Direito internacional e direito previdenciário tratados e soluções jurídicas para a efetiva proteção a tutela jurisdicional

Resumo: Artigo que tem a finalidade de analisar questões de Direito Internacional, em especial a origem dos tratados e a maneira pela qual estes ingressam no ordenamento jurídico pátrio, bem como a sua relação e aplicabilidade no Direito Previdenciário. Será analisada, também, a problemática da proteção internacional da criança e do adolescente.

Palavras-chave: Direito Internacional. Normas constitucionais. Proteção da Criança e do Adolescente. Tutela Jurisdicional. Vedação ao Retrocesso Previdenciário.

Abstract: This article is intended to analyze Internacional Law issues, especially the origin of treaties and the way they are inserted on national legislation, as well as its relation and applicability on Social Security Law. It will also be analyzed some issues about international protection of children and teenagers.

Keywords: International Law. Constitucional regulations. Children and Teenagers Protection. Judicial Protection. Forbiddance of Social Security Regression.

Sumário: 1. Introdução. 2. O direito internacional, seus tratados e os direitos humanos. 3. A seguridade social na constituição Federal. 4. Temas de direito internacional. 5. Conclusão

1. INTRODUÇÃO

A proposta do presente trabalho é analisar o estudo do Direito Internacional, a origem dos tratados e como este ramo do direito pode influenciar no Direito Previdenciário, de modo a proteger o beneficiário garantindo a conquista e preservação de direitos muitas vezes suprimidos pela autarquia federal.

Pretendemos demonstrar como os direitos humanos, juntamente com os pactos internacionais, podem ser objeto de estudo e de efetiva aplicação no ramo do Direito Previdenciário.

Buscamos analisar a Constituição Federal e como foram incorporados os tratados dentro do ordenamento jurídico, atribuindo um "status" hierárquico diferenciado de modo a proteger os cidadãos que vivem sob esse Estado, restringindo a violação de direito e objetivando responsabilizar o Estado quando houver supressão dos mesmos.

Expomos a proteção internacional da criança e do adolescente, que é amparada internacionalmente, e como normas infraconstitucionais tentam delimitar situações já pacificadas.

O presente artigo não tem por objetivo esgotar o tema, já que o estudo dos ramos do direito internacional, constitucional e previdenciário merece uma abordagem profunda de estudo. O objetivo do artigo, por sua vez, é dar uma visão panorâmica de que os direitos estão interligados e, quando uma norma infraconstitucional restringe um direito, a única saída é a busca de normas constitucionais ou internacionais para a proteção daquele que necessita da tutela do Estado, protegendo assim direito líquido e certo.

2. O DIREITO INTERNACIONAL, SEUS TRATADOS E OS DIREITOS HUMANOS

Antes de iniciar o tema sobre o direito internacional e os direitos humanos precisamos tratar de desigualdades sociais.

Não é de hoje que precisamos lidar com os mais pobres e necessitados. Muitos acham que a ideia de seguro social se iniciou somente na Segunda Guerra Mundial, ou com a igreja que foi também atuante na assistência aos necessitados. Essa passagem está contida em Deuteronômio 26:12: “De três em três anos junte a décima parte das colheitas daquele ano e dê aos levitas, aos estrangeiros, aos órfãos e as viúvas que moram na sua cidade, para que tenham toda a comida que precisarem” (Bíblia Sagrada – Tradução na linguagem de hoje).

Antes mesmo de existir uma idéia de amparo social, Moiséis criou aos povos israelitas um método de dizimo que consistia em amparar a viúva e o necessitado por meio de um sistema de coleta de alimentos, protegendo assim os desamparados socialmente.

A igreja continuou desempenhando esse mandamento. Com o passar dos anos, contudo, por volta da Segunda Guerra Mundial, este papel também foi assumido por Adolf Hitler, que determinou um programa que criasse pensões por velhice e invalidez para todos os alemães em atividade.

Em 1941, a Inglaterra passava por um momento de reconstrução do país, então foi criado um sistema que amparasse os necessitados. Esse método foi aplicado por William Henry Beveridge, que em 1942, ainda durante a Segunda Guerra Mundial, propôs um plano em que todas as pessoas deviam pagar uma contribuição ao Estado. Depois o Estado, com o dinheiro dessas contribuições, prestaria assistência às viúvas, desempregados e doentes.

Não foi só a Seguridade Social que começou a ser criada pelo Estado em meio à Segunda Grande Guerra. Surgiu também o direito internacional dos direitos humanos. Em meados de 1945, quando muitos se viram perplexos e chocados com o holocausto, que dizimou vidas de forma cruel, as nações e o mundo decidiram que o direito internacional dos direitos humanos deveria ser um dos principais propósitos das Nações Unidas.

Então, em 10 de dezembro de 1948, foi proclamada pela ONU a Declaração Universal dos Direitos Humanos, que tem como objetivo evitar as guerras promover a paz mundial e fortalecer os direitos humanitários.

A Declaração de Direitos Humanos tem tanta relevância para o sistema normativo que o Estado pode ser responsabilizado caso garantias fundamentais sejam suprimidas ou violadas.

Entre as normas de Direitos Humanos cabe destacar:

“Artigo 7. Todos são iguais perante a lei e têm direito, sem qualquer distinção, a igual proteção da lei. Todos têm direito a igual proteção contra qualquer discriminação que viole a presente Declaração e contra qualquer incitamento a tal discriminação.

Artigo 8. Todo ser humano tem direito a receber dos tribunais nacionais competentes remédio efetivo para os atos que violem os direitos fundamentais que lhe sejam reconhecidos pela constituição ou pela lei.

Artigo 25. 1. Todo ser humano tem direito a um padrão de vida capaz de assegurar a si e a sua família saúde e bem estar, inclusive alimentação, vestuário, habitação, cuidados médicos e os serviços sociais indispensáveis, e direito à segurança em caso de desemprego, doença, invalidez, viuvez, velhice ou outros casos de perda dos meios de subsistência fora de seu controle. 2. A maternidade e a infância têm direito a cuidados e assistência especiais. Todas as crianças nascidas dentro ou fora do matrimônio, gozarão da mesma proteção social.”

Portanto, quando ocorrer a violação de direitos e garantias deve-se buscar todos os ramos de direito que objetivem a proteção da pessoa e atingir a tutela jurisdicional. Nesse entendimento, os Tratados têm a função de salvaguardar o direito do ser humano e não a prerrogativa do Estado.

Desta forma, quando falamos no direito internacional, muitas vezes pensamos em casos como de extradição de presos políticos direitos e garantias dos estrangeiros, mas por muitas vezes esquecemos de nos socorrer do direito internacional aos tratados e convenções dos quais o Brasil é signatário para garantir o direito, quando todas as vias já foram esgotadas e por muitas vezes a garantia da tutela se encontra amparada juridicamente por tal direito, muitas vezes esquecido.

Em primeiro lugar, é necessário diferenciar o que são tratados e convenções e como podem ser aplicados ao direito previdenciário.

TRATADO. A expressão Tratado foi escolhida pela Convenção de Viena sobre o Direito dos Tratados de 1969, como termo para designar, genericamente, um acordo internacional. Denomina-se tratado o ato bilateral ou multilateral ao qual se deseja atribuir especial relevância política. Nessa categoria se destacam, por exemplo, os tratados de paz e amizade, o Tratado da Bacia do Prata, o Tratado de Cooperação Amazônica, o Tratado de Assunção, que criou o Mercosul, o Tratado de Proibição Completa dos Testes Nucleares.

CONVENÇÃO. Num nível similar de formalidade, costuma ser empregado o termo Convenção para designar atos multilaterais, oriundos de conferências internacionais e que versem assunto de interesse geral, como por exemplo, as convenções de Viena sobre relações diplomáticas, relações consulares e direito dos tratados; as convenções sobre aviação civil, sobre segurança no mar, sobre questões trabalhistas. É um tipo de instrumento internacional destinado em geral a estabelecer normas para o comportamento dos Estados em uma gama cada vez mais ampla de setores. No entanto, existem algumas, poucas é verdade, Convenções bilaterais, como a Convenção destinada a evitar a dupla tributação e prevenir a evasão fiscal celebrada com a Argentina (1980) e a Convenção sobre Assistência Judiciária Gratuita celebrada com a Bélgica (1955). http://dai-mre.serpro.gov.br/apresentacao/tipos-de-atos-internacionais/

Ademais, quando falamos em Direito Internacional surge a emblemática teoria monista que acreditam que tanto o direito internacional quanto o direito interno de cada país fazem parte do mesmo sistema jurídico, ou seja o direito interno encontra seu limite nas normas internacionais.

Já para a teoria dualista, os ordenamentos interno e externo são distintos e a sua aplicação se dá caso seja recepcionada a referida norma, ou seja, desde que não ocorra o conflito de normas; e caso o Estado descumpra ordem internacional, sua responsabilização poderia ser apenas internacional.

A Constituição Federal não se manifestou sobre qual teoria é adotada. O seu artigo 5º apenas afirma que:

“§ 2º Os direitos e garantias expressos nesta Constituição não excluem outros decorrentes do regime e dos princípios por ela adotados, ou dos tratados internacionais em que a República Federativa do Brasil seja parte.

§ 3º Os tratados e convenções internacionais sobre direitos humanos que forem aprovados, em cada Casa do Congresso Nacional, em dois turnos, por três quintos dos votos dos respectivos membros, serão equivalentes às emendas constitucionais.  (Atos aprovados na forma deste parágrafo).”

Ou seja, uma vez aprovados os tratados e convenções se incorporam ao ordenamento jurídico do Estado, estando assim acima das leis ordinárias, sendo certo que em caso de possível conflito entre a Constituição Federal e o tratado prevalecerão as normas constitucionais.

Quando falamos de tratado sobre direitos humanos, este não depende do reconhecimento constitucional. Está acima de qualquer ordenamento jurídico interno, não perdendo sua aplicação e eficácia jurídica.

Em 1945, no México, vinte países se reuniram com o objetivo de elaborar os Direitos do Homem. Por sua vez, foi aprovada em 1948 a Declaração Universal dos Direitos Humanos, com o objetivo de proteger direitos fundamentais dos indivíduos, já que a sociedade vivia sem um ordenamento comum que fosse capaz de proteger e garantir o reconhecimento de igualdade e liberdade do homem.

A nossa Constituição Federal de 1988 trouxe os princípios fundamentais, como os fundamentos da República do Brasil no artigo 1º, a separação dos poderes no artigo 2º, os objetivos fundamentais no artigo 3º e os princípios que regulam e regem as relações internacionais no artigo 4º.

Portanto, quando falamos em princípios nada mais é que o alicerce de cada país e Estado membro, devendo assim ser cumprido de forma a garantir a proteção de todo o cidadão que é regido por este Estado.

E um dos princípios expressos na Constituição é o da dignidade da pessoa humana, em seu artigo 1º, inciso III:

“Art. 1º A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos:

I – a soberania;

II – a cidadania;

III – a dignidade da pessoa humana;

IV – os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa;

V – o pluralismo político.”

Ainda tratando de Constituição Federal, esta dispõe no artigo 3º os objetivos da República Federativa do Brasil, entre eles construir uma sociedade livre e justa, e no artigo 4º, além de trazer a independência nacional, esta em seu inciso II a prevalência dos direitos humanos.

Portanto, não há como se falar em proteção sem antes recorrer à nossa Carta Magna, que é expressa justamente quanto a esses princípios e objetivos que são vezes muitas vezes esquecido pelas leis infraconstitucionais.

Mesmo com a soberania do Estado diante do povo ao qual é regido, quando houver conflito a tendência é o princípio internacional "pro homine", prevalecendo as normas que mais protejam os direitos humanos.

2. A SEGURIDADE SOCIAL NA CONSTITUIÇÃO FEDERAL

A seguridade social é um sistema de ampla proteção social, que visa amparar as essenciais necessidades da sociedade como um todo, de forma a assegurar um mínimo essencial para preservação da vida.

A seguridade é composta por três elementos: Previdência, Assistência Social e Saúde, que são esforços governamentais para promover o desenvolvimento através de medidas que consigam proteger a sociedade como um todo, chamados de direitos de segunda geração, e são direitos positivos que exigem a atuação do Estado.

O artigo 194 da Constituição Federal traz princípios constitucionais, que nada mais são que diretrizes básicas pelas quais a seguridade social deve se orientar de modo a proteger a população de que dela necessita:

“Art. 194. A seguridade social compreende um conjunto integrado de ações de iniciativa dos Poderes Públicos e da sociedade, destinadas a assegurar os direitos relativos à saúde, à previdência e à assistência social. Parágrafo único. Compete ao Poder Público, nos termos da lei, organizar a seguridade social, com base nos seguintes objetivos:

I – universalidade da cobertura e do atendimento;

II – uniformidade e equivalência dos benefícios e serviços às populações urbanas e rurais;

III – seletividade e distributividade na prestação dos benefícios e serviços;

IV – irredutibilidade do valor dos benefícios;

V – eqüidade na forma de participação no custeio;

VI – diversidade da base de financiamento;

VII – caráter democrático e descentralizado da administração, mediante gestão quadripartite, com participação dos trabalhadores, dos empregadores, dos aposentados e do Governo nos órgãos colegiados.”

Desta forma, quando tratamos do princípio da universalidade de cobertura de atendimento quer dizer que todos os cidadãos são amparados pelo sistema de seguridade social independentemente de contribuição.

Portanto, a universalidade de cobertura de atendimento é o amparo pelo Estado a todos que se apresentam em estado de vulnerabilidade e necessidade.

A uniformidade e equivalência dos benefícios as populações urbanas ou rurais foi dirimindo, assim, qualquer dúvida entre os trabalhadores, dando tratamento igual de proteção, sendo inconcebível qualquer distinção entre os mesmos em decorrência da função ou da atividade exercida.

Nesse sentido Thais Maria Riedel de Resende Zuba afirma:

“Esse princípio busca resgatar uma dívida do Estado brasileiro com as populações rurais que ficaram á margem de proteção trabalhista e previdenciária por muitos anos. Isso porque apenas com a Lei n.4214, de 1963, foi criada uma lei protetora aos rurais, com o Estatuto do Trabalhador Rural, garantindo direitos trabalhistas e criando o Fundo de Assistência e Previdência do trabalhador Rural”. (O Direito Previdenciário e o princípio da Vedação do Retrocesso pg,72).

Quando falamos em seletividade e distributividade na prestação dos benefícios e serviços devemos lembrar que as necessidades são sempre maiores que a capacidade do Estado de supri-las, principalmente quando falamos em um país em desenvolvimento como o Brasil. Desta forma, essa seletividade é uma forma do Estado intervir em situações que merecem a proteção da população com o mínimo de dignidade.

Princípio da irredutibilidade dos benefícios, ou seja, não pode o Governo de forma arbitrária reduzir os benefícios previdenciários sob a alegação de crise econômica desta forma. Conforme o artigo 201, § 4º da Constituição Federal determinar o reajustamento dos benefícios para preservar-lhes o caráter permanente, a Lei 8213/91 estipula a aplicação do INPC, o que tem gerado uma diminuição dos benefícios e uma sensação de prejuízo aos beneficiários.

A equidade na participação do custeio, prevista no artigo 195, §9º da Constituição Federal, traduz que toda a sociedade deve participar do financiamento da seguridade social conforme a capacidade contributiva de cada um.

Princípio da diversidade da base de financiamento significa que toda a sociedade é chamada a contribuir com a seguridade social, de forma que se houvesse uma única forma de participação de custeio a seguridade social não atingiria o objetivo comum. Nesse mesmo entendimento o artigo 195 caput da Constituição Federal dispõe que a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios participam da contribuição previdenciária.

“Art. 196. A saúde é direito de todos e dever do Estado, garantido mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença e de outros agravos e ao acesso universal e igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação”.

A saúde, mencionada no artigo 196 da Constituição Federal, é direito de todos e dever do Estado. O texto constitucional é claro ao mostrar que, independentemente de ter a pessoa condições para pagamento de tratamentos, o Estado deve promover o atendimento igualitário a todos os cidadãos que dele necessitam. De acordo com a Organização Mundial da Saúde – OMS a saúde é “um estado completo de bem-estar físico, mental e social e não somente ausência de afecções e enfermidades”.

Se para a Constituição é direito de todos e dever do Estado, para a OMS, que é uma agência mundial subordinada à Organização das Nações Unidas – ONU, tem como objetivo a conservação e o restabelecimento da saúde.

“Art. 203. A assistência social será prestada a quem dela necessitar, independentemente de contribuição à seguridade social, e tem por objetivos:

I – a proteção à família, à maternidade, à infância, à adolescência e à velhice;

II – o amparo às crianças e adolescentes carentes;

III – a promoção da integração ao mercado de trabalho;

IV – a habilitação e reabilitação das pessoas portadoras de deficiência e a promoção de sua integração à vida comunitária;

V – a garantia de um salário mínimo de benefício mensal à pessoa portadora de deficiência e ao idoso que comprovem não possuir meios de prover à própria manutenção ou de tê-la provida por sua família, conforme dispuser a lei.”

A assistência social, prevista nos artigos 203 e 204 da Carta Magna, se compreende como um dos três princípios da seguridade social, que tem por objetivo a atuação do Estado nos casos em que a família não consegue prover assistência a seus próprios membros. No artigo 1º da Lei nº 8.742/1993, conhecida como Lei Orgânica da Assistência Social – LOAS, é compreendida nos seguintes termos: “direito do cidadão e dever do Estado, é politica de Seguridade Social não contributiva que provê os mínimos sociais”.

Sendo assim, àquele que não tem condições financeiras de manter sua subsistência e nem de tê-la mantida pela sua família o Estado concede pequenos benefícios, independente de ter o que dele necessite contribuído.

Quando tratamos de Previdência Social, esta tem previsão nos artigo 201 da Constituição Federal, sendo certo que o artigo 202 trata da Previdência Complementar.

“Art. 201. A previdência social será organizada sob a forma de regime geral, de caráter contributivo e de filiação obrigatória, observados critérios que preservem o equilíbrio financeiro e atuarial, e atenderá, nos termos da lei, a: 

I – cobertura dos eventos de doença, invalidez, morte e idade avançada; 

II – proteção à maternidade, especialmente à gestante;

III – proteção ao trabalhador em situação de desemprego involuntário; 

IV – salário-família e auxílio-reclusão para os dependentes dos segurados de baixa renda;

V – pensão por morte do segurado, homem ou mulher, ao cônjuge ou companheiro e dependentes, observado o disposto no § 2º”.

Desta forma, a Previdência Social é estabelecida na Lei Maior tendo caráter contributivo e compulsório administrado pelo Instituto Nacional de Seguro Social – INSS e pela Receita Federal do Brasil, com o objetivo de proteger seus segurados nas situações de necessidade conforme elencado na constituição federal.

Essa proteção abrange obrigatoriamente todos aqueles que exercem uma atividade remunerada, exceto o funcionário público que participe do Regime Próprio de Previdência. Desta forma, o artigo 201 da Constituição Federal demostra de forma detalhada quais as situações que a Previdência Social ampara, de forma a ser um rol mínimo dos riscos sociais protegidos que poderá ser expandido.

4. TEMAS DE DIREITO INTERNACIONAL

Depois de tratarmos da Seguridade Social e alguns dos seus elementos de Saúde, Assistência e Previdência, vamos tratar da condição da criança no ramo do direito internacional e previdenciário.

A Convenção dos Direitos da Criança é um tratado que visa a proteção de crianças e adolescentes de todo o mundo. Foi aprovada pela Organização das Nações Unidas em 20 de novembro de 1989 com o seguinte texto:

“A Assembleia Geral das Nações Unidas adotou a Convenção sobre os Direitos da Criança – Carta Magna para as crianças de todo o mundo – em 20 de novembro de 1989, e, no ano seguinte, o documento foi oficializado como lei internacional. A Convenção sobre os Direitos da Criança é o instrumento de direitos humanos mais aceito na história universal. Foi ratificado por 196 países. Somente os Estados Unidos não ratificaram a Convenção, mas sinalizaram sua intenção de ratificar a Convenção ao assinar formalmente o documento” (https://www.unicef.org/brazil/pt/resources_10120.htm).

No Brasil ela foi aprovada por meio do Decreto Legislativo 99.710 em 21 de novembro de 1990. Além da proteção à criança e adolescente, entre os princípios gerais estão o direito à vida, à liberdade e a participação dos pais, do Estado e da sociedade para tornar efetiva a proteção da criança e do adolescente.

No seu artigo 26 estão dispostas as seguintes diretrizes:

“1. Os Estados Partes reconhecerão a todas as crianças o direito de usufruir da previdência social, inclusive do seguro social, e adotarão as medidas necessárias para lograr a plena consecução desse direito, em conformidade com sua legislação nacional. 2. Os benefícios deverão ser concedidos, quando pertinentes, levando-se em consideração os recursos e a situação da criança e das pessoas responsáveis pelo seu sustento, bem como qualquer outra consideração cabível no caso de uma solicitação de benefícios feita pela criança ou em seu nome.”

A Lei 8213/91 traz no seu artigo 16 o rol de dependentes do segurado falecido:

“Art. 16. São beneficiários do Regime Geral de Previdência Social, na condição de dependentes do segurado:

I – o cônjuge, a companheira, o companheiro e o filho não emancipado, de qualquer condição, menor de 21 (vinte e um) anos ou inválido ou que tenha deficiência intelectual ou mental ou deficiência grave; (Redação dada pela Lei nº 13.146, de 2015)   (Vigência)

II – os pais;  

III – o irmão não emancipado, de qualquer condição, menor de 21 (vinte e um) anos ou inválido ou que tenha deficiência intelectual ou mental ou deficiência grave;(Redação dada pela Lei nº 13.146, de 2015) (Vigência)

§ 1º A existência de dependente de qualquer das classes deste artigo exclui do direito às prestações os das classes seguintes.

§ 2º .O enteado e o menor tutelado equiparam-se a filho mediante declaração do segurado e desde que comprovada a dependência econômica na forma estabelecida no Regulamento. (Redação dada pela Lei nº 9.528, de 1997)

§ 3º Considera-se companheira ou companheiro a pessoa que, sem ser casada, mantém união estável com o segurado ou com a segurada, de acordo com o § 3º do art. 226 da Constituição Federal.

§ 4º A dependência econômica das pessoas indicadas no inciso I é presumida e a das demais deve ser comprovada”.

Devemos notar que ocorreu uma alteração no parágrafo 2º: a equiparação a filho do menor que estiver sob guarda judicial ou tutela, para fins de concessão do benefício. Por meio da Medida Provisória 1523, de outubro de 1996, foi retirado o menor sob guarda judicial e passou-se a exigir a dependência econômica para os que estivessem sob tutela.

Muitos defendem que a retirada dos menores que estão sob guarda judicial é inconstitucional, haja visto que a Constituição Federal no seu artigo 227 traz ampla proteção a criança e o adolescente conforme expresso:

“Art. 227. É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança, ao adolescente e ao jovem, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão. 

§ 3º O direito a proteção especial abrangerá os seguintes aspectos:

I – idade mínima de quatorze anos para admissão ao trabalho, observado o disposto no art. 7º, XXXIII;

II – garantia de direitos previdenciários e trabalhistas;”

No mesmo entendimento, a Lei 8.069, de 13 de julho de 1990, popularmente conhecida como ECA – Estatuto da Criança e Adolescente, no seu artigo 33 registra que a guarda obriga a prestação de assistência à criança, tanto material quanto moral e educacional. Ainda confere ao detentor direito a opor-se aos pais ou a terceiros, ou seja, tendo a criança a necessidade de ser suprida em qualquer situação.

Ademais, o artigo 3º da mesma lei é expresso quanto às questões previdenciárias: “§ 3º A guarda confere à criança ou adolescente a condição de dependente, para todos os fins e efeitos de direito, inclusive previdenciários”.

Assim, a questão tem sido polêmica em alguns casos; de um lado um tratado, a Constituição Federal, o Estatuto da Criança e do Adolescente, e de outro a retirada da Lei 8213/91 dos direitos previdenciários do menor sob guarda.

Muitos defendem a tese de ser inconstitucional a retirada do menor sob guarda da proteção previdenciária, enquanto outros defendem que a lei tem se esguardado contra possíveis fraudes, já que muitos têm se valido da condição de ter menor sob sua guarda para pleitear benefícios previdenciários indevidamente.

O STF, em decisão recente por meio do Mandado de Segurança MS 26144, entendeu por manter o pagamento de verbas previdenciárias a menor que estava sob a guarda de seu avô, funcionário público, até completar 21 anos de idade.

“MS 26144 AgR / DF – DISTRITO FEDERAL
AG.REG. EM MANDADO DE SEGURANÇA
Relator(a): Min. TEORI ZAVASCKI
Julgamento: 10/05/2016      Órgão Julgador: Segunda TurmaEmenta: ADMINISTRATIVO E PREVIDENCIÁRIO. AGRAVO REGIMENTAL EM MANDADO DE SEGURANÇA. PENSÃO POR MORTE. MENOR SOB GUARDA. DEPENDÊNCIA ECONÔMICA DEVIDAMENTE COMPROVADA. ART. 217, II, “B”, DA LEI 8.112/90, EM SUA REDAÇÃO ORIGINAL. NÃO DERROGAÇÃO PELO ART. 5º DA LEI 9.717/98. PRECEDENTES. AGRAVO REGIMENTAL A QUE SE NEGA PROVIMENTO.”

Ainda que sua mãe morasse na mesma residência, ficou comprovado que havia a dependência econômica, por isso a menor faria jus a pensão por morte, afastando assim o que dispõe a Lei 9717 de 1998, em seu artigo 5º, que veda a concessão de benefícios previdenciários distintos dos previstos no Regime Geral da Previdência Social, e mantendo o entendimento da proteção da adolescente, conforme preceitua a Constituição Federal e o Estatuto da Criança e do Adolescente.

Por outro lado, o Superior Tribunal de Jutiça – STJ entende que a data do óbito, ou seja, o evento morte determina a legislação aplicável, como se vê no seguinte julgado:

“STJ. PENSÃO POR MORTE. MENOR SOB GUARDA. BENEFICIÁRIO. EQUIPARAÇÃO. LEGISLAÇÃO APLICÁVEL. LEI VIGENTE À ÉPOCA DO ÓBITO. MED. PROV. 1.523/96. A pensão por morte a ser paga ao menor sob guarda deve observar a lei em vigor na data do óbito do segurado, pois esse é o fato gerador para a concessão do benefício previdenciário: se o falecimento ocorreu antes da edição da Medida Provisória 1.523, de 11/10/96, o recebimento está assegurado; se a morte ocorreu depois, o menor não tem direito ao benefício. A conclusão é da 05ª Turma do STJ, que definiu também que o menor sob guarda não pode mais ser equiparado ao filho de segurado para fins de dependência. De acordo com o voto do relator, Min. Gilson Dipp, o reconhecimento do direito à pensão por morte não é mais possível após as alterações promovidas pela Med.Prov. 1.523/96, reeditada até sua conversão na Lei 9.528, em 10/12/1997.” (Boletim Informativo nº.180/181 do IBDP, de 01/12/2011)

5.CONCLUSÃO

O entendimento majoritário é pela aplicação da proteção dos direitos previstos nas normas constitucionais, que por vezes tem sido levados a serem suprimidos pelas normas de direito previdenciário, que restringem por vez ou outra direitos já pacificados internacionalmente e constitucionalmente.

A Constituição Federal de 1988, onde se iniciou um Estado Democrático de Direito, foi criada com princípios que buscam uma sociedade igualitária voltada para a eliminação de desigualdades. Contudo,o que estamos presenciando no atual momento é a supressão de alguns direitos sob a ótica de enxugar gastos da administração pública.

Quando fazemos um estudo dos ramos do direito e pensamos nele individualmente, somos levados a pensar que são ramos distintos e autônomos, mas conforme a sociedade vem passando por transformações observamos que não é bem assim que se funciona o direito. O direito existe para socorrer situações que necessitam de proteção como no caso analisado, onde tratamos os direitos das crianças e adolescentes que estão sob guarda.

O direito internacional surgiu em meio a uma grande guerra mundial e também nasceu para resguardar aqueles que sequer têm condições de se protegerem sozinhos, que são as crianças e os adolescentes.

O sistema da seguridade nacional (INSS) tem por caráter contribuição e retribuição, porém, por vezes quando o segurado necessita da sua retribuição é surpreendido por novo ordenamento jurídico ou medidas provisórias mudando toda a sua expectativa de direito.

Quando pensamos em princípios constitucionais expressos e objetivos da República Federativa do Brasil acreditamos que serão considerados inválidos quaisquer atos que revoguem essa norma e, caso ocorra uma revogação, esta deve estar acompanhada de uma norma ou projeto político que substitua se equivale a um direito.

Ao tratarmos aqui da questão da proteção do direito social, do seu surgimento mais remoto até o mais recente, pensamos em proteção e proteção significa a não supressão de direitos já adquiridos.

No caso da proteção à criança e ao adolescente podemos observar que a Lei 8213/91, em seu artigo 16, §2º, alterou os beneficiários da Previdência Social, retirando os menores que estão sob guarda. E essa mudança foi sentida aos poucos pela população como toda regra previdenciária existente.

Quando falamos em proteção de crianças e adolescentes muitos têm a visão dos menores infratores e não conseguem enxergar a mudança social pela qual a sociedade passa com o decorrer dos tempos, tanto na família como na sociedade.

Toda norma parece sem importância quando essa não nos atinge e, por muitas vezes, somos levados a pensar que não há nenhum risco social, sendo que o que ocorre a nossa volta é a situação de crianças que normalmente são criadas por outras pessoas que não seus pais devido ao risco social em que se encontram.

Muitos grupos de direitos humanos se preocupam mais com o torturado do que com uma criança que não tem onde estudar, e hoje presenciamos a legislação protegendo de modo insuficiente, não sendo efetiva a proteção previdenciária.

O atual governo se vê diante de uma crise e o primeiro alvo são os direitos sociais e a classe mais fraca, ou seja, a população de modo geral.

Os direitos sociais, portanto, são direitos de conquistas e o que vemos é uma retirada ou outra de direitos e garantias ocorrendo um retrocesso previdenciário.


Informações Sobre os Autores

Eliana Cristina de Castro Silva

Advogada Pós-Graduada em Direito Penal e Processo Penal pela EPD- Escola Paulista de Direito Pós-Graduanda em Direito Previdenciário pela Faculdade Legale

Carlos Alberto Vieira de Gouveia

Carlos Alberto Vieira de Gouveia é Mestre em Ciências Ambientais e Doutorando em Ciências Jurídicas e Sociais; Vice-Presidente para a área Previdenciária da Comissão Direitos e Prerrogativas e Presidente da Comissão de Direito Previdenciário ambas da OAB-SP Coordenador do curso de pós-graduação em Direito Previdenciário da Faculdade Legale


Equipe Âmbito Jurídico

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