A Aposentadoria Especial é uma herança histórica, que vem sendo justificada pelo legislador como um direito de antecipação da aposentadoria para quem trabalha sujeito a condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física. O conceito subjacente era de que o trabalho agressivo à saúde humana deveria ser mais bem pago – adicional de insalubridade e periculosidade – e mais curto – aposentadoria especial aos 15, 20 ou 25 anos de trabalho, conforme a atividade desempenhada.
A admissibilidade do dano a priori, sinaliza a probabilidade ou a certeza de que ele possa ocorrer em face das atividades desenvolvidas pelo trabalhador, quando exposto aos agentes agressivos à sua saúde.
Numa perspectiva técnica e social é também inadmissível aceitar que o trabalho não possa ser realizado em condições seguras para a saúde. Entretanto, o que se vê na prática e a exposição de trabalhadores a agentes agressivos a sua saúde ou a integridade física.
O trabalho seguro, é um dos direitos sociais fundamentais garantidos pela Carta Magna de 1988, em seu artigo 7º inciso XXII. Como se sabe os direitos sociais são preceitos essenciais do homem, que se mostram com a representação fiel das liberdades positivas e de cumprimento obrigatório por um Estado Democrático de Direito.
Em vista disto, o que se pretende demonstrar de maneira clara e precisa é que a falta de norma regulamentadora por parte da União Federal, a qual regularia aposentadoria especial do servidor público, não pode e não deve ser óbice para sua não concessão ou para o seu não reconhecimento, pois o artigo 7º da Constituição da República é claro ao dizer que o rol ali elencado é exemplificativo e não exaustivo, já que os direitos enumerados não se esgotam com o texto constitucional. E mesmo com a falta de norma o direito ali esta latente.
A nossa Carta Política ainda em seu artigo 40 reconhece o direito a contagem do tempo de serviço prestado por servidor público como ESPECIAL in verbis:
“Artigo 40 – (… omissis…)
§ 4º É vedada a adoção de requisitos e critérios diferenciados para a concessão de aposentadoria aos abrangidos pelo regime de que trata este artigo, ressalvados os casos de atividades exercidas exclusivamente sob condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física, definidos em lei complementar.
I – portadores de deficiência;
II – que exerçam atividades de risco;
III – cujas atividades sejam exercidas sob condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física.“
Todavia, a menção de que uma Lei Complementar estaria a regulamentá-la, não foi, imposta pelo legislador originário sem razão. Ocorre que, ao prever a regulamentação via Lei Complementar o constituinte só o fez, por achar que a matéria seria melhor regulamentada por uma lei específica, não conquanto sonhou que a mesma demoraria mais de 20 (vinte) anos para ser editada. Nobre foi a intenção, não obstante, o resultado não é aceitável.
Destarte que, atualmente a única defesa apresentada pela Administração Pública, para não realizar o cômputo de tempo de forma especial é a falta de Lei Complementar.
Entretanto, não pode, o Poder Judiciário, detentor do manto constitucional da eqüidade social, garantidor das leis e das relações jurídicas, quedar-se-á frente à não edição de tal mandamento, pois não seria crível que o servidor público passaria a ser dotado de super-poderes pelo simples ato de sua investidura, ou ainda, deixado de ser composto organicamente como qualquer ser humano, agora imune aos agentes agressivos à saúde ou integridade física, pelo simples fato da não edição da LC que regulamente a Aposentadoria Especial.
A ausência de Lei Complementar cria uma vacância legislativa que se estende ao longo dos tempos, prejudicando o exercício do efetivo direito dos servidores públicos federais, diferentemente dos trabalhadores filiados do Regime Geral de Previdência Social e que trabalham expostos aos mesmos agentes agressivos à saúde ou em atividades idênticas, consideradas como especial para efeito de aposentadoria.
O que se indaga é o seguinte: se o espírito da Lei foi criar uma espécie de aposentadoria (Especial) que evite que o trabalhador exposto a agentes agressivos ou a atividades penosas por longo período de tempo, se submeta ainda mais aos efeitos indesejados que sua saúde sofrerá, a vacância da Lei Complementar e a manutenção dos servidores públicos nesta situação, não seria uma agressão aos princípios mais mesquinhos de proteção à vida? Seriam os servidores públicos federais feitos de um “material” mais resistente que os trabalhadores da iniciativa privada? Obviamente que não. Não é a Constituição da República uma carta de intenções onde a igualdade entre os pares é preceito fundamental? Claro que sim, a nossa Constituição Federal prega o tratamento desigual para os desiguais e o tratamento igual para os iguais, consagrando o princípio constitucional da igualdade. Assim, se as condições de trabalho são iguais e se os agentes agressivos agem contra os trabalhadores – independentemente do regime de previdência ao qual estão filiado – também de maneira igual, porque não se aplicar supletivamente a legislação existente?
Longos vinte anos já se vão desde da promulgação da Carta Cidadã e nada, repise-se nada, foi feito em relação a normatização da Aposentadoria Especial. Como já foi aventado, o Poder Judiciário pode e deve declarar a contagem do tempo especial.
O simples fato de não se ter Lei Complementar não poderá tolher os Servidores de um direito que a eles é inerente, pois se o direito a Aposentadoria Especial tem o objetivo de preservar o bem VIDA, nada mais justo que, na falta de normatização própria sejam aplicadas ao presente caso as normas do Regime Geral de Previdência Social – RGPS (artigos 57 e 58 da Lei 8213/91). Instando agrupar que, o próprio parágrafo 12 do artigo 40 da Constituição Federal preceitua que:
“Artigo 40 – (… Omissis…)
§ 12. Além do disposto neste artigo, o regime de previdência dos servidores públicos titulares de cargo efetivo observará, no que couber, os requisitos e critérios fixados para o regime geral de previdência social. ” ( Grifo Nosso)
Utilizando o preceito normativo acima exposto, a aplicabilidade da analogia no presente caso é totalmente possível, posto ser esta a única solução para se fazer cessar uma ilegalidade negativa por parte dos poderes competentes.
Observe-se, desde já, que mesmos no casos onde os Servidores possuem laudos técnicos os quais discriminam que as atividades exercidas encontram-se no campo das atividades especiais, a situação é desconsiderada totalmente pela Administração Pública ao elaborar os cálculos de aposentação (contagem de tempo laboral) dos Servidores Públicos.
Instando comentar, que mesmo quando as atividades e os agentes nocivos a que estejam expostos, se dão de modo habitual e permanente, não ocasional nem intermitente e são considerados como especiais para fim do tempo de serviço para efeito de aposentadoria.
Neste sentido vejamos o que os nossos Tribunais estão decidindo:
“Negado provimento à remessa oficial e dado provimento ao apelo dos Impetrantes para conceder a ordem de modo a assegurar-lhe a contagem do tempo de serviço prestado sob o regime jurídico único, como tempo de serviço especial, para fins de contagem de tempo de serviço, com tempo mínimo de 25 anos, bem como para confirmar a r. sentença na parte que conceda a contagem especial de tempo de serviço na vigência do regime jurídico celetista, no mais permanece a r. sentença tal como lançada.”
“ACÓRDÃO Vistos, relatados e discutidos estes autos, em que são partes as acima indicadas.DECIDE a Primeira Turma do Tribunal Regional Federal da Terceira Região, por maioria de votos, dar parcial provimento à apelação e negar provimento à remessa oficial, na forma do relatório e voto do Relator, vencido o Juiz Federal Convocado Castro Guerra, na forma da declaração de voto que fica fazendo parte integrante do presente julgado. Proc. 2000.61.03.004507-0 MAS 227938 – Relator Juiz Conv. Gilberto Jordan – 1ª Turma 26/03/01” (data do julgado)
Este, também entendimento dos Embargos Infringentes na Apelação Cível n.o 250.498 – CE (2001.05.00.011864-9) – DESEMBARGADOR FEDERAL PETRUCIO FERREIRA – TRF5ª Região.
Ademais, o STF, recentemente também já se posicionou acerca da matéria no MI, 721, senão vejamos:
Por unanimidade, o Plenário do Supremo Tribunal Federal (STF) acompanhou o voto do ministro-relator Marco Aurélio, no Mandado de Injunção* (MI) 721, para deferir à impetrante, uma servidora pública o direito à aposentaria especial, nos termos do artigo 57, da Lei 8.213/91, que dispõe sobre plano de benefício da Previdência Social.
SINTESE CONCLUSIVA
Em face do exposto, entendemos que em o tempo laboral, realizado junto a empresas onde sua atividade era considerada como especial deva ser convertido pelo fator conversor como disciplina o regime geral da previdência social e ao qual o mesmo era subordinado a época, ou seja, até 11 de dezembro de 1990, sem que os Servidores se socorram da Justiça para tanto. E ainda, que contagem do tempo trabalhado sob a égide do Estatuto, deva ser considerado como especial com a aplicabilidade analógica dos artigos 57 e 58 da 8213/91 frente a inteligência do artigo 40 da Constituição Federal de 1988.
Carlos Alberto Vieira de Gouveia é Mestre em Ciências Ambientais e Doutorando em Ciências Jurídicas e Sociais; Vice-Presidente para a área Previdenciária da Comissão Direitos e Prerrogativas e Presidente da Comissão de Direito Previdenciário ambas da OAB-SP Coordenador do curso de pós-graduação em Direito Previdenciário da Faculdade Legale
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