Da prescrição aplicável aos trabalhadores portuários avulsos

Resumo: O trabalho portuário avulso é regido pelas Leis nºs 9.719/1998 e 12.815/2013. As referidas leis, atendendo e observando as peculiaridades e particularidades do trabalho portuário avulso, determinam que as regras, condições de trabalho e remuneração pelos serviços prestados serão objeto de negociação coletiva entre as entidades representativas dos trabalhadores avulsos e dos operadores portuários. O trabalhador portuário avulso não mantém vínculo empregatício com o Órgão Gestor ou com os tomadores de serviço, fato este que tem gerado ao longo dos anos grande discussão na doutrina e na jurisprudência no que concerne ao prazo prescricional aplicável ao trabalhador portuário avulso, o que será objeto do presente estudo, cuja conclusão é pela aplicação da prescrição bienal.

Palavras-chave: Trabalhador; portuário; avulso; prescrição; igualdade; porto; órgão gestor.

Abstract: The separate dock work is governed by the Laws nºs 9.719/1998 and 12.815/2013. These laws, meeting and observing the peculiarities and particularities of separate dock work, determine the rules, working conditions and remuneration for services rendered will be subject to collective bargaining between the representative bodies of temporary workers and port operators. The single port worker does not maintain an employment relationship with the Management Agency or the service takers, a fact that has generated over the years a great deal of discussion in the doctrine and jurisprudence regarding the prescriptive period applicable to the single port worker, which will be object of the present study, whose conclusion is the application of the biennial prescription.

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Keywords: Worker; port; single; prescription; equality; port; management agency.

Sumário: Introdução; 1 Do trabalho portuário avulso. Visão geral; 2 Da prescrição aplicável ao trabalhador portuário avulso; Conclusão; Referências.

INTRODUÇÃO

A Constituição Federal, em seu art. 7º, inciso XXIX, estabelece quanto ao prazo prescricional um limite de dois anos para o exercício do direito de ação, a contar da extinção do contrato de trabalho.

A nova Lei dos Portos (12.815/2013), ao tratar da relação de trabalho avulso, embora mantendo a limitação bienal constitucional, define como marco inicial do prazo prescricional a data do cancelamento do registro ou do cadastro do trabalhador junto ao Órgão Gestor de Mão de Obra (OGMO). A previsão está contida no § 4º do art. 37.

Contudo, a referida previsão legal se encontra nitidamente em desacordo com a regra geral de prescrição dos créditos trabalhistas, prevista no art. 7º do inciso XXIX da Constituição Federal.

A distinção de tratamento está causando insegurança jurídica para os operadores portuários e para os órgãos de gestão de mão obra em âmbito nacional, porquanto a norma em discussão conferiu aos trabalhadores portuários avulsos uma condição mais benéfica do que a aplicável aos trabalhadores portuários contratados em caráter permanente, o que implica na incompatibilidade dessa disposição legal com os princípios da igualdade e da proporcionalidade, ambos previstos na Constituição Federal, em seus arts. 1º e 5º.

No caso do trabalhador portuário avulso, diferentemente do trabalhador comum ou do portuário contratado a vínculo, submete-se a regime de contratação temporária – geralmente por turnos de 6 (seis) horas –, prestando serviços na modalidade de engajamento voluntário a curtíssimo prazo. O vínculo contratual se forma diretamente com o operador portuário – tomador de serviços –, de sorte que, a cada contratação, aperfeiçoa-se uma nova relação com o respectivo tomador de serviços, independente da anterior. Isto é, encerrado o turno de trabalho, a relação de trabalho formada entre o trabalhador avulso e o tomador de serviços se extingue, afeiçoando-se a um contrato de trabalho quando da sua rescisão.

No término de cada relação de trabalho com os operadores portuários, do mesmo modo como ocorre em uma rescisão de contrato, o trabalhador avulso recebe todas as verbas salariais, incluindo férias e décimo terceiro proporcional, repouso semanal remunerado e Fundo de Garantia por Tempo de Serviço.

Logo, encerrado o turno de trabalho, com o pagamento da remuneração e demais encargos trabalhistas, extinta está a relação de trabalho, devendo este ser o marco para contagem prescricional de dois anos para reclamar na forma do Texto Constitucional.

O fato de os TPAs estarem registrados e cadastrados junto ao OGMO e de este intermediar a relação de trabalho, de acordo com a intenção da Lei dos Portos, é para facilitar o acesso democrático ao trabalho para esse tipo de trabalhador, concedendo a eles treinamentos qualificados, setor de saúde e segurança do trabalho especializado e garantido de forma solidária o pagamento da remuneração devida pelo trabalho prestado aos tomadores de serviço, inclusive em caso de acidente, contudo, sem manter qualquer vínculo empregatício.

Por isso, o Tribunal Superior do Trabalho, com o intuito de pacificar a relação de trabalho havida entre portuários avulsos e operadores portuários, havia editado a Orientação Jurisprudencial nº 384 da sua Subseção Especializada em Dissídios Individuais no ano de 2010. No entanto, sem qualquer justificativa, em 2012, a referida orientação jurisprudencial foi cancelada, passando os órgãos julgadores do TST e dos TRTs e os Juízes de Primeiro Grau a julgarem em sentidos antagônicos, uns defendendo a aplicação da bienal e outros, a aplicação da prescrição quinquenal.

Posteriormente, quando da edição da Lei nº 12.815/2013, que alterou a Lei nº 8.630/1993, atendendo a reinvindicação da classe trabalhadora, o Congresso Nacional aprovou a inclusão do texto final (o § 4º ao art. 37) da lei durante a sua votação, determinando que as ações relativas aos créditos decorrentes da relação de trabalho avulso prescrevem em cinco anos, até o limite de dois anos após o cancelamento do registro ou do cadastro no órgão gestor de mão de obra, o que trouxe insegurança jurídica para o setor portuário.

Considerando essa insegurança jurídica, o aumento considerável do passivo trabalhista, mas principalmente pelo fato de a referida norma legal não estar de acordo com a Carta Magna por ofensa aos princípios da igualdade e da proporcionalidade, a Federação Nacional dos Operadores Portuários, apoiada por outras entidades do setor, como a Associação Brasileira dos Terminais de Contêineres de Uso Público, ingressou no Supremo Tribunal Federal com a Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 5132, buscando extirpar do ordenamento legal o § 4º do art. 37 da Lei nº 12.815/2013.

Desta feita, o presente estudo defende a aplicação da prescrição bienal para o trabalhador portuário avulso, sob pena da relativização do princípio da igualdade e ofensa ao princípio da legalidade, previstos na Constituição Federal.

1 DO TRABALHO PORTUÁRIO AVULSO. VISÃO GERAL

Com a promulgação da Constituição Federal de 1988, o cenário portuário nacional sofreu diversas mudanças em sua sistemática, entre elas a igualdade de direitos entre os trabalhadores com vínculo empregatício a prazo indeterminado e os trabalhadores avulsos.

A referida equiparação de direitos se encontra prevista no art. 7º, inciso XXXIV, da Constituição Federal. Contudo, a amplitude do princípio da isonomia não pode ser relativizada, consubstanciando-se apenas em igualdade formal e não em igualdade material, já que o trabalho avulso não se compara materialmente ao trabalho a prazo indeterminado. O referido dispositivo deve ser aplicado com parcimônia e apenas no que efetivamente couber ou em caso de extrema necessidade.

Neste sentido, defendendo a aplicação relativa da isonomia ao trabalhador avulso, o saudoso Arnaldo Süssekind ensina que a Lei Maior, no inciso XXXIV do art. 7º, preceitua a igualdade de direitos entre o trabalhador avulso e o empregado, tratando-se de mera fantasia, pois a norma jurídica não tem o condão de solucionar o impossível. Essa pretendida isonomia há de ser respeitada no que couber, como, por exemplo, assegurar ao trabalhador avulso a indenização por despedida, pois, se não sendo ele empregado, jamais poderia ser despedido. Como garantir-lhes participação nos lucros, nos resultados ou na gestão de empresas tomadoras de serviços se entre estas e os trabalhadores escalados estabelece-se relação jurídica efêmera[1]?

Para que efetivamente fossem alçados direitos iguais aos trabalhadores portuários avulsos em relação aos trabalhadores com vínculo empregatício, foi editada a Lei de Modernização dos Portos (Lei nº 8.630/1993), legislação que acarretou uma grande reestruturação no Sistema Portuário Brasileiro.

A referida lei foi revogada pela Lei nº 12.815/2013; todavia, as suas disposições foram mantidas quase que integralmente no que se refere ao trabalho portuário avulso. As alterações referem-se ao sistema de concessão, arrendamento ou até mesmo privatização dos Portos Públicos brasileiros, visando a aumentar a competitividade do Brasil neste segmento. Outras importantes modificações foram a pactuação da multifuncionalidade por meio de norma coletiva de trabalho, o fato de a aposentadoria não cancelar mais a matrícula do trabalhador avulso junto ao OGMO, bem como a fixação em cinco anos do prazo prescricional para o trabalhador avulso.

A Lei nº 8.630/1993 incentivou a negociação coletiva na área portuária por meio de contratos, acordos e Convenções Coletivas de Trabalho, fortalecendo a presença das entidades sindicais. Todavia, acabou com a intermediação da mão de obra avulsa exercida por estas, criando a figura do OGMO, visando a estabelecer a igualdade de oportunidades de trabalho aos trabalhadores avulsos.

Dadas as particularidades e peculiaridades que norteiam o trabalho portuário avulso e as operações portuárias, a referida lei privilegiou a negociação coletiva entre os sindicatos patronal e obreiro, visando à manutenção das oportunidades de trabalho dos avulsos junto aos operadores portuários e a melhor competitividade dos portos brasileiros frente ao cenário internacional.

O OGMO passou a realizar o gerenciamento da mão de obra portuária avulsa, promovendo a habilitação e o treinamento dos trabalhadores, aplicando penalidades, efetuando a remuneração, recolhendo encargos fiscais e zelando pelo cumprimento das normas de saúde e segurança no trabalho. A atuação do OGMO está estritamente atrelada ao conteúdo das normas coletivas de trabalho. Na vacância destas, o Órgão Gestor deve observar o disposto na legislação especial aplicável ao avulso e, na lacuna desta, o constante na CLT.

Desta feita, o OGMO é responsável por recolher dos tomadores de serviços os valores para pagamento da remuneração devida aos trabalhadores avulsos que prestaram serviços àqueles, assim como deve recolher e adimplir os encargos fiscais, previdenciários e trabalhistas que incidem sobre a referida remuneração.

São considerados trabalhos portuários avulsos as categorias de capatazia, estiva, conferência, conserto, vigilância e bloco (art. 40, § 1º, da Lei nº 12.815/2013). E podem ser realizados tanto a bordo das embarcações quanto em terra nos cais públicos ou em terminais públicos ou privados.

Sobre o trabalho portuário avulso, bem explica Francisco Edivar Carvalho[2] que o trabalho portuário nos portos organizados e nas instalações portuárias localizadas no seu interior pode ser realizado por avulsos ou por empregados contratados a prazo indeterminado oriundos dos quadros do OGMO. Havia divergências de entendimentos em face da interpretação do art. 26, parágrafo único, da revogada Lei nº 8.630/1993, que tratava da contratação de TPA. O caput do referido artigo fazia referência a todas as atividades, e o parágrafo único não fazia referência às atividades de capatazia e bloco. Tal divergência foi sanada pelo art. 40, § 2º, da Lei nº 12.815/1993, ao ditar que a contratação de trabalhadores a prazo indeterminado de todas as atividades (capatazia, estiva, conferência de carga, conserto de carga, vigilância de embarcações e bloco) deverá ser feita exclusivamente entre os trabalhadores portuários avulsos registrados no OGMO. E ainda, por força do art. 40, § 4º, as atividades anteriormente citadas passaram a ser consideradas diferenciadas, o que representa uma conquista para os TPA, posto que a negociação dos acordos ou Convenções Coletivas de Trabalho se dará com as representações deles, independentemente da atividade preponderante desenvolvida pelo titular da instalação portuária, esteja ela dentro ou fora da área do porto organizado.

O portuário avulso é uma categoria específica de trabalhador, tendo características bem peculiares, como, por exemplo, intermediação do Órgão Gestor de Mão de Obra, ausência de subordinação, impessoalidade e liberdade de escolha quanto ao trabalho ofertado.

Na visão de Arnaldo Bastos Santos Neto e Paulo Sérgio Xavier Ventilari, as características marcantes do trabalho avulso são a prestação de serviços de forma descontínua a diversos tomadores de serviços e a intermediação por meio de sindicato ou, como nos portos, por meio do OGMO – Órgão Gestor de Mão de Obra. Sendo a descontinuidade uma das suas características, o trabalhador avulso é, sem dúvida, um trabalhador de natureza eventual, sem vínculo empregatício[3].

Desta forma, temos o trabalhador avulso como sendo aquele que presta serviços, sem vínculo empregatício, para diversas empresas (tomadoras de serviço), tendo o OGMO como intermediador desta relação.

A Lei de Modernização dos Portos (8.630/1993), em seu art. 20, mencionava claramente que o trabalhador avulso não possui vínculo empregatício com o Órgão Gestor de Mão de Obra. A referida disposição foi mantida pela nova lei em seu art. 34, motivo pelo qual a equiparação com trabalhadores que possuem vínculo empregatício é difícil de se aplicar na prática.

O trabalhador avulso, de acordo com a Lei nº 12.815/2013, deverá ser inscrito no OGMO, podendo ser registrado ou cadastrado, conforme dispõem os seus arts. 41 e 42. A diferença entre as duas formas de inscrição no OGMO é que o trabalhador registrado tem prioridade na distribuição do serviço (escala rodiziária), enquanto os cadastrados servem de força supletiva e são escalados somente quando o número de registrados não é suficiente para atender a demanda solicitada pelos operadores portuários. O TPA poderá ainda ser multifuncional, ou seja, atuando em mais de uma categoria, desde que possua treinamento e exista norma coletiva de trabalho entre os sindicatos e operadores autorizando o trabalho multifuncional. O trabalho multifuncional ocorre quando o TPA possui registro na estiva, mas também treinamento para capatazia, por exemplo, atuando como força supletiva na capatazia, quando necessário e desde que respeitada a ordem da escala rodiziária de trabalho.

Após a prestação dos serviços, o operador portuário repassa ao OGMO os valores relativos à operação portuária para que este proceda ao pagamento da remuneração devida aos trabalhadores portuários avulsos envolvidos nas atividades, além de encargos sociais, previdenciários e fiscais.

É por isso que o OGMO foi uma das principais inovações trazidas pela Lei nº 8.630/1993 e mantido pela Lei nº 12.815/2013, devendo ser constituído e mantido pelos operadores portuários em cada porto organizado de nosso País, sendo responsável por gerenciar a mão de obra avulsa e intermediar a relação de trabalho entre os operadores portuários e os trabalhadores portuários avulsos.

Segundo Cristiano Paixão e Ronaldo Curado Fleury:

“É um órgão de finalidade pública, sem fins lucrativos (consoante o art. 25 da Lei nº 8.630/1993), que tem como objetivo primordial centralizar e administrar a prestação de serviços nos portos organizados do Brasil. O OGMO é um órgão gestor que concentra a administração do trabalho portuário”.[4]

Entre as finalidades do órgão gestor está a fiscalização relativa aos trabalhadores portuários avulsos, como manutenção do cadastro e registro dos trabalhadores, recebimento das requisições de serviço, realização da escalação dos trabalhadores, treinamento e habilitação profissional e fornecimento de identificação individual. Além disso, também possui poder disciplinar, podendo aplicar penalidades, por meio da instituição de Comissão Paritária, quando necessário, previstas em lei, convenção ou Acordo Coletivo de Trabalho.

Suas atribuições e competências estavam previstas nos arts. 18 e 19 da Lei nº 8.630/1993 e foram mantidas pela nova Lei dos Portos, sendo importante citar o disposto no art. 32, VII, da Lei nº 12.815/2013, que é no mesmo sentido: “Arrecadar e repassar, aos respectivos beneficiários, os valores devidos pelos operadores portuários, relativos à remuneração do trabalhador portuário avulso e aos correspondentes encargos fiscais, sociais e previdenciários”. Da mesma forma é o disposto no § 4º do art. 2º da Lei nº 9.719/1998.

De acordo com a previsão legal, apesar de não fazer parte das negociações coletivas de trabalho, o OGMO possui como dever precípuo observar e aplicar o que for pactuado nos contratos, convenções ou Acordos Coletivos de Trabalho realizados entre os sindicatos patronal e obreiro.

Outrossim, o art. 2º da Lei nº 9.719/1998 estipula o prazo de 24 horas, após a realização do serviço, para o operador portuário passar os valores referentes ao serviço para o OGMO, sendo dado a este o prazo de 48 horas para repassar o pagamento aos trabalhadores. É claro que esses prazos podem sofrer alterações por força de convenção ou Acordo Coletivo de Trabalho, visando a adequar ou facilitar o adimplemento da remuneração devida aos trabalhadores avulsos.

No que se refere à relação entre o OGMO e os trabalhadores, conforme já comentado, inexiste vínculo trabalhista, conforme se observa do art. 34 da Lei nº 12.815/2013 (art. 20 da Lei nº 8.630/1993), uma vez que aquele está somente desempenhando o exercício de suas atribuições que estão previstas em lei.

Inovação trazida pela Lei nº 12.815/2013 é a fixação, como marco inicial do prazo prescricional para o TPA reclamar seus direitos, da data do cancelamento do registro ou do cadastro junto ao OGMO (art. 37, § 4º):

“§ 4º As ações relativas aos créditos decorrentes da relação de trabalho avulso prescrevem em 5 (cinco) anos até o limite de 2 (dois) anos após o cancelamento do registro ou do cadastro no órgão gestor de mão de obra”.

A referida norma legal tem sido objeto de discussão no âmbito dos portos brasileiros e de acirrada contenda na justiça juslaboral brasileira, pois trouxe insegurança jurídica para este tipo de relação de trabalho e implicou o aumento do passivo trabalhista, fustigando ainda mais o setor portuário que desde 2008 sofre com a crise econômica nacional e mundial.

Feitas as referidas considerações a respeito do trabalho portuário avulso e suas particularidades, a seguir será tratado especificamente do tema central do presente estudo, qual seja, a aplicação da prescrição bienal à relação de trabalho portuário avulso.

2 DA PRESCRIÇÃO APLICÁVEL AO TRABALHADOR PORTUÁRIO AVULSO

A aplicação da prescrição bienal para os trabalhadores portuários avulsos sempre foi objeto de controvérsia na Justiça do Trabalho, posto que a Lei nº 8.630/1993 nada disciplinava a respeito da prescrição aplicável à relação de trabalho havida entre o trabalhador portuário avulso com os operadores portuários.

A discussão cingia à interpretação do art. 7º, incisos XXIX e XXXIV, da Constituição Federal, que atribuiu igualdade de direitos entre o trabalhador com vínculo empregatício e o trabalhador avulso.

Após o enfrentamento do tema em diversas oportunidades, finalmente, no ano de 2008, a Subseção I da Seção de Dissídios Individuais – SBDI-I do Tribunal Superior do Trabalho pacificou o entendimento de que a prescrição bienal também era aplicável ao trabalhador avulso, conforme se observa da ementa a seguir colacionada:

“RECURSO DE EMBARGOS – I – PRESCRIÇÃO – TRABALHADOR AVULSO PORTUÁRIO X TRABALHADOR COM VÍNCULO EMPREGATÍCIO PERMANENTE – 1. Cinge-se a controvérsia na interpretação do art. 7º, XXIX, da CF, para verificar qual será o prazo prescricional a ser observado pelo trabalhador avulso, se quinquenal ou bienal contado da extinção do contrato de trabalho. 2. O inciso XXXIV do art. 7º da Carta Magna, ao atribuir “igualdade de direitos entre o trabalhador com vínculo empregatício permanente e o trabalhador avulso”, terminou por resolver a questão que ora se busca decifrar, pois o princípio da isonomia, calcado na igualdade substancial (CF, art. 5º, II), não permitiria que se atribuíssem para situações consideradas pelo ordenamento jurídico como idênticas tratamentos diferenciados. 3. Desse modo, se para o trabalhador com vínculo permanente a contagem da prescrição tem limite constitucional de dois anos após a extinção do contrato de trabalho, outra solução não poderá ser dada ao trabalhador avulso, cujo contrato de trabalho deve ser considerado como aquele que decorreu da prestação dos serviços, muito embora não se desconheça a atipicidade da relação jurídica que une um avulso ao tomador do seu serviço.

4. Assim, a partir de cada trabalho ultimado, nasce para o titular da pretensão o direito de verificar a existência de crédito trabalhista, iniciando-se a partir daí a contagem do prazo prescricional. 5. Ora, se virtuais direitos trabalhistas foram sonegados ou não reconhecidos ao trabalhador avulso, impõe-se que este reivindique o mais breve possível, ou seja, dentro do biênio prescricional contado da extinção contratual, consoante orienta a máxima latina dormientibus non succurrit ius (o direito não socorre os que dormem). Se assim não fosse, o beneficiário dos serviços prestados pelo avulso ficaria em situação desigual e desprivilegiada em relação aos empregadores que mantêm vínculo de emprego permanente, já que estes sabem que a inércia do ex-empregado pelo prazo de dois anos, contados da extinção do contrato de trabalho, fulmina definitivamente a pretensão trabalhista. Recurso de embargos desprovido, no particular. […]”. (E-ED-RR 8700-54.2002.5.09.0022, Subseção I Especializada em Dissídios Individuais, Relª Min. Maria de Assis Calsing, Data de Julgamento: 18.02.2008, Data de Publicação: DJ 28.03.2008)

Com base no entendimento e nos reiterados julgados, se, para o trabalhador com vínculo permanente, a contagem da prescrição tem limite constitucional de dois anos após a extinção do contrato de trabalho, outra solução não poderia ser dada ao trabalhador portuário avulso, cujo contrato de trabalho deve ser considerado como aquele que decorreu da prestação dos serviços aos operadores portuários, muito embora não se desconheça a atipicidade da relação jurídica que une um avulso ao tomador do seu serviço, ou seja, a partir de cada trabalho ultimado, nasce para o titular da pretensão o direito de verificar a existência de crédito trabalhista, iniciando-se a partir daí a contagem do prazo prescricional bienal. O Tribunal Superior do Trabalho editou a Orientação Jurisprudencial nº 384 da SBDI-1 (DEJT divulgado em 19, 20 e 22.04.2010):

“É aplicável a prescrição bienal prevista no art. 7º, XXIX, da Constituição de 1988 ao trabalhador avulso, tendo como marco inicial a cessação do trabalho ultimado para cada tomador de serviço”.

O tema parecia restar pacificado quando o Tribunal Pleno do TST surpreendeu o setor portuário com o cancelamento da Orientação Jurisprudencial nº 384 da SBDI-1 por meio da Resolução nº 186/2012 (DJe de 25, 26 e 27.09.2012). Na referida resolução, não havia qualquer justificativa ou julgamento de novo recurso de embargos representativo que ensejasse o seu cancelamento.

Em que pese o cancelamento da OJ 384, o próprio Tribunal Superior do Trabalho continuou a declarar a prescrição bienal nas relações de trabalho existente entre portuários avulsos e tomadores de serviço. Neste sentido e a exemplo os julgados: RR 1386-08.2010.5.04.0122 (DEJT 09.11.2012), RR 265-93.2012.5.08.0014 (DEJT 13.09.2013) e RR 13500-27.2007.5.02.0255 (DEJT 04.04.2014).

Contudo, a discussão voltou à tona e com grande repercussão no setor portuário após a edição da Lei nº 12.815/2013, que dispõe sobre a exploração direta e indireta pela União de portos e instalações portuárias e sobre as atividades desempenhadas pelos operadores portuários; altera as Leis nºs 5.025, de 10 de junho de 1966, 10.233, de 5 de junho de 2001, 10.683, de 28 de maio de 2003, 9.719, de 27 de novembro de 1998, e 8.213, de 24 de julho de 1991; revoga as Leis nºs 8.630, de 25 de fevereiro de 1993, e 11.610, de 12 de dezembro de 2007, e dispositivos das Leis nºs 11.314, de 3 de julho de 2006, e 11.518, de 5 de setembro de 2007; e dá outras providências.

Entre as novidades trazidas para o setor portuário, uma delas trouxe impacto financeiro e econômico de modo negativo – isto é, trouxe prejuízo para o setor, pois aumentou o passivo trabalhista –, é o disposto no art. 37, § 4º, a seguir colacionado:

“4º As ações relativas aos créditos decorrentes da relação de trabalho avulso prescrevem em 5 (cinco) anos até o limite de 2 (dois) anos após o cancelamento do registro ou do cadastro no órgão gestor de mão de obra’.

Nesse contexto, no Tribunal Superior do Trabalho, mesmo nas ações ajuizadas antes da entrada em vigor da Lei nº 12.815/2013, deixou prevalecer a aplicação da prescrição bienal, conforme se observa a título exemplificativo pelo julgado a seguir:

“TRABALHADOR PORTUÁRIO AVULSO – PRESCRIÇÃO BIENAL – CONTAGEM DO PRAZO PRESCRICIONAL A PARTIR DA DATA DO DESCREDENCIAMENTO DO TRABALHADOR AVULSO DO ÓRGÃO GESTOR DE MÃO DE OBRA (OGMO) – CANCELAMENTO DA ORIENTAÇÃO JURISPRUDENCIAL Nº 384 DA SBDI-1 – O Tribunal Pleno desta Corte, em decorrência dos debates realizados na denominada “Semana do TST”, no período de 10 a 14.09.2012, decidiu, em sessão realizada em 14.09.2012, por meio da Resolução nº 186/2012 (DJe de 25, 26 e 27.09.2012), cancelar a Orientação Jurisprudencial nº 384 da SBDI-1. Assim, não mais prevalece, nesta Corte Superior, o entendimento consagrado no verbete jurisprudencial cancelado de que, nos processos envolvendo os trabalhadores avulsos, a prescrição bienal prevista no art. 7º, inciso XXIX, da Constituição Federal de 1988 conta-se da data do término de cada prestação de serviços aos seus tomadores, uma vez que o trabalhador avulso não mantém contrato de trabalho típico com os tomadores. Prevalece agora o entendimento de que, no caso de trabalhador avulso portuário, a prescrição bienal será contada a partir da data do seu descredenciamento do Órgão Gestor de Mão de Obra – OGMO. Isso se explica pela circunstância de que o Órgão Gestor de Mão de Obra – OGMO (ao qual permanecem ligados, de forma direta, sucessiva e contínua, os trabalhadores) faz a intermediação entre os trabalhadores e os vários e sucessivos tomadores dos seus serviços e repassa àqueles os valores pagos por esses últimos. Por outro lado, com a adoção desse novo entendimento, não se está violando o art. 7º, inciso XXIX, da Constituição Federal, sem dúvida também aplicável aos trabalhadores avulsos, por força do inciso XXXIV do mesmo dispositivo constitucional. Ademais, foi recentemente editada a Lei nº 12.815, de 05.06.2013, na qual, corroborando o entendimento jurisprudencial desta Corte Superior, por meio do seu art. 37, § 4º, dispõe-se que “as ações relativas aos créditos decorrentes da relação de trabalho avulso prescrevem em 5 (cinco) anos até o limite de 2 (dois) anos após o cancelamento do registro ou do cadastro no Órgão Gestor de Mão de Obra”. Nesse contexto, está expressamente reconhecido, na atual legislação, que a prescrição bienal, na hipótese de trabalhador avulso, deve ser contata a partir do cancelamento do registro ou do cadastro no Órgão Gestor de Mão de Obra, o que afasta a tese do reclamado de que a prescrição deve ser observada a partir de cada engajamento. Registra-se, ainda, que, como a prescrição bienal somente tem lugar quando houver o descredenciamento do trabalhador do Órgão Gestor de Mão de Obra, na ausência do referido descredenciamento, permanece a aplicação da prescrição quinquenal em razão do liame contínuo que se estabelece entre o trabalhador portuário e o OGMO (E-RR 65500-90.2009.5.04.0121, Rel. Aloysio Corrêa da Veiga, Julgado em 28.04.2016, publicado no DEJT do dia 06.05.2016). Esse foi o entendimento adotado pela Subseção I de Dissídios Individuais desta Corte, ao julgar o Processo nº E-ED-RR 183000-24.2007.5.05.0121, de lavra deste Relator, em 04.08.2016, acórdão pendente de publicação, quando, por maioria, decidiu-se que, no caso de trabalhador avulso portuário, a prescrição bienal será contada a partir da data do seu descredenciamento do Órgão Gestor de Mão de Obra – OGMO. No caso ora em exame, ante a ausência de cancelamento do registro ou do cadastro do reclamante no OGMO, em razão da continuidade da prestação do serviço, não há falar em declaração da prescrição bienal, conforme pretende o reclamado.” (TST, ED-RR 9909720115040121, 3ª T., Rel. Alexandre de Souza Agra Belmonte, Data de Julgamento: 18.05.2016, Data de Publicação: DEJT 20.05.2016)

Contudo, as 4ª, 5ª e 7ª Turmas do Tribunal Superior continuam a aplicar a prescrição bienal às demandas envolvendo trabalhadores portuários avulsos com fundamento constitucional. Neste sentido, os julgados: RR 138100-53.2004.5.09.0022 (DEJT 07.12.2012), RR 265-93.2012.5.08.0014 (DEJT 13.09.2013), RR 1386-08.2010.5.04.0122 (DEJT 09.11.2012), RR 13500-27.2007.5.02.0255 (DEJT 04.04.2014), RR 11-72.2010.5.04.0121 (DEJT 19.06.2015) e, mais recentemente:

“RECURSO DE REVISTA INTERPOSTO PELOS RECLAMADOS – MATÉRIA COMUM – ANÁLISE CONJUNTA – 1. PRESCRIÇÃO BIENAL – TRABALHADOR AVULSO – PROVIMENTO – O regime de contratação do trabalhador avulso é distinto do trabalhador comum, já que sua contratação é sempre ad hoc, sendo certo que o Órgão de Gestão de Mão de Obra tem por finalidade administrar o fornecimento de mão de obra, além de gerir a arrecadação e o repasse da remuneração aos trabalhadores. Na realidade, o vínculo contratual se dá diretamente entre o trabalhador avulso e a empresa tomadora de serviços, de maneira que, a cada contratação, exsurge uma nova relação independente da anterior. Por conseguinte, não há como se afastar a conclusão de que o marco extintivo se aplica a cada engajamento concreto, para postular os direitos dele decorrentes. Dessa forma, no caso, devem ser consideradas prescritas as pretensões relativas aos engajamentos que se encerraram há mais de dois anos do ajuizamento da reclamação trabalhista. Precedentes. Recurso de revista a que se dá provimento. 2”. (RR 1396-81.2012.5.04.0122, 5ª T., Rel. Min. Guilherme Augusto Caputo Bastos, Data de Julgamento: 13.04.2016, Data de Publicação: DEJT 22.04.2016)

Do mesmo sentir é o voto do Ministro Ives Gandra Martins Filho nos autos do Recurso de Embargos nº TST-E-RR 278-07.2011.5.04.0122:

“O art. 7º, XXXIV, da CF concedeu ao trabalhador avulso todos os direitos conferidos aos trabalhadores urbanos e rurais com vínculo empregatício reconhecido.

No rol do art. 7º se encontra o inciso XXIX, que trata do prazo prescricional (unificado o critério para trabalhadores urbanos e rurais a partir da Emenda Constitucional nº 28/2000), sendo bienal a partir da extinção do contrato e quinquenal a contar da data da lesão, quando esta ocorrer no curso do contrato.

Assim, a primeira conclusão a que se chega é a de que a prescrição bienal não pode, em tese, ser descartada em relação ao trabalhador avulso, por imperativo constitucional.

Na verdade, o que se questiona é o marco inicial da prescrição, quando se tratar de trabalhador avulso, dada a natureza especial do trabalho que desempenha.

Com efeito, o trabalhador avulso portuário presta serviços sob a modalidade de engajamento nos navios que aportam, com a intermediação do Órgão Gestor de Mão de Obra – OGMO (que substituiu, nesse mister, os sindicatos obreiros, conforme a Lei nº 8.630/1993).

Nessa linha, duas são as teses de consideração do marco prescricional: a data do encerramento de cada engajamento, considerado como um contrato a prazo determinado com o navio, ou a baixa do registro no OGMO, assimilado, por analogia, o OGMO ao empregador (já que recebe as verbas salariais e as repassa ao trabalhador).

O regime de contratação do trabalhador avulso é distinto daquele do trabalhador comum, já que sua contratação é sempre ad hoc, a curtíssimo prazo, sendo certo que o Órgão de Gestão de Mão de Obra tem por finalidade administrar o fornecimento desta, além de gerir a arrecadação e o repasse da remuneração aos trabalhadores. Na realidade, o vínculo contratual se dá diretamente entre o trabalhador avulso e a empresa tomadora de serviços, de maneira que, a cada contratação, exsurge uma nova relação independente da anterior.

Por conseguinte, não há como afastar a conclusão de que o marco extintivo se aplica a cada engajamento concreto, para postular os direitos dele decorrentes.

Assimilar o OGMO ao empregador seria o mesmo que pretender, no regime anterior à Lei dos Portos, que os sindicatos fossem empregadores, quando eram eles que intermediavam o fornecimento de mão de obra.

Cabe ressaltar que a matéria se encontrava disciplinada na Orientação Jurisprudencial nº 384 da SBDI-1 do TST, verbis:

TRABALHADOR AVULSO – PRESCRIÇÃO BIENAL – TERMO INICIAL – (DEJT divulgado em 19, 20 e 22.04.2010) É aplicável a prescrição bienal prevista no art. 7º, XXIX, da Constituição de 1988 ao trabalhador avulso, tendo como marco inicial a cessação do trabalho ultimado para cada tomador de serviço.”

Tribunal Superior do Trabalho transmitiu claro posicionamento no sentido de que as entidades gestoras deveriam provisionar o seu passivo trabalhista considerando-se a prescrição bienal, a contar de cada engajamento, não vinculando a contagem do prazo prescricional ao cancelamento do registro ou do cadastro no Órgão Gestor de Mão de Obra.

Todavia, o Tribunal Pleno desta Corte, em decorrência dos debates realizados na denominada “Semana do TST”, no período de 10 a 14.09.2012, decidiu, por maioria, em sessão realizada em 14.09.2012, por meio da Resolução nº 186/2012 (DJe de 25, 26 e 27.09.2012), cancelar a citada orientação jurisprudencial.

Não se pode perder de vista que o cancelamento de eventual súmula ou orientação jurisprudencial visa a deixar a jurisprudência livre, para que ela trilhe o seu próprio caminho, sem ficar jungida àquela hipótese, antes prevista no verbete sumular ou na orientação jurisprudencial.

Não é demais lembrar que, na mesma “Semana do TST”, citada alhures, foi alterada a sinalização da Súmula nº 277 do TST, que trata da ultratividade de cláusulas de acordos e convenções coletivas, adotando-se entendimento diametralmente contrário ao exposto em sua redação original.

Em outras palavras, quando esta Corte Superior realmente quer dizer o contrário do que dispõe um enunciado sumular, muda-se a diretriz da súmula. Quando se quer deixar livre a jurisprudência, cancela-se e, depois, forma-se um novo entendimento, com precedentes específicos. Nessa senda, o cancelamento da Orientação Jurisprudencial nº 384 da SBDI-1 do TST apenas deixou em aberto a discussão para que a jurisprudência se sedimentasse em um sentido ou noutro, mas não significou a inversão automática de sinal.

Ademais, não se ignora que a Lei nº 12.815, de 5 de junho de 2013, abraçou o entendimento contrário ao aqui defendido, ao prever, no art. 37, § 4º, que “as ações relativas aos créditos decorrentes da relação de trabalho avulso prescrevem em 5 (cinco) anos até o limite de 2 (dois) anos após o cancelamento do registro ou do cadastro no órgão gestor de mão de obra”.

Cumpre alertar, ainda, que o art. 37, § 4º, da Lei nº 12.815/2013, transcrito acima, é alvo no STF da Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 5.132/DF, ajuizada pela Federação Nacional dos Operadores Portuários – FENOP, de Relatoria do Ministro Gilmar Mendes, pendente de julgamento.

Assim, em que pese o cancelamento da Orientação Jurisprudencial nº 384 da SBDI-1 desta Corte, conclui-se que é aplicável ao trabalhador portuário avulso o prazo prescricional de dois anos (bienal), tendo como marco inicial o término do contrato firmado com cada um dos tomadores de serviço.

Imprescindível considerar que eventual vinculação do prazo prescricional ao cancelamento do registro dos trabalhadores avulsos no OGMO promoverá substancial majoração dos passivos trabalhistas, com consequências irreparáveis à maioria das entidades gestoras de mão de obra, esfacelando o sistema de gestão imposto pela Lei nº 8. 630/1993 e mantido pela Lei nº 12.815/2013, o que também causa extrema preocupação.”

Atualmente, os julgados das 4ª, 5ª e 7ª Turmas e o posicionamento do Ministro Presidente do Tribunal Superior do Trabalho são minoria, pois não mais prevalece, na referida Corte Superior, o entendimento consagrado no verbete jurisprudencial cancelado de que, nos processos envolvendo os trabalhadores avulsos, a prescrição bienal prevista no art. 7º, inciso XXIX, da Constituição Federal de 1988 conta-se da data do término de cada prestação de serviços aos seus tomadores, uma vez que o trabalhador avulso não mantém contrato de trabalho típico com os mesmos tomadores. 

Prevalece agora o entendimento de que, no caso de trabalhador avulso portuário, a prescrição bienal será contada a partir da data do seu descredenciamento do OGMO. Não havendo cancelamento da matrícula, aplica-se o prazo quinquenal.

Isto se explica pela circunstância de que o OGMO (ao qual permanecem ligados, de forma direta, sucessiva e contínua, os trabalhadores) faz a intermediação entre os trabalhadores e os vários e sucessivos tomadores dos seus serviços e lhes repassa os valores pagos por estes últimos.

Ressalta-se que a prestação de serviço do trabalhador portuário avulso é obrigatoriamente intermediada pelo OGMO, independentemente dos distintos tomadores de serviço, ou seja, é exclusividade do OGMO manter os registros dos trabalhadores portuários avulsos para o fornecimento de força de trabalho aos tomadores de serviços, denominados operadores portuários.

Por outro lado, com a adoção desse entendimento, os Ministros que seguem essa linha consideram não se estar violando o art. 7º, inciso XXIX, da Constituição Federal, pois sem dúvida que também é aplicável aos trabalhadores portuários avulsos, por força do inciso XXXIV do mesmo dispositivo constitucional.

Destaca-se que, no referido inciso XXIX, não se fixa, para os trabalhadores portuários avulsos, nenhum termo inicial para a contagem do prazo prescricional, o qual, com a consagração dessa nova tese, será contado, sempre e exclusivamente, da data da extinção da relação jurídica entre o trabalhador portuário avulso e o OGMO, o que somente ocorrerá quando da extinção por morte do trabalhador ou pelo cancelamento da sua inscrição no cadastro e no registro do trabalhador portuário.

Esse foi o entendimento adotado pela Subseção I de Dissídios Individuais do TST ao julgar o Processo E-ED-RR 183000-24.2007.5.05.0121, em 04.08.2016, quando, por maioria, decidiu-se que, no caso de trabalhador avulso portuário, a prescrição bienal será contada a partir da data do seu descredenciamento do OGMO. Na mesma oportunidade, foram julgados os seguintes processos, com o mesmo entendimento: E-ED-RR 1232-60.2012.5.09.0322, E-RR 1966-74.2013.5.09.0322, E-RR 11200-67.2008.5.02.0252, E-ED-RR 35600-93.2004.5.02.0444, E-ED-RR 70840-36.2005.5.05.0021, E-RR 72400-34.2001.5.02.0442, E-ED-RR 131700-24.2005.5.05.0014, E-RR 211900-27.2006.5.02.0447, de lavra deste Relator; E-ED-RR 2033-66.2013.5.09.0022, E-ARR 20063-78.2013.5.04.0123, Rel. Min. Aloysio Corrêa da Veiga; E-ED-RR 1174-84.2012.5.09.0022, E-RR 177300-96.2006.5.09.0022, Rel. Min. João Batista Brito Pereira; E-RR 48100-23.2006.5.02.0251, Rel. Min. Mário Eurico Vitral Amaro; E-ARR 139-86.2012.5.09.0411, E-RR 954-83.2012.5.09.0411, Rel. Min. Hugo Carlos Scheuermann.

Em virtude do supradito entendimento da maioria dos Ministros do Tribunal Superior do Trabalho, bem como pelo fato de a referida previsão legal se encontrar nitidamente em desacordo com a regra geral de prescrição dos créditos trabalhistas, prevista no art. 7º do inciso XXIX da Constituição Federal, a Federação Nacional dos Operadores Portuários – FENOP ajuizou uma Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADIn 5132) no Supremo Tribunal Federal para questionar o dispositivo da Nova Lei dos Portos (Lei nº 12.815/2013), que trata do prazo de prescrição para ingresso na Justiça do Trabalho com ações de trabalhadores avulsos.

A ADI contesta o § 4º do art. 37 da Lei dos Portos, segundo o qual “as ações relativas aos créditos decorrentes da relação de trabalho avulso prescrevem em cinco anos até o limite de dois anos após o cancelamento do registro ou do cadastro no Órgão Gestor de Mão de Obra”.

Para a entidade representativa dos operadores portuários, a regra prevista na nova legislação para o setor está em desacordo com o art. 7º, inciso XXIX, da Constituição Federal, pelo qual as ações para a obtenção de créditos decorrentes de relações de trabalho, urbanas ou rurais, podem ser ajuizadas “até o limite de dois anos após a extinção do contrato de trabalho”.

Segundo a FENOP, há uma clara diferença entre as duas normas:

“Enquanto a Constituição Federal estabelece, quanto ao prazo prescricional, um limite de dois anos para o exercício do direito de ação, a contar da extinção do contrato de trabalho, a Nova Lei dos Portos, ao tratar da relação de trabalho avulso, embora mantendo essa limitação, define como marco inicial do prazo de prescrição a data do cancelamento do registro ou do cadastro no órgão gestor de mão de obra”.

A entidade explica que a relação de trabalho no caso dos portuários é intermediada pelo OGMO. Segundo o art. 32 da Lei dos Portos, esse órgão é um intermediador entre o operador dos portos e os trabalhadores do setor e também responsável pela arrecadação e repasse de verbas relativas a encargos fiscais, sociais e previdenciários.

Na ação, a Federação lembra que há um regime diferenciado para tratar o trabalhador avulso em relação ao trabalhador comum, pois aquele

“submete-se a regime de contratação ad hoc (finalidade específica), a curtíssimo prazo, prestando serviços na modalidade de engajamento. O vínculo contratual se forma diretamente entre o trabalhador avulso e a empresa tomadora de serviços, de sorte que, a cada contratação, aperfeiçoa-se uma nova relação com o respectivo tomador de serviços, independente da anterior”.

Assim, para a entidade, não existe qualquer vínculo empregatício entre o trabalhador avulso e o OGMO. “Se o OGMO não participa da relação jurídica do avulso com o operador portuário, não há nenhuma justificativa plausível para que o marco do prazo prescricional bienal das reclamações do trabalhador contra o operador portuário coincida com um episódio das relações exclusivas do avulso com o OGMO”, argumenta a Federação na ADI.

Diante das alegações, a FENOP busca a concessão de liminar, com efeito retroativo (ex tunc), para suspender a eficácia do dispositivo questionado (§ 4º do art. 37 da Nova Lei dos Portos). No mérito, pleiteia a declaração, também com efeito retroativo, a inconstitucionalidade do dispositivo impugnado. O relator da ADI é o Ministro Gilmar Mendes.

A referida ADI é apoiada pela Associação Brasileira dos Terminais de Contêineres de Uso Público (Abratec) e pela Associação Brasileira dos Terminais Portuários (ABTP), ambas aceitas no feito na condição de amici curiae.

Neste ponto, cabe lembrar que uma das características da Constituição é, nas palavras de Luís Roberto Barroso apud Amandino Teixeira Nunes Junior, a natureza da linguagem, que se refere à veiculação, no Texto Constitucional, de normas de índole princípio lógica que apresentam “maior abertura, maior grau de abstração e, consequentemente, menor densidade jurídica”[5].

Ora, por se configurar a Constituição como paradigma normativo de todo o ordenamento jurídico, impossível ansiar do constituinte a mesma rigidez de escrita, tanto formal quanto tecnicamente utilizada no processo legislativo infraconstitucional.

Assim, verifica-se do conteúdo do art. 7º, inciso XXIX, da Constituição Federal, que a utilização da expressão “relação de trabalho” e ao final do mesmo, a expressão “vínculo de emprego”. Entretanto, sopesando os elementos do conjunto, chega-se à conclusão de que o espírito do constituinte foi de utilizar a segunda como sinônimo da primeira, até por englobá-la em seu sentido jurídico. Tamanha seria a incoerência do referido texto legal se interpretado pela exegese pura.

Válido também lembrar que é de importância cabal para a interpretação da Constituição a observância do princípio da unicidade, que nos informa sê-la um ordenamento jurídico único, não devendo ser aplicadas suas normas isoladamente.

O ilustre Mestre J. J. Gomes Canotilho[6] nos ensina o seguinte neste particular, in verbis:

“O princípio da unidade da Constituição obriga o intérprete a considerar a Constituição na sua globalidade e a procurar harmonizar os espaços de tensão existentes entre as normas constitucionais a concretizar.”

Desta feita, ao aplicar o inciso XXIX, do art. 7º, da Constituição, o operador do direito deve ater-se aos dispositivos constitucionais afins ao mesmo, para que o interprete em seu próprio contexto. Urge frisar que merecem cotejo ao dispositivo supracitado o inciso XXXIV do mesmo artigo e, ainda, o caput do art. 5º da Carta Política. Vejamos:

“Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e a propriedade […]

Art. 7º São direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, além de outros que visem à melhoria de sua condição social:[…]

XXXIV – igualdade de direitos entre o trabalhador com vínculo empregatício e o trabalhador avulso.”

Ora, o caput do art. 5º supramencionado configura-se como carro-chefe do princípio da igualdade, informando que todos os indivíduos merecem tratamento jurídico não discriminatório. Por sua vez, o inciso XXXIV do art. 7º da CF reforça o princípio da isonomia formal entre trabalhador avulso e trabalhador com vínculo empregatício. A partir dessa premissa, passa-se à análise do inciso XXIX com o peso da igualdade jurídica entre as consideradas relações de trabalho avulso e de emprego.

No que concerne à igualdade formal havida entre o trabalhador portuário avulso e o trabalhador vinculado, o Grupo Jurídico de Estudos da Abratec, formado por profissionais com experiência e renome do setor portuário, como muita propriedade explicam que:

“A aplicação do princípio constitucional de igualdade de direitos entre avulsos e trabalhadores com vínculo empregatício, insculpido no art. 7º, XXXIV, da CF, eis que a igualdade assegurada é de forma geral e não de direitos especiais e para a prescrição dos avulsos não existe regramento especial. Dentre os direitos gerais previstos está a prescrição. Não há lei infraconstitucional ou mesmo constitucional a regular a prescrição de forma diversa.

Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, consoante preceitua o art. 5º, caput, da Constituição Federal. Consta também do Texto Constitucional que todos são iguais em direitos e obrigações (art. 5º, I, da Constituição Federal), ou ainda a igualdade preconizada entre empregado e trabalhador avulso (art. 7º, inciso XXXIV).

Esta é a igualdade formal.

Todavia, a igualdade há de subordinar-se às diferenças existentes entre os destinatários da norma, o que leva à conclusão da inexistência da igualdade absoluta, que, caso configurada, criaria situações de absoluta desigualdade.

Esse entendimento confirma que ao princípio da igualdade deve ser incluído o conceito de proporcionalidade.

Igualdade jurídica significa que todos serão tratados da mesma forma perante a lei. No entanto, cumpre esclarecer que, em adequação ao entendimento atual, o tratamento dispensado será equivalente para todos aqueles que se encontrem em idêntica situação. Deve-se, portanto, pelo princípio da igualdade, tratar desigualmente os desiguais.

É evidente que a aplicação do princípio constitucional da igualdade deve ocorrer com base na igualdade jurídica, ou seja, devem ser respeitadas as peculiaridades do trabalho portuário avulso, as quais, de forma incontroversa, restam reconhecidas.

A aplicação do referido princípio constitucional deverá ser analisada e/ou interpretada na intenção de que o Poder Constituinte o fez, ou seja, de que todos são iguais perante a lei, mas dentro das diferenças existentes.

Dessa forma, tem-se que será respeitado o princípio da igualdade jurídica quando for baseado em diferenças reais e inerentes dos sujeitos envolvidos. Essa é a hipótese em apreço. Ou seja, os trabalhadores portuários avulsos têm constitucionalmente garantida sua igualdade em relação aos trabalhadores com vínculo de emprego, por força do art. 7º, XXXIV, da Constituição Federal, nos limites da igualdade fática existente entre eles, não, porém, nos limites da desigualdade existente entre eles e os trabalhadores com vínculo de emprego permanente. […]

Assim, o trabalhador portuário faz jus aos mesmos direitos devidos aos empregados em geral, previstos na Constituição, entre eles a prescrição bienal, prevista no art. 7º, XXIX, da Constituição Federal. […]

Desta forma, não pode prevalecer o entendimento de que o prazo prescricional bienal só começa a fluir com a extinção do cadastro ou registro perante o Órgão Gestor, sob o fundamento de que “[…] a relação que se estabelece entre o avulso e os reclamados é única, de trato sucessivo e de forma continuada, […]”, uma vez que a essência dos contratos de engajamento – como ocorre com os trabalhadores portuários avulsos – é a provisoriedade e não a comunicação de períodos, pois, conforme já sobredito, a cada engajamento no trabalho, forma-se entre o trabalhador avulso e o operador portuário uma nova relação de trabalho, e, cumprido o seu objeto, uma nova contratação adquire contornos de independência da anterior, motivo pelo qual a partir do término de cada relação de trabalho deve-se iniciar a contagem do prazo prescricional bienal.”[7]

Em resumo, se para o trabalhador com vínculo permanente a contagem da prescrição tem limite constitucional de dois anos após a extinção do contrato de trabalho, outra solução não poderá ser dada ao trabalhador avulso, cujo contrato de trabalho deve ser considerado como aquele que decorreu da prestação dos serviços, muito embora não se desconheça a atipicidade da relação jurídica que une um avulso ao tomador do seu serviço. Assim, a partir de cada trabalho ultimado, nasce para o titular da pretensão o direito de verificar a existência de crédito trabalhista, daí a contagem do prazo prescricional.

Desta feita, entender que o § 4º do art. 37 da Lei nº 12.815/2013 se encontra em consonância com a Constituição Federal, especialmente sob o entendimento do TST de que a prescrição bienal somente incide quando do descredenciamento do trabalhador portuário avulso do OGMO, é manter uma lide perpetua e que, portanto, gera insegurança jurídica ao setor portuário, pois é sabido que a matéria prescrição é a densificação da segurança jurídica, que, por sua vez, é um desdobramento do Estado de Direito, como já decidiu o STF (Pet 2.900-QO, DJ de 01.08.2003) e como já escreveu Luis Roberto Barroso[8]:

“[…] Num Estado democrático de direito, a ordem jurídica gravita em torno de dois valores essenciais, a segurança e a justiça […] É nessa mesma ordem de ideias que se firmou e difundiu o conceito de prescrição, vale dizer, da estabilização das situações jurídicas potencialmente litigiosas por força do decurso do tempo”.

O trabalhador portuário avulso, diferentemente do trabalhador comum, submete-se a regime de contratação temporário – no caso dos autos por turnos de 6 (seis) horas –, prestando serviços na modalidade de engajamento voluntário a curtíssimo prazo. O vínculo contratual se forma diretamente com o operador portuário – tomador de serviços –, de sorte que, a cada contratação, aperfeiçoa-se uma nova relação com o respectivo tomador de serviços, independente da anterior. Isto é, encerrado o turno de trabalho, a relação de trabalho formada entre o trabalhador avulso e o tomador de serviços se extingue, afeiçoando-se a um contrato de trabalho quando da sua rescisão.

Não é por acaso que a Lei nº 9.719/1998 determina, em seu art. 2º e parágrafos, que, após o término do turno de trabalho, o operador portuário possui o prazo de 24h para repassar ao OGMO os valores devidos aos trabalhadores, que, por sua vez, possui o prazo de 48 horas para pagar a remuneração do trabalhador acrescida de FGTS, férias proporcionais e terço constitucional, décimo terceiro salário, RSR, bem como realizar os descontos previdenciários. Logo, encerrado o turno de trabalho, extinta está a relação de trabalho, devendo este ser o marco para contagem prescricional de dois anos na forma do texto constitucional.

O fato de os TPAs estarem matriculados junto ao OGMO e deste gerenciar a relação de trabalho, de acordo com o escopo da Lei dos Portos, é para facilitar o acesso democrático ao trabalho para este tipo de trabalhador, concedendo a eles, treinamento qualificado, setor de saúde e segurança do trabalho e garantido de forma solidária o pagamento da remuneração devida pelo trabalho prestado aos tomadores de serviço, inclusive em caso de acidente de trabalho. No entanto, sem manter qualquer vínculo empregatício com o OGMO ou com os tomadores de serviço, na forma do art. 34 da Lei nº 12.815/2013.

Desse modo, a cada engajamento no trabalho com tomadores diferentes entre si, forma-se uma nova relação contratual de trabalho. Cumprido o seu objeto, uma nova contratação adquire contornos de independência da anterior, motivo pelo qual, ao término de cada prestação de serviço do avulso às diferentes empresas portuárias, deve-se dar o início da contagem do prazo prescricional bienal.

Portanto, resta claro que o art. 37, § 4º, da Lei nº 12.815/2013 se encontra em descompasso com o texto da Carta Magna, pois, de acordo com a regra prevista no art. 7º, XXIX, da Constituição de 1988, ao trabalhador avulso aplica-se a prescrição bienal, tendo como marco inicial a cessação do trabalho ultimado para cada tomador de serviço. O inciso XXXIV do art. 7º da Carta Magna, ao atribuir “igualdade de direitos entre o trabalhador com vínculo empregatício permanente e o trabalhador avulso”, terminou por resolver a questão que ora se busca decifrar, pois o princípio da isonomia, calcado na igualdade substancial (CF, art. 5º, II), não permitiria que se atribuíssem para situações consideradas pelo ordenamento jurídico como idênticas tratamentos diferenciados.

Desse modo, a partir de cada trabalho ultimado, nasce para o titular da pretensão o direito de verificar a existência de crédito trabalhista, iniciando-se a partir daí a contagem do prazo prescricional bienal.

CONCLUSÃO

A nova Lei dos Portos (12.815/2013), ao tratar da relação de trabalho avulso, embora mantendo a limitação bienal constitucional, define como marco inicial do prazo prescricional a data do cancelamento do registro ou do cadastro do trabalhador junto ao OGMO, fato este que atrai a declaração da prescrição quinquenal enquanto não descredenciado o trabalhador dos registros do OGMO. A previsão está contida no § 4º do art. 37.

No entanto, conforme amplamente demonstrado no presente estudo, a referida previsão legal se encontra nitidamente em desacordo com a regra geral de prescrição dos créditos trabalhistas, prevista no art. 7º do inciso XXIX da Constituição Federal, que estabelece um limite de dois anos para o exercício do direito de ação, a contar da extinção do contrato de trabalho.

O vínculo existente entre os tomadores de serviço e os trabalhadores avulsos escalados pelo OGMO limita-se ao período efetivamente trabalhado, sendo que, a cada pegada, uma nova relação jurídica é formada.

O trabalhador portuário avulso executa uma forma peculiar de prestação de serviço, que se resume em uma relação jurídica sui generis, que se consubstancia em vários contratos individuais, independentes e não contínuos, impondo-se, nos termos da Constituição Federal art. 7º, XXIX, que, ao término de cada relação de trabalho, comece a fluir o prazo prescricional bienal para o exercício do direito de ação.

Cabe repisar que o trabalho portuário avulso por particularidades intrínsecas, como a impessoalidade (participa de escala rodiziárias), a liberdade de escolha (não está obrigado a comparecer à chamada) e a falta de subordinação (não mantém vínculo empregatício com o OGMO ou com os operadores portuários), fato este que materialmente os diferenciam do trabalhador com vínculo empregatício, nos leva a concluir pela existência de contratos individuais de trabalho e pela existência de uma relação jurídica sui generis.

Dessa forma, por se tratar de vários contratos individuais, independentes e não contínuos, embora com curtíssimo período de duração, o art. 7º, XXIX, da Carta Maior resta perfeitamente aplicável à hipótese do presente estudo, restando prescritas todas as pretensões não exercidas no prazo de dois anos, contados da data da extinção de cada contrato de trabalho.

A cada engajamento na escala e a cada faina de trabalho do portuário avulso, forma-se uma relação de trabalho atípica. Consequentemente, concluído o serviço junto ao tomador de serviço para o qual foi escalado, o prazo para o trabalhador avulso propor ação trabalhista será de dois anos, contados de cada extinção de contrato de trabalho.

Igualmente, a prescrição bienal não pode ser desconsiderada em relação ao trabalhador avulso, por imperativo constitucional, seja por força do próprio art. 7º, XXIX, da CF, seja por causa do inciso XXXIV do referido artigo constitucional, que, conforme consignado anteriormente, ao atribuir igualdade de direitos entre o trabalhador com vínculo empregatício permanente e o trabalhador avulso, terminou por resolver a questão que ora se busca decifrar, pois o princípio da isonomia, lastreado na igualdade material prevista no art. 5º, I, da CF, não permitiria que se conferissem para situações consideradas pelo ordenamento jurídico como idênticas tratamentos diferenciados. Ou seja, entre avulsos e celetistas, existe uma igualdade formal, assegurada pela CF. Contudo, na prática, os dois tipos de obreiros gozam de condição materialmente distintas em sua rotina de trabalho, motivo pelo qual o princípio da isonomia deve ser sopesado com cuidado, sob pena de gerar desigualdade e beneficiar demasiadamente o trabalhador avulso.

Por isso, a contagem do prazo prescricional para o portuário avulso somente após o seu descredenciamento junto ao OGMO implica a quebra da isonomia constitucional, já que o celetista somente pode pleitear seus direitos após a rescisão de contrato, enquanto o avulso, após o término de cada pegada, recebe a remuneração e demais encargos acessórios como se tivesse ocorrido uma rescisão contratual.

Portanto, a ADI movida pela FENOP junto ao STF que busca a declaração da inconstitucionalidade do § 4º do art. 37 da Lei nº 12.815/2013, por ofensa à isonomia constitucional e ao princípio da legalidade, bem como os recursos que defendem a tese da prescrição bienal ao trabalho portuário avulso junto ao TST com lastro no art. 7º, incisos XXIX e XXXIV, da CF, merecem acolhimento e melhor reflexão acerca das peculiaridades que permeiam as relações entre os trabalhadores portuários avulsos e seus tomadores de serviço (operadores portuários), que justificam o reconhecimento da aplicação da prescrição bienal a esta categoria, com a fixação do marco inicial da contagem do prazo prescricional como sendo a cessação de cada trabalho ultimado para cada operador portuário e não do descredenciamento do OGMO.

 

Referências
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Notas
[1] SÜSSEKIND, Arnaldo. Curso de direito do trabalho. 2. ed. rev. e atual. Rio de Janeiro: Renovar, 2004. p.103.
[2] CARVALHO, Francisco Edivar. Trabalho portuário a partir do novo marco regulatório instituído pela Lei nº 12.815/2013. Jus Navigandi, Teresina, a. 18, n. 3712, 30 ago. 2013. Disponível em: <http://jus.com.br/artigos/25182>. Acesso em: 3 jan. 2014.
[3] SANTOS NETO, Arnaldo Bastos; VENTILARI, Paulo Sérgio Xavier. O trabalho portuário e a modernização dos portos. Curitiba: Juruá, 2009. p. 50.
[4] PAIXÃO, Cristiano; FLEURY, Ronaldo Curado. Trabalho portuário a modernização dos portos e as relações de trabalho no Brasil. 2. ed. São Paulo: Método, 2008. p. 26.
[5] NUNES JUNIOR, Amandino Teixeira. A moderna interpretação constitucional. Revista Jus Navigandi, Teresina, a. 7, n. 60, 1 nov. 2002. Disponível em: <https://jus.com.br/artigos/3497>. Acesso em: 5 dez. 2016.
[6] CANOTILHO, J. J. Gomes. Direito constitucional. 5. ed. Coimbra: Almedina, 1991.
[7] ABRATEC. Trabalhador portuário avulso. Prescrição bienal. Grupo jurídico de estudo. Disponível em: <http://www.abratec-terminais.org.br/files/pdf/Trabalho_Portuario_Avulso.pdf>. Acesso em: 30 nov. 2016.
[8] BARROSO, Luis Roberto. A prescrição administrativa no Direito brasileiro antes e depois da Lei nº 9.873/1999. Diálogo Jurídico, Salvador: CAJ, 2001.

Informações Sobre o Autor

Maxweel Sulívan Durigon Meneghini

Bacharel em Direito pela Universidade Federal do Rio Grande, Pós-Graduado em Direito Tributário pela Fundação Getúlio Vargas, Pós-Graduando em Direito Marítimo e Portuário pela Maritime Law Academy, Advogado na Frank Peluffo & Advogados Associados


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