A era digital introduziu várias
mudanças em nosso cotidiano. Hoje praticamente todas as operações comerciais
tradicionalmente realizadas no meio físico, se encontram “clonadas”
na plataforma eletrônica.
Nesta, porém, se apresentam e se operam
de forma distinta, respeitando as características específicas do instrumento
tecnológico.
Não foram, portanto, as relações
comerciais que se transformaram, mas apenas a forma de apresentação dessas. Os
negócios realizados pela atividade empresarial encontram no mercado eletrônico novas aplicações, podendo se realizar sem a
presença física dos contraentes, onde documentos não são mais exclusivamente
produzidos no suporte físico do papel, como também podem ser assinados e
arquivados digitalmente .
A tendência mundial sinaliza para a auto regulamentação da Internet, sendo certo que somente a
tecnologia conseguirá adequar a fórmula negócios versus segurança, considerada
esta a palavra chave para as operações realizadas através do ambiente virtual.
A rápida evolução do comércio
eletrônico que alavancou a economia digital e que
depende de transações eletrônicas seguras, veio exigir a adoção de tecnologias
de segurança, como única forma de se garantir a eficácia jurídica dos
documentos produzidos por meio eletrônico.
Para que os contratos realizados pelo meio digital, gozem das mesma proteção
daqueles realizados no meio físico, é indispensável à adoção da Certificação
Digital .
Essa tecnologia de segurança permite a
verificação da identidade das partes, a confirmação da integridade do conteúdo
do documento bem como a autenticação da assinatura, através da criptografia assimétrica .
A crescente demanda negocial
gerada pelo desenvolvimento do comércio eletrônico, obrigou os Estados a editar
farta legislação internacional sobre assinatura e certificação digital.
Pela Constituição Federal em vigor, os
serviços notariais são exercidos por delegação do Poder Público, cabendo ao
Tabelião de Notas a exclusividade para proceder ao reconhecimento de firmas .
Tendo em vista que a assinatura
eletrônica não carrega em seu bojo as mesmas características daquela realizada
no meio convencional, funciona o certificado digital como uma
cédula de identidade garantidora da identificação do usuário. Não se vislumbra,
pois, qualquer inconstitucionalidade de atribuições no surgimento da atividade
desenvolvida pelas Entidades Certificadoras, uma vez que se encontram adstritas
às relações desenvolvidas no ambiente digital. A nova figura da entidade
privada de certificação, tem sua atuação limitada ao
meio, permanecendo, portanto, os Tabeliães responsáveis pela
autenticidade pública.
A legislação internacional contempla
amplamente a assinatura digital reconhecida por Autoridade Certificadora. O
exercício da atividade é livre, como forma de estimular a concorrência privada,
não sendo obrigatório o uso específico de determinada tecnologia. A única
exigência reside na imparcialidade, neutralidade e confiança da empresa, posto
que a finalidade da prestação do serviço é garantir
segurança e autenticidade aos documentos .
O Projeto de Lei nº
1.589/99 em trâmite no Congresso Nacional, que dispõe sobre o comércio
eletrônico, a validade e o valor jurídico dos documentos eletrônicos bem como a
assinatura digital, adotou alguns dispositivos previstos na Lei Modelo da
UNCITRAL – Comissão das Nações Unidas para o Direito Comercial Internacional.
O texto legal, porém, adotou infeliz
distinção entre os tipos de certificação, considerando que são de caráter
comercial as certidões eletrônicas emitidas por entidades privadas e de caráter
público, aquelas desenvolvidas por tabeliães.
O impróprio dispositivo preceitua que a
atividade de certificação de chave pública realizada por particulares não gera
presunção de autenticidade perante terceiros, considerando que os serviços
prestados pela certificadora privada são de caráter essencialmente privados,
não se podendo confundir seus efeitos com a atividade de certificação
eletrônica por tabelião.
Ao estabelecer que somente a
certificação da autenticidade pública realizada pelo tabelião faz presumir a
autenticidade da assinatura e do documento eletrônico, praticamente invalida a
atividade de certificação desenvolvida por entidades particulares.
Nova incoerência se constata no
anteprojeto, ao preconizar que as certificações estrangeiras somente serão
consideradas eficazes no caso de estarem as empresas
sediadas e reconhecidas em país signatário de acordos internacionais em que o
Brasil seja parte.
Parece que nosso País está
irremediavelmente preso e condenado ao modelo ancestral de monopólio do Poder
Público, em detrimento da iniciativa privada, que, como sabido, sempre prestou melhores e mais ágeis serviços.
Melhor faria ao mercado se a atividade
fosse desempenhada segundos os critérios da livre
concorrência, concedendo aos certificados emitidos pelas empresas particulares,
validade jurídica idêntica àqueles concedidos por Tabelião.
Espera-se que tal dicotomia seja
extirpada do texto legal, pois em recente pronunciamento, o relator do Projeto
deixou claro que não pretende permitir a criação de reserva de mercado
existente no meio físico, onde somente Cartórios podem autenticar documentos.
No ponto de vista do Relator, qualquer empresa que atenda aos pré-requisitos da
legislação poderá oferecer os serviços à sociedade, sejam estas públicas ou
privadas.
Por outro lado, pretende conceder o
mesmo tratamento jurídico dos documentos físicos àqueles emitidos por meio
eletrônico, como forma de validar as transações comerciais realizadas na Rede.
O dispositivo legal não deverá conter
qualquer restrição à tecnologia a ser utilizada para a Certificação, a fim de
que a legislação consiga acompanhar o desenvolvimento tecnológico, além de
escapar da tendência monopolista de algumas empresas.
Levando-se em consideração que a
ausência de normas legais no Brasil é o maior empecilho ao crescimento do
comércio eletrônico no País, ainda resta a esperança do aprimoramento do texto
legal, posto que somente a abrangência de certificadoras digitais permitirá o avanço do comércio eletrônico bem como a solução
de e-problemas.
Advogada Coordenadora da Área Internet do Escritório
José de Castro Ferreira, Décio Freire & Associados Advocacia
Presidente da Comissão de Comunicação e Informática do Instituto dos Advogados Brasileiros – IAB
Membro da Associação Brasileira de Direito de Informática e Telecomunicações
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