Resumo: O instituto da Adoção Internacional realizado por estrangeiros no Brasil será analisado sob o aspecto social e legal, tema de suma importância para a sociedade contemporânea, passando pelas mudanças do instituo no cenário nacional e seu desenvolvimento internacional. Diante disso, a proteção das crianças e adolescentes no âmbito do direito internacional, tais como a proteção contra a apátrida e a atuação das autoridades centrais e organismos credenciados nos procedimentos para a adoção. O papel das Comissões Estaduais Judiciárias de Adoção (CEJA/CEJAI), que atuam como órgão auxiliador por parte daqueles estrangeiros que buscam adotar crianças brasileiras, tratando das questões quanto à nacionalidade da criança adotada.
Palavras Chave: Adoção Internacional. Estatuto da Criança e do Adolescente(ECA).Adotante estrangeiro.
Abstract: The Institute of International Adoption held by foreigners in Brazil is analyzed under the social and legal issues of paramount importance to contemporary society, going through the changes in the national institute and its international development. With this addition, the protection of children and adolescents under international law, such as protection against the stateless and the performance of the central authorities and bodies accredited in the procedures for adoption. The Role of State Commissions of Judicial Adoption (CEJA / CEJAI), which act as auxiliary bodies by those foreigners seeking to adopt children in Brazil, addressing the issues regarding the nationality of the adopted child.
Keywords: International Adoption. Status of Children and Adolescents (ECA). The foreign adopter.
Sumário: 1.Introdução. 2. O Instituto Da Adoção 2.1 Origem Da Adoção No Mundo. 2.2 Instituto Da Adoção No Brasil. 2.3 A Adoção Internacional no Brasil. 2.3.1 Conceito de adoção internacional. 3. Os Efeitos da Adoção Internacional. 3.1 A Nacionalidade. 3.2 Nacionalidade No Brasil. 4. Conclusão. Referências.
1. Introdução[1]
A palavra adoção vem do latim “adoptio” e significa tomar alguém como filho. Nos dicionários, em geral, tem o conceito de “Ato jurídico pelo qual se estabelece relação legal de filiação” segundo o Dicionário Aurélio da Língua Portuguesa¹. A adoção, na concepção de Pontes de Miranda é “o ato solene pelo qual se cria entre o adotante e o adotado relação fictícia de paternidade e filiação” [2]².
O conceito de adoção começou a ter maior aplicabilidade a partir da criação do Estatuto da Criança e do Adolescente em 1990, realizado para proteger os interesses da criança e do adolescente diante das diversas situações de risco em que a criança se encontrava na sociedade, como o abandono e os maus tratos. Porém, diante da tarefa árdua, e muitas vezes quase impossível de resolver a questão menoril através da adoção nacional, surge a figura da adoção internacional como mais uma opção de família substituta. Este instituto vem se tornando uma fonte de esperança para todos, na medida que se torna uma alternativa para que o Estado brasileiro diminua os contingentes de crianças marginalizadas, apesar de não conseguir amparar todas elas. A conseqüência disto é o abandono nas ruas ou em instituições para menores, os antigos abrigos mantidos pelo poder público.
A institucionalização que afeta a maioria das crianças, no Brasil e na América Latina, não tem como motivo principal o abandono, a violência, a negligência ou a rejeição por parte dos pais, mas, na maioria dos casos, as precárias condições de vida que conduzem à desestruturação de milhões de famílias brasileiras. Estas são integrantes dos chamados núcleos de pobreza, que sobrevivem, muitas vezes, abaixo da linha da pobreza; conseqüência terrível da má distribuição de renda presente no Brasil. Quanto mais perversa a distribuição da riqueza em um país, maior o número de famílias desestruturadas e de crianças sem futuro sólido e, quanto maior a redução dos níveis de emprego, maiores também as taxas de pobreza e indigência. Assim, as maiores prejudicadas com esta situação, quase sempre, são aquelas que deveriam ser o futuro do país: as crianças.
A adoção internacional, contudo, mesmo não sendo suficientes para todas as crianças, se torna alternativa válida, colocando o menor sob o amparo de uma família estrangeira na falta de uma família brasileira, que serve para evitar a miséria e garantir o convívio familiar fraternal, com amor e solidariedade. O ECA³ em seu art. 31 estabelece a excepcionalidade da adoção em respeito ao Princípio da Primazia do Vínculo Familiar, ou seja, o lugar da criança é junto com sua família de origem, a princípio. Nesse sentido, a adoção é uma exceção e, a exceção da exceção é a adoção internacional, já que os brasileiros têm prioridade de adoção face aos adotantes estrangeiros, prioridade que visa manter a criança em família brasileira.
Crianças brasileiras que precisam de pais que as acolham e amem, somando estas a casais estrangeiros em busca de filhos que não podem gerar. Quando essas duas realidades se cruzam nasce o instituto da adoção internacional, e, com o tempo, novas famílias – e uma esperança para meninos e meninas que tinham perdido a capacidade de sonhar, reencontrando esta através do amor familiar, sentimento universal. A adoção internacional, portanto é mecanismo válido para evitar que crianças tenham que passar pela fome, miséria, abandono entre outros males oriundos de países subdesenvolvidos, onde reina a desigualdade social, como no Brasil. É necessário, segundo critérios legais, portanto, a recondução de crianças a famílias que a cuidem, com o apoio das autoridades brasileiras em busca de seus direitos fundamentais.
A adoção de crianças brasileiras feita por pais estrangeiros poderá ser efetivada com um pedido perante uma comissão especial local no Brasil, que analisará a possibilidade de colocação do menor em lar estrangeiro, depois de não ser possível uma adoção nacional, pois esta tem prioridade, de acordo com a Lei 12.010/2009, novo dispositivo sobre adoção no ordenamento jurídico nacional. A adoção nacional e internacional está contemplada nos arts. 1618 e 1619 do Código Civil Brasileiro de 2002, no livro de Família, que teve seus arts 1.620 a 1.629 revogados pela nova lei de adoção.
A colocação em família substituta estrangeira, através do instituto da adoção tem levantado divergências no que diz respeito aos seus efeitos no âmbito internacional, principalmente quanto aos direitos fundamentais da pessoa humana, como a nacionalidade e a cidadania do ser brasileiro adotado.[3]
Os direitos individuais fundamentais ao ser humano, hoje são indispensáveis para o seu convívio na sociedade e sob a vigilância do Estado, sujeita a normas específicas de cada país, com sistemas rígidos e quase imutáveis; assim, as partes envolvidas na adoção internacional estão subordinadas a diferentes soberanias e, por conseguinte, a diferentes sistemas jurídicos.
Para dirimir as dificuldades decorrentes do conflito de sistemas jurídicos, foi adotada pela Conferência da Haia, em 1993, a Convenção Relativa à Proteção das Crianças e à Cooperação em Matéria de Adoção Internacional, a qual conseguiu em boa parte uniformizar os procedimentos específicos da adoção internacional nos países envolvidos. No Brasil o tema está regulado pela Constituição Federal de 1988, pelo Estatuto da Criança e do Adolescente, de 1990, e pelo Decreto n° 3.087, de 1999, que promulgou a Convenção da Haia sobre adoção, ficando presente o pluralismo de fontes, mas evidenciando-se o diálogo entre todas. Dessa maneira, verifica-se que o Estatuto da Criança e do Adolescente está em harmonia com a Convenção da Haia no tocante às normas que regem a adoção internacional, evitando uma discrepância entre as normas que podem incidir sobre a adoção internacional.
Diante do direito internacional inerente a todas as crianças e adolescentes brasileiros sujeitos a adoção internacional em seu país, pergunta-se: Quais os efeitos da adoção internacional na criança brasileira adotada por casal estrangeiro?
A questão se torna discutível dentro dos direitos fundamentais inerentes às pessoas que se sujeitam ao Estado; direito que deve ser preservado não só para o adulto, mas também para a criança e adolescente envolvidas na adoção, que também são sujeitos de direito e merecem pertencer a uma nação, jurídico e politicamente. É importante destacar que os direitos fundamentais são indestrutíveis, indisponíveis, inalienáveis, por serem direitos exclusivos da personalidade, como a nacionalidade e a cidadania que nascem junto com a vida do individuo, e estabelecem os deveres de uma pessoa para com o seu Estado. Assim, o Estado estabelece suas leis, devendo a doutrina e jurisprudência interpretá-las e aplicá-las com justiça, de forma independente e autônoma principalmente na adoção internacional, instituto presente no Brasil e regido pelo Estado Brasileiro; que diminuirá o estado de pobreza e miséria de milhões de órfãos e crianças abandonadas.
2. O Instituto Da Adoção
2.1 Origem Da Adoção No Mundo
É necessário conhecer o significado do termo “família” à época, para compreender o fenômeno da adoção internacional. Para melhor compreensão da adoção internacional, é necessário buscar no passado a origem da adoção, que se deu junto ao Direito Romano. O povo hebraico caracterizava uma espécie de adoção conhecida pelo nome de levirato, palavra que provém do latim, considerada uma lei hebraica que obrigava um homem a esposar a viúva de um irmão quando do morto não houvesse herdeiro. Podendo ser encontrado vários registros sobre o instituto na Bíblia, como o de Jacó que adotou Efraim e Manassés, filho de seu filho José[4].
Durante o período feudal a adoção teve escassa aplicação, por contrariar os interesses dos senhores feudais, que não admitiam mesclar, na sua família, aldeões e plebeus. A Igreja também não apoiava a adoção, de um lado porque a constituição de um herdeiro prejudicava a donatio post obitum (doação dos bens daqueles que não tinham herdeiros feita à Igreja), de outro lado porque via na adoção uma possibilidade de fraude às normas que proibiam o reconhecimento de filhos adulterinos e incestuosos. Contudo deve-se observar que a adoção ocorria na forma adoptio minus plena (adoção menos plena), em que não ocorria o rompimento dos vínculos de parentesco do filho adotivo com sua família natural e permanecia sob a patria potestas(poder pátrio) do pai natural. Ela não se realizava diante do juiz, entretanto aperfeiçoava-se com a redação por escrito, além da forma testamentária. De forma geral, entre os antigos existia a necessidade de manter-se uma continuidade em relação à família. Em função disto, desde a mais remota Antigüidade era conhecida a figura da adoção. Encontrava-se regulamentada no Código de Hamurábi, cerca de 2.283 a.C.; os egípcios e os gregos serviram-se de tal instituto e os romanos foram os responsáveis pela sua efetiva sistematização e introdução na cultura ocidental.
No direito romano, existiam quatro grupos de pessoas ligadas pelo parentesco ou pelo casamento: a) gens, que eram membros descendentes de um antepassado comum, do qual recebiam o nome gentílico; b) família comuni iure, que significa comunhão pela lei, ou seja, os membros eram ligados pelo parentesco civil, chamado agnatício; c) conjunto de cognados – os membros eram ligados pelo parentesco consangüíneo; d) família proprio iure (ou de direito próprio)– compreendia todos aqueles que se encontravam sob o poder de um pater familias (o pai da família).
No período Pré-clássico havia duas categorias de pessoas: o chefe absoluto, independente, sem ascendente vivo ao qual estaria sujeito; e as pessoas subordinadas ao chefe, os filii famílias(filhos da família), a esposa do chefe, os seus descendentes e mulheres. Os filhos adotivos estavam inclusos na categoria dos filii famílias.
O ingresso na família proprio iure, ou de diretio próprio, ocorria por sujeição à patria potestas(poder pátrio), por meio da procriação em justas núpcias, por adoção ou por legitimação.Havia entre os romanos três tipos de adoção, decorrente da comunhão pelas leis (comuni iure):
a) A adoptio per testamentum(adoção por testamento) – ato último de vontade que produzia efeitos após a morte do testador, mas tinha como condição para a sua eficácia a confirmação, feita por assembléia formada por patrícios, homens livres em idade de serviço militar.
b) A ad-rogatio – realizava-se entre o adotado capaz e o adotante; completava-se com a aprovação na abertura dos comícios (assembléias do povo).
c) A datio in adoptionem ( ou dação em adoção) – o adotante recebia o incapaz em adoção, por vontade própria; completava-se após a terceira emancipação concedida pelo pai e recebida pelo adotante.
Portanto o parentesco agnatício, civil, através da comunhão legal, que originava a adoção, naquela época. Porém, foi somente depois da Revolução Francesa (após 1799), acontecimento que deu inicio a idade contemporânea, com a liberdade, igualdade, fraternidade, que a adoção, como ato jurídico que estabelece o parentesco civil entre duas pessoas, ressurgiu e passou a ser admitida em quase todas as legislações. A adoção surge na legislação francesa como um ato essencialmente contratual e estabelece regras diferentes com respeito ao sujeito ativo da adoção, ganhando uma maior força legal. Posteriormente, foram criadas leis que trouxeram importantes modificações à adoção, que culminaram por modernizar o instituto na França e no mundo, depois do pontapé iniciado pela Revolução Francesa.
2.2 Instituto Da Adoção No Brasil
A adoção brasileira surge, no período Colonial e depois no Imperial , quando inúmeras crianças “legítimas” e “ilegítimas” eram abandonadas por suas famílias naturais, na tentativa dos pais livrarem-se do filho indesejado (aquele que não era amado ou legítimo). Para essas crianças usava-se o apelido de enjeitadas, desvalidas ou expostas, onde lhes eram dado um destino, copiado do modelo europeu, que se chamava “Roda dos Expostos”. A “Roda Dos Expostos” era um móvel grande e feito de madeira, cilindro e oco, que girava em torno de seu próprio eixo e tinha uma porta voltada para a rua. Sem ser identificada, a mãe deixava seu bebê e rodava o cilindro 180º graus, o que fazia a porta ficar voltada para o interior do prédio, onde alguém recolhia a criança rejeitada.
A inclusão da adoção no Código Civil de 1916 ocorreu graças à argumentação do notório jurista Clóvis Beviláqua, que a partir de então fora amplamente praticada em vários estados brasileiros, como elucida Carlos Roberto Gonçalves[5]:
“O Código Civil de 1916 disciplinou a adoção com base nos princípios romanos como instituição destinada a proporcionar a continuidade da família, dando aos casais estéreis os filhos que a natureza lhes negara. Por essa razão, a adoção só era permitida aos maiores de 50 anos, sem prole legítima ou legitimada, pressupondo-se que, nessa idade, era grande a probabilidade de não virem a tê-la.”
Em meados de 1937, através da primeira Agência de Colocação Familiar, dentro do Departamento Estadual da Criança do Rio de Janeiro, a adoção ganhou um maior incentivo no Brasil pelo médico Álvaro Bahia, que organizou o serviço de “Colocação Familiar”, primeiro do Brasil com a finalidade de proteger e acompanhar as crianças órfãs na Bahia.
O anteprojeto de reforma do Código Civil apresentado pelo Prof. Orlando Gomes em 31 de março de 1963, também tratava do instituto da adoção e da legitimidade adotiva; idéia inovadora implementada pelo renomado jurista baiano em sua inteligência jurídica e social, apesar de o código não ter saído naquele ano.Em 1979 foi criado o Código de Menores, o primeiro da América Latina a trazer definições de “abandono – físico e moral”, e foi editado exclusivamente, visando o “controle” da infância e da adolescência “abandonada e delinqüente”, e se tornou um código extremamente autoritário e abusivo.
Em meio a uma revolução sociopolítica no Brasil, em 1990, foi promulgada a Lei n.º 8.069/90 que deu origem ao Estatuto da Criança e do Adolescente – ECA. Considerada uma das leis mais avançadas no mundo, esta foi redigida em prol das crianças e adolescentes, sob o ponto de vista material e psicológico. O tratamento da questão da adoção no ECA se originou do art. 227 da Constituição Federal de 1988, caput e §6 da denominada “Constituição Cidadã”[6], que coloca sob proteção absoluta e em prioridade a criança e adolescente e garante a igualdade de tratamento entre os filhos biológicos e os filhos adotivos, afastando qualquer caráter discriminatório.
É importante também citar o benefício trazido pela nova Lei de Adoção n°12.010/2009, que revogou os arts. 1.620 a 1.629 do Código Civil, colocando a criança sob o amparo do ECA em seus arts. 1618 e 1619, havendo uma substituição de um ordenamento jurídico por outro, mais eficaz e em maior harmonia com a Constituição Federal[7].
Assim, em busca de uma harmonia entre o Código Civil Brasileiro e o Estatuto da Criança e do Adolescente com a Carta Magma, no que diz respeito à proteção à criança e ao adolescente no cenário nacional e internacional, o legislador vem, apesar de tardiamente, respeitando os dizeres constitucionais do art.227, prevenindo a criança de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão.
2.3 A Adoção Internacional no Brasil
2.3.1 Conceito de adoção internacional
O conceito da adoção internacional consiste em toda vez que se encontre presente o critério de nacionalidade estrangeira de uma das partes ou que algumas delas tenha domicílio ou residência no estrangeiro, ou, ainda, que alguns atos vinculados à adoção tenham ocorrido no estrangeiro, como presente no art. 51 do Estatuto:
“Art. 51. Considera-se adoção internacional aquela na qual a pessoa ou casal postulante é residente ou domiciliado fora do Brasil, conforme previsto no Artigo 2 da Convenção de Haia, de 29 de maio de 1993, Relativa à Proteção das Crianças e à Cooperação em Matéria de Adoção Internacional, aprovada pelo Decreto Legislativo no 1, de 14 de janeiro de 1999, e promulgada pelo Decreto no 3.087, de 21 de junho de 1999. (Redação dada pela Lei nº 12.010, de 2009)
§ 1o A adoção internacional de criança ou adolescente brasileiro ou domiciliado no Brasil somente terá lugar quando restar comprovado: (Redação dada pela Lei nº 12.010, de 2009)
I – que a colocação em família substituta é a solução adequada ao caso concreto; (Incluída pela Lei nº 12.010, de 2009) Vigência
II – que foram esgotadas todas as possibilidades de colocação da criança ou adolescente em família substituta brasileira, após consulta aos cadastros mencionados no art. 50 desta Lei; (Incluída pela Lei nº 12.010, de 2009) Vigência
III – que, em se tratando de adoção de adolescente, este foi consultado, por meios adequados ao seu estágio de desenvolvimento, e que se encontra preparado para a medida, mediante parecer elaborado por equipe interprofissional, observado o disposto nos §§ 1o e 2o do art. 28 desta Lei. “(Incluída pela Lei nº 12.010, de 2009)
É válido mencionar que para que se configure a adoção internacional, é necessário que o adotante seja cidadão estrangeiro; incluindo, além dos estrangeiros nascidos no exterior, os brasileiros que residem no estrangeiro, estes que estarão sujeitos as mesmas regras da adoção internacional, conforme o art. 51 e seguintes. No entanto, o adotante deve obedecer o período de convivência, pelo prazo que a autoridade judiciária fixar, salvo se a criança sujeita adoção não tiver mais de 1 ano de idade ou se, independente da idade, já estiver na companhia do adotante durante tempo suficiente para poder avaliar a constituição do vínculo afetivo, nos moldes do art. 46 do ECA. O artigo 51 do Estatuto da Criança e do Adolescente vem gerando, segundo Carlos Roberto Gonçalves, discussões nacionalistas[8]:
“Na realidade, não se deve dar apoio à xenofobia manifestada de alguns, mas sim procurar regulamentar devidamente tal modalidade de adoção, coibindo abusos, uma vez que as adoções mal-intencionadas, nocivas à criança, não devem prejudicar as feitas com a real finalidade de amparar o menor.”
Sobre o citado controle do poder público aliado a flexibilização do processo de adoção internacional, que o renomado autor acima afirma com experiência, nota-se que o direito da criança precisa urgentemente de uma atenção redobrada dos três poderes públicos do Brasil: o Legislativo, o Executivo e o Judiciário. Esses poderes têm a função de preservar a ordem pública, até mesmo a inerente a adoção internacional, baseando-se no principio do interesse público, para o bem geral da sociedade brasileira.
2.3.2 Natureza Jurídica
A adoção internacional brasileira tem natureza jurídica de instituto de ordem pública nacional. É ato bilateral entre adotado e adotante, através do ato jurídico celebrado entre o país de Acolhida e o país de Origem. A adoção internacional é um instituto que protege e previne as crianças contra as desigualdades que assolam o Brasil, pois constitui mais uma medida válida pelas Varas de Infância e Juventude, contra o abandono.
2.3.3 O ordenamento jurídico do Brasil frente à adoção internacional
A importância da utilização de princípios e práticas comuns às crianças adotadas interfere positivamente na adoção internacional, ajudando a reduzir as dificuldades causadas pelas diferentes legislações entre adotando e adotante. A cooperação para o bem-estar da criança supera deve superar limites territoriais, e prezar pelo seu melhor interesse, facilitando o diálogo entre fontes distintas sobre o mesmo tema, que se torna fundamental para boas relações internacionais entre os países do mundo. Tema polêmico, a adoção internacional é hoje prática cada vez mais freqüente no mundo, especialmente envolvendo crianças que vivem em regiões subdesenvolvidas (como no Brasil), e pessoas que desejam adotar, que geralmente residem em países desenvolvidos, como a Itália e os Estados Unidos, e buscam o sonho de concretizar uma família, dentro dos laços de amor e convivência que resultarão, muitas vezes no melhor interesse da criança (ou adolescente).
Com a nova lei de adoção, que dispõe tanto sobre a possibilidade de adoção nacional, quanto de adoção internacional, adotar tornou-se mais seguro, visando o bem-estar do adotando, em primeiro lugar. Um dos requisitos que a adoção deve obedecer é que a mesma só se efetiva se o interessado estiver representado por uma entidade legalmente habilitada, no campo das adoções, no seu país e no Brasil, respectivamente. É bom lembrar, que, mesmo residente fora do país, a pessoa de nacionalidade brasileira tem prioridade de adoção sob o casal (ou pessoa) estrangeiro. Assim, para que um estrangeiro possa adotar no Brasil é necessário que este pertença a um país signatário da convenção de Haia ou do qual o Brasil tenha acordo sobre adoção internacional; obedecendo, assim leis compatíveis ao interesse do adotando.
A adoção internacional, quando proposta por estrangeiro no Brasil – tanto o estrangeiro propriamente dito, quanto o brasileiro naturalizado estrangeiro – está condicionada a estudo prévio da Autoridade Central brasileira e análise de uma comissão estadual judiciária de adoção, que verificará se a adoção proposta pelo interessado estrangeiro não fere os direitos fundamentais da criança (ou adolescente) que será adotada.
A adoção é explicada de modo consistente no site governamental do consulado brasileiro[9]:
“Com a ratificação, pelo Brasil, da Convenção de Haia, o interessado em adoção deverá ser representado por uma entidade estrangeira habilitada, segundo a lei brasileira, a atuar no Brasil no campo das adoções; ficando proibida a adoção requerida diretamente pelo interessado.”
O referido mecanismo coloca a criança sob o amparo e proteção não só da Constituição Federativa Do Brasil, mas também internacionalmente perante todos os países signatários da Convenção de Haia, tratado internacional que pode ser incorporada a lei dos países que o aderem. Assim, os países signatários da Convenção de Haia estarão sujeitos ao mesmo mecanismo de adoção; portanto, se verifica que existe uma tendência em uniformizar os direitos da criança no mundo para que estas permaneçam protegidas e amparadas como merecem. A proteção da criança vem sendo matéria bem recebida e discutida em congressos, convenções e acordos internacionalmente no mundo inteiro.
O Brasil recepcionou a Convenção Relativa à Proteção das Crianças e à Cooperação em Matéria de Adoção Internacional[10]:
“1. A Convenção será aplicada quando uma criança com residência habitual em um Estado Contratante ("o Estado de origem") tiver sido, for, ou deva ser deslocada para outro Estado Contratante ("o Estado de acolhida"), quer após sua adoção no Estado de origem pôr cônjuges ou pôr uma pessoa residente habitualmente no Estado de acolhida, quer para que essa adoção seja realizada, no Estado de acolhida ou no Estado de origem”.
A adoção internacional deve ser acompanhada de Autoridade Centrais Estaduais e Federal em Matéria de Adoção Internacional. Cada Estado Brasileiro possui uma Comissão Estadual Judiciária de Adoção, que fornecerá um documento denominado Certificado de Habilitação para que o casal estrangeiro possa futuramente adotar. Cabe ressaltar que, para interessados provenientes de países que não assinaram a Convenção de Haia ou não a ratificaram, estes não estão impedidos de adotar. Entretanto existirão algumas burocracias, uma vez que não há a presença da entidade estrangeira vinculada à adoção internacional credenciada no Brasil e surgirão, assim, exigências relacionadas à legislação sobre a adoção e sobre as garantias de concessão de direitos fundamentais à criança no país que a acolherá.
É importante a leitura do art. 51 e 52 do ECA, alterados pela nova Lei de Adoção, que elencam pressupostos e mecanismos que o estrangeiro deve obedecer para adotar, como no dever que o estrangeiro tem em formular pedido de habilitação à adoção perante autoridade central do seu país, e respeitar a legislação do país do adotando, inclusive sobre os direitos e garantias da pessoa humana, clausulas pétreas dentro do direito internacional. Os incisos III e IV do artigo 52 dispõe do relatório que o país do adotante enviará ao país do adotando, que deve conter toda documentação necessária, incluindo estudo psicossocial elaborado por equipe interprofissional habilitada e cópia autenticada da legislação pertinente, acompanhada da respectiva prova de vigência.
De acordo com o ECA, com a devida habilitação (através da Convenção de Haia acima descrita e respeitadas todas garantias fundamentais), com o estágio de convivência mínima de 30 dias, após um ano do pedido, o casal estrangeiro poderá adotar uma criança brasileira. A nova lei de adoção reduziu o tempo de habilitação de estrangeiros de dois anos para um, ou seja, após serem considerados aptos pela Justiça de seu país e do Brasil, os estrangeiros só têm um ano para efetivar a adoção. Vale também para brasileiros residentes no exterior. Para se adotar é necessário que o adotante (pessoa que adota) seja maior de 18(dezoito) anos, não dependendo do estado civil desta. A lei diz que o adotante deve ter pelo menos 16 anos mais velho que o adotado, devendo ter a criança 2 anos, se tratando de adotante com 18 anos. As crianças e adolescentes podem ser adotadas, no máximo, até os 18 anos, completos até a data de pedido da adoção; mas podem também serem adotados os maiores de 18 anos que já estejam sobre a guarda ou tutela do adotante na data do pedido de adoção. A documentação do casal estrangeiro deve ser entregue no Juizado da Infância e Juventude presente no Brasil, juntamente com o pedido a ser verificado por autoridade competente, que verificará se o país de acolhida estrangeiro possui tratado com o Brasil, evitando um posterior conflito jurídico, sobre qual legislação aplicável para o melhor interessa da criança.
Os casais estrangeiros, assim, passarão a ser pais da criança, e responsáveis por ela assim como se pais biológicos fossem, por isso é uma medida que deve ser julgada com cautela, visto que a mesma é irrevogável. O juiz competente pode deferir o pedido de adoção internacional para o estrangeiro, se tiver a certeza do vínculo de amor entre os sujeitos envolvidos, este que deverá ser forte o suficiente para sustentar uma boa relação familiar. O magistrado baseia sua decisão, também, a partir dos laudos da equipe multiprofissional da Vara da Infância e Juventude, medida que será sempre fundamentada em lei, doutrina e jurisprudências. As famílias residentes no exterior que adotam no Brasil são informadas que serão acompanhadas, com o envio de relatórios periódicos quanto à adaptação da família, às autoridades centrais brasileiras, pelo período mínimo de dois anos ou até que seja apresentada a certidão de nascimento com a cidadania do país de acolhida; garantindo uma melhor adaptação do adotando ao país de acolhida.
A adaptação do adotando no país de acolhida é de suma importância, tendo como principais efeitos o gozo de direitos fundamentais humanos e inerentes a criança e adolescente, como a nacionalidade e a cidadania. Os direitos fundamentais são entendidos como cláusulas pétreas irrevogáveis, irretratáveis e indisponíveis do ser humano, pois geram direitos e deveres para todos, assim como para os sujeitos na adoção internacional. Com mencionado anteriormente, dois dos direitos fundamentais na adoção internacional são a nacionalidade e a cidadania, estes que dependerão exclusivamente da boa relação entre o pais de origem e de acolhida do adotado e também do respeito a ambas legislações. Para se entender a nacionalidade aplicada ao menor diante da possibilidade da adoção internacional, mister se faz o entendimento da nacionalidade como direito fundamental que nasce junto com a pessoa humana.
Neste sentido, é importante salientar que é dever do Estado de Origem, através dos órgãos judiciários responsáveis, assegurar os direitos da criança sujeita a adoção internacional, para depois ocorrer a transição definitiva desta para o Estado de acolhida, para a conclusão do processo de adoção. A criança brasileira adotada por casais estrangeiros, portanto passará a ser cidadã do país de acolhida, através da garantia que a adoção internacional lhe proporcionará a manter seus interesses respeitados, tanto na nacionalidade, quanto na cidadania.
3. Os Efeitos da Adoção Internacional
3.1 A Nacionalidade
Um dos efeitos da efetivação da adoção internacional é sobre a nacionalidade da criança adotada por estrangeiros no Brasil, a partir do deslocamento da criança brasileira para o país de acolhida estrangeiro.
Constitui a nacionalidade em seu sentido jurídico em o vínculo jurídico-político permanente que liga um indivíduo a um determinado Estado. Na sabia lição de Pontes de Miranda, a nacionalidade “é o vínculo jurídico político de Direito Público interno, que faz da pessoa um dos elementos componentes da dimensão pessoal do Estado”[11]. O vínculo jurídico e político gera para o nacional direitos e deveres em relação ao Estado que pertence, como direito ao voto universal, prestação de serviço militar, e tem caráter permanente, pois este vínculo permanece tanto em solo brasileiro quanto estrangeiro. Portanto, como assegura Leo Van Holthe, “a nacionalidade decorre da relação entre o elemento humano (povo) e o geográfico (território) de um Estado, (…)”[12]. Em um eventual conflito da nacionalidade da criança brasileira perante o país do adotante (país do interessado na adoção internacional), é preciso que a autoridade que julgue a questão estude o caso com dignidade, legalidade, moralidade e ética, respeitando os direitos fundamentais da criança e o princípio do melhor interesse da mesma, tendo o adotando seus direitos respeitados em qualquer lugar do mundo, através de tratados internacionais de proteção à criança[13].
É importante salientar que, apesar da flexibilidade de alguns julgadores, em decorrência do art. 227 e ao principio do melhor interesse da criança, é preferível que a criança adotada por casais estrangeiros, em território brasileiro não perca sua condição de nacional, pois esta é direito previsto na Constituição Federal adquirido com o nascimento dentro do Brasil, de caráter fundamental e intrínseco ao ser humano.
Neste sentido, é importante citar Jacob Dolinger (2003, pag. 423):
“Por um lado, os efeitos da adoção a partir do momento em que o adotado se integra na família do adotante, deveriam ser regidos pela lei deste, mas por outro lado, a relação entre o adotado e sua família de sangue constitui um direito adquirido não afetado pelo novos status, adquirido com a adoção.”
Portanto, a adoção internacional, como ensina magistralmente o jurista Jacob Dollinger, não exclui direitos adquiridos pela criança em seu país de origem, incluindo ai a nacionalidade, direito adquirido pela criança com seu nascimento com vida dentro do território nacional.
Um dos benefícios que o adotando garantirá com a nacionalidade estrangeira somada à brasileira é o exercício da cidadania no país de acolhida. A cidadania vincula-se ao gozo dos direitos políticos e institucionais em um país, exercidos pelos indivíduos que tenham nacionalidade, ou seja, a cidadania está implícita no conceito de nacionalidade que tem como base o ideal de nação.
A nacionalidade, portanto, prende o indivíduo ao Estado, situando-o, jurídico e politicamente, como integrante da nação de um povo em qualquer lugar do mundo. Constitui, hoje, num dos elos jurídicos e políticos mais fortes dentro do ordenamento jurídico nacional e internacional, pois garante à pessoa o exercício de direitos e obrigações, inclusive no que diz respeito à criança e ao adolescente no processo adotivo internacional.
3.2 Nacionalidade No Brasil
A nacionalidade brasileira se adquire através do critério jus soli, através do nascimento com vida dentro de território brasileiro.
Com a Emenda Constitucional de Revisão nº 3/94 e, nos termos do parecer da Secretaria da Justiça, publicado no Diário Oficial da União em 7/8/95, a perda da nacionalidade brasileira só deverá ocorrer quando houver manifestação inequívoca do interessado nesse sentido, pois a pura e simples aquisição de nacionalidade estrangeira não mais constitui causa para a perda da nacionalidade brasileira. Assim, aplica-se a emenda em questão ao adulto, a partir dos 18 anos, podendo também a criança brasileira adotada por estrangeiros a qualquer tempo reivindicar sua nacionalidade brasileira, com a manifestação de vontade.
A referida emenda se baseou no art.15 da Declaração dos Direitos do Homem[14]:
“Artigo 15:
I) Todo homem tem direito a uma nacionalidade.
II) Ninguém será arbitrariamente privado de sua nacionalidade, nem do direito de mudar de nacionalidade.”
A nacionalidade, como visto, dentro da adoção internacional realizada Brasil tem um caráter peculiar, por envolver direito fundamental do menor e seu futuro familiar dentro da família substituta estrangeira, devendo sempre ser ouvido o Ministério Público, que opinará na defesa e garantia à nacionalidade do adotando, e deverá somar o seu parecer junto ao Juiz da Vara da Infância e Juventude, que aplicará a Lei, e fará o necessário para o benefício da criança ou adolescente. Assim, esclarece Valter Kenji Hishida[15]:
“A habilitação do casal requerente não implica o deferimento do pedido de adoção feito na Vara da Infância e Juventude competente. Após o pedido de habilitação, o casal requerente submete-se a novo acompanhamento pelo ST da Vara da Infância e da Juventude respective”.
Assim, a adoção internacional será objeto de investigação do poder público afim de preservar os direitos fundamentais e o melhor interesse da criança envolvida, não vinculando o Juiz e o Promotor, da Vara em questão, de deferir favoravelmente, se mostrando uma medida discricionária, mas sempre de acordo com a lei.
O melhor interesse ora observado é de inteira importância e foi matéria da Convenção Internacional dos Direitos da Criança, que foi aprovada, por unanimidade, na sessão de 20 de novembro da Assembléia Geral das Nações Unidas, em 1989 e foi ratificada pelo Brasil através do Decreto n° 99.710/90. A convenção dispõe no art. 3.1: "todas as ações relativas às crianças, (…), devem considerar, primordialmente, o interesse maior da criança”, ações estas que a criança fica submetida perante o poder público. Para uma maior garantia do bem estar da criança na adoção internacional, foi ratificada pelo Brasil a Convenção de Haia, dando maior segurança para os direitos da criança. A Convenção instaurou um sistema de cooperação entre os Estados Contratantes que assegura o respeito às garantias legais de crianças e adolescentes e, em conseqüência, colocou mais obstáculos para impedir o seqüestro, a venda ou o tráfico de crianças.
A nacionalidade foi matéria de discussão dentro de diversas convenções sobre direito da criança, visto que, por muitas vezes não ter flexibilidade dentro das legislações dos países que compõe o planeta terra. A questão da nacionalidade da criança adotada foi um dos temas abordados na Convenção de Haia de 1993, que traçou parâmetros em prol dos sujeitos envolvidos na adoção afim de assegurar que o Estado de Origem e de Acolhida não firam os direitos adquiridos no país de origem da criança. Assim, o direito de não-perda de direitos fundamentais se ramifica na garantia de nacionalidade e cidadania do adotando, como assegura o art. 15 da Declaração dos Direitos dos Homens, na pag. 16.
Durante o governo Getúlio Vargas, foi aprovado um decreto baseado na Convenção de Haia de 1930 que teve como uma das matérias escritas a nacionalidade, dispondo no art. 17:
“Se a lei de um Estado admitir a perda da nacionalidade, em conseqüência da adoção, esta perda ficará, entretanto subordinada à aquisição pelo adotado da nacionalidade do adotante, de acordo com a lei do Estado de que este for nacional, relativa aos efeitos da adoção sobre nacionalidade”.
Porém, como já exposto, não mais vigora este entendimento no ordenamento jurídico brasileiro e está descartada, assim, a perda da nacionalidade brasileira através da adoção internacional, podendo, entretanto, os adotantes adotarem nos moldes da Constituição, norma máxima brasileira.
4. Conclusão
O brasileiro adotado por estrangeiros, com isso, poderá viver e permanecer em qualquer estado de acolhida, não perdendo, seus direitos a nacionalidade e cidadania, estes que foram adquiridos anteriormente no Brasil, e serem indisponíveis ao homem. Antes de existir mecanismos totalmente integrados com convenções e tratados internacionais sobre a adoção internacional e seus efeitos, alguns juristas brasileiros já defendiam o instituto; por entenderem que este constitui uma forma positiva que a criança tem em garantir seu futuro e sua felicidade, mesmo que a busque fora do país, em lares internacionais.
É fundamental descrever, em parte, uma lição de um dos juristas brasileiros de maior autoridade de maior repercussão dentro do direito de família no Brasil, quiçá no mundo, o eminente Professor Alyrio Cavallieri, que prestou o depoimento na Revista de Magistrados do Rio de Janeiro sobre a adoção internacional[16]:
“Em 1970, uma senhora sueca, viúva, que morava no Rio de Janeiro, freqüentava o orfanato Romão Duarte, onde, como voluntária ajudava com as crianças. Um dia, procurou o juizado e me disse que tinha pena de crianças que jamais eram visitadas por parentes, enquanto na sua terra, a Suécia, casais queriam filhos e não conseguiam. Conversei com o curador Araújo Jorge e a assistente social Julieta Pires. Vamos experimentar? Mas não havia nenhuma lei, nem jurisprudência, nem prática anterior conhecida. Inventamos três condições: 1. Vamos pedir a lei de lá, para saber se nossas crianças não seriam pessoas de segunda classe naquele país; 2. Vamos pedir um estudo da família, como exigimos dos brasileiros aqui, e 3. Só vamos mandar crianças que não tenha nenhuma possibilidade de obter família brasileira. Fizemos os processos, tudo certo, o estudo das famílias era uma beleza, com exames, testemunhos e até recomendação do cônsul brasileiro de lá. Mandamos 7 crianças.”
Atitudes como a do magistrado, contribuíram para que o Brasil colocasse em sua legislação a adoção internacional, protegendo direitos fundamentais da criança, como a nacionalidade e cidadania ora descritas; surgindo, no âmbito internacional, o Brasil como um dos países que mais realiza adoções internacionais no mundo. Filhos que os pais não querem ou não podem exercer o poder familiar sempre existiram e sempre existirão. Crianças abandonadas, jogadas no lixo, maltratadas, violadas e violentadas, escancaram esta realidade, principalmente no Brasil atual. A sorte é que existem milhões de pessoas que desejam realizar o sonho de ter filhos, mesmo que estas sejam estrangeiras. Garantir o processo de encontrar um lar para quem quer alguém para chamar de pai e de mãe deve ser a preocupação maior do Estado, pois não há solução pior do que manter abrigados crianças, adolescentes e jovens; estes que são o futuro do planeta terra.
A união da adoção internacional com a garantia dos seus efeitos positivos quanto a nacionalidade e cidadania do adotado em questão deve ser observado, agindo os poderes envolvidos como protetores do direito da criança e do adolescente, utilizando a aplicação correta das leis em prol dos direitos fundamentais do menor e para que seu futuro seja digno e promissor.A presença do Estado como garantidor destes direitos é uma questão que não deve ser esquecida jamais pelo direito internacional, pois, como descrito no presente artigo, são direitos indisponíveis. Estes são a garantia que milhões de crianças brasileiras e do mundo inteiro possam ter uma segurança jurídica efetiva frente à sociedade no momento presente, e no futuro; onde esta gozará de benefícios oriundos da aquisição nacionalidade e cidadania, como o direito a voto e a elegibilidade para Presidente. Portanto, a nacionalidade constitui conjunto de direitos e deveres, públicos e privados, que atribuem ao indivíduo à qualidade de cidadão, devendo este ser uma garantia expressa durante o processo da adoção internacional feita no Brasil, dando origem a um exercício da cidadania estrangeira no país de acolhida.
É necessário não esquecer que, o direito de escolher uma nova nacionalidade é um dos direitos primordiais do homem, desde que ele seja juridicamente capaz, e desde que seja-lhe compensador fazer tal mudança, convém que homem avalie se é-lhe proveitoso inclusive acumular títulos de nacionalidades. Mas essa mudança pela vontade individual é condicionada a aquisição de capacidade civil, dentro no ordenamento jurídico brasileiro, devendo o cidadão brasileiro ter 18 anos ou mais para que decida sozinho e individualmente, pela aquisição de outra nacionalidade.
Por fim se faz necessário a leitura do art. 5º da CF, que nunca deve ser esquecido na busca do direito a ter direitos, principalmente os direitos fundamentais e intrínseco à pessoa humana:
“Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:
I – homens e mulheres são iguais em direitos e obrigações, nos termos desta Constituição;
II – ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei;”
É fundamental destacar, assim que, o brasileiro poderá manter sua condição de nacional junto com a cidadania, por ser direito adquirido com a vida. A nacionalidade é fundamental no direito político porque determina a condição de cidadania, da qual é pressuposto necessário, já que apenas os nacionais podem participar da vida política plena; no direito civil, por integrar um dos estados da pessoa e condicionar o gozo dos direitos; e nos direitos administrativo, fiscal e penal, nos quais a condição de nacional tem influência decisiva. A nacionalidade é um instituto, portanto, que se mistura e se confunde em diversos ramos do direito, devendo estes serem estudados e interpretados não apenas na linha do direito internacional presente no trabalho em questão acerca da adoção internacional, devendo ser sempre difundido o seu conceito e utilizado de forma democrática e saudável para a boa interpretação da lei e as boas relações sociais do homem.
Advogado formado pela Universidade Católica do Salvador
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