Resumo: Liberdade e contrato no âmbito da atividade empresarial. O tema liberdade contratual desafia, inicialmente, dois pontos básicos, que se constituem em verdadeiros pressupostos para o estudo do assunto: o da livre iniciativa e sua relação com a liberdade de empresa; e a livre iniciativa e seus liames como princípio da dignidade da pessoa humana. Quando se faz referência à liberdade de iniciativa, não se pode olvidar que ela está inserida em um contexto maior, o do direito à liberdade. Assim, neste mapa maior em que estão contidas a liberdade de locomoção, circulação, pensamento, profissão, entre outras, evidencia-se existente a liberdade de iniciativa econômica. Este não é somente um princípio institucional de direito econômico inserto na Constituição, mas representa verdadeiro direito subjetivo, cujas restrições jamais poderão comprometer a extensão e alcance do conteúdo essencial do direito.
Palavras-chave: Livre iniciativa. Liberdade de Empresa. Contrato. Atividade Empresarial.
Sumário: introdução. 1. Livre iniciativa (liberdade de empresa) como direito fundamental. 2. Liberdade de iniciativa (negocial) e dignidade da pessoa humana. 3. Liberdade pré-contratual. 3.1 Boa-fé objetiva na fase pré-contratual: a responsabilidade pela ruptura das negociações. 3.1.1 Fundamentos da boa-fé objetiva. 3.2. Característicos de Negociações como Relação Jurídica Obrigacional; 3.3 Responsabilidade Pré-contratual por Ruptura de Negociações. 4. Liberdade contratual. 4.1 Efeitos externos do contrato. 4.2 Autonomia da vontade. 4.3 Principiologia clássica. 4.4 Novos princípios do Direito contratual. 4.5 A responsabilidade contratual. 4.5.1 A culpa e o risco: fundamentos da responsabilidade civil. 4.5.2 Aspectos distintivos entre responsabilidade contratual e extracontratual. 4.5.3 Pressupostos da obrigação de indenizar. 4.5.3.1 A falta de prestação e sua ilicitude. 4.5.3.2. A presunção de culpa. 4.5.3.3. O dano. 4.5.3.4 O nexo causal. 5. Liberdade pós-contratual. 5.1 Teoria dos deveres de consideração. 5.2. Espécies de deveres de consideração incidentes na fase pós-contratual. 5.2.1 Espécie de deveres de consideração. 5.2.2 Dever de proteção. 5.2.3 Dever de informação. 5.2.4 Dever de lealdade. 5.25 Dever de sigilo. Conclusões. Referências bibliográficas.
INTRODUÇÃO
O tema liberdade contratual desafia, inicialmente, dois pontos básicos, que se constituem em verdadeiros pressupostos para o estudo do assunto: o da livre iniciativa e sua relação com a liberdade de empresa; e a livre iniciativa e seus liames como princípio da dignidade da pessoa humana.
1 A livre iniciativa (liberdade de empresa) como direito fundamental
Quando se faz referência à liberdade de iniciativa, não se pode olvidar que ela está inserida em um contexto maior, o do direito à liberdade. Assim, neste mapa maior em que estão contidas a liberdade de locomoção, circulação, pensamento, profissão, entre outras, evidencia-se existente a liberdade de iniciativa econômica. Este não é somente um princípio institucional de direito econômico inserto na Constituição, mas representa verdadeiro direito subjetivo, cujas restrições jamais poderão comprometer a extensão e alcance do conteúdo essencial do direito[1].
É através do exercício do direito à liberdade[2] que se obtém o livre desenvolvimento da personalidade humana, instrumento fundamental para a consolidação do Estado Democrático de Direito preconizado na carta constitucional vigente[3].
O cerne do direito constitucional à liberdade reside na “libertad de hacer y omitir lo que se quiera, es decir, la libertad de elegir entre alternativas de acción”[4]. Em síntese, na chamada liberdade negativa em sentido amplo[5].
Ao optar o direito brasileiro por um regime capitalista liberal[6], inseriu a livre iniciativa como princípio fundamental da República Federativa do Brasil[7]. Não obstante, não se pode pensar em um liberalismo econômico nos moldes do século XIX e do início do século XX, pois naquela época o modelo de Estado era o Liberal . Na medida em que passou a existir uma preocupação crescente de ordem social, deixou de ter o Estado um modelo de puro liberalismo para aceitar um tipo social. Data exatamente desta época, ou seja, motivada pela transição do Estado Liberal para o Social a preocupação com o reconhecimento da existência de um princípio assegurador da liberdade de comércio e indústria[8].
Assim, quando se tem em mente o princípio da livre iniciativa este “há de ser entendido no contexto de uma Constituição preocupada com a Justiça Social e com o bem-estar coletivo”[9]. Destarte, as limitações à livre iniciativa devem ser justificadas por um valor constitucional mais relevante que se busca preservar, bem como pela ausência de meio menos oneroso para o caso concreto. O fato é que “o legislador tem de se basear num outro valor constitucional que imponha a restrição do direito fundamental. Se esse valor não existe, ou não existe tanto quanto o legislador alega, então a restrição não é legítima e viola o conteúdo essencial do preceito constitucional que garante a liberdade de empresa privada”[10].
Essa idéia de Justiça Social encontra-se presente quando a Constituição revela seus objetivos fundamentais em seu artigo 3º[11]. Nestas finalidades precípuas percebe-se, claramente, a presença da liberdade de iniciativa, pois não se pode negar que construir uma sociedade livre, justa e solidária; garantir o desenvolvimento nacional; erradicar a pobreza e a marginalização e reduzir as desigualdades sociais e regionais; bem como promover o bem estar de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação, passa por um necessário desenvolvimento econômico e este somente pode ser alcançado, de forma democrática, através da liberdade de iniciativa.
Esta atuação do Estado na economia, visando a preservar a Justiça Social, até porque subsidiária [12], não é incompatível com um regime de livre iniciativa [13].
Esclareça-se, por fim, que a livre iniciativa não compreende, tão-somente, a de empresa, também chamada de comércio ou indústria[14], mas, igualmente, a de contrato[15], possuidora, também, de indiscutível caráter constitucional[16].
Assim, esta liberdade negocial, corolário da autonomia privada, tem sua origem na necessidade de autogestão dos interesses privados, conduzidora à auto-responsabilidade pelos atos praticados no exercício deste direito e, por outro lado, os seus limites e justificativa na tutela da confiança.
Frise-se, porém, que a visão de contrato não é mais aquela decorrente da ótica clássica, ou seja, também se amoldou a este novo enfoque social.
Assim, com a alteração da posição econômica do Estado, dando o liberalismo vez a um Estado Social, “em lugar da vontade, tem surgido um elemento estranho à composição original: o interesse social. E assim o suporte fático do contrato se torna mais complexo, cheio de elementos necessários à sua complementação. Às vezes, a vontade se vê substituída pela conduta do particular, sendo indiferente se é voluntária ou não”[17].
“Na sociedade moderna, a liberdade contratual passou a ser unilateral. Via de regra, a parte economicamente mais forte impõe à outra as condições da contratação, deixando-lhe apenas a alternativa entre ‘pegar ou largar’ (take it or leave it)”[18] .
Surge assim um Estado Social em que o interesse coletivo passa a preponderar, surgindo aquilo que JEAN CARBONNIER chamou de lei da socialização do contrato[19].
Destarte, “o suporte fático do contrato se torna mais complexo, cheio de elementos necessários à sua complementação. Às vezes, a vontade se vê substituída pela conduta do particular, sendo indiferente se é voluntária ou não.
Os princípios fundamentais do contrato não conseguem ter mais uma aplicação generalizada. O Estado social desconsidera noções como consentimento, intangibilidade do contrato, força obrigatória do contrato. O esquema contratual clássico que se configura na oferta e na aceitação também não se aplica na maioria das novas categorias contratuais”[20].
Percebe-se, assim, que as modificações na concepção liberal decorreram da necessidade de que a autonomia da vontade não fosse utilizada como forma disfarçada de consagrar o poder do forte sobre o fraco. Assim, preservar a igualdade das partes, bem como o real querer delas, é função inafastável do Estado legislador, até porque “o interesse fundamental da questão da função social está em despertar a atenção para o fato de que a liberdade contratual não se justifica, e deve cessar, quando conduzir a iniqüidade, atentatórias de valores de justiça, que igualmente têm peso social (sic)” [21].
Isto tudo fez com que a visão da teoria geral do contrato sofresse inúmeras mutações, situação que refletirá nas novas respostas dadas pela doutrina e pelos tribunais aos problemas surgidos no dia a dia.
2 Liberdade de iniciativa (NEGOCIAL) e dignidade da pessoa humana
Não se pode ter a ilusão – fruto certamente de um pensamento clássico – que a liberdade de iniciativa, principalmente na sua especificação negocial, tem por fundamento um conteúdo exclusivamente econômico. Na verdade, mesmo as relações contratuais cujo enfoque patrimonial é obrigatório e conceitual[22]/[23] devem ser vistas sob o ângulo da primazia da pessoa humana como protagonista das relações sociais[24].
O direito fundamental à liberdade[25] sofre indissociável apego à dignidade, pois a liberdade humana freqüentemente se debilita quando o homem cai em extrema necessidade. Assim, quanto maior for a proteção à dignidade, maior será a liberdade real.
Ninguém poderá negar que com o advento do Estado Social, a visão de direitos individuais e, sobretudo, do papel do Estado, cambiou de sentido. O enfoque dos direitos subjetivos, ou seja, da chamada facultas agendi, passou a ser encarado, em alguns casos, até como direito objetivo. A indisponibilidade alterou até mesmo a idéia de autonomia.
Preocupação clara com o problema teve a Constituição Italiana[26], pois em seu artigo 41 disciplinou que “a iniciativa econômica é livre. Ela não pode se desenvolver em contraste com a utilidade social ou de uma forma que possa acarretar dano à segurança, à liberdade, à dignidade humana”[27].
Esta imprescindível inquietação com a dignidade da pessoa humana no âmbito negocial se manifesta em diversas situações. Um dos flagrantes temas a respeito é o reconhecimento da função social do contrato em que se atua, v.g., para limitar o poder do forte sobre o fraco; intervindo o Estado com normas imperativas; buscando-se evitar a onerosidade excessiva dos negócios jurídicos, sempre atento para a alteração das circunstâncias, entre outros aspectos[28].
Diante disso, é que a liberdade contratual, apesar de direito fundamental, deve ceder a outras liberdades mais importantes, pois a liberdade de exprimir o pensamento, de trabalhar, de se alimentar convenientemente, de se instruir e de morar decentemente são mais importantes que a de firmar contratos. Como frisam STARCK, ROLAND & BOYER[29], pensamento ratificado por NORONHA[30], “a liberdade de contratar, não importando as condições, a que preço, seja com quem for, pode facilmente conduzir a uma asfixia dos outros direitos e liberdades, que são mais importantes para a felicidade de todos e de cada um. Se ao preço de um certo abandono da liberdade contratual, aumentarmos a eficácia dos outros direitos e liberdades, o balanço será ainda positivo e benéfico”[31]. Ou seja, assegurando-se a dignidade humana não importa que para isto, aparentemente, retire-se da esfera do indivíduo uma gama de sua liberdade contratual. Limita-se a liberdade para aumentar a igualdade. Diminuída a desigualdade, aumenta-se a liberdade real.
Assim, quando classicamente se mencionava como limitação à liberdade contratual a ordem pública, é evidente que em tal concepção deveria ser lida também como respeito à dignidade da pessoa humana. Mas não era. Tanto isto é verdade que a histórica demonstra os abusos cometidos nas relações negociais, em que imperava o poder do forte sobre o fraco. Sai-se, porém, deste período de liberdade e propriedade, para uma época em que as bases dos direitos fundamentais passam a ser a liberdade e a dignidade.
A infração, mediante o exercício da liberdade negocial, à dignidade da pessoa humana pode se dar diretamente ou com o consentimento do lesado, nesta hipótese especialmente através de atos voluntários de disposição de direitos. Estas situações devem ser analisadas casuisticamente de maneira a verificar se trata de renúncia à dignidade humana – que é vedado – ou de adaptação ao interesse particular do seu sentido e conteúdo.
Jorge Reis NOVAIS[32], defendendo posição idêntica à de DÜRIG, adaptando fórmula kantiana, deixa claro que a dignidade “será heteronomamente violada quando a pessoa for degrada ao nível de uma coisa ou de um objecto do actuar estatal, na medida em que deixe de ser considerada um autónomo, para ser tratada como instrumento ou meio de realização de fins alheios. Por sua vez, será violada, mesmo com o consentimento do lesado, quando este anua na destruição ou anulação das condições de sua auto-determinação futura, ou aceite colocar-se numa situação que iniba a possibilidade de continuar a conformar a sua vida de acordo com planos pessoais livremente concebidos, na medida em que isso signifique uma degradação, sem possibilidades de correcção, ainda que voluntário, ao nível de um objecto heteronomamente determinado”.
O que ocorre de fato, é que a interpretação do princípio da dignidade humana quando em confronto com o exercício da autonomia privada, deverá ser feita a partir do Direito Privado. Ou seja, utilizando-se dos fundamentos privatísticos, negociais no caso, chegar-se-á à melhor resposta para a preservação das garantias constitucionais. Assim, sempre que os princípios fundamentais do direito dos contratos restarem objetivamente violados, vistos estes sob o enfoque do personalismo ético, não restará nenhuma dúvida que o princípio da dignidade da pessoa humana igualmente foi maculado[33].
Destarte, no âmbito do direito das obrigações, constitui-se em pressuposto genérico de validade das relações jurídicas negociais[34], total ou parcialmente[35], o respeito à dignidade da pessoa humana[36], seja de alguma pessoa em especial, seja do ser humano genericamente. A presença deste princípio, no caso concreto, dá-se pela visualização da boa fé objetiva, verdadeiro cerne da dignidade no âmbito negocial[37].
3 LIBERDADE PRÉ-CONTRATUAL
3.1 BOA-FÉ OBJETIVA NA FASE PRÉ-CONTRATUAL: A RESPONSABILIDADE POR RUPTURA DAS NEGOCIAÇÕES
3.1.1 Fundamentos da Boa-fé Objetiva
O art. 422/CCB estabelece que “os contratantes são obrigados a guardar, assim na conclusão do contrato, como em sua execução, os princípios de probidade e boa-fé”. Deste mandamento, destaca-se o atributo da boa-fé relacionado no gênero, uma vez se tratar de categoria jurídica que subdivide-se em subjetiva e objetiva.
A boa-fé subjetiva está para os aspectos internos, da psique, do agente contratante, ou seja, trata-se de suas crenças, conhecimentos (ou falta destes) que fazem, ou não, as convicções do mesmo. Em outros termos, a boa-fé subjetiva pode ser traduzida como a falta de conhecimento de situação qualquer que pode afetar os interesses do contratante. Nas palavras de César Fiuza[38], “quem compra e quem não é dono, sem saber, age de boa-fé, no sentido subjetivo”.
Por outro lado, segundo este mesmo autor, a boa-fé objetiva “baseia-se em fatos de ordem objetiva”, ou seja, “baseia-se na conduta das partes, que devem agir com correção e honestidade, correspondendo à confiança reciprocamente depositada”. Esta confiança deve estar pautada em elementos objetivos que caracterizam a conduta da parte adversa.
Importante destacar que a raiz do princípio da boa-fé objetiva é a dignidade humana, “da qual decorre a necessidade elementar de respeito à pessoa e à sua dignidade. A dignidade da pessoa (sic) humana […] constitui valor máximo no ordenamento jurídico brasileiro, uma vez que a Constituição Federal de 1988 a erigiu a fundamento do Estado, nos termos do art. 1º, III, e, portanto, de toda a ordem jurídica”[39].
Depreende-se, portanto, que a concepção de dignidade humana implica na obrigatoriedade de pautar-se em conduta honesta para tratar de qualquer negócio jurídico, seja para com o outro contratante, ou para quem pode ser mediatamente afetado pelo comércio em operação. Referida conduta requer agir com honestidade e transparência, pois é por meio deste comportamento, potencialmente previsível, que se dá ou concebe os indícios e os caracteres de confiança, cujo atributo se faz indispensável para conclusão de qualquer contrato no âmbito do comércio jurídico.
3.1.2. Característicos de Negociações como Relação Jurídica Obrigacional
Fazendo-se um levantamento doutrinário acerca das características que denotam a fase pré-contratual, podemos perceber que há um sem-número de explicações para identificarmos quais são as fases que precedem a conclusão de determinado contrato. Ocorre que este levantamento parece sugerir mais utilidade para fins acadêmicos do que para efeitos da prática de mercado propriamente dita.
Karina Nunes Fritz aborda a questão da culpa in contrahendo sob o viés do Direito comparado demonstrando variados aspectos jurídicos no trato de negociações que acabam por se estabelecer como relações obrigacionais.
Para exemplificar, esta autora destaca alguns momentos em contatos negociais que podem ser considerados, conforme o caso, para efeitos de responsabilidade pré-contratual, quais sejam: i) negociações preliminares; ii) preparação do contrato; e, iii) contatos semelhantes aos negociais.
As negociações preliminares seriam caracterizadas pela existência de uma discussão entre as partes, em torno de determinado objeto, com vistas à celebração de um contrato. A preparação do contrato consistiria num contato efetivo com finalidade negocial, cujo momento se difere das negociações preliminares por já se ter em vista os necessários parâmetros do objeto de negociação, ainda que de forma genérica. E, os contatos semelhantes aos negociais sugerem encaminhamento para a conclusão de determinado contrato, todavia há grandes divergências na doutrina do que sejam estas semelhanças entre contatos negociais e contrato efetivamente concluído[40].
Entretanto, o que se observa na prática de mercado é a adoção de procedimentos ligeiramente diferentes do que se escreve em eventuais doutrinas cujo mote está desconectado do pragmatismo operacional. A fase pré-contratual pode ser construída objetivamente de formas diferentes, conforme queiram proceder os interessados de determinado negócio. Como exemplo, podemos citar um contrato de traspasse; podemos supor que neste tipo de negociação, as partes se manifestam demonstrando interesse em negociar o traspasse de determinada empresa: para formalizar tais intenções, a primeira questão a ser resolvida entre os mesmos é a necessária confidencialidade que deverá haver entre os mesmos, a fim de que as negociações possam seguir hígidas em seu “livre” curso. Uma vez celebrado o termo de confidencialidade, as partes elaboram e/ou celebram o memorando de entendimentos, o qual guiará as negociações com vistas à conclusão de determinado contrato. E ainda, esta suposta conclusão de contrato pode ser dar de forma parcial no sentido qualitativo, pois, primeiramente, pode-se consumar o ato de traspasse da empresa, para, num segundo momento, comparecerem as partes junto ao INPI para se fazerem as necessárias transferências de propriedades intelectuais, anteriormente registradas.
Percebe-se que, para além das infindáveis discussões acadêmicas acerca do que gera ou não responsabilidade pré-contratual, nos momentos das negociações que precedem eventual conclusão de contrato, os sujeitos (de mercado), num modo geral, fazem suas adaptações necessárias no sentido de formalizar juridicamente um negócio usual, todavia pelo caminho que traduz maior eficácia de resultado pelo viés econômico, pois grande parte dos riscos são previamente analisados e o respectivo planejamento financeiro, que faz adstringência aos objetivos de qualquer negociação, normalmente são bem dimensionados sob o ponto de vista da perspicácia econômica.
3.2. Responsabilidade Pré-contratual por Ruptura de Negociações
Segundo Almeida COSTA, “através da responsabilidade pré-contratual, o que directamente se tutela é a confiança recíproca de cada uma das partes em que a outra conduza as negociações num plano de probidade, lealdade e seriedade de propósitos”[41].
Partindo-se desta premissa, surge o dever de indenizar quando uma das partes das negociações em andamento rompe com as tratativas de forma injustificada. Diante de tais circunstâncias, o dano sofrido pela contraparte, em função do rompimento arbitrário, deve ser reparado. Naturalmente, para que esta reparação seja levada a cabo, alguns requisitos são essenciais para que fique caracterizada tal responsabilidade, quais sejam: i) a existência de negociações; ii) a certeza ou confiança legítima na conclusão do contrato; e, iii) a violação da boa-fé objetiva por meio do rompimento injustificado das negociações. Ainda, segundo Karina Nunes Fritz, “a esses requisitos peculiares da responsabilidade pré-contratual acrescentem-se ainda os demais elementos gerais da responsabilidade civil aquiliana, ou seja, culpa, dano e nexo causal”[42].
A existência de negociações se caracteriza pelas conversações ou formalidades ajustadas sobre o objeto do contrato que ainda será formado. Nesta etapa inclui-se, então, as tratativas iniciais com seu concomitante momento de decisões acerca do que se pretende contratar. Neste sentido, as negociações podem ser verbais ou escritas, conforme queiram ou definam as partes.
O fato de as tratativas nesta fase estarem escritas facilita a comprovação da existência da confiança que se formou entre as partes. A certeza ou a confiança legítima na conclusão do contrato pode ser verificada explicitamente quando se adotam as necessárias formalidades desde o início das negociações. Por outro lado, há que se considerar também que esta confiança pode ser suscitada ainda que as negociações tenham se dado apenas verbalmente. A eficácia de eventuais negociações verbais deverá ser aferida conforme o caso concreto, pois não havendo instrumentos destinados a registrar estas tratativas, a pretensão sobre eventual responsabilidade nesta fase pode resultar frustrada. É por isso que comumente são utilizados “minutas” e/ou “cartas de intenções” (denominados genericamente de punctações)[43] para documentar eventuais negociações, pois podem resultar efeitos com maior eficácia do que por provas testemunhais, por exemplo.
Entretanto, deve-se considerar que a ruptura injustificada das negociações não implica necessariamente em responsabilidade pré-contratual. A violação da boa-fé objetiva que resulta em ruptura injustificada de negociações é aquela caracterizada como sendo ilegítima, arbitrária, intempestiva, sem justa causa, como um comportamento desleal[44]. Neste contexto, pretender obter indenizações em face de um comportamento que diverge da expectativa gerada pela confiança que permeou as negociações havidas entre as partes; parecem justificadas quando os tratamentos formais estão condizentes com a importância e apreço que se relacionam ao objeto em oferta.
Vale dizer, colocar uma robusta empresa (ainda que no sentido meramente jurídico) à venda e partir para negociações sem as necessárias punctações que se praticam neste meio, certamente este despropósito terá por conseqüência a extravagância econômica de um “bem social” cujo prejuízo será imediatamente notório aos protagonistas deste cenário. Em se tratando de negociações relacionadas à atividade empresarial, deduz-se existir significativa preocupação e cuidado no trato preliminar que antecede a conclusão de qualquer contrato.
4. LIBERDADE CONTRATUAL
4.1. EFEITOS EXTERNOS DO CONTRATO
4.1.1 Autonomia da Vontade
Com o advento das codificações no século XIX verificou-se que a concepção individualista do direito também adentrou ao ordenamento jurídico através do instituto da autonomia da vontade, segundo o qual “todo homem é livre e, na medida de sua liberdade, dispõe autonomamente dos seus interesses, tendo assegurada a faculdade de governar sua vontade para estabelecer acordos e obrigações que, nessa dimensão devem ser adimplidos, em respeito à palavra dada”[45].
A autonomia da vontade se fixou, basicamente, em função de duas teorias, quais sejam: a teoria da vontade (interna, psíquica), e a teoria da declaração (vontade exteriormente declarada). O negócio jurídico era tido como manifestação onipotente, causa eficiente, que criava e determinava os efeitos jurídicos pretendidos pelos sujeitos. Pela concepção individualista, o contrato fazia lei entre as partes, o qual deveria ser obrigatoriamente cumprido, e cabia ao Estado (liberal) assegurar estes direitos.
Realmente, o principal efeito do contrato é vincular as partes para consecução do negócio jurídico que foi pactuado; pode-se dizer que tal vinculação equivale à força de lei. Via de regra, o contrato não pode ser modificado ou extinto pela vontade unilateral (a não ser que seja cumprido), mas a principiologia clássica, que engessava o formato contratual, no Estado Liberal, passou a ser flexibilizada por exceções que derivam de estipulação própria em função de eventual consenso, ou que sejam concebidas e/ou adotadas por força de lei; todavia, permanece inderrogável o princípio vinculante do mesmo[46].
A seguir, será feita uma rápida apreciação dos princípios clássicos que regiam a vinculação contratual, quais sejam, a liberdade contratual, a força obrigatória dos contratos, e, a relatividade dos efeitos do contrato.
4.1.2. Principiologia Clássica
Humberto Theodoro NETO[47] relaciona três princípios clássicos, forjados no século XIX, que giram em torno da autonomia da vontade: 1. Princípio da Liberdade Contratual (lato sensu): dá ao indivíduo a garantia de escolher sem desrespeito à lei quando, com quem e o que contratar, segundo sua conveniência; 2. Princípio da Força Obrigatória do Contrato: enunciado pelo brocardo latim pacta sunt servanda, ou seja, o contrato faz lei entre as partes; e, 3. Princípio da Relatividade dos Efeitos do Contrato: o contrato somente vincula as partes, não beneficiando nem prejudicando terceiros.
4.2. Novos Princípios do Direito Contratual
Desde o advento do liberalismo, o contrato apresentou-se substancialmente dinâmico no meio social. Sua aparente estaticidade reflete nada mais que uma leitura restrita do momento que situa a análise, pois a lógica do sistema é autoconfigurar-se em função da constante evolução e adaptações às novas realidades que até então conhecemos. É por isso que o Direito contratual, hoje, está circunscrito em um novo panorama, jamais visto pelas concepções clássicas de relacionamentos econômicos e sociais.
Para melhor ilustrarmos o fenômeno acima descrito, basta verificarmos os fatos históricos que relatam os acontecimentos no mundo. Diante do aumento dos incontáveis negócios jurídicos que se consumam cotidianamente, bem como a transformação da sociedade agrária para uma sociedade eminentemente industrial, capitalista, e consumerista[48], percebemos que o poder público também mudou sua postura diante dos novos fatos econômicos e sociais que, geometricamente, emergiram em nosso meio.
Logicamente, estas transformações não poderiam estar insensíveis ao contexto das iniciativas do poder público, pois o Estado somente se justifica pela sua efetiva atuação preceptiva ao garantismo da viabilidade social. É claro, então, que resta ao Estado, em sentido lato, a ingerência inevitável no poder privado afim de que o mesmo possa ter sob controle os critérios objetivos para a harmonização da vida em comum, seja entre pessoas físicas ou jurídicas.
Uma vez que a autonomia da vontade está relativizada, o contrato deixou de ser um átrio à livre criação negocial dos indivíduos. Hoje, o instrumento de viabilização de negócios jurídicos contempla uma parcela inafastável e inerente à natureza jurídica da função social.
Cláudia Lima MARQUES[49] faz uma complexa análise dos aspectos objetivos atuais da nova teoria contratual. Ao comentar sobre os interesses sociais do consumidor (art. 5.º, XXXII, CF/88), não deixou de tangenciar o mandamento constitucional relacionado à ordem econômica (art. 170, V, CF/88), e contempla, incisivamente, a enunciação havida ao legislador derivado (art. 48 dos ADCT) para a consecução de um diploma que efetivamente satisfizesse a vontade do legislador impressa na Constituição Federal de 1988.
Foi neste contexto que o princípio da função social do contrato ganhou maior relevo na doutrina e na legislação. Para comprovar, citamos, ainda, o art. 421 do Código Civil, o qual diz: “a liberdade de contratar será exercida em razão e nos limites da função social do contrato”.
A autonomia da vontade deixa de ser a única fonte de obrigações pactuada entre partes. A mesma tinha por função, apenas, a auto-regulamentação de interesses próprios, porém, foi delimitada pela lei. Assim, o Direito, agora, é quem oferece o instrumento adequado para que ocorra a auto-regulamentação de interesses particulares, pois a vontade é apenas “pressuposto e fonte geradora das relações jurídicas já reguladas em abstrato e em geral, pelas normas jurídicas.” Assevera a autora que a autonomia privada passou a ser objeto de reconhecimento da ordem jurídica, de forma ativa, e, por conseqüência, é esta quem coloca limites ao exercício da autonomia da vontade.
Esta nova concepção do Direito dos contratos implica numa leitura jamais feita no mundo dos negócios jurídicos. Legislação, doutrina e jurisprudência movem-se para aperfeiçoar os limites da justa distribuição dos direitos e obrigações entre as partes. Nesta perspectiva, os contratos foram inseridos em um processo de reestruturação da eqüidade, o que trouxe uma equivalência prestacional que assegura aos interessados, intrínsecos e extrínsecos, ao contrato, uma proteção objetiva da confiança e da boa-fé.[50]
Desta assertiva, ensina a autora que o Direito acaba por sendo relativizado em seu propósito positivista, e, portanto, dedutivo, enquanto ciência, para reconhecer a influência do social, consubstanciada nas vertentes dos costumes, da harmonia, e da tradição.
Quando o ordenamento jurídico passou a ser manejado sob este enfoque, verificamos que a lógica dedutiva foi preterida face ao caso concreto. Nesta linha de resolução de problemas emerge o pensamento tópico para justificar os meios de proteção à ordem social, uma vez que a sistematicidade do silogismo não mais tem o condão de aperfeiçoar o verdadeiro significado de um contrato no contexto do mundo globalizado. As evidências demonstram as transformações qualitativas da legislação vigente, as quais migraram de contextos mais abstratos para o mais concretos, e dos mais conceituais para os mais funcionais.[51]
Com a superveniência desta dogmática desencadeou-se novas possibilidades para aplicação de princípios contratuais jamais utilizados e conseqüentes resoluções de conflitos. Sob a égide de um novo preceito social, foram re-potencializados os juízes e os doutrinadores, pois, agora, os mesmos, têm maior flexibilidade para atuação quando partem do pressuposto que o caso concreto é, em parte, o objeto do Direito, e não o contrário.
Para que estas premissas fossem colocadas em prática, o ordenamento jurídico não poderia prescindir dos princípios que contemplam a matéria em estudo. Nesta disciplina, os seguintes princípios norteiam a aplicabilidade do sistema no Direito Contratual, a saber: a) transparência; b) boa-fé; c) eqüidade; e, d) confiança.[52]
O princípio da transparência requer uma aproximação sincera na relação contratual entre cliente e fornecedor, ou seja, isenção de reserva mental. Segundo Cláudia Lima MARQUES, este princípio deve significar a precisão das informações sobre o produto ou o serviço objeto do contrato, e a clareza de seus termos deve ser notória para sua celebração. Em as partes agindo assim, estarão demonstrando lealdade e mútuo respeito à relação contratual que estabeleceram.[53]
Os aspectos de oferta do fornecedor, publicidade e/ou propaganda, sejam estes por qual meio for, as especificações que menciona, ou, as condições pelas quais oferece seus produtos e/ou serviços, devem ter por premissa a veracidade das informações, uma vez que as mesmas sujeitam, quem as veicula, a responder por elas na categoria pré-concebida de oferta-contratual. Neste viés, a transparência deve ser evidente, pois este aspecto caracteriza a pré-disposição de cláusulas potenciais ao contrato principal.
Um outro fator importante, senão o mais relevante da principiologia contratual, é a boa-fé objetiva. A doutrina menciona o entendimento deste caracter desde os primórdios do direito natural, o qual foi tratado como princípio geral da boa-fé. Hoje, trata-se de uma espécie de “mandamento […] obrigatório a todas as relações contratuais na sociedade moderna”.[54]
Com o advento da nova teoria contratual, o princípio da boa-fé objetiva ganhou novo relevo com um conjunto de funções até então inerte no ordenamento jurídico, quais sejam: a) passou a funcionar como balizamento para geração de novos deveres, anexos, durante o vínculo contratual; b) passou a limitar o exercício do direito subjetivo, antes lícito, agora abusivo conforme o caso; e, c) consolidou-se como mecanismo de materialização dos pactos, bem como aprimorou a técnica de interpretação dos contratos.[55]
Quando da operacionalização de um determinado contrato, poderá surgir, para os contratantes, deveres outros que não estavam previstos na configuração inicial do objeto do negócio, pois, via de regra, o próprio ordenamento jurídico poderá lhes impor condições adicionais para o aperfeiçoamento do contrato. Neste caso, haverá o suplemento do dever de bem informar, cuidar e cooperar com os aspectos complementares do contrato celebrado.
Relativamente aos limites impostos ao exercício do direito subjetivo, o que se pretende é manter o justo equilíbrio entre as partes, impedindo eventuais abusos, protegendo o devedor de condutas que possam lhe trazer maior risco profissional do que aquele inicialmente previsto como razoável.
No que diz respeito à terceira função, aplicando-se o princípio da boa-fé na leitura e interpretação dos contratos, verificaremos que a relação contratual estará pautada por preceitos de lealdade e respeito para com o outro contratante, e isto possibilita a previsibilidade contínua do comportamento da outra parte, o que é fundamental para o seu aperfeiçoamento.
Podemos perceber que a eqüidade e a boa-fé se complementam para trazer justeza à relação contratual. Diz-se eqüitativo quando há o equilíbrio de direitos e deveres entre as partes, de forma que há a preterição do abuso de direito consubstanciado na subjetividade do ato. Em assim ocorrendo, não haverá a obtenção de vantagens unilateral ou exagerada[56] para quem vende determinado produto ou serviço, pois estes fenômenos são incompatíveis com nova realidade social.
É considerando no novo contexto mercadológico que a função social do contrato aprimorou-se também no quesito confiança. Não fosse este princípio, reconhecido na nova teoria contratual, haveria uma grande dificuldade ao movimento ou transferência das riquezas no mundo, pois seria muito difícil dar legitimidade aos diversos interesses. Salutar, portanto, é o ordenamento jurídico impor-se como regramento legal de condutas e funcionar como “imperativo de seus efeitos”.[57]
4.3. A Responsabilidade Contratual
4.3.1. A culpa e o risco: fundamentos da responsabilidade civil
Preliminarmente, cabe entender a terminologia no sentido comum do que seja responsabilidade. No sentido coloquial de nossa língua, esta palavra nos remete à idéia de guardar e/ou cuidar de alguma coisa ou alguém. Nestes termos, diz-se, então, de quem assim faz, ser o cuidadoso ou o zeloso de sua tarefa. Decorre desta acepção uma conseqüência imediata relacionada ao Direito, qual seja: a ligação da responsabilidade à noção de prestação de contas, de restituição, e de reparação por determinado ato ou fato relacionado a alguma coisa ou alguém. Notemos a implicância da primeira com a segunda acepção do termo: quem faltar com seu dever de cuidado ou de zelo (responsabilidade na primeira acepção) deverá reparar o dano (responsabilidade na segunda acepção).
Assim é a ordem jurídica nos termos inicialmente colocados. Tais assertivas consubstanciam nossa realidade social no que concerne ao nosso dever geral de cuidado. Não devemos cometer ato ilícito, sob pena de sermos compelidos a repará-lo na medida do dano provocado. Tecnicamente, a concepção jurídica de nosso sistema relacionada ao nosso dever de cuidado consiste no fato que se algum ato ilícito for cometido, ou se um dano for causado, o mesmo deve ser reparado, ou seja, haverá responsabilização civil e obrigação de reparar um dano ou um prejuízo causado pela inobservância do devido cuidado.
Importante salientar que ato ilícito abrange tanto o ilícito civil como o ilícito penal. Evidentemente que só se pode falar da existência de responsabilidade civil se verificado, precedentemente, um dano gerado em função de um ato ilícito. Por maior que seja determinado dano, somente se poderá argüir de responsabilidade civil se houve a precedência de um ato ilícito categoricamente identificado.[58]
Para tanto, faz-se a leitura a partir de um ato ilícito objetivamente identificado, afere-se o dano, o qual deverá pairar no plano da existência material e/ou moral, e então, argúi-se, por conseqüência, da respectiva responsabilidade civil, nesta ordem. Ressalve-se o fato de que em tal construção não se verifica a mesma solução para a responsabilidade civil objetiva, pois estamos a fundamentar o tratamento da lógica legal à subjetividade deste instituto do direito civil.
Uma vez chegando-se ao convencimento da existência da responsabilidade civil, há que se cogitar da culpa[59] do agente que cometeu o ato ilícito, e que, portanto, gerou um dano à determinada vítima. A culpa deve ser entendida no sentido amplo, cujo matiz especializa a culpa, no sentido estrito, e o dolo. Vale dizer, a ação humana (esta compreendida no sentido amplo, pois ação em sentido estrito é espécie-contra-par da omissão, ambas pertencentes ao mesmo plano categorial) é predisposta pela vontade do agente, e como tal a doutrina classifica a culpa em vários níveis de gravidade, quais sejam: gravíssima, grave, moderada, leve ou levíssima.
Naturalmente sempre haverá a possibilidade de relativizar o aspecto quantitativo que quer mensurar o intérprete ou o aplicador da lei para classificar a culpa, entretanto, por ora, não podemos perder de vista que a culpa, no sentido estrito, traduz-se pelos caracteres, combinados ou não, da negligência, da imprudência e da imperícia do agente causador do dano. No caso de dolo, o agente quer o resultado da ação ou assume o risco de seu resultado (dolo eventual).
O dano[60] pode ser classificado como gênero do dano material e do dano moral. Naquele, cabe a reparação pela emergência de prejuízos materiais e pela eventual cessação de lucro que possa advir com o fato em si. Neste, a tentativa de reparação consiste numa pretensão de se compensar o sofrimento psicológico da vítima destinatária do dano. Evidentemente que em ambas situações a indenização pecuniária jamais terá capacidade real de tornar efetivamente indene a situação de quem experimentou tais prejuízos e/ou abalos psicológicos, pois as seqüelas são inevitáveis e perdurarão para sempre.
Procura-se, assim, com o instituto da reparabilidade obrigatória através de indenizações, alcançar-se justiça face a um fato que poderia ter sido evitado.
Eliseu FIGUEIRA chama atenção para o fato de que a valorização destes princípios devem levar em conta o atual contexto econômico-social.[61] Segundo o autor, na atual sociedade empresarial, onde os riscos atingem enormes proporções, não há como não individualizar eventuais culpados por danos causados, uma vez que o princípio da culpa está diretamente ligado ao processo de desenvolvimento econômico.[62]
Neste sentido, verifica-se que a atividade empresarial entrelaça-se com operações complexas e, portanto, o problema da responsabilidade deve recair sobre um sujeito-organizacional e não, especificamente, sobre um determinado autor, pois o critério de valorização de interesses está pautado no conceito relacional entre a atividade e o respectivo sujeito que a explora.[63]
Da conjugação analítica dos princípios da ilicitude e da culpa, em função das atividades empresariais, emerge o princípio do risco, o qual está “a cargo do titular dos meios de produção, já que ele deve suportar o dano como risco da empresa”.[64]
O risco[65] é o fundamento que justifica a responsabilidade civil objetiva. A objetividade da responsabilidade consiste na verificação de seus pressupostos, quais sejam: o dano, o autor do fato, e o nexo de causalidade entre o autor e o dano ocorrido. Exclui-se da análise da responsabilidade civil objetiva a variável culpa, pois a lógica deste instituto decorre do risco que assume o agente quando de determinada ação.
Esta objetividade pode ser descartada somente em casos muito excepcionais, e desde que sejam circunstâncias originárias de advento de força maior. Se assim não for, persistirá o liame da causalidade nos termos relacionados.
Esta teoria surgiu em função dos anseios sociais pela transparência na aplicação ou realização de justiça a partir da Revolução Industrial (ou seja, não é herança do direito romano). Inicialmente, foi adotada para proteger os trabalhadores dos acidentes de trabalho, e, posteriormente, estabeleceu-se o instituto do risco para transmissão e distribuição de eletricidade, e para os transportes ferroviário e marítimo.
Com a evolução doutrinária acerca desta teoria, a mesma sofreu algumas variações para efeitos de sua aplicação, com concomitante definição de novas categorias classificatórias. Por exemplo: a teoria do risco administrativo[66] – que fundamenta a responsabilidade objetiva da administração pública; a teoria do risco criado[67] – que fundamenta a responsabilidade objetiva de qualquer empresa pela atividade econômica que exerce, uma vez ser inevitável o risco que cria para a sociedade quando da consecução de seus objetivos sociais; e, a teoria do risco proveito[68] – pela qual se verifica o proveito econômico das empresas pelos riscos que criam, e, portanto, devem assumi-lo.
Devemos observar que o risco administrativo é distribuído à sociedade por intermédio da arrecadação de impostos que a todos se impõe, enquanto que o risco criado e o risco proveito são absorvidos pelos produtos quando da formação do preço de venda, pois são fatores potenciais para eventuais indenizações. No que diz respeito ao risco inerente de qualquer produto, serviço, ou atividade, a responsabilidade civil objetiva é aplicada em função de qualquer incidente ocorrido com os mesmos, pois os danos que causarem não estarão atrelados ao pressuposto da culpa para sua argüição de responsabilidade.
A inauguração da teoria do risco na legislação brasileira se deu com o Decreto n.º 2.681, de 07 de dezembro de 1912, pelo qual se regulamentou a responsabilidade civil das estradas de ferro. Subseqüentemente, o segundo passo dado foi com o advento da chamada Lei de Acidentes do Trabalho, Decreto n.º 24.687, de 10 de julho de 1934. Contemporaneamente, verificamos maior avanço legislado acerca da adoção da teoria do risco, bem como da responsabilidade objetiva através da Constituição Federal de 1988, em seu art. 37, § 6º, pelo qual relaciona a responsabilidade civil do Poder Público. O Código Civil Brasileiro, em seu art. 931, expressa claramente a imposição de tal responsabilidade para empresários e empresas que coloquem produtos em circulação que venham a causar danos aos seus adquirentes.
Relacionado ao Código de Defesa do Consumidor, há uma polêmica pelo fato de o mesmo ter adotado a responsabilidade civil objetiva sem estar fundamentado na teoria do risco, mas esta questão também não contempla o escopo deste trabalho.
4.3.2. Aspectos Distintivos entre Responsabilidade Contratual e Extracontratual
Na seara do Direito dos contratos, conhece-se um brocardo herdado do direito romano que diz: pacta sunt servanda. Por este princípio, diz o adágio, os contratos têm que ser cumpridos. Tal princípio impõe a seguinte pontualidade: que a obrigação seja cumprida ponto por ponto.
O Direito nos impõe a obrigatoriedade de não transgredirmos as leis, bem como nos impõe o dever geral de cuidado. Claro está que estas premissas têm por finalidade responsabilizar o agente pelos danos causados, independentemente da existência de uma relação jurídica entre o autor e a vítima do dano.
Se um dos contratantes não cumpre sua parte, violando alguma cláusula previamente pactuada, indubitavelmente o mesmo estará transgredindo aquele princípio e causando danos à outra parte que esperava o adimplemento. Neste caso, gera-se um desequilíbrio entre prestação e contraprestação, afetando-se diretamente o caráter sinalagmático do contrato. Se o contrato não foi cumprido, haverá a responsabilidade contratual, que se pauta na existência de uma relação jurídica prévia entre as partes. Há transgressão de um dever jurídico específico estabelecido pelo contrato, cujo inadimplemento impõe a reparação dos danos causados.
Porém, se não há tal relação jurídica, a responsabilidade será chamada de extracontratual, ou aquiliana,[69] ou seja, aquela que é atributo de um dano, imputável ao agente, não oriundo de um contrato[70] (todavia verificamos também a característica do dever jurídico preexistente neste tipo de relação).
Observemos o seguinte: Se o agente causa dano a alguém (com o qual não tem qualquer relação jurídica ou contrato preexistente) nascerá, neste caso, a responsabilidade extracontratual, pois violou seu dever geral de cuidado ou o de proibição legal. Verificaremos que sempre haverá este tipo de responsabilidade se determinado dever jurídico não estiver previsto em contrato, todavia estará o mesmo impresso na lei, em sentido amplo.
4.3.3. Pressupostos da Obrigação de Indenizar
4.3.3.1 A falta de prestação e sua ilicitude
Partindo-se da premissa que o contrato tem que ser cumprido, pode-se inferir que todo contrato possui uma essência jurídica que requer do devedor o cumprimento de sua obrigação, uma vez ter o mesmo pactuado com seu credor uma relação desta natureza.
Nas palavras de Roberto Wagner MARQUESI, temos que “o princípio da força obrigatória não está expresso em nosso sistema positivo, mas isso nem é necessário, pois a doutrina o considera um princípio geral do Direito, de caráter universal e transcendente, presente em todas as culturas e equiparável ao honeste vivere”.[71]
Deste preceito, cria-se ao credor uma expectativa de segurança jurídica, pois se houver inadimplemento por parte do devedor, deste vínculo poderá surgir responsabilidade contratual à parte inadimplente relativa ao negócio pactuado.
Para efeitos desta reflexão, devemos considerar que o contrato válido é fruto de vontades conjugadas para consecução de um negócio jurídico, o qual viabilizará a percepção de um resultado previamente vislumbrado pelas partes e formalizado mediante uma proposta.
Assim, o devedor vincula-se ao credor para realizar determinada prestação, a qual é passível de mensuração econômica. Se assim não ocorrer, poderá o credor exercer direito de expropriação do patrimônio do devedor a fim de reparar eventual prejuízo advindo do descumprimento do contrato. Necessário se faz esclarecer que este liame obrigacional une devedor e credor numa relação de coordenação, e não de subordinação.
Os contratos devem conter um ideal de justiça equilibrada entre as partes, e mais, devem estar conforme sua finalidade social. Aliás, Rosalice Fidalgo PINHEIRO, ao abordar a questão da ilicitude na concepção autônoma do abuso de direito, de acordo com o art. 187 do Código Civil, menciona que o ato abusivo pode ocorrer na esfera da boa-fé, dos bons costumes, e no fim social e econômico do Direito.[72]
Traçando um paralelo desta questão maior, para ensaiar a compreensão de ilicitude por falta de prestação em um contrato, temos que tal assertiva está por configurar uma violência contra a segurança jurídica dos contratos, o que implica na falta de cumprimento de sua função social, bem como desrespeita a supremacia da ordem pública. Eis, então, o que caracteriza de forma determinante referida ilicitude.
4.3.3.2. A presunção de culpa
Rememorando os pressupostos da responsabilidade civil, temos que, para argüirmos da subjetividade da mesma, devemos comprovar o dano, apontar o seu autor, demonstrar o nexo de causalidade entre o autor e o dano ocorrido, bem como evidenciar se o agente agiu com imprudência, imperícia ou negligência. Demonstrados estes pressupostos estará caracterizada a responsabilidade civil subjetiva. O que diferencia a responsabilidade civil objetiva é o fato de que o pressuposto da culpa está descartado para caracterização da mesma, não se rescindindo, todavia, dos demais.
Repetindo, o requisito fundamental da responsabilidade civil subjetiva é que somente se pode falar em ilicitude se o agente causador do dano agiu com culpa, caso contrário não se poderá falar em tal responsabilidade. Assim sendo, a regra geral é que somente haverá responsabilidade civil subjetiva se o dano causado foi motivado por um comportamento culposo do sujeito que assim procedeu. Notemos, entretanto, que nem sempre a vítima do dano precisa provar a culpa de seu ofensor, ou seja, nesta hipótese poderá o juiz inverter o ônus da prova ou atribuir culpa pelo instituto da presunção.[73]
Diferentemente do que ocorre pela regra geral, é possível atribuir-se culpa a determinado ofensor sem prévia comprovação da mesma, a qual se denomina responsabilidade civil objetiva. Nesta hipótese, a responsabilidade objetiva não depende de culpa para se argüir do evento danoso, todavia a mesma não pode ser prescindida do “liame de causalidade”.[74]
4.3.3.3. O dano
Dano é o prejuízo patrimonial ou moral suportado por alguém que foi vítima de um ofensor que agiu ilicitamente. Nesta hipótese, haverá a obrigatoriedade da reparação do dano cujo meio será a indenização pecuniária, pois estamos diante de um dano injusto. Este pode, também, ser traduzido pela expressão de lesão a determinado interesse.
Conforme acima mencionado, o dano é gênero dos danos patrimoniais emergentes, bem como do dano moral. O dano patrimonial refere-se aos prejuízos sofridos nos bens materiais e pelo advento de eventual lucro cessante em função do ato ilícito. O dano moral é aquele que se caracteriza pelo sofrimento da vítima, cujo desconforto afeta-lhe o comportamento e seu bem-estar psicológico.[75] Há, ainda, uma corrente doutrinária que classifica uma terceira categoria de dano denominada de perda de chance.[76] Esta estaria paralelamente classificada com danos emergentes e com lucros cessantes. A perda de chance se caracteriza com a oportunidade real e potencial que teria a vítima se não fosse lesionada em sua esfera patrimonial ou moral, do que decorre a impossibilidade de realizar determinado projeto uma vez estar afetada com o infortúnio causado pelo seu ofensor.
Atual e doutrinariamente, classifica-se também o que é chamado de dano reflexo ou dano em ricochete.[77] Nesta circunstância, assim é classificado determinado dano suportado por alguém colocado de forma indireta em relação à primeira vítima, o qual também é reparável por ter atingido pessoa que sofre a comprovada repercussão do dano principal.
Todos os critérios de averiguação e mensuração do dano e de suas respectivas indenizações, ou seja, da verificação de seus pressupostos, objetivação e conseqüências inevitáveis na operação do direito civil, são submetidos ao processamento judicial da questão, para que lá, no Poder Judiciário, se diga o Direito e o suposto valor de cada um, na medida de sua razoável subsunção. Neste diapasão, os parâmetros de aplicação da lei são objetivos e qualquer indenização está limitada ao patrimônio do ofensor. Eis, então, porque pode o juiz autorizar a “reduzir, eqüitativamente, a indenização, se houver excessiva desproporção entre a gravidade da culpa e o dano” (art. 944 do Código Civil). Por outro lado, pode o juiz, também, dar solução diversa à obrigação de indenizar se for aferido culpa concorrente ou culpa exclusiva da vítima.
4.3.3.4. O nexo causal
Nexo causal tem pelo mesmo significado as categorias jurídicas de relação de causalidade e de nexo etiológico, cujo conceito advém das leis naturais, pois “é o liame que une a conduta do agente ao dano”.[78] Para sabermos quem causou determinado dano, precisamos analisar qual é a relação causal entre o agente e o ato praticado.
Ainda que haja um dano, a conduta do agente e o respectivo resultado podem estar necessariamente desvinculados para efeitos civis, se o que motivou o ato foi culpa exclusiva da vítima, ou se o mesmo foi fruto de caso fortuito ou de força maior. Nestes casos não haverá qualquer responsabilidade, em função da força exonerativa destas excludentes.
Evidentemente, o nexo causal requer elementos comprobatórios convincentes, e se faz necessária a identificação do fato que causou o dano. Ambas questões nem sempre são fáceis de serem resolvidas, todavia ao juiz compete analisar o liame dos fatos ainda que deva deduzir o nexo causal pelo instituto da presunção.
5 LIBERDADE PÓS-CONTRATUAL
5.1 TEORIA DOS DEVERES DE CONSIDERAÇÃO INCIDENTES NA FASE PÓS-CONTRATUAL
O mandamento da boa-fé objetiva, previsto no art. 422 do CC/2002, exige adequação de comportamento pautado em padrões de lealdade e retidão, cujo dever de conduta impõe-se às partes como um todo. Ainda que neste artigo haja referência apenas ao critério de probidade (o qual se trata de um conceito ético-jurídico), é incontroverso que o dever de conduta se circunscreve numa gama de comportamentos que sequer foram relacionados pelo legislador, assim como o preceito da boa-fé não se aplica exclusivamente na conclusão e na execução do contrato, mas também na fase da pós-contratualidade.
Tais deveres de conduta (ou, deveres de consideração) não incidem apenas na conclusão e durante a execução do contrato, mas a obrigação de observá-los nasce desde as tratativas iniciais para formação de um consenso, cuja finalidade se contextualiza como sendo a fase de preparação de um negócio, o qual culminará com a respectiva conclusão do contrato. Uma vez concluído, a boa-fé objetiva também deverá estar adstrita aos deveres do período contratual, bem como continuará seus efeitos quando do encerramento do mesmo, que incidirão no padrão de comportamento, probo, para com a contraparte, cuja implicação será o percurso operacional dos deveres de proteção, informação, lealdade, e sigilo[79].
Imagine-se que efeitos danosos e diversos podem advir às partes se uma delas resolve violar, por exemplo, o dever de sigilo sobre negócio encerrado entre os mesmos. Ou ainda, se uma delas resolve romper com tratativas que até então chegaram ao ponto de gerar mútua confiança sobre dado negócio, e que posteriormente a esta arbitrariedade resolve divulgar informações que até então eram (porque deviam ser) confidenciais.
Não obstante a boa perspicácia que normalmente perfaz o arcabouço cultural de partes que negociam expressivos contratos, há de ser que em havendo o infortúnio de confrontar-se com o desvio social premeditado dos mesmos para prejudicar alguém, resta verificar e/ou levantar as evidências objetivas e “subsumi-las” aos ditames das regras para que se pleiteie eventual indenização por danos sofridos.
Importante salientar que tais deveres não estão instituídos positivamente para que se tipifique direta e prontamente determinado ato mercantil no aspecto quantitativo e qualitativo. Trata-se de cláusula aberta, cuja expertise do interessado poderá oferecer parâmetros de verificação e mensuração no espaço, no tempo, e no valor pretendido, em função de determinado desvio de conduta conforme o requeiram as circunstâncias do caso concreto.
A seguir, faremos uma rápida apreciação dos citados deveres de conduta incidentes na fase da pós-contratualidade.
5.2. ESPÉCIES DE DEVERES DE CONSIDERAÇÃO INCIDENTES NA FASE PÓS-CONTRATUAL
5.2.1. Dever de Proteção[80]
Basicamente, este dever importa em adotar um comportamento passivo no sentido de não causar dano a então contraparte, mas, adicionalmente, pode implicar em observar outras condutas que inicialmente não estavam previstas. Por exemplo, pode surgir o dever de guarda e/ou restituição de bens que foram recebidos durante o período contratual. Ainda que este dever seja um desdobramento do dever de proteção, pode o mesmo, no caso concreto, ganhar autonomia suficiente para caracterizar determinada violação ao dever de proteção.
5.2.2. Dever de Informação[81]
Da mesma forma que este dever integra os aspectos da culpa in contrahendo, encontra-se ele como parâmetro de conduta quando exige que uma das partes se manifeste ou não em favor da outra, quando as circunstâncias do negócio encerrado assim o exigirem. Neste quesito corrobora-se o elenco de variáveis implícitas ao fenômeno que fazem enriquecer o conteúdo ético-jurídico desta regra com os seguintes preceitos: a) dever de informar: não significa necessariamente que quem informou acabou por explicar algo; quem informar deve também explicar; b) dever de esclarecimento: implica, eventualmente, em também aconselhar a outra parte; c) dever de clareza: quem informa, explica, e aconselha, deve fazê-lo segundo o meio mais eficaz de comunicação; para tanto, necessário se faz observar as condições pessoais das partes, o equilíbrio formal que se coloca entre os mesmos, etc.
5.2.3. Dever de Lealdade[82]
O conceito de lealdade no ordenamento jurídico está para a compreensão do que seja a ampla boa-fé nas relações contratuais. O que nos interessa analisar neste tópico é a incidência do dever de lealdade quando do encerramento de determinado contrato. Uma boa aplicação para este dever, nesta fase, parece ser quando uma das partes começa uma nova negociação, com uma parte terceira, quando envolve o mesmo objeto ou o escopo do contrato que ora foi encerrado. Especialmente nos casos em que não há um “pacto de exclusividade”, o dever de lealdade rege os imperativos comerciais-comportamentais dos agentes do novo negócio que potencialmente se apresenta. Neste caso, surgirá o dever de comunicar a outra parte de que estão ocorrendo negociações paralelas, e tudo o que deve ou não afetar o interesse do mesmo deve ser apresentado ao interessado de forma transparente.
5.2.4. Dever de Sigilo[83]
Este dever proíbe as partes de se utilizarem de informações obtidas durante as negociações e/ou no período contratual para fins de repassar a terceiros, sem o consentimento da outra parte. Este dever está relacionado ao de lealdade, consistente para prevenir danos com a divulgação indevida de dados e informações cujo domínio ou “propriedade” se restringiu aos então interessados.
Algumas circunstâncias extras podem correlacionar o dever de sigilo o qual pode ser desdobrado em função de situações anômalas. Por exemplo: se o contrato foi rescindido antes do término regularmente previsto; os motivos pelos quais se antecipou seu encerramento podem ser objeto para observação desta conduta.
Entretanto, como dito anteriormente, é usual que as partes celebrem cláusula no sentido de pactuar estes deveres, todavia, em inexistindo esta providência o mandamento da boa-fé objetiva, previsto no art. 422, do CC/2002, abarca a obrigação de as partes não divulgar informações que possam prejudicar a parte interessada até que estes dados percam seu potencial lesivo perante a sociedade e/ou mercado.
Conclusão
Na consagração das lutas humanistas, surge a Constituição Federal de 1988, que contemplou em seu bojo textual diversas garantias, consideradas inalienáveis e de cunho fundamental.
Dentre elas, destaca-se, em gênero, a liberdade de empreender, que se materializa, dentre outros, na liberdade de empresa, garantia típica da economia de mercado do estado liberal.
Bem ainda, a liberdade negocial, que se materializa nos ajustes operados entre pessoas e/ou empresas, via de regra de cunho econômico ou para circulação de bens, os quais se materializam nos contratos, negócios jurídicos que se destinam justamente a instrumentalizar a liberdade de contratar.
Sob a égide hermenêutica da Constitucionalização do Direito Privado, é editado em 2002 o Código Civil Brasileiro, que em seu bojo reformado, tratou de contemplar, por meio da técnica legiferante das cláusulas abertas, tutelas com delineamento axiológico, propícias a estimular o bom comportamento negocial das partes, visando a mantê-las dentro do mínimo ético e moral desejável.
Das cláusulas gerais, emergem os postulados da boa-fé objetiva e da função social das figuras jurídicas, escopo este a ser prospectado em todas as condutas humanas, afetando, também, a sua responsabilização civil, pela releitura funcionalizada do instituto.
Doutor em Direito pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo e Mestre em Direito pela Universidade Federal do Paraná (1995). É Professor Titular do Centro Universitário Curitiba para a Graduação e Programa de Pós-Graduação do Mestrado em Direito. Membro da Academia Paranaense de Letras Jurídicas; do Instituto dos Advogados do Paraná; do Conselho Editorial da Juruá Editora; e do Instituto de Direito Privado. É advogado sócio de Popp & Nalin Advogados Associados. Líder ‘1’ do Grupo de Pesquisa ‘Livre Iniciativa e Dignidade da Pessoa – Ano III’ do programa de pós-graduação (mestrado) do Centro Universitário Curitiba.
Advogado, Contador, Mestrando em Direito Empresarial e Cidadania pelo UNICURITIBA, é especialista em Administração Financeira e Metodologia do Ensino Superior. Atualmente é Diretor de empresa industrial, atua na controladoria das áreas Administrativa, Financeira, Contábil, e Jurídica.
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