As Constituições brasileiras de 1946, 1967 e 1969 atribuíam à Justiça Comum a competência para dirimir os conflitos envolvendo acidentes de trabalho.
Com o advento da Constituição Federal de 1988 (artigos 114 e 109), a Justiça Comum deixou de deter a competência exclusiva para as questões acidentárias. Reinava, no entanto, certa controvérsia acerca da interpretação efetiva do artigo 109[1], I, da Constituição da República, no que tange à competência para julgar e processar demandas envolvendo indenização decorrente de acidente de trabalho, pois, para uns, a competência era da Justiça Comum e, para outros, da Justiça do Trabalho.
Até a edição da Emenda Constitucional 45/2004, a Justiça do Trabalho detinha competência específica para, além do poder normativo, julgar controvérsias decorrentes das relações de emprego; e competência derivada para solucionar conflitos decorrentes da relação de trabalho, estritamente na forma da legislação infraconstitucional.
Com o advento da Emenda Constitucional nº 45, de 08.12.2004, que alterou a redação do artigo 114 da Constituição Federal, a Justiça do Trabalho passou a processar e julgar, também, as ações decorrentes da relação de trabalho, gênero do qual é espécie a relação de emprego.
Tal Emenda, no entanto, não dispôs expressamente acerca da competência para julgar e processar ações indenizatórias dirigidas contra o empregador decorrentes de acidente de trabalho, permanecendo a controvérsia quanto à interpretação do artigo 109 da Constituição Federal.
A questão somente restou dirimida pelo Supremo Tribunal Federal em decisão proferida no Conflito de Competência 7.204-1, envolvendo o Tribunal Superior do Trabalho e o Tribunal do Estado de Minas Gerais, da lavra do Exmo. Ministro Carlos Britto, onde foi fixada a competência da Justiça do Trabalho, após a edição da Emenda Constitucional 45/2004, para julgamento das ações de indenização por danos morais e patrimoniais decorrentes de acidente de trabalho. Consta da referida decisão:
“Revisando a matéria, (…) o Plenário concluiu que a Lei Republicana de 1988 conferiu tal competência à Justiça do Trabalho. Seja porque o art. 114, já em sua redação originária, assim deixava transparecer, seja porque aquela primeira interpretação do mencionado inciso I do art. 109 estava, em boa verdade, influenciada pela jurisprudência que se firmou na Corte sob a égide das Constituições anteriores. Nada obstante, como imperativo de política judiciária – haja vista o significativo número de ações que já tramitaram e ainda tramitam nas instâncias ordinárias, bem como o relevante interesse social em causa -, o Plenário decidiu, por maioria, que o marco temporal da competência da Justiça trabalhista é o advento da EC 45/04. Emenda que explicitou a competência da Justiça Laboral na matéria em apreço”.
Tal solução vai ao encontro da própria evolução histórica do direito do trabalho, que culminou na criação da Justiça do Trabalho, pois a primeira lei trabalhista que se tem notícia, versou justamente sobre higiene no local de trabalho de menores aprendizes, aprovada pelo Parlamento Britânico em 1802.
Posteriormente, em 1833, ainda na Inglaterra, foi instituída a inspeção oficial da higiene do trabalho nos estabelecimentos. Além disso, conforme destaca Arnaldo Süssekind[2], o surgimento das normas de segurança e higiene do trabalho são frutos do
“desenvolvimento industrial do Reino Unido, nos Estados Unidos da América, na Alemanha e na França, assim como a criação do seguro de acidentes do trabalho no país de BISMARCK, em 1889, motivaram e incrementaram a adoção de medidas visando à prevenção de acidentes, aos quais as doenças profissionais vieram a equiparar-se para os fins de seguro”.
Cabe, ainda, destaque à Primeira Conferência Mundial de Direito do Trabalho, ocorrida em Berlim, em 1890, que recomendou a proibição de trabalho de mulheres e menores em atividades insalubres e perigosas; a Conferência de Berna (1906), que proibiu o uso de fósforo branco em determinadas indústrias; o Tratado de Versalles (1919), que, ao criar a Organização Internacional do Trabalho – OIT – incluiu na sua competência a proteção contra acidentes de trabalho e as doenças profissionais, com medidas protetivas e preventivas de engenharia de segurança e medicina do trabalho; bem como as sucessivas Convenções que se seguiram.
No que tange às origens do conceito de responsabilidade do empregador, merece destaque a Lei de Acidentes de 1898, da França, que deu ensejo à teoria do risco profissional decorrente da apropriação do trabalho[3].
Na América, a primeira obra sistemática sobre direito de indenização por danos trabalhistas foi escrita por Juan Bialet Massé em 1903, sob o título “Tratado de La Responsabilidad Civil em Derecho Argentino. Bajo em punto de vista dês los Accidentes del Trabajo”.
Aliás, merece destaque o princípio da “indemnidad del trabajador”, adotado pelo direito argentino, mencionado por Ricardo J. Corniglia[4]:
“Al relacionar el principio de indeminidad con las responsabilidades contractuales propias del deber de seguridad en los oficios y la norma constitucional consagratoria del principio ‘alterum non laedere’, estaba marcando senderos para un derecho de daños moderno, acorde con las requisitorias de la époco de la revolución industrial.
El contrato de trabajo comienza a ser llamado tal cuando se tratan los temas que hacen al resarcimiento de los daños sufridos en ocasión o por motivo de una relación apropiativa, que se considera intervenida por un deber de seguridad, que se complementa con su ajenización del riesgo de la empresa. Ello implicaba el comienzo del ocaso de la culpa aquiliana como protagonista central de la responsabilidad civil”.
No Brasil, o Capítulo V da CLT, que trata da Segurança e Medicina do Trabalho, na sua versão original (1943), foi considerado, à época, um dos mais completos da legislação comparada. O Decreto-lei 7036, de 1944, por sua vez, deu destaque à prevenção de acidentes de trabalho, impondo às empresas, a obrigação de organizarem CIPAS – Comissões Internas de Prevenção de Acidentes. A Lei 5161/66 criou a Fundação Centro de Segurança, Higiene e Medicina do Trabalho (FUNDACENTRO) para investigação, pesquisa e assistência às empresas no aperfeiçoamento de prevenção de acidentes de trabalho, inclusive, de doenças profissionais a ele equiparados. Já a Portaria MTb 3460, de 1975, tornou compulsória a instituição de serviços especializados em segurança e medicina do trabalho. Finalmente, a Lei 6514, de 1977, criou o novo capítulo da CLT, denominado “Segurança e Medicina do Trabalho”, destinado à normatização de medidas para a neutralização ou eliminação dos agentes nocivos à saúde do empregado (arts. 191 e 194), atribuindo ao Ministério do Trabalho, no entanto, a edição de normas específicas para tal finalidade.
Além disso, conforme acrescenta o Juiz do Trabalho Alexandre Nery de Oliveira, do Tribunal Regional do Trabalho da 10ª Região, in Dano Material, Dano Moral e Acidente de Trabalho na Justiça do Trabalho,
“o artigo 7º, inciso XXVIII, da Constituição vigente, é claro ao atribuir responsabilidade indireta do empregador pelo acidente do trabalho, quando lhe comete a responsabilidade de propiciar o seguro contra acidente de trabalho, e em acréscimo, a prever a responsabilidade direta por via indenizatória ao trabalhador, urbano ou rural, quando incorrer em dolo ou culpa. Logicamente, a indenização do empregador como reparação a acidente de trabalho sofrido pelo empregador acarreta litígio estranho à autarquia previdenciária, cuja atuação encerra-se no âmbito do seguro de acidente de trabalho financiado pelos empregadores e por ela gerido, que, assim, logicamente não seria, a princípio, da Justiça Federal, nem por exceção do que não há à Justiça Local, restando precisamente definido pelo artigo 114 da Constituição quando estabelece tal especial conflito à competência da Justiça do Trabalho. Tal indenização, pois, devida pelo empregador ao trabalhador em decorrência de dolo ou culpa no evento ocasionador de acidente de trabalho, é de natureza laboral e não acidentária, a ocasionar a inexistência de interesse autárquico previdenciário a deslocar a causa à Justiça Local, de modo a estabelecer-se, para tais casos, a competência absoluta da Justiça do Trabalho”.
Neste sentido, inclusive, é o entendimento que emana da interpretação sistemática da Súmula 736 do STF:
“Compete à Justiça do Trabalho julgar as ações que tenham como causa de pedir o descumprimento de normas trabalhistas relativas à segurança, higiene e saúde dos trabalhadores”.
Ora, se a Justiça do Trabalho é competente para processar e julgar ações concernentes ao cumprimento das normas trabalhistas relativas à segurança, higiene e saúde dos trabalhadores (direitos sociais assegurados no artigo 7º, inciso XXII da CF/88), que dirá dos efeitos de seu descumprimento, os quais, muitas vezes, são as próprias causas do acidente de trabalho ou do acometimento de doença profissional a ele equiparável.
Aliás, tanto a indenização material como a indenização por danos morais decorrentes de acidente de trabalho, embora sejam de natureza civil, são oriundas da relação de emprego, e é daí que, de fato, decorre a competência da Justiça do trabalho para conhecer, processar e julgar tais litígios.
Sedimentada, portanto, a competência da Justiça do Trabalho para processar e julgar ações envolvendo pedidos de reparação de danos materiais e morais[5] decorrentes de acidente de trabalho, é de ressaltar que quanto a este último aspecto, o TST já havia firmado este entendimento através da Súmula nº 392[6] do TST.
Superada a questão da competência em razão da matéria, outra controvérsia surgiu: qual o prazo prescricional aplicável, o trabalhista ou o civil?
Primeiramente, alguns esclarecimentos se fazem necessários.
Conforme leciona Alexandre Agra Belmonte[7], e na dicção do artigo 19 da Lei nº. 8.213/91,
“são considerados acidentes do trabalho quaisquer lesões à vida ou à integridade física do empregado como decorrência do exercício do trabalho a serviço da empresa durante o horário de trabalho[8], que cause a morte ou a perda ou redução, permanente ou temporária, da capacidade para o trabalho, bem como as doenças profissionais, as doenças do trabalho caso da LER (lesão por esforço repetitivo), os atos de agressão e de imprudência provindos de terceiros, companheiro de trabalho ou pessoa privada do uso da razão, e as concausas” (grifei).
Sua caracterização, portanto, pressupõe a implementação de quatro requisitos básicos: a existência de trabalho, a ocorrência de acidente, a ocorrência de dano e o nexo causal entre eles, ou seja, relação de causa e efeito, a qual, conforme Odonel Urbano Gonçalves (Manual de Direito Previdenciário – Acidentes do Trabalho. SP: Atlas, 1993, 2a. Ed, p. 116.), pode ser de três tipos:
(a) trabalho – acidente
(b) acidente – lesão
(c) lesão – incapacidade”
O Brasil, lamentavelmente, figura no 10º lugar no ranking mundial dos recordistas de acidentes de trabalho, de acordo com a estatística oficial da Organização Internacional do Trabalho (OIT), perdendo, tão-somente, para a Indonésia, Turquia, África do Sul, Burundi, Coréia do sul, Guatemala, Zimbábue, Costa Rica e Índia. Essa posição, no entanto, conforme esclarece Raimundo Simão de Melo[9], Procurador-Chefe do Ministério Público do Trabalho da 15ª Região (Campinas), não condiz com a realidade, que é ainda mais severa, pois nas estatísticas oficiais apenas constam os trabalhadores formais, sem computar mais de 50% dos brasileiros que não têm carteira de trabalho assinada e atuam na informalidade, cujos infortúnios não chegam ao conhecimento do Instituto Nacional do Seguro Social – INSS. Além disso, muitos dos acidentes atípicos – doenças profissionais e do trabalho – sequer são comunicados ao instituto pelos empregadores, ou, quando comunicados, aqueles relutam em reconhecê-los como tal, não obstante a legislação previdenciária seja absolutamente clara ao equipará-los ao acidente do trabalho típico, para todo e qualquer efeito.
Clarice Couto e Silva de Oliveira Prates, in Evolução Histórica da Legislação Acidentária no Brasil, esclarece, ainda, que
“o conceito de acidente do trabalho aos empregados que prestem serviços subordinados, de natureza urbana ou rural, de forma pessoal e não-eventual a um empregador, e mediante salário, inclusive aos empregados temporários. Os trabalhadores avulsos, os produtores, os parceiros, os meeiros, os arrendatários rurais, os garimpeiros, os pescadores artesanais e assemelhados que exerçam suas atividades de forma individual ou em regime de economia familiar também recebem benefícios acidentários. Por equiparação legal (artigo 21 da Lei nº 8.213/91), o conceito de acidente do trabalho foi estendido a outros acontecimentos de situações assemelhadas e justificadoras da mesma proteção jurídica. É o que se depreende dos dizeres do inciso I do citado artigo: “Equipara-se também ao acidente do trabalho, para efeitos desta Lei: I – o acidente ligado ao trabalho que, embora não tenha sido a causa única haja contribuído diretamente para a morte do segurado, para redução ou perda da sua capacidade para o trabalho, ou produzido lesão que exija atenção médica para sua recuperação. (…) A ampliação da proteção ao acidentado vincula até situações que não tenham relação direta com a atividade do obreiro, conforme incisos II, III e IV do artigo 21[10] da Lei nº 8.213/91”.
Além disso, o acidente ocorrido no trajeto casa-trabalho-casa e o atentado também são considerados acidente de trabalho, o que demonstra que mudou o enfoque conceitual do acidente de trabalho da conseqüência ou resultado para o da causa.
Por sua vez, os efeitos do acidente de trabalho podem estar indiretamente ligados ao trabalho, de forma anteveniente ou superveniente à causa, sendo que nem sempre o dano (evento lesivo) coincide com a data de acidente típico, pois o sinistro pode ser decorrente, também, de doença do trabalho ou profissional, equiparadas legalmente a acidente e, assim, envolverem inúmeras concausas[11].
De acordo com Raimundo Simão de Melo[12], os acidentes de trabalho representam grave problema para a economia brasileira, acarretando um gasto anual de cerca de 6 milhões de dólares, suportado pela Previdência Social e pelas próprias empresas, e, via reflexa, por toda a sociedade. Além disso, conforme o autor, acarretam, para os trabalhadores e respectivos familiares, irreparáveis prejuízos pelas milhares de mutilações, incapacidades e mortes, atingindo, muitas vezes, seu patrimônio material e moral”.
A fim de ressarcir tais trabalhadores e seus familiares por tais danos, aliás, é que foram criados, num primeiro momento, a cargo do Instituto Nacional do Seguro Social – INSS, os seguintes benefícios previdenciários: auxílio-doença acidentário, auxílio-acidente, aposentadoria por invalidez e pensão por morte. Soma-se a isto o reconhecimento de estabilidade provisória no emprego até doze meses após a alta do benefício previdenciário, na forma do artigo 118 da Lei 8213/91, ou por período superior, acaso exista cláusula coletiva contemplando tal previsão.
Todavia, havendo dolo ou culpa do empregador no acidente de trabalho ou no acometimento de moléstia a ele equiparável, ou sendo o sinistro decorrente do próprio risco do empreendimento econômico da empresa, surge, ainda, o dever de indenizar por responsabilidade civil do empregador, na forma do artigo 7º, XXVII[13], da Constituição Federal e artigo 927[14] do Código Civil, como já havia sido assentado na Súmula 229[15] do STF, o qual independe das outras indenizações devidas pelo órgão previdenciário.
O problema que se verifica, de plano, é que nem sempre há uma data certa para o evento (acidente), já que as doenças ocupacionais, conforme esclarece Clarice Couto e Silva de Oliveira Prates, “são de lenta e progressiva evolução, pois são decorrentes de um ambiente de trabalho agressivo ou de uma atividade laborativa agressiva[16]”. É o caso, também, do aparecimento de seqüelas após o acidente sofrido pelo empregado, cujo prejuízo material e até mesmo o moral podem vir a ocorrer inclusive depois de finda a relação de emprego.
Neste contexto, é necessária uma breve explanação acerca do prazo prescricional para as ações indenizatórias oriundas de danos de acidentes de trabalho.
A dificuldade de lançar uma data efetiva para o evento danoso, do qual, em tese, ante a dicção dos artigos 186 e 187 [17] c/c art. 927, do Código Civil vigente, decorreria o dever de indenizar o empregado[18], prejudicaria, também, a estipulação de um marco efetivo para a contagem do prazo prescricional para a exigibilidade da indenização correspondente pelo trabalhador lesado. Acerca do tema, é oportuna a transcrição da Súmula 230 do STF:
“A prescrição da ação de acidente do trabalho conta-se do exame pericial que comprovar a enfermidade ou verificar a natureza da incapacidade”. Neste sentido, também, é o entendimento que se extrai da Súmula 278 do STJ, in verbis: “O termo inicial do prazo prescricional, na ação de indenização, é a data em que o segurado teve ciência inequívoca da incapacidade laboral”.
Conforme salienta André Araújo Molina[19],
“no remoto Direito Romano tinha-se a idéia de que as ações eram perpétuas, não podendo o titular do direito sofrer limitação pela sua inércia. Somente com o início da fase do direito pretoriano é que se passou a admitir como exceção à regra a possibilidade de perda da ação. Exceção esta que, após algumas decantações jurisprudenciais, passou a se constituir em regra geral, culminando com o ‘axioma dormientibus non sucurrit ius’ (o direito não socorre aos que dormem)”.
Na lição de Savigny, a prescrição, ao acarretar a perda da ação, se destina a afastar as incertezas das relações jurídicas, buscando, assim, a paz social, com o fim das controvérsias jurídicas após o transcurso do tempo. Para ele, a prescrição iniciava com o nascimento da ação (actia nata), ou seja, na data da violação de um direito. Para tanto, defendia como condições essenciais para a verificação da “actia nata”: a existência de um direito atual, suscetível de ser reclamado em juízo e a violação desse direito pelo sujeito passivo da relação material.
Posteriormente, a doutrina passou a separar direito material de direito processual, diferenciando a pretensão propriamente dita do direito de ação.
Conforme Agnelo Amorim Filho, Professor da Universidade Federal da Paraíba:
“A pretensão é um poder dirigido contra o sujeito passivo da relação de direito substancial, ao passo que a ação processual é poder dirigido contra o Estado, para que esse satisfaça a prestação jurisdicional a que está obrigado. A rigor, só quando a pretensão não está satisfeita pelo sujeito passivo, ou seja, só quando o sujeito passivo não atende a exigência do titular do direito, é que surge, como conseqüência, a ação, isto é, o poder de provocar a atividade jurisdicional do Estado. Em resumo: violado o direito (pessoal ou real), nasce a pretensão (ação material) contra o sujeito passivo; recusando-se o sujeito passivo a atender a pretensão, nasce a ação processual, com a qual se provoca a intervenção do Estado”[20].
Ora, conforme é consenso na doutrina atual, a prescrição é instituto de direito substantivo, não extinguindo propriamente o direito de ação nem o direito material, mas sua exigibilidade, ou seja, a pretensão continua existindo no mundo jurídico, “mas o credor não pode mais impor seu interesse sobre a vontade do devedor”[21].
De acordo com o Código Civil Alemão, “A prescrição começa com o nascimento da pretensão”, idéia esta, que foi adotada pelo nosso Código Civil atual, no artigo 189[22], conforme, inclusive, esclareceu seu mentor – Miguel Reale[23] e já defendia Pontes de Miranda[24].
Destaco, no entanto, que a ação, em sentido estrito, como direito abstrato previsto constitucionalmente, não nasce com a violação do direito, mas sim, da pretensão resistida, ou seja, da recusa do sujeito passivo em satisfazer a pretensão, extrajudicialmente. Portanto, pretensão e direito de ação podem ocorrer em momentos distintos. A prescrição não nasce, assim, com a “actio nata”, mas da pretensão (ação de direito material), que, depois de resistida, faz correr o prazo prescricional para que o agente busque a exigibilidade de seu direito. Portanto, o que marca o nascimento do prazo prescricional não é a violação do direito, mas é a implementação de todas as condições de exigibilidade da prestação material. O que a prescrição fulmina, portanto, é a exigibilidade da pretensão de direito material e não a ação processual, a qual somente é atingida via reflexa, face à perda de seu exercício. Nestes termos, o que a prescrição inviabiliza é o exame da pretensão deduzida na ação e não a propositura da ação em si, sobretudo, porque o direito de ação é assegurado constitucionalmente.
A princípio, entendo que, em sendo a prescrição instituto de direito material, seu prazo é fixado pelo Código Civil, e não pelo art. 7°, XXIX, da Constituição Federal. Esta, inclusive, é a lição que emana de Pontes de Miranda[25], quando afirma: “O ramo do direito em que nasce a pretensão é o que lhe marca a prescrição, ou estabelece o prazo preclusivo do direito. Se a regra jurídica não foi prevista, rege o que o ramo do direito aponta como fundo comum a ele e a outros ramos do direito”. Assim, como a prescrição está intimamente conectada à pretensão de direito material a que se refere, por consectário, a simples alteração da competência da Justiça do Trabalho, no que tange às ações indenizatórias decorrentes de acidente de trabalho, não poderia, por si só, alterar o prazo prescricional de tais tipos de demandas; isto porque as normas jurídicas “sistematizadoras da relação de direito material não se alteram ao gosto da regra da competência para julgamento das ações. Independentemente do ramo do Poder Judiciário que está a julgar o processo, as regras materiais serão aquelas do diploma substancial que alicerça a relação jurídica material”[26].
Na linha de Câmara Leal, na obra Da Prescrição e Decadência, depreende-se que a argüição da prescrição não a cria, nem lhe dá eficácia, apenas a invoca, como fato consumado e perfeito, a ela preexistente. Assim, “argüir prescrição não é determinar sua eficácia, mas exigir que esta seja reconhecida, por isso que a prescrição já exigia e havia operado os seus efeitos extintivos”.
Relevante destacar, também, que as mais recentes decisões do TST, na esteira do Enunciado 36[27] da 1ª Jornada de Direito Material e Processual na Justiça do Trabalho, reconhecem a competência da Justiça do trabalho, inclusive, para julgar e processar ações de reparação de danos morais e materiais promovidas pelos herdeiros do trabalhador, a reforçar a idéia ora defendida neste artigo de que a prescrição a ser adotada deveria ser a prevista no direito civil e não a trabalhista, porquanto se tratam de demandas que extrapolam a simples relação de trabalho ou de emprego.
Por todo o exposto, sinalo que o deslocamento da competência, por si só, não teria o condão de alterar o prazo prescricional para aqueles pleitos de indenização por danos morais e materiais, haja vista que se tratam de matérias de natureza civil, ainda que o dano seja oriundo de relação de trabalho, porquanto a pretensão se alicerça na responsabilidade civil do empregador, cujo regramento é civil e não trabalhista.
Neste sentido, inclusive, é a decisão proferida no âmbito deste Tribunal Regional, Proc. RO 00357.2004.403.04.00-0, publicado em 09.11.2005, em acórdão da lavra da Exma. Juíza Ione Salin Gonçalves, no sentido de que
“aplicar a regra do artigo 7º, XXIX, da Constituição Federal ao caso em apreço, seria exigir do autor poderes premonitórios que o permitissem antever, já em dezembro de 1996, a alteração na legislação constitucional que viria a ocorrer somente em dezembro de 2004, com a citada Emenda Constitucional nº 45, transferindo à Justiça do Trabalho a competência para o julgamento da ação ora em exame. Impossível, portanto, admitir tal retroatividade da lei, ainda que inserida na Constituição, de sorte a ferir o ato jurídico perfeito e acabado, traduzido na tempestiva interposição da ação dentro do prazo segundo a lei vigente à época”.
Na mesma linha, o artigo do Juiz Ricardo Luiz Tavares Gehling, intitulado Ações sobre Acidente do Trabalho contra o empregador – Competência, Coisa Julgada e Prescrição, publicado na Revista Eletrônica nº 14 deste Tribunal[28].
Todavia, não foi este o entendimento que prevaleceu no âmbito do TST, onde restou sedimentado que o artigo 205 do atual Código Civil, – ao dispor que a prescrição ocorre em dez anos (quando a lei não lhe haja fixado prazo menor) -, remete o disciplinamento da matéria relativa a pleito de reparação por danos morais e materiais, decorrente de evento oriundo da relação de trabalho, à legislação trabalhista, face à força atrativa do processo do trabalho que decorre da autonomia do Direito Processual do Trabalho e da própria Justiça do Trabalho, à qual o legislador constituinte confiou o exame de tais questões. Além disso, o art. 7º, XXIX, da Carta Magna tem hierarquia superior ao art. 205 do Código Civil, sendo norma específica, razão pela qual, tem vigência material nos casos de prescrição sobre pretensão relativa à indenização por danos morais e materiais decorrentes do contrato de trabalho, inclusive, no que tange às pretensões de reparação decorrentes de acidente de trabalho. Assim, o prazo prescricional para a exigibilidade de reparação por dano moral decorrente do contrato de trabalho, mesmo oriunda de acidente de trabalho, é o que trata o artigo 7.º, XXIX, da Constituição Federal, pelo menos no que se refere àquelas ações ajuizadas depois do deslocamento da competência da matéria para a Justiça do Trabalho. Neste sentido, é ilustrativo o seguinte precedente daquela Corte:
A este respeito, embora não seja a minha posição sobre a matéria, peço vênia para transcrever excerto de acórdão da lavra do Juiz Hugo Carlos Scheurmann, da 2ª Turma do TRT da 4ª Região (Proc. 01573-2005-403-04-00-3 RO), pois corresponde à posição defendida pelo TST, ao sintetizar a questão no sentido de que
“a mudança de competência do direito de ação indenizatória de dano material e moral decorrente da relação de trabalho, antes parcialmente vinculado à Justiça Estadual se a causa de pedir fosse acidente de trabalho ou doença ocupacional, para a Justiça do Trabalho, sinaliza mudança de política judiciária. Nesse sentido é que se pode aventar a discussão sobre a natureza do direito violado e conseqüente incidência do prazo prescricional. (…) Reitera-se que a referida mudança de política judiciária nasceu com a reforma do Poder Judiciário, de novos enfoques provenientes do avanço da cultura jurídica, do aumento do volume das ações reparatórias, da especialização do ramo Trabalhista do Poder Judiciário e, também, da aplicação do princípio da proporcionalidade constitucional do legislador. Este, sopesando os princípios da segurança jurídica, do direito de ação, do acesso ao Poder Judiciário, da celeridade e economia processuais, da razoável duração do processo, determinou a mudança de competência das ações reparatórias decorrentes da relação de trabalho para a Justiça do Trabalho. Com tal mudança, de fato, os Juízos e Tribunais Trabalhistas se inclinam pela aplicabilidade das normas trabalhistas (princípios e regras), firmando posição orientadora de que, se o fato gerador da lesão se dá na relação de trabalho, o prazo prescricional para o exercício do direito de ação é o trabalhista”.
A fim de visualizar a problemática que envolve a questão, é preciso, antes de mais nada, fazer um apanhado das sucessivas alterações referentes ao prazo prescricional de tais demandas.
À época da vigência do Código Civil de 1916, no que tange às pretensões indenizatórias decorrentes de acidente de trabalho, vigia a prescrição vintenária, na esteira do disposto no então artigo 177[29] do mesmo Diploma Legal.
Com a alteração do Código Civil, em 2002, o prazo foi reduzido à metade (art. 205[30], do Código Civil vigente), com a limitação constante do artigo 206, § 3º, V[31], do mesmo Diploma Legal, observada a regra de transição do artigo 2028[32], no que tange às questões já em curso ao tempo da edição do novo Código. Assim, o prazo prescricional será de vinte anos quando, na data de entrada em vigor do novo Código, houver transcorrido mais da metade do prazo estabelecido na lei revogada.
Portanto, a prescrição para a exigibilidade das pretensões de reparação civil, com o advento do Código Civil de 2002, passou de vinte (art. 177 do Código Civil de 1916) para três anos (art. 206, § 3º, V, do Código Civil de 2002), reduzindo drasticamente o prazo para a vítima de acidente de trabalho obter judicialmente reparação pelo dano sofrido.
Não bastasse isto, na linha do entendimento assentado no TST, com o advento da Emenda Constitucional nº 45, de 08.12.2004, que alterou a redação do artigo 114 da Constituição Federal e a competência da Justiça do Trabalho, o prazo prescricional relativo às pretensões indenizatórias por danos morais e materiais decorrentes de acidente de trabalho passou a ser regido pela legislação trabalhista, mais precisamente, pelo art. 7º, XXIX, da Constituição Federal, excepcionando-se, tão-somente, aquelas ações que, ao tempo da alteração da competência, já haviam sido ajuizadas sob a égide da legislação anterior, em face ao princípio da segurança jurídica. Assim, conforme a Corte Trabalhista, o prazo prescricional para reclamar reparação civil decorrente de acidente de trabalho sofreu mais uma restrição, passando a ser, com a alteração da competência, de dois anos, na linha dos demais créditos trabalhistas.
Ora, o TST, ao adotar a prescrição trabalhista, também para as demandas ressarcitórias de danos morais e materiais decorrentes de acidente de trabalho, na contramão da melhor doutrina, dissociou o prazo prescricional da natureza do direito material (que era o civil), fixando o prazo prescricional pela origem da relação jurídica, por ser o dano oriundo da relação de trabalho.
Aliás, antes de restar consolidada a posição do TST, saliento que adotava, nos acórdãos em que atuei como Relator, a distinção do direito material tutelado, a exemplo dos seguintes julgados da 8ª Turma deste Regional: 01574-2005-403-04-00-8 RO, 01847-2005-261-04-00-9 RO e 01260-2005-403-04-00-5 RO. Assim, sintetizo o meu posicionamento acerca do tema:
EMENTA: RECURSO ORDINÁRIO DO AUTOR. ACIDENTE DO TRABALHO. INDENIZAÇÃO. PRESCRIÇÃO. A prescrição é instituto de direito material e o seu prazo, na espécie, é fixado pelo Código Civil, e não pelo art. 7°, XXIX, da CF. Com o advento do Código Civil de 2002, a prescrição foi reduzida de 20 (art. 177 do Código Civil de 1916) para 3 anos (art. 206, § 3º, V, do Código Civil de 2002). Porém, com a observação da regra de transição prevista no art. 2028 do Código Civil de 2002, o prazo prescricional será de vinte anos quando, na data de entrada em vigor do novo código, houver transcorrido mais da metade do prazo estabelecido na lei revogada. Recurso provido para afastar a prescrição pronunciada na origem.
De qualquer forma, face às sucessivas alterações do prazo prescricional, tem-se que, quer se adote a prescrição civil, quer se adote a prescrição trabalhista, o que se observa é que, num período inferior a seis anos (se considerarmos a alteração do Código Civil) ou inferior a quatro anos (se considerarmos a edição da EC 45/2004), o trabalhador teve seu prazo prescricional drasticamente reduzido, em claro prejuízo à efetividade de seu direito.
De fato, se considerarmos a jurisprudência pacífica do TST, quanto ao prazo prescricional para tais pretensões, o trabalhador teve seu prazo reduzido para dois anos da extinção do contrato de trabalho, limitada a exigibilidade das parcelas a cinco anos da data do ajuizamento da ação.
Como é cediço, sem dano não há reparação por responsabilidade civil, ainda que o empregador tenha cometido um ato ilícito, como, por exemplo, não ter tomado as medidas necessárias para minimizar as condições insalubres de trabalho na sua empresa. Assim, um problema já se verifica de plano, em razão da diminuição do prazo prescricional, é que, muitas vezes, a doença profissional, cujos efeitos podem ser cumulativos, somente fica evidente depois de transcorridos dois anos da extinção da relação de emprego, o que inviabilizaria, ante a interpretação fria do art. 7.º, XXIX, da Constituição Federal, que o trabalhador alcance a reparação do dano sofrido, a menos que se conte o prazo da consumação da lesão, a qual, como vimos, pode ser posterior à ruptura do pacto laboral, ainda que seja decorrente deste.
Não se pode olvidar do princípio protetivo, que rege o direito do trabalho, devendo se ter em conta sempre os fatos concretos, no momento de fixar o marco prescricional, a fim de evitar prejuízo irreparável ao trabalhador.
Conforme Carlos Roberto Gonçalves[33], o atual Código Civil “adota o vocábulo ‘pretensão’ (anspruch), para indicar que não se trata do direito subjetivo público abstrato de ação. E, no art. 189, enunciou que a prescrição se inicia no momento em que há violação do direito”.
Neste contexto, é razoável que, enquanto ignorada a lesão, como pode ocorrer no caso de doenças profissionais ou do trabalho, as quais podem se manifestar tardiamente, a contagem do prazo prescricional pode ser postergada ao efetivo conhecimento do dano pela vítima, desde, é claro, que comprovado o nexo causal com a relação laboral, pois é da configuração da lesão que, efetivamente, nasce a pretensão de direito material.
É de se ter em conta, também, que o direito à vida e à integridade física são protegidos pela Constituição Federal (artigos 1º, III, e 5º, III), pelo Código Civil (arts. 13 e 15) e pelo Código Penal (arts. 121 a 124 e 129 a 136), sendo estes os bens violados no caso de acidente de trabalho, passíveis de reparação por danos morais e materiais. Não se trata, portanto, de ressarcimento de lesão a trabalhador, meramente, mas de valoração do ser humano, em razão da violação de sua integridade física, direito maior, que não pode ficar à mercê da impunidade, face a alterações de ordem processual. Note-se que o pleito indenizatório, nas ações de acidente de trabalho, não visa, tão-somente, ressarcir a lesão material e moral do trabalhador, mas coibir a prática de atos ilícitos e reprováveis pelas empresas, empregadores e tomadores de serviços em geral.
Assim, “de nada adiantaria a previsão constitucional desses direitos tão caros aos cidadãos se não houvesse meio infraconstitucional de sua efetivação”[34]. No caso de reparação por acidente de trabalho, especificamente, as normas de lei ordinária, garantidoras da efetividade do direito, são aquelas previstas no título sobre responsabilidade civil do Código Civil. Portanto, consectário lógico seria a adoção do prazo prescricional da legislação material que ampara o pedido.
Ademais, há quem sustente, ainda, que a indenização por danos morais e patrimoniais advinda de acidente de trabalho, por ser decorrente de violação de direito fundamental e sendo omissa a lei trabalhista a respeito deveria ser regida pela prescrição civil, mas não a de três anos, afeta aos pleitos indenizatórios, mas a prescrição geral de dez anos de que trata o artigo 205 do Código Civil de 2002.
Especial destaque merece o Enunciado nº 1, aprovado na 1ª Jornada de Direito Material e Processual na Justiça do Trabalho, que assim dispõe:
“DIREITOS FUNDAMENTAIS. INTERPRETAÇÃO E APLICAÇÃO. Os direitos fundamentais devem ser interpretados e aplicados de maneira a preservar a integridade sistêmica da Constituição, a estabilizar as relações sociais e, acima de tudo, a oferecer a devida tutela ao titular do direito fundamental. No Direito do Trabalho, deve prevalecer o princípio da dignidade da pessoa humana”.
Aliás, conforme leciona Alexandre Agra Belmonte[35],
“os direitos fundamentais não são destinados a resolver, direta ou imediatamente, os conflitos de direito privado. A repercussão desses direitos, originariamente exercitáveis como garantias do cidadão contra o Estado, no Âmbito das relações jurídicas, os transforma em outra categoria, a de direitos da personalidade, ajustados às circunstâncias e limitações necessárias ao desenvolvimento dessas relações. Neste sentido, se ao Estado cabe garantir a vida, a saúde e a integridade física dos cidadãos, nas relações privadas esses direitos são apreciados com enfoque totalmente distinto, especificamente quanto às normas de proteção e de composição das lesões decorrentes. Enfim, se os direitos fundamentais à vida, à saúde e à integridade física são imprescritíveis, não o são as pretensões decorrentes das ofensas cometidas”.
Na verdade, as alterações legislativas ocorridas recentemente, que, também, atingiram o instituto da prescrição, dão conta do atual momento histórico em que vivemos, onde, paulatinamente, em prol de uma pretensa agilidade na solução dos litígios, estão, pouco a pouco, reduzindo os direitos dos cidadãos, dentre os quais, e, de forma mais severa, os dos trabalhadores em geral.
Oportuna, no aspecto, a lição de Francesco Carnelutti[36]: “
As incertezas e contrastes da jurisprudência são como poros através dos quais o Direito respira a Justiça. E, quando, pelo fetichismo da uniformidade, os juízos descansam nas soluções feitas, e o conjunto de máximas adquire na prática o valor de um código desmedido, cerra-se a via normal de renovação do Direito”.
A questão da prescrição das pretensões reparatórias de danos materiais e morais decorrentes de acidente de trabalho, ainda que o TST tenha optando pela adoção dos prazos trabalhistas, ainda é polêmica, exemplo disto são os Enunciados 45[37] e 46[38], aprovados na 1ª Jornada de Direito Material e Processual na Justiça do Trabalho, promovida no TST, em 23.11.2007, os quais defendem a prescrição de 10 anos, na forma do art. 205, ou de 20 anos, com a observância da regra de transição do artigo 2028 do Código Civil de 2028, bem como, como termo inicial, a data em que o trabalhador teve ciência da incapacidade laboral, ou seja, a data do efetivo resultado gravoso para sua saúde física e mental.
De acordo com as regras da legislação civil vigente, no entanto, para aqueles danos consolidados na vigência do Código Civil de 1916 (até 10.01.2003), a prescrição é vintenária, na forma do artigo 177 daquele diploma; mas se o dano ocorreu já na vigência do Código atual, vale a prescrição de três anos a contar da lesão do direito, afeta às ações de responsabilidade civil de que trata o inciso V do § 3º do artigo 206, ou seja, aquelas cujo dano remonta de data posterior a 12.01.2003. Todavia, para aquelas situações jurídicas abrangidas na regra de transição (artigo 2028 do Código Civil de 2002), ou seja, na hipótese de danos ocorridos entre 12.01.1993 a 11.01.2003, a prescrição é de 3 anos a contar da vigência do novo Código, com prazo fatal, portanto, em 11.01.2006.
Cabe mencionar, por oportuno, quanto à prescrição trabalhista de que trata o artigo 7º, XXIX, da Constituição Federal, a crítica efetuada por Arnaldo Süssekind, quando da edição da nova Carta Magna, quanto à falta de primor técnico do legislador constituinte originário de fixar a prescrição como regra constitucional e, muito menos, nas disposições do artigo 7º, já que não se trata, por óbvio, de um direito social.
Além disso, o artigo 7º, quando de sua edição, contemplava, na verdade, créditos trabalhistas típicos, ou seja, aqueles decorrentes da relação de emprego, a priori, não abarcando, portanto, em seu bojo, todo o rol de relações jurídicas advindas do trabalho, razão pela qual, é razoável dizer que a regra da prescrição do artigo 7º da Constituição Federal não abrange todas as relações de trabalho, a justificar, também, a idéia que, nas ações que tenham por fundamento pedido de reparação civil, de igual sorte, seja admitido outro prazo prescricional. Tanto é assim, que é cediço que os benefícios previdenciários também podem ser concedidos a pessoas que não mantém relação de emprego, a exemplo do disposto no artigo 19 da Lei 8213/90.
Além disso, tal qual destacado por André Araújo Molina[39],
“não há como defender que somente após a edição da Emenda Constitucional 45 de 2004 que as indenizações por responsabilidade civil passaram a ter natureza trabalhista, como reverberam alguns, para adoção do critério misto, ora entendendo que a prescrição era a civil nas ações acidentárias julgadas pela Justiça Comum, ora entendendo que as mesmas ações, agora de competência da Justiça do trabalho, devam ter a aplicação da prescrição do artigo 7º da Constituição Federal. Ora, o texto do artigo 7º não foi alterado pela Emenda Constitucional 45, nem uma vírgula (…) daí não havendo qualquer razão, mesmo que superficialmente fundamentada, que possa sustentar a adoção da corrente mista que entende que a Reforma do Judiciário é o divisor de águas da prescrição”.
É certo que, considerando que o direito é dinâmico, não podemos nos omitir perante as reformas nocivas nem nos furtar aos debates, sendo necessário, sempre, proceder à devida crítica sobre todas as questões envolvidas, com seus prós e contras, pois somente aí é que se consolida a verdadeira democracia e que se consegue, de forma efetiva, defender o interesse maior dos trabalhadores.
Por fim, finalizando e parafraseando o poeta operário russo – Maiakovski, fica a pergunta: “E então, o que quereis”[40]?
Desembargador Vice-Presidente do TRT da 4ª Região, Formado em Direito pela Universidade Federal de Santa Maria (1966-70), Pós-graduação pela Fac. de Direito da Universidade de Buenos Aires (1995-96), Ex-professor do Departamento de Direito da UFSM.
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