Direito à dispensa pelo dobro de dias de convocação para prestar serviços à justiça eleitoral: uma análise do artigo 98 da Lei nº 9.504/97 e da Resolução nº 22.747/2008 do TSE

Resumo: Pretende-se aqui abordar o direito do servidor de lhe ser concedida à dispensa prevista no artigo 98 da Lei nº 9.504/97, abordando temas afetos à disciplina, especialmente, a questão do direito à concessão da licença quando o servidor encontra-se afastado ou de férias.


Palavras-chave: Afastamento – Justiça Eleitoral – Artigo 98 da Lei nº 9.504/97 – Resolução nº 22.747/2008 do TSE. Dispensa – dobro de dias


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Sumário: I – Introdução. II – Mera apresentação do servidor para a posse como mesário: concessão do direito à dispensa pelo dobro de dias? III – Possibilidade de dispensa pelo dobro de dias aos servidores que se encontram afastados ou de férias. IV – Identidade entre o vínculo empregatício no momento da convocação e no momento da fruição da dispensa. V – Conclusão. Referências.


I – Introdução


O presente artigo analisará a possibilidade de se conceder o direito à dispensa pelo dobro de dias da convocação quando o servidor público tiver sido convocado para prestar serviços à Justiça Eleitoral.


Será abordado ao longo do presente três grandes questões que envolve a temática ora proposta, quais sejam, se a dispensa prevista na Lei Eleitoral abarca também as hipóteses em que o servidor encontra-se em gozo de férias/licença e/ou afastamento; se deverá haver identidade entre o vínculo empregatício tanto no momento da prestação de serviços quanto no momento do gozo dos dias em dobro; e por fim, será analisada a questão da mera apresentação do servidor para a posse como mesário, avaliando se este dia também dará direito à dispensa prevista no artigo 98 da Lei nº 9.504/97 e regulamentado pela Resolução nº 22.747/2008 do TSE.


II – Mera apresentação do servidor para a posse como mesário: concessão do direito à dispensa pelo dobro de dias?


A concessão do direito à dispensa pelo dobro de dias de convocação para prestar serviços à Justiça Eleitoral encontra-se prevista no artigo 98 da Lei Eleitoral que prevê:


“Art. 98. Os eleitores nomeados para compor as Mesas Receptoras ou Juntas Eleitorais e os requisitados para auxiliar seus trabalhos serão dispensados do serviço, mediante declaração expedida pela Justiça Eleitoral, sem prejuízo do salário, vencimento ou qualquer outra vantagem, pelo dobro de dias de convocação.”


Extrai-se da análise do dispositivo legal a exigência de dois requisitos: a) os eleitores devem ter sido nomeados para compor as mesas receptoras ou juntas eleitorais ou devem ter sido requisitados para auxiliar os seus trabalhos; b) existência de declaração expedida pela Justiça Eleitoral; c) os dias concedidos devem corresponder aos dias de convocação.


Quanto aos dois primeiros requisitos não há maiores problemas de interpretação. Aqueles eleitores que tiverem sido convocados para prestar serviços à Justiça Eleitoral terão direito à dispensa prevista no citado dispositivo legal, desde que de posse da certidão expedida pela Justiça Eleitoral.


Relativamente aos dias a serem abarcados pela dispensa verifica-se que somente os dias considerados de convocação poderão ser computados para os fins da dispensa prevista legalmente.


Sob esse enfoque, entende-se que o dia no qual se dá a mera apresentação do eleitor para posse como mesário não deve ser computado em dobro, justificando a ausência apenas naquele dia.


É que, em verdade, o dia em que se dá a mera apresentação do mesário não corresponde ao dia de efetiva convocação, em que a Justiça Eleitoral estabelece data e hora para apresentação, cientificados formalmente, seja por meio eletrônico, seja via aviso de recebimento.


Nos parece mais uma voluntariedade do servidor de comparecer antes da data da convocação do que propriamente a formalidade exigida pela lei, qual seja, os dias de efetiva convocação.


Nesse pórtico, o servidor não poderá ausentar-se do serviço sem que haja justificativa para tanto, sugerindo-se que a Administração pondere a necessidade de solicitar certidão/atestado/declaração expedida pela Justiça Eleitoral a fim de justificar o afastamento do servidor somente naquele período.


III – Possibilidade de dispensa pelo dobro de dias aos servidores que se encontram afastados ou de férias


O fundamento legal ventilado para justificar a concessão da dispensa nos casos em que o servidor encontra-se de férias ou afastado é o §5º do artigo 1º da Resolução nº 22.747/2008 que dispõe:


Art. 1º(…)


§ 5º A concessão do benefício previsto no artigo 98 da Lei nº 9504/97 será adequada à respectiva jornada do beneficiário, inclusive daquele que labora em regime de plantão, não podendo ser considerados para este fim os dias não trabalhados em decorrência da escala de trabalho.”


Percebe-se da análise do dispositivo que o legislador mencionou em seu texto apenas aqueles eleitores que possuem vínculo trabalhista. Contudo, esse não é o melhor raciocínio. É certo que tanto eleitores da iniciativa pública como da iniciativa privada podem ser convocados para prestar serviços à Justiça Eleitoral, de modo que o dispositivo abrange tanto uns quanto outros.


Depreende-se da leitura do citado artigo que o legislador pretendeu garantir àqueles eleitores convocados para prestar serviços à Justiça Eleitoral e que trabalhem em regime de plantão, por exemplo, que a concessão do benefício não poderia considerar os dias não trabalhados, ou seja, o empregador não pode fazer uso dos dias não trabalhados pelo eleitor convocado para descontar os dias relativos à licença.


Em verdade, o que o legislador pretendeu foi evitar que a pessoa concedente do benefício, no caso, a Administração, utilizasse outros afastamentos para computar o benefício auferido pelo servidor.


Exemplificativamente podemos imaginar servidor que se encontra afastado em razão da escala de trabalho e a Administração deixa de lhe conceder o benefício argumentando que o foi usufruído quando dos dias não trabalhados em razão da escala de trabalho.


Sob esse enfoque, entende-se que tal dispositivo sequer seria aplicável aos servidores públicos, posto que, pelo menos na maioria das instituições públicas, não há escala de trabalho a exigir dos servidores, por exemplo, regime de plantão ou afastamentos semanais.


De todo modo, ainda que houvesse, o intuito do legislador foi evitar que o concedente fizesse uso dos dias não trabalhados em razão da escala de trabalho para computar o benefício, ou seja, o eleitor convocado não teria direito à dispensa quando já tivesse usufruído de licenças em razão do trabalho.


Outro exemplo que poderíamos citar é o caso do servidor que se encontra licenciado em razão de atestado médico e a Administração deixa de lhe conceder o benefício eleitoral sob o argumento de que já gozou quando do citado afastamento.


Por essas razões, entende-se, salvo melhor juízo, que nos dias em que o servidor encontrar-se de férias, licença ou afastado terá direito à dispensa pelo dobro de dias trabalhados, não havendo razão para conferir tratamento distinto àqueles que se encontram em exercício.


Ademais, entender o contrário, seria tratar desigualmente situações iguais, não havendo que se falar em quebra do vínculo nos períodos em que o servidor se encontra de férias, afastado ou de licença, desde que formalizadas.


Somando-se a isso temos que o parágrafo único do artigo 2º da Resolução nº 22.747/2008 nada mais faz do que corroborar esse entendimento, pois prescreve que, em casos de interrupção ou suspensão do contrato de trabalho, como ocorre com as férias, por exemplo, a fruição do benefício deve ser acordada entre as partes, a fim de não impedir o exercício do direito.


Sendo assim, o § único do artigo 2º ratifica o entendimento de que a fruição de férias ou afastamento ou licença do servidor não pode impedir a fruição do benefício de ser dispensado pelo dobro de dias de convocação.


IV – Identidade entre o vínculo empregatício no momento da convocação e no momento da fruição da dispensa


Para usufruir do direito à dispensa pelo dobro de dias trabalhados deverá haver identidade entre o vínculo empregatício no momento da convocação e no momento da fruição da dispensa.


É o que dispõe o artigo 2º da Resolução nº 22.747/2008:


Art. 2º O direito do gozo do benefício previsto no caput do artigo anterior pressupõe a existência de vínculo laboral à época da convocação e, como tal, é oponível à parte com a qual o eleitor mantinha relação de trabalho ao tempo da aquisição do benefício e limita-se à vigência do vínculo.


Parágrafo único. Nos casos em que ocorra suspensão ou interrupção do contrato de trabalho ou do vínculo, a fruição do benefício deve ser acordada entre as partes a fim de não impedir o exercício do direito.”


Da leitura do dispositivo em questão, depreende-se que o legislador deixou claro que o direito ao benefício somente é oponível à parte com a qual o eleitor mantinha relação de trabalho ao tempo da aquisição do benefício, limitando-se à vigência do vínculo.


Desse modo, se servidor da justiça federal é convocado para compor mesas eleitorais, por exemplo, somente pode opor o seu direito à parte com a qual mantém vínculo, no caso a Justiça Federal. Se, posteriormente, for aprovado em outro concurso, por exemplo, especialista da Anatel, não poderá fruir da dispensa, nem poderá opor seu direito à Anatel com a qual não mantinha vínculo algum ao tempo da aquisição do benefício.


Assim, entende-se que o direito ao benefício deve ser oposto a parte com a qual o eleitor mantém vínculo de trabalho ao tempo da aquisição do benefício.


V – Conclusão


Analisou-se no presente artigo a possibilidade de se conceder o direito à dispensa do serviço ao eleitor-servidor convocado para prestar serviços à Justiça Eleitoral, nos termos do artigo 98 do Código Eleitoral.


Examinou-se a questão da mera apresentação para posse como mesário concluindo-se pela impossibilidade de concessão do benefício nessas hipóteses, uma vez que apenas nos dias de efetiva convocação, ou seja, em que há data e hora previamente estabelecidas pela Justiça Eleitoral poderá ser concedido o benefício do dobro de dias de dispensa do serviço, de forma que, a apresentação do servidor fora dessas hipóteses deverá ser avaliada pela Administração, sugerindo-se a apresentação de declaração expedida pela Justiça Eleitoral para justificar a falta, limitando-se ao período de ausência.


Apurou-se que deve haver identidade entre o vínculo do servidor no momento da aquisição do direito e no momento da fruição, nos termos do artigo 2º da Resolução nº 22.747/2008.


Por fim, avaliou-se o serviço prestado à Justiça Eleitoral durante o período em que o trabalhador/servidor público federal está em gozo de férias /licença/afastamento também assegura o direito ao afastamento previsto no artigo 98 da Lei nº 9.504/97 e Regulamentado pela Resolução nº 22.747/2008;


 


Referência

CANDIDO, Joel J. Direito Eleitoral Brasileiro. Editora Edipro. 14ª edição, 2010

Informações Sobre o Autor

Ana Carolina de Sá Dantas

Procuradora Federal junto à Agência Nacional de Telecomunicações – Anatel. Pós graduada em Direito do Estado pela Escola Superior do Ministério Público do Estado do Rio Grande do Norte. Atuou nas áreas tributária e administrativa da Anatel e no Departamento de COnsultoria da Procuradoria Federal junto à Antaq.


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Equipe Âmbito Jurídico

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