Guerra fiscal existe quando um ente tributante
concede benefícios e vantagens de natureza fiscal no intuito de atrair empresas
que se encontrem estabelecidas no território de outro ente tributante.
Nos últimos tempos, o termo “guerra fiscal” foi
gradativamente se tornando familiar para boa parte dos brasileiros, mesmo
porque nas duas últimas décadas esta vem ocorrendo de forma agressiva entre os
Estados Federados, com conseqüências econômicas das mais diversas.
Enquanto há poucas décadas as indústrias concentravam-se
principalmente no Estado de São Paulo, encontram-se hoje estas espalhadas por
todo o Brasil, em virtude, principalmente, dos benefícios fiscais que Estados
menores passaram a conceder para atraí-las.
Apesar de possuir mais opositores do que defensores,
a guerra fiscal vem sendo adotada cada vez por mais entes tributantes, o que
nos leva a concluir pela importância de compreender seus efeitos e resultados.
Em um primeiro momento, a guerra fiscal funcionou
como mecanismo de diminuição das desigualdades regionais, visto que, por ter
sido inicialmente adotada apenas por Estados menos desenvolvidos, teve por
conseqüência produzir uma descentralização industrial no país, com conseqüência
direta de criação de empregos, demanda e oferta de mão-de-obra especializada,
bem como aumento de renda per capita nos Estados que a adotaram.
Todavia, em um segundo momento, os Estados mais
desenvolvidos, tendo por principal objetivo não a atração de novas empresas,
mas simplesmente a manutenção, em seu território, do parque industrial nele
instalado, também aderiram à guerra fiscal e os efeitos da desconcentração
industrial começaram a arrefecer.
Para melhor compreensão, pode-se fazer um paralelo
com a situação hipotética na qual determinado comerciante, instalado em local
mais afastado, adota uma política agressiva de preços no intuito de atrair a
clientela de outros comerciantes.
Inicialmente este objetivo é atingido, todavia,
quando os demais comerciantes passam a praticar política similarmente
agressiva, restam ao primeiro duas alternativas possíveis: a primeira,
abandonar a sua guerra de preços, mantendo parte dos clientes conquistados,
embora não todos, todavia perdendo seu principal mecanismo de atração de novos
clientes; segunda, manter sua guerra de preços, sucessivamente reduzindo as
suas margens, o que na maior parte das vezes resulta em situações
insustentáveis, com margens de lucratividade tão ínfimas ou mesmo negativas
que, a médio prazo, podem inviabilizar o próprio negócio, ou seja, na busca
desenfreada por crescimento do negócio tem-se provavelmente ao final negócio
algum.
A impressão que se tem é que a guerra fiscal entre
Estados Federados no Brasil caminha para a concretização da segunda hipótese,
na qual ninguém ganha e todos perdem, o que é um bom indicador de estar, o
modelo de guerra fiscal adotado no Brasil, já superado.
Não se deve também perder de vista o fato de que a
guerra fiscal, em seu formato atual, não produz crescimento econômico para o
país, visto que seus resultados são, para os Estados que a adotam, simplesmente
a atração de empresas de outros Estados, em detrimento destes, ou mesmo a
manutenção das que já se encontram em seu território estaladas.
Todavia, antes de simplesmente concluir-se pela
inviabilidade da guerra fiscal, vale a pena conhecer o que se passa no restante
do mundo.
Quando se iniciou, no Brasil, a guerra fiscal entre
os Estados, a amplitude do leque negocial encontrava-se basicamente restrita a
pessoas instaladas no próprio território nacional, todavia, a situação atual é
essencialmente diversa.
A globalização é hoje um fenômeno irreversível, o
comércio internacional uma realidade e o Brasil, infelizmente, encontra-se
substancialmente isolado desta realidade.
O leque negocial tornou-se substancialmente mais
amplo do que era há algumas décadas. Hoje se pode comprar e vender de e para
praticamente qualquer pessoa ou empresa no mundo, e é dentro desta ótica que
deve ser concebida a nova política de guerra fiscal brasileira.
Há países que já acordaram para esta realidade. Na
década de 80, ao mesmo tempo em que, no Brasil, a guerra fiscal florescia
internamente, a Irlanda já adotava guerra fiscal em relação a outros países,
com concessão de vantagens e benefícios fiscais para empresas que se
estabelecem em seu território. Somente na área de eletrônica e software, a
Irlanda, por meio de benefícios fiscais, atraiu para seu território mais de 300
multinacionais, respondendo atualmente por mais de 30% dos computadores
vendidos em toda a Europa.
As conseqüências econômicas deste processo são
notáveis. Enquanto, nas últimas duas décadas, o crescimento acumulado do PIB do
Brasil, foi de 77,82%, no mesmo período o crescimento da economia da Irlanda
foi de 347,61%. Por outro lado, como a população brasileira aumentou
substancialmente neste período, caso seja tomada por base a renda per capita,
constata-se um crescimento acumulado brasileiro de 25,68%, enquanto, no mesmo
período, o da Irlanda foi de 281,67%.
Mas, para buscar-se exemplos, sequer se precisa ir
tão longe. A Costa Rica, cujas exportações há cinco anos atrás eram restritas a
café e bananas, tem hoje mais de 50% de suas exportações centradas em chips
da Intel, empresa que se instalou naquele país em virtude das vantagens e dos
benefícios fiscais concedidos.
O caminho para o crescimento econômico brasileiro
passa necessariamente pela atração de investimentos internacionais e, para
atraí-los, o Brasil deve centrar seus esforços em uma guerra fiscal diferente
da que vem ocupando seus esforços, deve priorizar a guerra fiscal internacional.
Se nossos governantes já tivessem “acordado” para
este fato, ao invés de tentar tomar os pequenos peixes uns do outros, estariam
buscando os grandes peixes que estão além do oceano.
Consultor Tributário, ex-Auditor Fiscal da Secretaria da Fazenda do Estado de Goiás e sócio da Dênerson Rosa & Associados Consultoria Tributária.
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