Categories: FilosofiaRevista 37

Ensaios sobre ideologia, poder e dominação no estado contemporâneo – Ensaio 4: Vanilla Sky

O filme retoma o mundo construído artificialmente na mente, mas agora de forma deliberada, como opção individual de viver em um espaço artificialmente construído como forma de negar uma vida real insuportável.

Os recursos tecnológicos a disposição da representação do real também estão presentes neste filme. O filme trabalha com o oposto da busca do real. O filme fala da fuga do real. Quando o real se torna insuportável, intolerável, quando não conseguimos olhar para o real. Quando o real ofende nossos olhos, agride nossa razão, acaba com a estima humana, alguns fogem. Escolhem a fuga. É melhor esquecer o real e viver em uma realidade programada. A escolha do irreal, de viver na representação existe e ocorre. O filme provoca. Mas a escolha de viver na representação programada não é para todos, pois, se fosse não seria mais representação e sim realidade uma vez que não seria mais necessário fugir. A escolha da representação programada existe para se fugir do real e existe para alguns: por isto é representação falsa da vida.

Nas palavras de ZIZEK[1]:

“Porque a verdadeira lição da psicanálise não é que os eventos externos que nos fascinam e/ou perturbam sejam apenas projeções de nossos impulsos internos reprimidos. O fato insuportável da vida é que realmente há eventos perturbadores lá fora: há outros seres humanos que vivenciam intenso prazer sexual enquanto somos meio impotentes; há pessoas submetidas a torturas terríveis… Reiterando, a verdade máxima da psicanálise não é descobrir nosso próprio Eu, mas o traumático encontro com um insuportável Real.”

Mas não há segurança no mundo virtual. A felicidade pode ser comprometida pelo subconsciente. Nem tudo está sob controle. A segurança e a felicidade fundada no controle têm limites. A felicidade produzida é perfeita demais. São estereótipos. Clichês. O personagem ao final escolhe o real. Mas será que ele já tinha vivido o real? O real para ele foi talvez a ruptura com a sua vida perfeita, rica. A ruptura traumática com sua aparência perfeita, bela. Mesmo na construção da vida virtual perfeita esta foi construída sobre os valores superficiais que pautavam sua vida antes do trauma. A vida virtual era propositalmente artificial: ela não tentava se passar pelo real. Era propositalmente uma imitação romântica, artificial, perfeita, do real. Uma representação que não tinha a intenção de representar o real, mas, uma idealização do real.

Nota:

[1] ZIZEK, Slavoj. Às portas da revolução – escritos de Lênin de 1917, Editora Boitempo, São Paulo, 2005, pag. 178.

 


 

Informações Sobre o Autor

 

José Luiz Quadros de Magalhães

 

Especialista, mestre e doutor em Direito Constitucional pela UFMG Professor da graduação, mestrado e doutorado da PUC-MINAS e UFMG.

 


 

Equipe Âmbito Jurídico

Recent Posts

TDAH tem direito ao LOAS? Entenda os critérios e como funciona o benefício

O Benefício de Prestação Continuada (BPC), mais conhecido como LOAS (Lei Orgânica da Assistência Social),…

10 horas ago

Benefício por incapacidade: entenda como funciona e seus aspectos legais

O benefício por incapacidade é uma das principais proteções oferecidas pelo INSS aos trabalhadores que,…

10 horas ago

Auxílio reclusão: direitos, requisitos e aspectos jurídicos

O auxílio-reclusão é um benefício previdenciário concedido aos dependentes de segurados do INSS que se…

10 horas ago

Simulação da aposentadoria: um guia completo sobre direitos e ferramentas

A simulação da aposentadoria é uma etapa fundamental para planejar o futuro financeiro de qualquer…

10 horas ago

Paridade: conceito, aplicação jurídica e impacto nos direitos previdenciários

A paridade é um princípio fundamental na legislação previdenciária brasileira, especialmente para servidores públicos. Ela…

10 horas ago

Aposentadoria por idade rural

A aposentadoria por idade rural é um benefício previdenciário que reconhece as condições diferenciadas enfrentadas…

10 horas ago