Reasumo: Nos dias de hoje é muito comum vermos empresas que são lesadas, na realização da prestação de serviços. Por vezes, o valor da prestação do serviço não pago é tão exorbitante, a tal ponto de contribuir para uma evidente desestabilização econômica. O objetivo do presente texto é apresentar ao profissional militante a importância de não só ler as letras da Lei, mas em seguir a tendência jurisprudencial, já que o profissional precisa comprovar o pedido de gratuidade (situação de desastibilização econômica que gerou a precariedade da empresa), para fins da concessão.
Nos dias de hoje é muito comum vermos empresas que são lesadas, na realização da prestação de serviços.
Por vezes, o valor da prestação do serviço não pago é tão exorbitante, a tal ponto de contribuir para uma evidente desestabilização econômica.
Boa parte das empresas ingressa com ações de cobrança ou execuções de títulos discutindo valores astronômicos, e em contrapartida, não possuem condições sequer de arcar com o valor das custas e taxa judiciária, no momento da distribuição da peça inaugural.
Assim, analisando o “ontem” e o “hoje”, pode o juiz deferir o pedido de concessão da gratuidade temporária (ou não) para que a mesma custeie o valor em partes ou na totalidade, antes do Juízo proferir sentença.
Concede-se tal “dilação” para o pagamento quando o Juízo constata a precariedade financeira, além do prejuízo sofrido, notando, por exemplo, através dos balancetes da pessoa jurídica e demais documentos, que a mesma possuía um padrão antes, e em contrapartida, um padrão diametralmente oposto hoje.
Para que ocorra a concessão, bastaria que as mesmas apresentassem a afirmação de que não possuem condições financeiras em arcar com custas processuais, sem prejuízo da sua própria mantença e funcionamento?
É importante levantar tal questionamento para não se deparar com a problemática do requerer e não comprovar.
Um dos pontos conflitantes da Lei Federal nº 1.060/50, conhecida como a Lei de Assistência Judiciária, versa sobre a possibilidade de deferimento do pedido de gratuidade, pela simples juntada da afirmação de pobreza, o que não é razoável e suficiente, quando o assunto versa pessoa jurídica.
Dispõe a Constituição Republicana, no artigo 5º, incisos XXXV e LXXIV:
“Artigo 5º – Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:(…)
XXXV – A lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça ao direito.(…)
LXXIV – O Estado prestará assistência jurídica integral e gratuita aos que comprovarem insuficiência de recursos”.
A própria Carta Magna não faz a distinção sobre a pessoa física ou jurídica. Para ela, todos devem ter assistência jurídica e integral, por parte do Estado, desde que comprovem serem ou estarem “pobres”, na acepção jurídica da palavra.
Prevê ainda o caput do artigo 19 do Código de Processo Civil:
“Art. 19. Salvo as disposições concernentes à justiça gratuita, cabe às partes prover as despesas dos atos que realizam ou requerem no processo, antecipando-lhes o pagamento desde o início até sentença final; e bem ainda, na execução, até a plena satisfação do direito declarado pela sentença”.(grifo meu)
É evidente e notório que a situação não vem caminhando dessa maneira, e, para um juiz, seria um tanto vago conceder o benefício sem analisar se houve ou não uma desestabilização econômica passível de concessão.
Com o fito de agir sensatamente, e analisando, na prática, a situação de pessoas e representantes legais que pleiteiam o benefício, tendo um padrão condizente para pagar custas, os Tribunais Pátrios têm exigido, em prazo determinado, a juntada de documentos que comprovem a real condição do pleiteante ou da empresa, ou seja, a real desestabilização.
Poderão ser exigidos documentos, tais como: comprovantes de rendimentos, as três últimas declarações do Imposto de Renda, balancete da empresa, certidões da Secretaria da Receita Federal, dentre outros.
Por mais que seja uma faculdade da parte Ré em manifestar-se através da impugnação à gratuidade concedida ao autor/representante legal (fato), os Tribunais tentam agir da forma mais justa possível, diante da análise das referidas provas, para evitar a concessão a quem realmente tem padrão, desfavorecendo o ex adverso.
Na verdade, o magistrado dá um “trabalho a menos” ao Réu, e verifica se aquele autor está agindo de boa-fé.
Vale frisar que, no Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro, com relação ao pedido para pagamento parcelado das custas ou até antes da sentença, vem se exigindo a máxima comprovação da condição de desestabilização financeira, conforme prevê o Enunciado nº 27, do Fundo Especial do Tribunal de Justiça:
“Considera-se conforme ao principio da acessibilidade ao Poder Judiciário (CF/88, art. 5°, XXXV) a possibilidade, ao critério do Juízo em face da prova que ministre a parte autora comprovadamente hipossuficiente, desta recolher as custas e a taxa judiciária ao final do processo ou de parcelar o recolhimento no curso do processo, desde em ambas as situações, que o faça antes da sentença, como hipótese de singular exceção ao principio da antecipação das despesas judiciais (CPC, art. 19), incluindo a serventia do Juízo a fiscalização quando ao correto recolhimento das respectivas parcelas”. (grifo meu)
Já a Súmula TJ-RJ nº 39, de 12 de novembro de 2002, prevê que “é facultado ao Juiz exigir que a parte comprove a insuficiência de recursos, para obter concessão do beneficio da gratuidade de Justiça (art. 5º, inciso LXXIV, da CF/88), visto que a afirmação de pobreza goza apenas de presunção relativa de veracidade”. (grifo meu)
Como exemplo, segue recentes entendimentos do Egrégio Tribunal sobre o tema:
“TJ-RJ – AI 2009.002.32086 – 16A Câmara Cível – Julg. em 26-1-2010 – Relator: Des. Mario Robert Manheimer.AGRAVO DE INSTRUMENTO – GRATUIDADE DE JUSTIÇA – PESSOA JURÍDICA. O inciso LXXIV do artigo 5º da Constituição Federal dispõe que o Estado prestará assistência jurídica integral e gratuita aos que comprovarem insuficiência de recursos, sem fazer distinção entre pessoas físicas e jurídicas. Embora a presunção de hipossuficiência decorrente da simples afirmação, consoante previsão do artigo 4º da Lei 1.060/50, somente se aplique às pessoas físicas, é de ser deferido o benefício também à pessoa jurídica, ainda que de fins lucrativos, que comprovadamente não disponha de recursos para fazer frente às despesas judiciais. Hipótese em que a precariedade financeira alegada não restou evidenciada pela documentação acostada aos autos. A simples existência de débitos não pode traduzir, por si só, a falta de capacidade financeira de uma empresa e, por conseguinte, justificar a concessão da Assistência Judiciária Gratuita. A Agravante não trouxe aos autos balancetes e declarações de imposto de renda, indispensáveis para aferição da situação econômica da sociedade. Conhecimento e desprovimento do recurso.” (TJ-RJ – AI 0048706-97.2009.8.19.0000 (2009.002.40910) – Julg em 8-1-2010 – 3ª Câmara Cível – Relator: Desembargador Mário Assis Gonçalves).
“GRATUIDADE DE JUSTIÇA – PESSOA JURÍDICA – NÃO COMPROVAÇÃO DE MISERABILIDADE – DESEQUILÍBRIO ORÇAMENTÁRIO MOMENTÂNEO – PAGAMENTO DE CUSTAS AO FINAL – POSSIBILIDADE – ENUNCIADO Nº. 27 DA FETJ. A aferição sobre a concessão da assistência judiciária gratuita (Lei nº. 1060/50) é poder-dever do juiz (Súmula nº 39 do TJERJ). Já foi pacificado o entendimento no sentido da possibilidade de concessão da gratuidade de justiça tanto a pessoas físicas quanto a pessoas jurídicas, estas, em caráter excepcional, e desde que concretamente comprovada a hipossuficiência. Alegação de que a situação econômica da empresa agravante foi desestabilizada em virtude das vultosas despesas que teve de realizar por exigência do contrato celebrado com a ré, e que foi unilateralmente rescindido por esta, não tendo sido ressarcida dos mencionados gastos. A análise do conjunto fático-probatório leva a crer não na miserabilidade jurídica da empresa, e sim no desequilíbrio orçamentário pelo qual afirma estar passando. Diante disso, considerando o objetivo da demanda e em prestígio às regras contidas nos incisos XXXV e LXXIV do art. 5º da CR/88, que garantem o amplo acesso ao Judiciário, constitui solução razoável que se defira o pagamento das custas e da taxa judiciária ao término do processo, antes da solução do litígio. Enunciado Administrativo nº 27 do FETJ. Recurso parcialmente provido.” (grifo meu)
Por mais que, em casos especiais, se possa conceder o benefício da gratuidade à pessoa jurídica, é imprescindível que a pretensão autoral esteja bem fundamentada e comprovada.
Quanto à necessidade da caracterização das condições da empresa, para fins de gratuidade, prevê a Súmula nº 121, do Egrégio Tribunal de Justiça do Rio, que “a gratuidade de justiça a pessoa jurídica não filantrópica somente será deferida em casos excepcionais, diante da comprovada impossibilidade do pagamento das despesas processuais”.
Para o Julgador, protestos, negativações, débitos, atrasos na folha de pagamento e empréstimos, não são provas suficientes que depreendam a situação de desestabilização, eis que mútuos, mínimos prejuízos e problemas com outras empresas são corriqueiros no giro dos negócios, tornando-se provas insuficientes para comprovar a atual precariedade.
É bem verdade que a garantia do acesso à justiça é um fato incontroverso, pelo que dispõe o artigo 5º inciso LXXIV da Constituição Republicana de 1988. Contudo, quanto ao pedido de gratuidade judiciária provisória em favor das empresas com fins lucrativos, excepcionalmente, exige-se a concreta comprovação da precariedade financeira, em razão do prejuízo sofrido, por uma medida de mais lídima e salutar justiça. Desta feita, caberá à empresa comprovar a impossibilidade de pagamento dos encargos, de modo que não venha a comprometer a sua existência.
Advogada – Pós-Graduada em Direito Público pela Universidade Estácio de Sá – Redatora responsável pelos impressos jurídicos de uma grande editora à nível nacional (COAD) – Membro da Equipe Técnica ADV dessa empresa – Consultora jurídica.
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