Resumo: Este trabalho é fruto de leituras e discussões norteadas ocorridas no decorrer da disciplina “Meio Ambiente, Sociedade e Desenvolvimento”, do Programa de Pós-Graduação em Recursos Naturais (CAPES 5) da Universidade Federal de Campina Grande, e trata-se de uma resenha dos capítulos: 1 – “Histórico, Fundamentos Filosóficos e Teórico-metodológicos da Interdisciplinaridade” de autoria de Alvarenga et al., e presente no livro “Interdisciplinaridade em ciência, tecnologia e inovação”, organizado por Philippi Jr e Silva Neto, (2010); 2 – “Complexidade, Interdisciplinaridade e Saber Ambiental” de autoria de Leff, (2006) em seu “Epistemologia Ambiental”; 3 – “Marcos Conceituais para o Desenvolvimento da Interdisciplinaridade” de Floriani, em “Interdisciplinaridade em ciências ambientais” de Philippi Jr et al., (2000); 4 – “A Relação Interdisciplinar: Problemas e Estratégias”, 5 – “O Meio Ambiente: Questões e Perspectivas para a Pesquisa” e 6 – “Gestão de Recursos Naturais: Fundamentos Teóricos de um Programa de Pesquisa”, textos presentes em “Gestão de recursos naturais renováveis e desenvolvimento: novos desafios para a pesquisa ambiental” de Vieira e Weber, (2002). Todos os textos tratam de discussões atuais e pertinentes acerca do tema Interdisciplinaridade e de sua inclusão em diversos cenários crítico-científicos de implicações para a humanidade e o mundo.
Palavras-chave: Interdisciplinaridade, Educação, Sociedade
Abstract: This work is the result of guided readings and discussions that took place in the subject “Meio Ambiente, Sociedade e Desenvolvimento”, of the Programa de Pós-Graduação em Recursos Naturais (CAPES 5) of the Universidade Federal de Campina Grande, and it is a critical review of the six chapters in four books written and arranged by renowned authors. All texts dealing with current and relevant discussions about the issue of interdisciplinarity and their inclusion in various educational settings and critical-scientific implications for humanity and the planet.
Keywords: Interdisciplinary, Education, Society
Sumário: 1.Introdução. 2. História e alicerces filosóficos e teóricos da interdisciplinaridade. 3. Balizas conceituais para o desenvolvimento da interdisciplinaridade e do saber ambiental. 4. A relação interdisciplinary: perspectivas, problemas e estratégias para a pesquisa. 5. Conclusões. Referências bibliográficas.
1. Introdução
A interdisciplinaridade surge no século XX como um esforço de superar o movimento de especialização da ciência e sobrepujar a fragmentação do conhecimento em diversas áreas de estudo e pesquisa. A ciência, no século XX, tornou-se especializada ao ponto de não ser mais possível realizar o movimento pretendido quando do inicio da especialização, que era chegar ao micro para conseguir ver o todo de forma plena e completa, e também, chegou-se ao ponto em que em algumas áreas não era mais possível continuar aprofundando no conhecimento, tendo chegado ao limite do que era possível a determinadas especialidades pesquisar.
Então a interdisciplinaridade surge como proposta para a realização do movimento inverso, partir do micro e retornar ao todo. Desse modo, com a tentativa de aplicação da interdisciplinaridade na ciência, surgem novos comportamentos e termos como multidisciplinaridade, pluridisciplinaridade, transdisciplinaridade, dentre outros, e também novas disciplinas agregadoras, que unem áreas específicas do conhecimento a fim de compreender fenômenos que seriam incompreensíveis com os conhecimentos de apenas uma área, como é o caso, por exemplo, da bioengenharia, que une as áreas da biologia e engenharia a fim de dar conta de estudos que uma ou outra disciplina sozinha não daria conta. Sendo assim, o presente trabalho traz posicionamentos desse autor em relação a alguns textos que norteiam a evolução do conceito e das práticas interdisciplinares em nossa realidade.
2. História e Alicerces Filosóficos e Teóricos da Interdisciplinaridade
Para Alvarenga et al. (2010), a chamada tecnociência é ambivalente e que essa ambivalência e seus benefícios e riscos deve-se a ausência de auto-reflexão por parte dos tecnocientistas e à concentração, na esfera político-econômica, do poder gerado por essa modalidade científica”. Quanto à questão da ausência de auto-reflexão, entende o presente autor que para o modelo de pensamento atualmente imperante, que, infelizmente, visa atender interesses cada vez mais restritos e gananciosos, a auto-reflexão seria em alguns casos até mesmo “prejudicial” e menos rentável, e reduziria as chances de “progresso” do saber, pois, não é implícito que grande parte do chamado “conhecimento científico” produzido nos últimos tempos, tenha tido sua essência desviada para atender objetivos de grupos socioeconômicos detentores das ferramentas de ascensão do conhecimento.
Por outro lado, como desvincular a tecnociência dos poderes sócio-políticos e econômicos, considerando que a pedra angular que sustém os mais elevados índices de investimento em modernização e “qualidade” das pesquisas técnicas e científicas provém exatamente desses âmbitos. Esse desenlace seria catastrófico no que diz respeito ao constante “avanço” do saber, pois, o direcionamento de domínio funciona, erroneamente, na visão do presente autor, mas funciona, para tornar constantes e crescentes os investimentos em conhecimento, mesmo que esses investimentos sejam direcionados, muitas das vezes, apenas à determinadas áreas do saber, e não distribuídos de forma equitativa.
No que diz respeito ao paradigma hegemônico que preside a ciência moderna, mencionado também pelos autores supracitados, este vem, ao longo dos séculos, restringindo o conhecimento apenas àquele que é alcançado sob aparato metodológico, na desculpa de garantir a liberdade crítica pautada apenas na razão formalmente lógica e na dissolução das complexidades na “singeleza” dos processos investigativos científicos. A grande questão que o presente autor coloca é: Para quem essa “liberdade crítica” é garantida, uma vez que a apropriação do método vem destinando-se historicamente ao usufruto de instituições que miram, muitas vezes, a ascensão, com consequente subjugo dos desacordes ou daqueles que não são resguardados pelas mátrias paredes dessas instituições. O que dizer da “liberdade” crítica daqueles que, mesmo exatos e precisos metodologicamente em suas afirmações e conclusões, tiveram que retratar-se ante o tirânico despotismo da passada maioria que se achou “pensante” ou da minoria hegemonicamente compressora, como se nos rememoram os exemplos pretéritos. Essa provavelmente não é a liberdade crítica que se buscava ao propor-se e usar-se inicialmente o método como ferramenta.
Regressa-se assim, outra vez a uma etapa do conhecimento onde a mítica crença de liberdade e equivalência do conhecimento torna-se mais intensa e o dogma do método monopólico volta a imperar. O mítico torna-se mais intenso, pois, constantemente no meio acadêmico conta-se a fábula de que o “método científico” é a única ferramenta de que dispõe-se para entender os processos que circundantes e responder impecavelmente as indagações levantadas, sendo terminantemente proibida a utilização de sensibilidade, percepção, aguçamento, intuição, […], ou de quaisquer outros sentidos investigativos, sob pena de ter-se a averiguação servindo de chacota ou escárnio ante os paradigmáticos mestres e os colegas pupilos. Sendo assim, nasce o que este autor chama de o “dogmatismo esclarecido da ciência”, onde é “queimado” qualquer pesquisador que se opõe ou critica o domínio do método sobre o misticismo, o empirismo, a filosofia ou a religião, na tentativa de explicar fenômenos ou resolver até mesmo os problemas que o próprio método se abstém de enfrentar.
Dito isso, não cabe mais apenas saber onde e quando a chamada “ruptura epistemológica” entre a ciência e o restante ocorre. Se no século XIII com a Igreja, se no século XVII com o desenvolvimento do Capitalismo, se em qualquer outro período. Na mínima concepção deste autor, crê-se que a história da ciência dá-se em uma evolução contínua, mas, não desvinculada da economia, política, sociedade e cultura. E se realmente esse corte epistemológico levou essa ciência a tantas dicotomias perniciosas, preferível mesmo seria a eterna manutenção dos antigos modelos cognitivos considerados pelos servos do método como tão estúpidos e inconcebíveis.
3. Balizas Conceituais para o Desenvolvimento da Interdisciplinaridade e do Saber Ambiental
Percebe-se nos textos de Leff (2006) e Floriani (2000) a abordagem da temática “Complexidade, Interdisciplinaridade e Saber Ambiental” e a ideia de uma crise da civilização, perceptível graças ao fracionamento do saber e à degradação da natureza. Este autor concorda quanto ao entrelaçamento dessa crise aos fatores ambientais e intelectivos, entretanto, vê-se essa teia como mais emaranhada a fatores sociais, culturais e econômicos – Socioculturais, pois, a inversão de valores éticos e morais e a aculturação imposta pelos sistemas e alianças dominantes, tem minado o bom senso e a sanidade reflexiva das recentes gerações, alienando e abafando valores individuais. E Econômicos, pois, os pilares da crueldade capitalista têm transformado de forma geral a noção de felicidade, manipulando-a para que só alcance-se esse ápice de satisfação com o atendimento imediato e pleno da fascinação consumista e do intenso desejo desperdiçador, dilapidador e pródigo.
O que fazer então para moldar-se uma nova consciência realmente atenta às complexidades, que é tão necessária nesse mundo onde o caos tem se estabelecido? A grande pergunta é se investimentos pesados em educação mudariam esse quadro. Sinceramente este autor preocupa-se com isso, porque a ideia que se tem em relação à educação em nossa sociedade é a de atribuição e transferência de exemplificações e responsabilidades por parte de muitas instituições familiares (e quando se coloca educação aqui, quer-se restringir inicialmente a instituição “Escola”). Avançando ainda nesse ponto, outro problema esbarra conosco: é o modelo de “educação” tecnicista e mecânica, onde acabam-se gerando andróides e papagaios que repetem os processos ou as palavras sem um milésimo de cogitação crítica. Esses sujeitos educados acabam sendo apenas mais alguns muitos alimentadores do sistema em crise, sem nenhuma capacidade de refletir sobre o papel do ser humano em sua sociedade/natureza, natureza/economia e economia/sociedade. Daí a verdadeira importância das discussões acerca da Interdisciplinaridade e de sua cogente implementação, não apenas em rodas de intelectualmente elitizados e descrentes acomodados, mas, desde a base do saber e ao longo de todas as etapas do desenvolvimento intelecto-crítico da multidão de indivíduos, ou seja, desde cerne da educação básica.
Chaga-se assim a outro ponto polêmico: será mesmo que debates ideológicos e mudanças individuais na base social, no coração democrático que é a massa populacional vão surtir o efeito necessário, ou esses diálogos e essas mudanças devem partir de cima, das instituições para que realmente sejam viáveis. Por outro lado, para que mudanças partam, seja de cima ou de baixo, antes, devem-se despertar os envolvidos, tanto os superiores quanto os inferiores o mais rápido possível.
Este autor acredita que as instituições já vêm percebendo toda a problemática, pois vê-se as mudanças de marketing e o deixar transparecer uma consciência mais verde, menos sanguessuga e de aparente boa índole das corporações capital-exploradoras. Supõe-se assim, que essa mudança comportamental maiormente enganadora e gananciosa só é possível, graças à tomada de consciência em relação à “crise da civilização”, nesse sentido, consciência é consciência, mesmo que ela seja cauterizada, não comovida e/ou hedonista.
Há ainda recorrentemente a falta de uma discussão mais calorosa acerca dos que fazem as políticas governamentais. Não consegue-se vislumbrar uma efetividade interdisciplinar que abrolhe apenas de acadêmicos, e como este autor crê no regime democrático genuíno, pensa que as políticas governamentais deveriam ser os principais gatilhos do pensamento coletivo, uma vez que estas detêm em si um inerente caráter múltiplo, que em suas subdivisões abarca aspectos técnico-científicos, educacionais de base, econômicos, sócio-populares. Deve-se considerar a força da democracia (não essa pseudo-democracia que permiti-se que se instale e se mantenha na nação, como meros espectadores avessos à política cotidiana, mas, que levantam bandeiras hipócritas e interesseiras no período eleitoral), porém, na democracia onde têm-se voz ativa e onde realmente o povo escolhe seu futuro, por isso, deve-se tentar enxergar esse sistema governamental de forma sadia, não para que atinja-se uma “Dominação Afetiva” citada por Maquiavel, ou para chegar-se ao Socialismo sem ditaduras ou à Comuna utópica de Lênin, mas, simplesmente para que consiga-se ter e proporcionar às futuras gerações uma vida mais digna e feliz.
4. A relação interdisciplinar: perspectivas, problemas e estratégias para pesquisa
Segundo Vieira e Weber, (2002) faz-se cogente o emprego de atitudes interdisciplinares nas diversas áreas do saber. O principal problema enfrentado pelos que defendem essa necessária implementação é a falta de evolução intelecto-crítica e o “dogmatismo científico” que já mencionado em trechos anteriores deste trabalho. Essa insistência por parte de alguns em sumarizar os processos e inter-relações inerentes, não só às perspectivas educacional, ambiental, etc., mas aos diversos aspectos cotidianos da vida, advém, segundo o presente autor, do receio de enfrentar-se os riscos do novo, mesmo em face da imprescindível obrigação de ação e mudança dos velhos padrões. As derivações de foco, o senso comum, que nem é tão comum assim, a repetição de debates e posicionamentos, acabam tornando-se, em face do cenário atual, ousadias necessárias e bem vindas para a “cura” dessas mazelas da conveniência, do comodismo e da vaidade, mesmo que tragam consigo parasitas atrelados, afinal, até sanguessugas já foram usados na medicina.
Na visão deste autor, a principal ambição da interdisciplinaridade deve ser a inicial “anarquia científica”, com a perturbação das normas, dos costumes e das castas ou classes nocivas ao desenvolvimento da ciência nos moldes hoje aguardados. Essa é a visão, pois esse episódio poderia ser um meio para que o poder do conhecimento pudesse realmente servir para gerar o retorno, não apenas esperado, mas indispensável, e não apenas para determinar a temperatura do termostato de condicionadores de ar, a densidade de espumas de poltronas ou o saldo de contas bancárias de tantos nobres doutores.
Existe a real possibilidade de encontrar-se respostas em longo prazo para solucionar as tantas e presentes questões; mesmo que não veja-se a concretização dessas soluções a curto prazo; incluindo nas discussões dessa busca características de complexidade coletiva e deixando de lado a visão binocular focada apenas no ponto em questão, para passar-se a ver por várias perspectivas e com uma amplitude maior, com vários olhos juntos num só propósito. Deve-se sempre pretender continuar com o incômodo ao comodismo, desejando ainda mais gerar mal estar à mera especulação científica, e para isso, precisa-se continuar participando das velhas rodas de diálogo, só que agora, com novas argumentações. Dentre elas:
Se as questões educacionais são tão plenas e amplamente possíveis de serem trabalhadas de forma tão diversa, por que insiste-se em trabalhá-las pragmaticamente, restringindo-se a ver apenas o ponto central dos questionamentos e não relacioná-los aos contextos que lhe cercam. Esse pragmatismo e o medo de perder-se a identidade disciplinar têm peado o avanço de muitos cientistas verdadeiramente importados com um futuro viável, equilibrado, digno e justo.
Por que as percepções daquilo que aparenta-se subjetivo, mesmo devendo ser, em alguns casos consideradas, não costumam ser atraentes, em face de suas potenciais contribuições? Desse modo, jamais consegue-se enxergar os vários fenômenos ou situações concomitantes dentro do fenômeno ou situação analisada inicialmente. Esse é mais um entrave.
Por fim, como pode-se ainda insistir em buscar soluções macroscópicas para problemas que atingiram níveis gigantescos por não serem remediados a nível inicial? Como se atinge uma sociedade sem tocar os indivíduos que a compõe? Como atingir instituições influentes e influenciadas pela socioeconomia sem tocar as pessoas? É preciso que haja uma descontaminação dessa presunção, dessa soberba, e passe-se a encarar o que antes foi considerado pequeno e sem importância, como peça fundamental, como pedra angular da estrutura científica, só assim conseguir-se-á manter de pé as ruínas que se restam de nosso sistema educacional, de nossa quebradiça capitalização e de nossa decadente coletividade social que anda manquejando graças a sua própria parcimônia e inércia.
5. Conclusão
Muitas são as possibilidades quando se trata da interdisciplinaridade, mas, muitos também são os desafios. A interdisciplinaridade oferece uma nova postura e uma mudança de atitude diante do conhecimento e em busca do ser como pessoa integral, visa ainda garantir a construção de um conhecimento globalizante, rompendo com os limites das disciplinas.
Como todo caminho privilegia uma direção em detrimento de outras, espera-se ter contribuído no sentido de oferecer alguma orientação para que os caminhos da interdisciplinaridade sejam trilhados conscientemente.
Biólogo, Mestre em Recursos Naturais da Universidade Federal de Campina Grande, Centro de Tecnologia e Recursos Naturais/ UFCG. Membro do Grupo de Pesquisas em História, Meio Ambiente e Questões Étnicas da UFCG
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