Resumo: O presente estudo tem por objetivo analisar uma questão jurídica de interesse para a saúde pública: a proteção que a legislação e as decisões dos Tribunais brasileiros conferem ao idoso necessitado, no que se refere à obrigação do Estado de provê-lo de medicamentos necessários aos cuidados com sua saúde. A partir de referências normativas, destacamos os principais aspectos que são indicados pelo Poder Judiciário brasileiro em defesa do direito fundamental à saúde do idoso e pelo reconhecimento da obrigação, do Estado, de fornecer os medicamentos necessários aos cuidados com a saúde desse cidadão. Constamos que prevalece a tese da preservação dos direitos constitucionais à vida, à saúde e à dignidade do idoso que, carecendo de recursos, não é capaz de custear, por si, a realização de tratamento de saúde, diante da reconhecida omissão da Administração Pública em efetivar esses direitos fundamentais da população de forma adequada, especialmente de sua parcela mais carente.
Palavras-chave: 1. Saúde Pública. 2. Acesso aos serviços de saúde. 3. Direitos humanos. 4. Direito Processual. 5. Decisões judiciais.
Os estudos jurídicos suscitam o interesse para a investigação de temas interdisciplinares ou multidisciplinares. O foco desta pesquisa de interesse multidisciplinar é analisar a proteção que a legislação e as decisões dos Tribunais brasileiros conferem ao idoso necessitado, no que se refere à obrigação do Estado de provê-lo de medicamentos necessários aos cuidados com sua saúde. O tema indicado interessa especialmente aos pesquisadores das áreas da saúde pública; saúde do idoso; políticas, planejamento e administração em saúde; direito humanos; direito à saúde; direito do idoso, dentre outras.
Existem atualmente em análise pelo Poder Judiciário brasileiro diversos conflitos em que se discute a obrigação do Estado em fornecer medicamentos a cidadãos. O objetivo deste estudo é analisar essa obrigação em relação à pessoa com idade igual ou superior a 60 anos e necessitada, a partir de pesquisa em decisões disponíveis nos sítios do Superior Tribunal de Justiça e dos cinco Tribunais Regionais Federais, tendo como principais referências as palavras “idoso” e “medicamento”.
A questão da obrigação do Estado em fornecer medicamentos já foi objeto de estudos anteriores, sob outros enfoques. Destacamos o trabalho que investigou as demandas de medicamentos considerados essenciais nas decisões do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro em 2006 (Pepe 1); o artigo que estudou as ações judiciais para obtenção de medicamentos junto à Secretaria de Estado da Saúde de São Paulo no ano de 2006 (Chieffi; Barata 2); o trabalho que analisou a concessão de medicamentos pelo Supremo Tribunal Federal, Superior Tribunal de Justiça, Tribunal de Justiça de Pernambuco e 7ª Vara da Fazenda Pública de Recife (LOPES 3). Em nível de pós-graduação, indicamos o trabalho de Naide Aparecida de Oliveira, que estudou os gastos do Serviço Público de Saúde para prover os idosos com medicamentos de uso contínuo, para quatro doenças de maior prevalência, concluindo, pelas estimativas analisadas, “que fica inviável atender a legislação vigente e o direito do idoso à inclusão social fica comprometido” (4). Localizamos, ainda, os estudos de Andrize Leite Caldeira, sobre os “Novos direitos: poder judiciário e o direito dos idosos a uma vida digna. O caso da saúde” (5); de Fabiana Rodrigues Barletta, “Direito à saúde da pessoa idosa” (6); dentre outros.
O direito à saúde é um dos direitos sociais estabelecidos no artigo 6º. da Constituição Federal: “São direitos sociais a educação, a saúde, a alimentação, o trabalho, a moradia, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à infância, a assistência aos desamparados, na forma desta Constituição” (7).
Direitos sociais são os que o indivíduo pode postular contra o Estado, reclamando a realização de ações necessárias ao desenvolvimento de sua condição humana.
A importância do direito à saúde foi bem exposta por Rodolfo Soares Ribeiro Lopes:
“Ademais, o direito à saúde, pelo fato de ser enquadrado na categoria dos direitos que tendem a realizar a igualização de situações sociais desiguais (DA SILVA, 2008, p. 286) e por relacionar-se intrinsecamente a outras garantias fundamentais, a exemplo do direito à vida (art. 5º, caput, da CF/88) e da dignidade da pessoa humana (art. 1º, III, da CF/88), não deve ser relegado ao arbítrio de posterior e incerta concretização, pelo simples motivo de ser norma programática. Ao contrário, o Estado deve implementar as prestações positivas necessárias, de cujo cumprimento depende a sua adequada efetivação (DA SILVA, 2008, p. 309, 465 e 831), visto que a Constituição de 1988 é caracteristicamente uma Constituição dirigente, vinculando, portanto, legislador, poder público, juízes e tribunais.” (3, p. 3142-3143).
Sobre a obrigação do Estado em fornecer medicamentos, o Superior Tribunal de Justiça já decidiu que:
“Os arts. 196 e 227 da CF/88 inibem a omissão do ente público (União, Estados, Distrito Federal e Municípios) em garantir o efetivo tratamento médico a pessoa necessitada, inclusive com o fornecimento, se necessário, de medicamentos de forma gratuita para o tratamento, cuja medida, no caso dos autos, impõe-se de modo imediato, em face da urgência e consequências que possam acarretar a não-realização (8)”.
Nessa mesma decisão o Superior Tribunal de Justiça observou: a) que é função do Ministério Público “buscar a entrega da prestação jurisdicional para obrigar o Estado a fornecer medicamento essencial à saúde de pessoa carente, especialmente quando sofre de doença grave que se não for tratada poderá causar, prematuramente, a sua morte”; b) que a recusa do Estado em assegurar o direito fundamental à saúde “humilha a cidadania, descumpre o seu dever constitucional e ostenta prática violenta de atentado à dignidade humana e à vida” (8).
Segundo os termos da Constituição Federal, o Ministério Público tem como uma de suas funções a defesa da ordem jurídica, do regime democrático e dos interesses sociais e individuais indisponíveis [artigo 127], zelando pelo efetivo respeito aos direitos assegurados na Constituição, e promovendo as medidas necessárias à garantia desses direitos [artigo 129] (7).
O direito fundamental à saúde está expresso no artigo 196 da Constituição Federal: “A saúde é direito de todos e dever do Estado, garantido mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença e de outros agravos e ao acesso universal e igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação” (7).
Especificamente sobre o idoso, o artigo 230 da Constituição Federal prevê que “a família, a sociedade e o Estado têm o dever de amparar as pessoas idosas, assegurando sua participação na comunidade, defendendo sua dignidade e bem-estar e garantindo-lhes o direito à vida” (7).
Já no Estatuto do Idoso temos que:
“Art. 2o – O idoso goza de todos os direitos fundamentais inerentes à pessoa humana, sem prejuízo da proteção integral de que trata esta Lei, assegurando-se-lhe, por lei ou por outros meios, todas as oportunidades e facilidades, para preservação de sua saúde física e mental e seu aperfeiçoamento moral, intelectual, espiritual e social, em condições de liberdade e dignidade.
Art. 3o – É obrigação da família, da comunidade, da sociedade e do Poder Público assegurar ao idoso, com absoluta prioridade, a efetivação do direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, à cultura, ao esporte, ao lazer, ao trabalho, à cidadania, à liberdade, à dignidade, ao respeito e à convivência familiar e comunitária.
Parágrafo único. A garantia de prioridade compreende: […] VIII – garantia de acesso à rede de serviços de saúde e de assistência social locais.
Art. 15 – É assegurada a atenção integral à saúde do idoso, por intermédio do Sistema Único de Saúde – SUS, garantindo-lhe o acesso universal e igualitário, em conjunto articulado e contínuo das ações e serviços, para a prevenção, promoção, proteção e recuperação da saúde, incluindo a atenção especial às doenças que afetam preferencialmente os idosos.
§ 1o – A prevenção e a manutenção da saúde do idoso serão efetivadas por meio de:
I – cadastramento da população idosa em base territorial;
II – atendimento geriátrico e gerontológico em ambulatórios;
III – unidades geriátricas de referência, com pessoal especializado nas áreas de geriatria e gerontologia social;
IV – atendimento domiciliar, incluindo a internação, para a população que dele necessitar e esteja impossibilitada de se locomover, inclusive para idosos abrigados e acolhidos por instituições públicas, filantrópicas ou sem fins lucrativos e eventualmente conveniadas com o Poder Público, nos meios urbano e rural;
V – reabilitação orientada pela geriatria e gerontologia, para redução das seqüelas decorrentes do agravo da saúde.
§ 2o – Incumbe ao Poder Público fornecer aos idosos, gratuitamente, medicamentos, especialmente os de uso continuado, assim como próteses, órteses e outros recursos relativos ao tratamento, habilitação ou reabilitação.
§ 3o – É vedada a discriminação do idoso nos planos de saúde pela cobrança de valores diferenciados em razão da idade.
§ 4o – Os idosos portadores de deficiência ou com limitação incapacitante terão atendimento especializado, nos termos da lei. (9)”
A partir dessas referências normativas, destacaremos os principais aspectos que são indicados pelo Poder Judiciário brasileiro em defesa do direito fundamental à saúde do idoso e pelo reconhecimento da obrigação, do Estado, de fornecer os medicamentos necessários aos cuidados com a saúde desse cidadão.
Rodolfo Soares Ribeiro Lopes observou que:
“Grandes discussões foram suscitadas na jurisprudência a respeito da obrigatoriedade de União, Estados e Municípios fornecerem medicamentos gratuitamente para indivíduos sem condições materiais de os adquirirem, assim como das responsabilidades concorrentes dos entes públicos no desenvolvimento de tal obrigação. A principal problematização é se o Judiciário, ao posicionar-se a favor da concessão de medicamentos, estaria substituindo o Poder Público em atribuições típicas da Administração, invadindo sua esfera de discricionariedade no que diz respeito à alocação de recursos aos diversos âmbitos governamentais, de acordo com as necessidades consideradas prioritárias.” (3, p. 3149)
A importância do Poder Judiciário na garantização da vida e do respeito à dignidade humana, inclusive da saúde, foi objeto de importantes estudos de Germano André Doederlein Schwartz (10; 11), especialmente porque “a saúde é deixada em segundo plano, em detrimento de outras opções que a vontade política julgue premente” (10, p. 158). E observa o autor citado que “a saúde não pode estar condicionada a discursos vagos, promessas políticas e ideologias cambaleantes” (Schwartz 10, p. 161).
A responsabilidade do Estado em fornecer medicamentos abrange a União, os Estados-Membros, o Distrito Federal e os Municípios, que são responsáveis solidários por essa obrigação. O cidadão pode exigir o fornecimento de medicamentos de qualquer um desses três entes políticos, ou de todos eles (12). Nessa decisão foi reconhecida, entretanto, a necessidade de realização de perícia médica quando as provas inicialmente apresentadas se mostrem insuficientes para o convencimento quanto a real necessidade de uso do medicamento pleiteado (12).
O juiz pode, com ou sem requerimento da parte interessada, em casos que envolvam o fornecimento de medicamentos a portador de doença grave, determinar a imposição de multa cominatória contra o ente público, objetivando o efetivo cumprimento da determinação judicial (13).
No Superior Tribunal de Justiça, localizamos alguns processos que tratam do fornecimento de medicamentos ao idoso. As decisões foram todas favoráveis ao idoso: a) AgRg no Ag 1131833, DJe 26/08/2009; b) AgRg no REsp 963416, DJe 11/06/2008; c) REsp 828140, DJ 23/04/2007, p. 235; d) REsp 851174, DJ 20/11/2006, p. 290; e) REsp 695665, DJ 20/11/2006, p. 276. Em outros casos decidiu-se que o Ministério Público pode propor ações que visem à proteção do idoso (14).
No Tribunal Regional Federal da 1ª. Região, que abrange a Justiça Federal da Região Norte, e de parte dos Estados das Regiões Sudeste, Centro Oeste e Nordeste, prevalece a ideia da responsabilidade do Estado pelo fornecimento de remédios e tratamentos necessários ao cidadão idoso, doente e necessitado. Nesse sentido: a) Agravo Interno no Agravo de Instrumento 0009907-82.2010.4.01.0000/MG, e-DJF1 p. 292 de 28/10/2010; b) Agravo Interno no Agravo de Instrumento 2009.01.00.026009-7/MA, e-DJF1 p.408 de 16/10/2009; c) Apelação cível 2006.35.00.015457-5/GO, e-DJF1 p.306 de 28/03/2008 (15).
No Tribunal Regional Federal da 2ª. Região, que abrange a Justiça Federal dos Estados do Rio de Janeiro e do Espírito Santo, as decisões localizadas são favoráveis à proteção do direito à saúde dos anciãos. Nesse sentido: a) Apelação cível 456851, processo 2007.50.01.012864-7, DJF2R de 21/05/2010, p. 362-363; b) Agravo Interno da Apelação cível 421264, processo 2005.51.01.007492-9, DJU de 23/04/2009, p. 19 [com fornecimento, por tempo indeterminado, do medicamento Rivastigmina 1,5 mg, restringindo o Tribunal a sentença do juiz que determinava o fornecimento de “todos os demais que se fizerem necessários ao tratamento da autora”]; c) Agravo de instrumento 144230, processo 2006.02.01.001118-1, DJU de 20/03/2009, p. 113; d) Remessa Ex Officio 393388, processo 2003.51.02.000682-1, DJU de 04/07/2008, p. 411; e) Apelação cível 362880, processo 2003.51.01.024096-1, DJU de 30/11/2005, p. 111 (16).
No Tribunal Regional Federal da 3ª. Região, que abrange a Justiça Federal dos Estados de São Paulo e Mato Grosso do Sul, repete-se a prevalência da defesa ao direito à saúde do idoso, como no caso do Agravo de instrumento 2005.03.00.040585-8, DJF3 CJ1 de 19/01/2010, p. 344 (17).
No Tribunal Regional Federal da 4ª. Região, que abrange os Estados da Região Sul do Brasil, as decisões localizadas são igualmente favoráveis à proteção do direito à saúde dos idosos. Nesse sentido: a) Apelação cível, processo 0007279-07.2009.404.7200, D. E. de 01/10/2010; b) Apelação em Reexame Necessário, processo 2007.71.11.001297-4, D. E. de 26/05/2010; c) Agravo de Instrumento, processo 2009.04.00.021760-0, D. E. de 14/04/2010; d) Agravo de Instrumento, processo 2009.04.00.033760-5, D. E. de 08/02/2010; e) Agravo de Instrumento, processo 2009.04.00.012467-1, D. E. de 20/01/2010; f) Apelação em Reexame Necessário, processo 2007.70.00.013149-8, D. E. de 07/01/2010; g) Apelação cível, processo 2009.72.14.000456-5, D. E. de 25/11/2009 (18).
No processo 2007.70.00.013149-8, a Administração Pública foi condenada a pagar R$ 25.000,00 (vinte e cinco mil reais) de indenização por danos morais. Decidiu-se que a demora na internação da paciente, ocasionou um abalo emocional e psicológico, vivenciado pela demandante no aguardo de seu tratamento, período em que se agravou a infecção que sofria (19).
Localizamos no Tribunal Regional Federal da 4ª. Região um processo em que ocorreu o indeferimento do fornecimento de medicamentos. No caso não havia comprovação da hipossuficiência e da necessidade dos medicamentos, e não havia, também, laudo médico que atestasse a eficácia e a necessidade das medicações (20).
Dos Tribunais estaduais, merece destaque a súmula 18, do Tribunal de Justiça do Estado de Pernambuco, que dispõe que “é dever do Estado-membro fornecer ao cidadão carente, sem ônus para este, medicamento essencial ao tratamento de moléstia grave, ainda que não previsto em lista oficial” (21).
No que se refere à defesa contra as ações que buscam obrigar o Estado a fornecer medicamentos, é importante destacar que os entes públicos têm alegado que a questão da prestação dos serviços de saúde depende do estabelecimento de políticas públicas, com previsão orçamentária, o que é de competência exclusiva de cada ente público [União, Estados-Membros e Municípios], e que o Poder Judiciário não pode interferir em tal esfera. Nesse sentido destacamos, apenas de forma indicativa, o trabalho de Zélia Luiza Pierdoná, intitulado “O direito à saúde e a impossibilidade de concessão de medicamentos por decisões judiciais individuais” (22).
Em conclusão, é incontestável que prevalece a tese da preservação dos direitos constitucionais à vida, à saúde e à dignidade do idoso que, carecendo de recursos, não é capaz de custear, por si, a realização de tratamento de saúde. Esses direitos estão relacionados com o fornecimento de remédios e a prestação de tratamentos necessários ao cidadão, inclusive mediante determinação de transferência de paciente, para que seja tratado em outra unidade mais adequada.
Conforme observa Rodolfo Soares Ribeiro Lopes, “a argumentação empregada nas decisões gira em torno, basicamente, das responsabilidades do Estado em promover a efetivação da norma constitucional que trata do direito à saúde através de políticas sócio-econômicas” (3). O mesmo autor conclui que “há, portanto, um claro realce da omissão do Poder Público frente às necessidades dos cidadãos (LOPES 3, p. 3153).
Merece destaque a transcrição dos argumentos apresentados em decisão judicial, que defende a ideia de que “o Judiciário não pode ficar indiferente” diante de situações de doença grave, e que “o Judiciário deve ser sensível e tratar da questão de forma a proteger os princípios constitucionais próprios, dirigidos essencialmente à vida, à saúde e acima de tudo a dignidade do ser humano”:
“Tenho divergido na Turma por entender que se a pessoa doente deve aguardar a realização de uma perícia ou comprovar a negativa de tratamento eficaz custeado pelo SUS equivale a dizer que a vida pode esperar, o que nem sempre é possível, quando se trata de doença grave, além de representar total desconsideração de um diagnóstico e indicação efetuados por profissional da Medicina, o que é inadmissível.
A União Federal deveria preocupar-se com problemas realmente relevantes para a economia nacional, não com medidas que se dirigem à concretização de princípios constitucionais sagrados para a consciência jurídica da sociedade. Tratando-se de questão de vida ou morte, o Judiciário não pode ficar indiferente e deve minimizar os efeitos da política direcionada à saúde neste País, que tanto fica devendo à Constituição e nada acontece, diante do descaso dos demais Poderes.
Consigno a divergência que se impõe, porque o estado de saúde da agravante é grave e ficará privada do tratamento adequado, o que poderá ser fatal. […]
Se o Poder Público não dispõe do medicamento e tendo o médico, mesmo que particular, afirmado que é necessária a sua administração, como forma de fazer frente à moléstia, o Judiciário deve ser sensível e tratar da questão de forma a proteger os princípios constitucionais próprios, dirigidos essencialmente à vida, à saúde e acima de tudo a dignidade do ser humano.
Presente, portanto, a verossimilhança do direito alegado, bem como o risco de dano irreparável ou de difícil reparação, tendo em vista a gravidade da doença que acomete a representada.
Por isso, entendo que deve ser fornecido o medicamento a bem de resguardar o princípio constitucional que cuida da saúde e direito à vida, para tentar reverter o câncer ou garantir mais um tempo de sobrevida à agravante.” (23)
A questão jurídica e social em discussão se resume na escolha entre duas opções: a) admitir a concessão de medicamentos ao cidadão idoso e carente, por decisão do Poder Judiciário e diante da omissão do Estado, observando-se o direito à saúde, à vida, à dignidade da pessoa humana; ou b) aceitar que a prestação dos serviços de saúde depende exclusivamente do estabelecimento de políticas públicas pela União, Estados-Membros e Municípios, com previsão orçamentária, e que o Poder Judiciário não pode interferir em tal esfera.
O presente estudo indica que o Poder Judiciário fez a sua opção, e vem desempenhando o importante papel de concretizar, nos casos concretos, o direito à saúde, diante da reconhecida omissão da Administração Pública em efetivar esse direito fundamental da população, especialmente de sua parcela mais carente.
Doutor em Educação pela Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho UNESP. Mestre em Direito Negocial pela Universidade Estadual de Londrina UEL. Professor de Direito. Advogado
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