniárias devidamente aplicadas, em razão do cometimento de infração administrativa ambiental.
Por tais razões, enxergar um direito subjetivo do autuado na aplicação da conversão de multa ambiental em prestação de serviço significaria um verdadeiro retrocesso na defesa do meio ambiente, o que é inadmissível nesta seara do Direito.
Procuradora federal junto ao Ibama e pós graduada em Direito Público e em Direito Processual Civil pela Universidade do Sul de Santa Catarina.
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