Direito internacional dos refugiados e a internalização brasileira

Resumo: O presente estudo abordará a problemática dos refugiados. Nesse aspecto, terá como objetivo central tratar do Direito Internacional dos Refugiados (DIR), tomando por fundamento o direito humanitário, bem como o direito das gentes. Apresentará o Brasil como Estado que rompeu com o paradigma da acolhida de forma a garantir direito aos refugiados, independentemente das questões nacionais. O método utilizado para esta produção, tem enfoque em pesquisas bibliográficas, abrangendo analise e interpretação doutrinária, publicações jurídicas, editoriais de autores renomados, bem como pelas informações cedidas pelo Alto Comissariado das Nações Unidas – ACNUR.

Palavras-chave: Refugiados. Direito das gentes. Brasil. Rompeu. Acolhida

Abstract: This study will address the issue of refugees. In this regard, will have as its central objective to deal with international refugee law (DIR), taking as a basis the humanitarian law and the law of nations. Present Brazil as state who broke with the accepted paradigm in order to guarantee to refugees, regardless of national issues. The method used for this production, focuses on biblical research, covering doctrinal analysis and interpretation, legal publications, editorials of renowned authors, as well as information provided by the United Nations High Commission for Human Rights – UNHCR.

Keywords: Refugees. Law of Nations. Brazil. Broke. Reception

Sumário: Introdução. 1. O Direito Internacional dos Refugiados (DIR). 1.1. Histórico do Instituto Jurídico do Refúgio. 2. A Problemática dos Refugiados e a Crise Humanitária. 3. O Instituto Jurídico do Refúgio e o Brasil. 3.1. Princípio do Non-refoulement. Conclusão. Referências.

Introdução

A Constituição Federal do Brasil vigente, em seu artigo 5º, caput, garante tratamento igual aos nacionais e ao estrangeiro residente no país, impossibilitando qualquer tratamento desigual entre nacionais e estrangeiros, o que sinaliza para a ideia de que o Estado brasileiro rompeu as barreiras do acolhimento aos refugiados; contudo, essa alegação não se encontra no texto constitucional – não há cláusula expressa que garanta a isonomia e a condição jurídica dos refugiados, como tais, no texto constitucional. Todavia, o Brasil assumiu o compromisso de acolher e proteger esses indivíduos assinando a Convenção das Nações Unidas relativa ao Estatuto dos Refugiados (1961), a Declaração de Cartagena sobre os Refugiados na América Latina (1984), e em 1997 aprovou a Lei 9.474 que prevê o reconhecimento da condição de refugiado para aquele perseguido por motivo de raça, religião, nacionalidade, grupo social ou opinião política, segundo informações do Ministério da Justiça.

Muitos países são signatários da Convenção dos Refugiados (1951), dentre eles podemos citar os países membros do Conselho da União Europeia, da União Africana e da União dos Estados Americanos; contudo, não assumem uma postura eficaz quanto ao respeito à acolhida jurídica humanizada dos refugiados em seus territórios. Esta problemática não se apresenta apenas para um País determinado, essa luta é de toda a comunidade internacional – é, claramente, um problema transfronteiriço.

Nesse sentido o trabalho a seguir apresentará o Brasil, como Estado que avançou no que diz respeito a acolhida dos refugiados, rompendo com os paradigmas do trabalho, educação e saúde, aplicando o princípio da Dignidade da Pessoa Humana.

1. O Direito Internacional dos Refugiados (DIR)

 A Declaração Universal dos Direitos Humanos assegura em seu artigo primeiro que “[…] todas as pessoas nascem livres e iguais em dignidade e direitos (…)”. Dessa forma rompe qualquer limite às liberdades fundamentais de qualquer indivíduo do planeta. (ONU, 1948)

 As garantias e princípios fundamentais foram consolidados no Continente Americano pelo Pacto de San Jose da Costa Rica (1969), na Convenção Americana de Direitos Humanos, contudo o Brasil só assinou o tratado em 1992, desde então estabelece e protege tais direitos e garantias. Conforme Hannah Arendt:

“Os direitos humanos pressupõem a cidadania não apenas como um fato e um meio, mas sim como um princípio, pois a privação da cidadania afeta substantivamente a condição humana, uma vez que o ser humano privado de suas qualidades – o seu estatuto político – vê-se privado de sua subsistência, vale dizer: tornando pura substância, perde a sua qualidade substancial, que é de ser tratado pelos outros como semelhante.” (ARENDT, apud, UBER 2012, p. 108)

 Como características básicas dos direitos humanos, temos a: irrenunciabilidade, inviolabilidade e universalidade – esta determinando a cogência dos mesmos, independentemente das interpretações nacionais – por meio do Princípio da Interpretação Autônoma dos Tratados Internacionais de Direitos Humanos, o que impede a alteração desses direitos por qualquer alegativa nacionalizante. Trata-se de um direito “erga omnes”, a norma tem validade para todos sem distinção.

É preciso romper com a obscuridade paroquial nacionalista e garantir direitos. Nesse caminho, assegurar e preservar tais direitos não é obrigação de um determinado Estado, segundo Norberto Bobbio, em A era dos Direitos:

“[…] na Declaração, em seu artigo 2º, onde se enunciam os quatro direitos naturais que o homem possui originariamente, e se afirma textualmente que “a finalidade de toda associação política é a conservação” desses direitos. Numa concepção orgânica da sociedade, a finalidade da organização política é a conservação do todo”. (2004, p.108)

Nesse contexto surge a questão dos refugiados, que se apresenta com muita pujança no corpo social, em virtude dos últimos acontecimentos na Europa, bem como dos conflitos armados na Síria, Iraque, Afeganistão e do Norte da África.

Em termos conceituais, refugiado é todo aquele que por fundado temor de perseguição objetivo ou subjetivo, é forçado a deixar seu país de origem e emigrar para outro Estado em busca de ter seus direitos fundamentais resguardados. Refúgio não é um estado, César e Viviane (2012, p. 140) aduz que, “[…] ninguém gosta de ser um refugiado ou escolhe sê-lo. A pessoa se converte em refugiado quando um ou mais dos seus direitos humanos fundamentais são violados”.

O instituto jurídico do asilo não se confunde com instituto jurídico do refúgio, sendo o segundo uma espécie do primeiro. Conforme Guilherme Assis de Almeida “É fundamental esclarecer que o instituto jurídico ao asilo é gênero que possui duas espécies: o asilo político (diplomático ou territorial, de âmbito latino-americano, e o Estatuto do Refugido”. (2002, p. 109)

1.1. Histórico do Instituto Jurídico do Refúgio

 André de Carvalho Ramos aduz, na obra comemorativa aos 60 anos do Alto Comissariado das Nações Unidas para Refugiados (ACNUR) que “até o século XX, o Direito Internacional não possuía instituições ou regras voltadas especificamente…” aos refugiados, esses dependiam da “generosidade” das leis nacionais. (RAMOS, 2011, p. 24 e 25) Ainda conforme o autor:

“O grande impulso à proteção dos refugiados deu-se com a Declaração Universal de Direitos Humanos, que estabeleceu… em seu artigo XIV que “toda pessoa vítima de perseguição tem o direito a procurar e de gozar de asilo em outros países”. (RAMOS, 2011, p. 25)

 No ano de 1951, foi aprovada a Convenção das Nações Unidas Sobre o Estatuto dos Refugiados, entrando em vigor somente 22 de abril de 1954. Segundo o ACNUR o Conselho da União Europeia, a União Africana e a Organização dos Estados Americanos recepcionaram essa legislação. A Convenção de 1951, em seu artigo 1º, conceitua refugiado como aquele:

“Que, em consequência de acontecimentos ocorridos antes de 1º de Janeiro de 1951, e receando, com razão ser perseguida em virtude da sua raça, religião, nacionalidade, filiação em certo grupo social ou das suas opiniões políticas, se encontre fora do país de que tem a nacionalidade e não possa ou, em virtude daquele receio, não queira pedir a proteção daquele país; ou que, se não tiver nacionalidade e estiver fora do país no qual tinha a sua residência habitual após aqueles acontecimentos, não possa ou, em virtude do dito receio, a ele não queira voltar.” (ACNUR, 1954)

Contudo a Convenção apresentava um “limite temporal”, reconhecendo como refugiado, somente aqueles que fugiram de seu Estado de residência em busca de abrigo em outros países, antes de 1º de janeiro 1951.

Com o surgimento de novas situações de refúgio, manifesta-se a necessidade de ampliar esse conceito. O Protocolo de 1967, é criado, na intenção de romper com o limite temporal da Convenção de 51, a alteração, sinaliza para a ideia de que, os Estados que recepcionaram o Protocolo comprometeram-se a acolher como refugiados aqueles que preenchem os requisitos da Convenção dos Refugiados, sem se ater ao limite temporal.

Sendo assim refugiado é todo aquele que por fundado temor de perseguição objetivo ou subjetivo, ocasionado por motivo de raça, religião, nacionalidade, opiniões políticas ou pertencimento a um grupo social específico seja coagido a deixar seu país de origem em busca de preservar seu bem maior, qual seja- a vida. O Manual dos Refugiados aduz que:

“[…] A determinação da condição de refugiado não tem como efeito atribuir-lhe a qualidade de refugiado, mas sim constatar essa qualidade. Uma pessoa não se torna refugiado por que é reconhecida como tal, mas é reconhecida como tal porque é um refugiado”.(ACNUR, 2011, p. 6)

A Convenção de 1951, possui cláusulas de inclusão, cassação e exclusão. Conforme o Manual dos Refugiados:

“As cláusulas de inclusão definem os critérios que uma pessoa deve satisfazer para ser refugiado. Constituem os critérios positivos sobre os quais é declarada a condição de refugiado. As cláusulas ditas de cessação e de exclusão têm um significado negativo; as primeiras indicam as situações nas quais alguém deixa de ser refugiado e as segundas enumeram as circunstâncias em que uma pessoa não é amparada pela Convenção de 1951, mesmo que satisfaça os critérios positivos das cláusulas de inclusão”. (ACNUR, 2011, p. 10)

Dessa forma para que se determine a situação de refugiado – a qual não lhe é atribuída, e sim confirmado, é preciso preencher os requisitos da Convenção de 1951, bem como do Protocolo de 1967. O temor de perseguição deve ter fundamento, o qual será apresentado pelo solicitante ao ACNUR. Contudo no Brasil essa solicitação será apresentada a Polícia Federal, que juntamente com o CONARE analisará o preenchimento dos requisitos. Esse processo é cauteloso, de forma a impedir a acolhida de aproveitadores, criminosos ou terroristas.

Outro requisito é o de que o solicitante de refugio deverá está fora do seu país de nacionalidade. Destaca o Manual dos Refugiados que:

“Uma das condições gerais para o reconhecimento da condição de refugiado é que o solicitante que possui uma nacionalidade esteja fora do seu país de nacionalidade. Não há exceções para essa regra. A proteção internacional não pode intervir enquanto a pessoa se encontrar dentro da jurisdição territorial do seu país de origem”. (ACNUR, 2011, p. 20)

2. A Problemática dos Refugiados e a Crise Humanitária

Impende destacar, que embora o Direito Internacional reconheça asilo ou refúgio aqueles que sofrem perseguições, o mesmo não obriga os Estados a concedê-lo. Esse fator corrobora como argumento para que os Estados não recebam, acolham ou reassentem refugiados. César Silva e Viviane Rodrigues destacam que:

“[…] o problema dos refugiados cresceu nos últimos tempos, para questão que, a princípio, acreditava-se que seria extinta somente com a criação do Alto Comissariado das Nações Unidas para Refugiados (ACNUR), e que acabou se tornando uma tragédia quase insolúvel ao longo dos anos.” (RODRIGUES, SILVA, 2012, p. 125)

A ideia dos autores mostra-se atual, com a “Crise Humanitária” que vem ocorrendo na Europa. Nesse sentido, destaca o ACNUR:

“Desde o início deste ano, quase 500 mil pessoas atravessaram o Mediterrâneo, fazendo viagens perigosas a partir da Síria, Iraque, Afeganistão, Sudão e outros países dilacerados pela guerra e perseguição. Milhares de famílias estão fugindo para salvar suas vidas, se arriscando e, travessias marítimas e terrestres traiçoeiras”. (ACNUR, 2015)

No que diz respeito à acolhida, há um problema transfronteiriço. Os Estados Internacionais obstam a entrada de refugiados, impedindo a solicitação de refúgio. Segundo Francielle Uber:

“Os Estados, como atores racionais, não costumam agir de forma altruísta. O que podemos constatar é que o Estado somente garante proteção humanitária quando há algum interesse nacional, ou seja, quando os custos da proteção desses indivíduos são vantajosos pelos benefícios gerados”. (UBER, 2012, p. 108)

Continua na mesma obra dispondo que: “O Estado, considerando a proteção dos refugiados, não os coloca em primeiro plano quando há algum risco à sua segurança interna em virtude dessa proteção dispensada”. (UBER, 2012, p. 109)

O Estado Internacional teme a represália do país de origem do solicitante, bem como, os gastos gerados com a acolhida – é preciso romper com a obscuridade paroquial nacionalista.

Para o ACNUR, quando aos refugiados é dada a oportunidade de desfrutar de seus direitos, esses contribuem com mais eficácia ao desenvolvimento econômico da comunidade que o recebe. (ACNUR) Rosita Milesi e Flávia Carlet destacam que:

“[…] ao chegar em um novo país, as dificuldades que enfrentam não se limitam à nova cultura, ao idioma e aos costumes. Não raro, chegam em situação de pobreza, emocionalmente abalados, às vezes doentes e sem perspectiva de reestruturar sua vida.” (CARLET, MILESI, 2012, p. 87)

Surge nesse sentindo a necessidade de se criar políticas públicas voltadas aos refugiados. A problemática dos refugiados é uma luta de toda a comunidade internacional. Para César Silva e Viviane Rodrigues:

“Esse é o desafio da comunidade internacional atualmente: aprender com os erros do passado, parar de tratar estes indivíduos como uma “mercadoria” estrangeira em território nacional e oferecer a verdadeira chance de recomeço de uma nova vida para homens, mulheres, jovens, crianças, idosos, sem importar nacionalidade, etnia, raça, credo ou origem, no espírito dos regimes globais do sistema da ONU e também dos regionais nos diversos continentes”. (RODRIGUES, SILVA, 2012, p.141)

Ada Colau em discurso para um programa de Televisão, a respeito da acolhida aos refugiados, articulou:

“Antes de ontem 50 pessoas morreram por asfixia no porão de um barco. Hoje, mais de 70 pessoas dentro de um caminhão. Hoje acordamos com dois naufrágios: pode ser mais uma centena de mortos. Temos um mar que está cheio de mortos. Limites que são preenchidos com fios, pregos, lâminas … e pessoas mortas.

Homens, mulheres e crianças, mortos.

E uma parte da Europa chora, grita, quer que sejam salvos, quer que eles não morram, mas … mas que não venham, que se vão, que vão embora, que não existam e que parem de vê-los na TV, e menos ainda em nossas ruas, com seus cobertores, no metrô, ou nos degraus de nossas casas.
Alguns de forma irresponsável promovem o medo ao "outro", ao "ilegal", "àqueles que vêm para vender sem licença", "gastar a nossa saúde", "ficar com nossos recursos", "para ocupar o nosso lugar nas escolas" , "vão pedir", "vão mendigar" "vão delinquir" …
Mas o medo é apenas isso: medo. Nosso medo de viver um pouco pior contra o seu medo de não sobreviver. Nosso medo de ter de compartilhar uma pequena parte do bem-estar contra o seu medo da fome e da morte, tão profundo que lhes deu a coragem de arriscar tudo, para vir com outra equipagem do que o próprio medo ele mesmo.
Medo contra medo. E o deles é mais forte. Então, Europa, europeus: devemos abrir nossos olhos. Não haverão muros ou arames farpados suficientes para parar isso. Nem bombas de gás lacrimogêneo ou balas de borracha. Ou assumimos o drama humano desde a capacidade de amar que nos torna humanos, ou acabaremos todos desumanizados. E haverá mais mortes, muitas mais. Esta não é uma batalha para proteger-nos "dos outros". Agora mesmo esta é uma guerra contra a vida.
Que os governos parem de ameaçar com o "Efeito chamada". O que a Europa precisa urgentemente é de uma "Chamada ao afeto", uma chamada para a empatia. Poderiam ser nossos filhos, irmãs ou mães. Poderia ser nós mesmos, como também foram exilados muitos dos nossos avós.
Embora esta seja uma questão de competência nacional e europeia, a partir de Barcelona, vamos fazer tudo que pudermos para participar de uma rede de cidades-refúgio. Queremos cidades comprometidas com os direitos humanos e com a vida, cidades de que se orgulhar”.
(COLAU, 2015)

Segundo uma melhor compreensão da Teoria dos Direitos Humanos, é preciso romper com a ideia de “Soberania Estatal” e falar de “Intervenções Humanitárias”. Nesse sentido, aduz André Regis:

“[…] o princípio da soberania está vivo e forte. E, continua sendo o principal conceito das relações internacionais. Dele surge a ideia da igualdade entre os Estados. O argumento de que com o final da Guerra Fria, o novo princípio do Direito Internacional, princípio da intervenção humanitária, ou Responsabilidade de Proteger, tornou-se, hierarquicamente, superior ao da soberania está longe de se concretizar.” (REGIS, 2015, p. 14 e 15)

É preciso romper o paradigma localista, impedindo uma provável guerra, ou pelo menos solucionando a “crise humanitária” atual, com o objetivo de diminuir os efeitos da crise humanitária, que obstam a entrada de refugiados em Estados estrangeiros, possibilitando o diálogo entre os países, na perspectiva de falar de “soberania da humanidade”, universalizando os direitos humanos a fim de alcançar todos, sem limite, sem criar barreiras soberanas ou de interesses estatais.

Nessa perspectiva o Brasil avançou no sentido de acolhida aos refugiados. Rosita Milese e Flávia Carlet destacam:

“Com o amadurecimento da temática e o debate sobre a importância do acesso dos refugiados à educação, ao trabalho, à saúde, à moradia, ao lazer, o Brasil vem reconhecendo, em termos legais e teóricos, a necessidade de implementação de políticas públicas específicas e possibilidade de acesso dos refugiados às políticas existentes, ao amparo, como já dissemos, da disposição constitucional de tratamento paritário entre nacionais e estrangeiros residentes no País”. (CARLET, MILESW, 2012, p. 86)

3. O Instituto Jurídico do Refúgio e o Brasil

A Constituição Federal do Brasil vigente, em seu artigo 5º, caput, garante tratamento igual aos nacionais e ao estrangeiro residente no país. Ingo sustenta que “[…] a Constituição Federal, quanto à titularidade de direitos fundamentais não estabelece, pelo menos não de modo generalizado (pois ela própria prevê exceções), a exclusão dos estrangeiros residentes no país”, e prossegue em seu texto informando que “mesmo em relação aos estrangeiros não residentes tal proteção é garantida”. (SARLET, 2013, p. 651)

 O próprio texto constitucional impossibilita qualquer tratamento desigual entre nacionais e estrangeiros, o que sinaliza para a ideia de que o Estado brasileiro rompeu as barreiras do acolhimento aos refugiados; contudo, essa alegação não se encontra no texto constitucional – não há cláusula expressa que garanta a isonomia e a condição jurídica dos refugiados, como tais.

Dessa forma, o Brasil assumiu o compromisso de acolher e proteger esses indivíduos que possuem seus Direitos Humanos gravemente violados. Assinou a Convenção das Nações Unidas relativa ao Estatuto dos Refugiados (1961), a Declaração de Cartagena sobre os Refugiados na América Latina (1984), e em 1997 aprovou a Lei 9474 que prevê o reconhecimento da condição de refugiados para aquele perseguido por motivo de raça, religião, nacionalidade, grupo social ou opinião política.

Assim, não há dúvida que, a nação brasileira apresenta-se propícia a acolher refugiados. Em campanha nas redes sociais o Ministério da Justiça utiliza o lema “para os refugiados, o Brasil é uma oportunidade de viver ”. (MJ, 2015)

Embora a mobilização do Estado Brasileiro na luta de reassentar esses sujeitos seja explícita, somente alguns estados da federação brasileira possuem programas definidos para acolher esses imigrantes.

A ONU (Organização das Nações Unidas) considerou a norma jurídica brasileira, como uma das mais modernas, abrangentes e generosas do mundo. Mesmo com uma avançada legislação o país não apresenta estruturas e programas claramente definidos para receber, acolher e reassentar refugiados. Contudo, vem avançando nesse sentido, uma vez que mostra-se solidário em acolher refugiados. Luís Paulo indaga:

“Será que nós vamos precisar ter a economia arrumada, ter nosso sistema de saúde pública e educação perfeitos para poder estender a mão num gosto de solidariedade internacional para aquele que vem sendo perseguido, que não tem mais nada, só tem a própria vida como único bem que lhe restou a salvar”? (PAULO, apud, BARRETO, 2006, p. 47)

 Apesar de o Brasil ser reconhecido como uma referência no apoio aos refugiados, à realidade destes indivíduos ainda é marcada por uma situação frágil do ponto de vista da inclusão. O tema em mote é digno de reflexão, embora a problemática venha ganhando espaço nas discussões sociais, políticas e econômicas, a invisibilidade destes sujeitos ainda é recorrente. Dessa forma a nebulosidade do assunto faz com que o sujeito que “estar” em estado de refugiado tenha seus Direitos Humanos dissipados.

Não se pode desconsiderar um tema que vem ganhando visibilidade, segundo Rosita Milesi e Flávia Carlet:

“Paralelamente aos reconhecidos avanços, existem vazios, carências e necessidades que urgem vontade política, medidas, decisões e viabilização para que o país possa estar inserido efetivamente numa postura de acolhida e integração de refugiados”. (MILESI, CARLET, 2012, p. 92)

A proposta do tema apresenta-se importante no agrupamento social, é preciso romper a obscuridade, garantir direitos e sustar com paradigmas da regularização, trabalho e integração social. Segundo Ada Colau:

“Alguns de forma irresponsável promovem o medo ao “outro”, ao “ilegal”, “aqueles que vêm para vender sem licença”, “gastar a nossa saúde”, “ficar com nossos recursos”, “para ocupar nosso lugar nas escolas”, “vão pedir”, “vão mendigar”, “vão delinquir”. Mas o medo é apenas isso: medo.” (COLAU, 2015)

O distanciamento do tema traz indagações distorcidas, o refugiado só precisa ser visto como um “ser de direitos” e deveres, que terão acesso a essas garantias independente do lugar ou posição que estejam. Conforme Cesar e Viviane (2012, p. 141) “[…] é preciso avançar para além das regras jurídicas positivadas somente, e considerar os regimes internacionais como um todo”.

Tomando por base a mesma obra os autores informam que “[…] a busca de solução para os refugiados no Brasil e no mundo é mais do que nunca um problema de todas as comunidades, sejam nacionais ou internacionais”. (SILVA, 2012, p. 141)

O Brasil ratificou a Convenção de 1951, por meio do Decreto 50.215/1961, nesse momento havia recepcionado a “limitação temporal” presente na Convenção, rompendo o limite temporal em 1989 por meio do Decreto 98.602.

No ano de 1977 a ACNUR instalou-se em solo brasileiro, nesse mesmo ano o Brasil elaborou uma legislação voltada aos refugiados, bem como criou um órgão específico para tratar do tema – CONARE. A Lei nº 9474/97 – Estatuto dos Refugiados no Brasil, conceituando refugiado como:

“Art. 1º Será reconhecido como refugiado todo indivíduo que:

I – devido a fundados temores de perseguição por motivos de raça, religião, nacionalidade, grupo social ou opiniões políticas encontre-se fora de seu país de nacionalidade e não possa ou não queira acolher-se à proteção de tal país;

II – não tendo nacionalidade e estando fora do país onde antes teve sua residência habitual, não possa ou não queira regressar a ele, em função das circunstâncias descritas no inciso anterior;

III – devido a grave e generalizada violação de direitos humanos, é obrigado a deixar seu país de nacionalidade para buscar refúgio em outro país.” (BRASIL, 1997)

A mesma Lei determina em seu art. 2º que, a condição de refugiado será extensiva “ao cônjuge, aos ascendentes e descendentes, assim como aos demais membros do grupo familiar que do refugiado dependerem economicamente, desde que se encontrem em território nacional”. Internalizando assim, o que estabelece a Convenção de 1951, como sendo o Princípio da Unidade Familiar. (BRASIL, 1997)

Embora a Constituição Federal de 1988 não tenha cláusula expressa que garanta a condição jurídica do refugiado, essa possui a solidariedade como princípio fundamental (art. 3º, I), o que sinaliza para a ideia de que o Estado brasileiro rompeu as barreiras do acolhimento aos refugiados.

Segundo dados do ACNUR até outubro de 2014, o Brasil havia recepcionado 8302 refugiados, mas embora demostre aberto para acolhimento, não possui estrutura suficiente para apresentar-se efetivo nesse sentido. Conforme determina Rosita Milesi e Flávia Carlet:

“Paralelamente aos reconhecidos avanços, existem vazios, carências e necessidades que urgem vontade política, medidas de decisões e viabilização para que o País possa estar inserido efetivamente numa postura de acolhimento e integração de refugiado e refugiada”. (2012, p. 92)

Somente alguns estados-membros da Federação brasileira possuem políticas públicas voltadas a receber refugiados. O ACNUR informa:

“Os projetos do ACNUR que prestam assistência humanitária aos solicitantes de refúgio e refugiados são implementados por ONGs parceiras localizadas nos estados de São Paulo, Rio de Janeiro, Rio Grande do Sul, Amazonas e Distrito Federal”. (ACNUR, 2015)

Quanto a participação do Brasil na problemática dos refugiados, determina Guilherme Assis de Almeida:

“Da perspectiva do DIR, a lei brasileira é das mais avançadas, porque, além de incorporar as principais diretrizes e definição clássica da Convenção de 1951, incorpora a definição ampliada de refugiado inspirada na Declaração de Cartagena, de 1984”. (2001, p. 133)

Nessa perspectiva o Brasil avançou no sentido de acolhida aos refugiados. Rosita Milese e Flávia Carlet destacam:

“Com o amadurecimento da temática e o debate sobre a importância do acesso dos refugiados à educação, ao trabalho, à saúde, à moradia, ao lazer, o Brasil vem reconhecendo, em termos legais e teóricos, a necessidade de implementação de políticas públicas específicas e possibilidade de acesso dos refugiados às políticas existentes, ao amparo, como já dissemos, da disposição constitucional de tratamento paritário entre nacionais e estrangeiros residentes no País”. (CARLET, MILESW, 2012, p. 86)

O Brasil ratificou a Convenção de 1951, por meio do Decreto 50.215/1961, nesse momento havia recepcionado a “limitação temporal” presente na Convenção, rompendo o limite temporal em 1989 por meio do Decreto 98.602.

Com base nesse mesmo instituto é criado no Brasil um órgão específico com finalidade de aplicar políticas públicas voltadas aos refugiados. É implementado o CONARE (Comitê Nacional para Refugiados), composto pelo Ministério da Justiça, Ministério das Relações Exteriores, Ministério da Educação, Ministério da Saúde, Ministério do Trabalho, Departamento da Polícia Federal e o ACNUR como voz, mas sem voto. Ingo Wolfgang Sarlet aduz:

“No Brasil, a Constituição Federal não contempla o instituto do refúgio de tal sorte que a matéria foi objetivo de regulamentação no plano infraconstitucional, designadamente, pela Lei 9474/97. A concessão de refúgio se opera pela via administrativa (CONARE), órgãos vinculados ao Ministério da Justiça, que analisa os pedidos e decide sobre refúgio assegura beneficiário o respectivo status e proteção nos termos da lei interna e diploma internacionais aplicáveis.” (2014, p. 658)

Nesse sentindo compreendemos a necessidade do Brasil avançar para além do que está normatizado, criando medidas pública e estrutural na busca de perfazer sua postura como Estado de acolhimento eficaz. Contudo embora existam fragilidades do ponto de vista da inclusão, o Brasil apresenta-se propício para acolher esses indivíduos, tendo em seu ordenamento jurídico, uma avançada legislação – voltada para proteção dos refugiados – considerada pela ONU, como uma das mais modernas, abrangentes e generosas do mundo.

3.1. Princípio do Non-refoulement

Por meio do Princípio do Non-refoulement (não devolução), os Estados de refúgio não podem devolver seus refugiados ao país que sofreu “fundado temor de perseguição. Esse princípio encontra-se amparado pelo artigo 33 da Convenção de 1951. Determina Guilherme Assis de Almeida:

“O princípio do non-refoullement é a pedra angular de proteção internacional dos refugiados e é o mais fundamental direito deles; é esse princípio que garante ao refugiado ou ao solicitante de asilo a garantia do espaço de não violência expresso, juridicamente, por meio do instituto do asilo”. (2001, p. 156)

Vale salutar que esse princípio não deverá ser aplicado somente aos refugiados ou solicitantes de asilo, mas a todo ser humano que sofra ameaça aos seus direitos a liberdade ou a vida.

André de Carvalho Ramos destaca na obra comemorativa aos 60 anos do ACNUR que, “Tal princípio consiste na vedação da devolução do refugiado ou solicitante de refúgio (refugee seeker) para o Estado do qual tenha o fundado temor de ser alvo de perseguição odiosa”. (2011, p. 33)

Conclusão

Tomando por base as informações colhidas é possível averiguar que para a comunidade internacional o Brasil é um exemplo a ser seguido, oportunizando para esses indivíduos – refugiados – uma oportunidade de recomeçar, de fazer valer seus direitos humanos fundamentais.

Nesse sentindo o Brasil vem avançando para além do que está normatizado, criando medidas pública e estrutural na busca de perfazer sua postura como Estado de acolhimento eficaz.

É preciso romper a obscuridade paroquial nacionalista, garantir direitos e sustar com os paradigmas da regularização, trabalho e integração social. Isso será possível com a ruptura do óbices apresentado pelos Estados, de forma a garantir a efetivação da acolhida desses indivíduos. Nesse sentido o Brasil vem avançando.

 

Referências
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Informações Sobre o Autor

Nadhyel Anderson Freires de Sousa Lima

Bacharel em Direito pela Faculdade Nordeste – Devry Brasil; Advogado


Equipe Âmbito Jurídico

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