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Erro médico

Durante esse período em que tenho escrito nesta coluna, reparei que muitos, talvez a maioria dos comentários dos leitores não provém de pessoas com formação jurídica, mas de cidadãos que, acessando o site, se interessam pelo artigo através do título e nos brindam com seus comentários construtivos. Evidentemente que nem sempre compartilham do mesmo entendimento, mas isso é extremamente salutar e faz parte da democracia que tanto queremos. Todos os comentários são bem vindos, porque é a discussão do tema que proporciona a evolução da ciência, qualquer uma delas, e toda opinião pode ser alterada se sobrevêm o convencimento a partir entendimento do raciocínio oposto.

Nesta esteira, tenho procurado alternar alguns artigos de análises teóricas com outras de cunho especificamente prático. Em muitos deles, admito, pouco conheço do assunto, e por isso mesmo procuro apenas trazer alguns questionamentos ao debate, pretendendo, exatamente, promover a discussão para gerar aprimoramento.

Algo que têm me intrigado, e muito, é a questão do “erro médico”. Como mensurar a ação de um médico cirurgião, quando sobrevêm a morte do paciente, do ponto de vista de sua culpa, por negligência ou imperícia?

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Não são poucos os casos que resultam na morte do paciente. Eu, pessoalmente, assisti a vários episódios. Vi e soube de muitos em que o paciente entrou no hospital para “uma simples intervenção cirúrgica” – ou pelo menos “considerada simples”, e saiu morto. Não que o médico ou alguém de sua equipe não tenha prevenido o próprio paciente e seus familiares dos riscos inerentes a qualquer intervenção cirúrgica, mas há casos em que os riscos são baixíssimos e calculados, com pouco índice de perda do paciente. Mas acabam acontecendo. Não só nestes, mas em quase a totalidade, a investigação da causa mortis reveste-se de extrema complexidade, dependendo, na maioria dos casos, de opiniões de outros médicos especialistas, que, (não querendo desconfiar do tal “espírito de corpo”), acabam dizendo que “o procedimento adotado era compatível com a literatura médica” , ou que “pelas circunstâncias descritas a ação médica foi revestida de todas as cautelas recomendadas”, ou ainda que “nas condições existentes, a ação era a possível”; e muito poucos médicos sofrem as conseqüências de suas ações culposas. E, insisto, muitos pacientes morrem.

Atuando como Promotor de Justiça, confesso que observei muitos poucos casos que resultaram em condenação com comprovação de culpa. Tratando-se de área de conhecimento muito específico e ligado às ciências humanas, torna-se difícil concluir que a atitude tomada pelo médico, nas circunstâncias em que o paciente foi apresentado, não foi a correta – por negligência ou imperícia. As cirurgias acontecem evidentemente em salas próprias, especialmente preparadas e reunindo alguns, ou todos os integrantes de sua própria equipe. Não há qualquer monitoramento “externo”. São eles mesmo que relatam tudo o que sucedeu. Também ouve-se muitos comentários do tipo “foi o assistente que realizou a cirurgia, sem o devido acompanhamento do médico especialista” – e até onde isso se revestiria nas conseqüências menos desejáveis? Não desconheço o stress natural de qualquer cirurgia, pois ninguém duvida que muito maior é o número de casos em que os médicos salvam vidas e recuperam pacientes desenganados do que aqueles que, embora sem motivos aparentes para complicações, acabam morrendo.

Enfim, trata-se de assunto para extenso debate. Incontávies são os questionamentos. Não pretendo, e nem conseguiria, esgotar o tema, mas a sua importância parece sugerir maior aprofundamento e mesmo especialização naquilo que talvez pudéssemos chamar de “área médico-jurídica”. Gostaria mesmo de ver o tema ser desenvolvido por especialistas, a fim de se evitar a perda de vidas que, de alguma maneira pudessem ser evitadas, e acredito que, se as conseqüências fossem mais rigorosas, os profissionais se dedicariam mais ao aprimoramento de suas funções.

Termino com uma sugestão que coloco ao debate e à apreciação dos especialistas da área: Por que não se instalam filmadoras dentro das salas de cirurgias dos hospitais, para se registrar tudo o que lá acontece, em seus mínimos detalhes, em, por exemplo CD-roms – que ficariam obrigatoriamente guardados por um ano? Isso auxiliaria o Promotor de Justiça a melhor analisar a prova dos fatos, mesmo não tendo conhecimento técnico da área médica. Se as empresas investem tanto em segurança, por que os hospitais não investem em acompanhamento das intervenções médicas? Não seria essa uma hipótese de solução para aprimorar o atendimento dos pacientes, que já pagam tão caro por saúde neste País?

 


 

Informações Sobre o Autor

 

Marcelo Batlouni Mendroni

 

Promotor de Justiça/SP – GEDEC, Doutor em Processo Penal pela Universidad de Madrid, Pós-Doutorado na Università di Bologna/Italia

 


 

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Equipe Âmbito Jurídico

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