Temos verificado que na Justiça Federal, no tocante ao prazo legal para recolhimento das custas processuais iniciais, têm ocorrido situações interessantes que merecem reflexão e um estudo, mesmo que sucinto, como o presente, com o escopo de contribuir para a melhoria dos serviços judiciários, apontando soluções possíveis para um bom equacionamento dessas ocorrências.
A Seção de Classificação e Distribuição de feitos de cada Seção Judiciária é um Serviço Auxiliar da Justiça Federal, a teor do disposto nos incisos III e V, art. 36 da Lei nº 5.010/66, cuja supervisão está a cargo de um Magistrado previamente designado ou do próprio Juiz Diretor do Foro (§2º, art.36 Lei nº 5.010/96).
Com efeito, as questões identificadas são, basicamente, as seguintes:
1) Afastada a hipótese de pedido de Assistência Judiciária, a distribuição é feita sem o recolhimento das custas iniciais;
2) a petição é despachada em plantão, em face da urgência que o caso requer (Mandado de Segurança, Reintegração de Posse, Ações Cautelares, etc), não tendo sido recolhidas as custas iniciais e, depois que o Juiz Plantonista encaminha a petição e sua decisão à Seção de Classificação e Distribuição, o pleito é distribuído, mesmo sem o pagamento das custas;
3) nesse último caso é de destacar-se, ainda, duas situações, freqüentemente ocorrentes:
Dispõe o art. 257 do Código de Processo Civil:
“Art. 257 – Será cancelada a distribuição do feito que, em trinta (30) dias, não for preparado no cartório em que deu entrada”.
Sem dúvida alguma, esta é uma regra geral de direito que comina uma sanção processual e estabelece um prazo geral de trinta (30) dias para o pagamento das custas iniciais, de todas as ações propostas em qualquer foro judicial do País.
Comentando esse dispositivo, E. D. Moniz de Aragão diz ser esse prazo quase que inócuo, porque deve prevalecer à respeito o que dispuser a “lei local das custas judiciárias. Onde não houver tal exigência, nada haverá a pagar… Convém sublinhar que o texto não visa regular o preparo, ou prazo para ser feito, e sim o cancelamento da distribuição, no caso que enuncia; este é o seu único objetivo” ( Comentários ao CPC, Forense, Vol II, pág.416).
O texto, então, só está a indicar a conseqüência jurídica do inadimplemento no pagamento das custas processuais que é o cancelamento da distribuição, porque o prazo para esse fim será sempre o estabelecido nas Leis Especiais relativas as custas judiciais.
Na Justiça Federal, por conseguinte, a regra especial de direito que fixa o prazo para o recolhimento das custas judiciais é a estabelecida no inciso I, art. 14, da Lei nº 9.289, de 04-07-96 (REGIMENTO DE CUSTAS DA JUSTIÇA FEDERAL), que tem seguinte dicção:
Esse dispositivo está a indicar também que mesmo no caso das decisões de urgência, que acontecem nos plantões, as custas deverão ser pagas logo após esse despacho inicial, ou seja, até a distribuição que, nessa hipótese, deverá ocorrer no primeiro dia útil subseqüente, tenha ou não sido concedida a medida de urgência pelo Juiz Plantonista.
Esse é o entendimento da Justiça Federal da 1ª Região, que até baixou atos normativos à respeito através da sua Corregedoria Geral, primeiro pelo Provimento nº 40 de 14-08-1996 (no §3º, art 5º) e, agora, mediante o disposto no §3º, art. 179, do Provimento nº 03, de 03-04-2002, publicado no DJU da mesma data, que tem a seguinte redação:
Primeiramente observa-se que ao determinar o cancelamento da distribuição, como conseqüência dessa inadimplência, esse comando legal também deixa claro, que o recolhimento das custas iniciais é um pressuposto processual objetivo de existência do processo, vez que o cancelamento da distribuição implica no seu extermínio ab ovo, impedindo, ipso facto, que o juízo a quem tenha sido feita a distribuição cancelada possa proferir qualquer outro julgamento, quer de natureza formal ou de mérito.
Por outro lado, dispondo a Lei Especial de Custas da Justiça Federal (inciso I, art. 14, da Lei nº 9.289/96) que o prazo para o seu recolhimento é até a distribuição e, sendo esse ato (a distribuição), a teor do disposto no art. 263 do CPC, o momento em que considera-se proposta a ação, ou, ainda, o marco inicial de formação do processo nas Comarcas ( na Justiça Federal leia-se Seções Judiciárias ) onde houver mais de uma Vara Judicial com idêntica competência jurisdicional, pode-se afirmar que o legislador quis dizer que, sem o pagamento das custas iniciais, não pode haver processo validamente constituído.
Por isso, é fácil concluir que a distribuição feita sem o pagamento das custas iniciais, nas Seções Judiciárias da Justiça Federal, providas de mais de uma Vara com a mesma competência jurisdicional, é sempre indevida, porque feita em franca hostilidade aos comandos jurídicos emanados do inciso I, art. 14 da Lei nº 9.289/96 c/c art. 257 do CPC e §3º, art. 179 do Provimento/COGER Nº 03/2002, que só permitem a distribuição de petições iniciais após o pagamento das custas iniciais.
Entretanto, alguns defendem a necessidade de intimação, até pessoal, da parte em sentido material para que recolha, em novo prazo a ser assinado pelo Juiz, as custas iniciais que não quis recolher para, só então, ante a recalcitrância, poder o Juiz determinar o cancelamento da distribuição em casos que tais. Existe até alguns julgados nesse sentido.
E. D. Moniz de Aragão (obra citada, págs. 416/417), referindo-se a esse entendimento, nos comentários ao art. 257 do CPC, diz que “Trata-se de interpretação liberal do texto, visto que a falta de preparo (pagamento das custas), tal como prevista no dispositivo ora comentado, impede que o processo chegue sequer a formar-se, pois não será dado curso ao que não for preparado”.
Eis o motivo pelo qual tenho afirmado que na Justiça Federal esse processo natimorto deve, ao meu sentir, ser evitado, bastando que sejam cumpridos os dispositivos legais mencionados, pela Seção de Classificação e Distribuição, por ordem do próprio Juiz Distribuidor, impedindo-se a formação ilegal, onerosa e indevida desses processos, o que certamente evitará o desperdício de jurisdição e de dinheiro público.
É que esse processo mal formado, terá que ser incluído no cadastro de feitos por funcionário da Seção de Distribuição, que utilizará caríssimos equipamentos de informática ; receberá uma capa e um plástico protetor ; deverá ser transportado por outro servidor até o setor próprio para ser autuado, onde serão gastos outros materiais e equipamentos por mais um servidor ; depois será transportado para a Vara para a qual foi indevidamente distribuído ; na Secretaria dessa Vara terá que ser manuseado pelo funcionário encarregado e receberá o andamento devido através de digitação no terminal de processamento de dados ; esse andamento será incluído em relação diária que será encaminhada por E – Mail à Imprensa Nacional para ser publicado no Diário da Justiça da União ; depois será remetido ao Gabinete do Juiz, que terá que ler a inicial e todos os documentos que a acompanham para, no final, concluir que a distribuição deve ser cancelada, porque as custas iniciais não foram recolhidas, lançando, então, decisão nesse sentido, quase sempre através de equipamento de informática; depois disso o processo será novamente conduzido a Secretaria da Vara para receber novo andamento no cadastro geral de processos da Seção; essa decisão do juiz deverá ser publicada no DJU, passando, pois, pelo mesmo procedimento, demorado e dispendioso, utilizado para o primeiro andamento; e não fica só nisso, tal decisão de cancelamento poderá ser atacada por recurso de apelação, sendo fácil perceber-se que, doravante, é que o gasto de tempo e dinheiro ainda será maior.
Eis porque, inobstante as opiniões em contrário, abrolha à consciência de qualquer um que permitir a formação ilegal desses processos é demonstrar grande desapreço pelo dinheiro público.
Com todo respeito, os que defendem a formação desses processos, notadamente nos casos em que não é concedida a liminar no plantão, evindenciando-se, de conseqüência, o notório desinteresse da parte pelo seu prosseguimento, certamente não se detiveram em fazer a conta de quanto custa cada minuto de trabalho de um Juiz; de qual o valor da faina de tantos servidores da Justiça Federal e da Imprensa Oficial; do desgaste dos equipamentos e materiais utilizados, sem contar que, como é de corriqueira sabença, na Justiça, tempo é jurisdição. É evidente que esse precioso e caro tempo poderá ser melhor utilizado nos milhares de feitos legítimos que estão a reclamar atos de impulso, diligências, despachos, decisões, sentenças etc…
Considerando-se que todo esse trabalho e gasto ocorre com apenas um desses processos, e que em cada Seção Judiciária, anualmente, eles passam de uma centena, é de concluir-se que, nas cinco Regiões da Justiça Federal, eles podem ser contados aos milhares.
Claro, portanto, que se o Juiz Distribuidor evitar esse tipo de distribuição, estará cumprindo a lei e demonstrando zelo e respeito aos recursos públicos oriundos do esforço dos contribuintes que, em última ratio, são os que arcam com os custos da Justiça Federal.
Não sendo distribuídos, obviamente, não terão que ser despachados pelos Juízes das Varas, cujo despacho só poderá ser o de determinar o cancelamento da distribuição, pelo não pagamento das custas processuais, a teor do disposto no § 3º, art.179, do Provimento/COGER nº 03/2002 c/c inciso I, art. 14, da Lei nº 9.289/96 e art. 257 do CPC.
CONCLUSÕES
Feitas essas reflexões, é possível, agora, extrair-se as seguintes conclusões:
1) O art. 257 do CPC é regra geral de processo civil, aplicável a todos os pleitos deduzidos em qualquer foro nacional, exceto quanto ao prazo ali estabelecido para recolhimento das custas judiciais que, na Justiça Federal, em face de regra especial, é até a distribuição, conforme determina o inciso I, art. 14, da Lei Federal nº 9.289/96;
2) O recolhimento das custas iniciais em qualquer pleito é pressuposto objetivo de existência do processo, motivo pelo qual a omissão do seu pagamento no prazo legal impede a distribuição;
3) Por ser pressuposto objetivo de existência do processo, havendo a indevida distribuição, a conseqüência jurídica é o seu cancelamento, providência que extermina o processo no seu nascedouro;
4) Nos casos de despacho em plantão, observa-se o seguinte:
a) Se concedida a liminar pleiteada, conforme determinam o inciso I, art. 14, da lei 9.289/96 c/c §3º, art. 179 do Provimento/COGER nº 03/2002, na Justiça Federal da 1ª Região, as custas iniciais deverão ser recolhidas no primeiro dia útil seguinte, antes da distribuição, quando o Juiz Plantonista remeter a petição e sua decisão à Seção de Classificação e Distribuição. Se forem recolhidas as custas nesse prazo, a petição será distribuída normalmente.
Se, entretanto, as custas não forem pagas nesse prazo, a petição não será distribuída, devendo o Juiz Distribuidor devolvê-la ao seu signatário e oficiar a parte a quem incumbir o cumprimento da liminar, dando-lhe conhecimento desse fato para que seja efetivamente cumprida a sanção prevista na parte final do §3º, art. 179, do Provimento/COGER n º 03/2002 que diz que haverá o CANCELAMENTO DO QUE HOUVER SIDO ORDENADO, ou seja, A LIMINAR PERDERÁ A SUA EFICÁCIA.
b) Se não houver sido concedida a liminar no plantão, havendo o pagamento das custas no dia útil subseqüente, no prazo legal, a distribuição será feita normalmente. Se não houverem sido recolhidas as custas iniciais nesse prazo, a distribuição não será feita e a petição será simplesmente devolvida ao seu signatário;
5) Registre-se que, querendo, a parte interessada poderá renovar o pleito e, se recolher as custas iniciais a tempo e modo, seu pedido terá trânsito normal com a conseqüente distribuição.
6) Por último, de lege ferenda, é de se observar que melhor teria agido o legislador processual, como fez no art. 254 do CPC, no tocante a ausência de procuração, se na redação do art. 257, de modo expresso, e não de forma implícita, proibisse a distribuição de petições iniciais sem o pagamento das custas devidas.
Juiz Federal Titular da 8ª Vara da Seção Judiciária do Distrito Federal, Bacharel em Direito pela Universidade Federal de Goiás desde 1971, Pós graduado pela mesma UFGO com especialização em Direito Penal e Processual Penal, ex Promotor e Procurador de Justiça do Estado de Goiás, ex Professor Universitário da AEUDF
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