As negociações coletivas, para o direito do Trabalho, representam uma fonte muito eficaz e consolidadora de novos direitos para os trabalhadores. Isso é facilmente percebido ao longo da existência e evolução desse mecanismo no direito trabalhista pátrio. Nelas, o sindicato figura como sujeito legítimo para defender os interesses da coletividade que representa, atuando não como substituto processual, mas enquanto legitimado extraordinário autônomo.
Ademais, para que se possa haver uma saudável negociação coletiva de trabalho deve se assegurar ao máximo um processo de diálogo permanente entre trabalhadores e empregadores, afim de que os mesmos possam discutir seus pontos divergentes e posteriormente levar o resultado desse debate ao campo normativo, tais como: Convenção Coletiva de Trabalho, Acordo Coletivo de Trabalho ou mesmos as Sentença Normativa de Trabalho.
No Brasil, como ora mencionado, caberá ao sindicato, respaldado pelo texto de nossa Lei Maior e também pela Consolidação das Leis do Trabalho – CLT-, o papel de representar os trabalhadores nas negociações coletivas, quer seja judicialmente ou extrajudicialmente.
Nesse contexto, e tendo como ponto basilar a precariedade da representatividade sindical no Brasil, tem-se que não raras são as vezes que se confeccionam normas coletivas desfavoráveis aos empregados. Isso ocorre devido a inúmeros fatores, dentre os quais se cita: a ausência da pluralidade sindical, o baixo interesse dos trabalhadores por assuntos correlatos a esse tema, os sindicatos corrompidos que só se prestam aos próprios interesses, e também a existência dos sindicatos pelegos que somente servem os interesses patronais, alguns inclusive sendo por essas financiadas.
Para exemplificar o argumento, que aponta a precariedade da representatividade sindical brasileira, temos os seguintes casos na jurisprudência que demonstram a atuação dúbia dos sindicatos, nesses exemplos, bem fez o judiciário em anular as cláusulas dos diplomas coletivos; visto que estas ferem nitidamente o intuito da negociação coletiva, a qual deverá sempre respeitar parâmetros mínimos estabelecidos pela jurisprudência, doutrina e do princípio do não retrocesso social.
Sobre a extrapolação do limite máximo da jornada de trabalho, encontramos a seguinte decisão: AÇÃO ANULATÓRIA – CLÁUSULA DE ACORDO COLETIVO QUE ESTABELECE TURNO DE SERVIÇO DE 48X48 HORAS – EXTRAPOLAÇÃO DO LIMITE MÁXIMO DIÁRIO E SEMANAL – Procedência da ação – Deve ser reconhecida a nulidade de cláusula de acordo coletivo que estabelece turno de serviço de 48×48 horas, violando o disposto no art. 59, § 2º, da CLT, que fixa o limite máximo de 10 horas diárias para a jornada de trabalho, bem como o que preceitua o art. 7º, XIII, da Carta Magna, que prescreve o limite máximo do módulo semanal em 44 horas, ferindo, assim, as garantias mínimas de proteção ao trabalhador, sem atender aos intervalos necessários e adequados ao seu descanso, fato que prejudica sua saúde e integridade física. Ação conhecida e julgada procedente, para anular a clausula 23a do act que alterou as condições de trabalho. (TRT 16ª R. – AA 00059-2003-000-16-00-1 – (3594/2003) – Rel. Juiz Américo Bedê Freire – DJU 25.02.2004).
Já em relação Redução dos intervalos interjornada e intrajornada encontramos as seguintes decisões sobre ações anulatórias de cláusulas convencionais que estabeleciam a redução do intervalo todas proferidas pelo c. Tribunal Superior do Trabalho: AÇÃO ANULATÓRIA – INTERVALO INTERJORNADA – PORTUÁRIOS – REDUÇÃO – FLEXIBILIZAÇÃO – CONVENÇÃO COLETIVA DE TRABALHO – 1. Ação Anulatória ajuizada pelo Ministério Público impugnando cláusula de convenção coletiva de trabalho que estipula seis horas de intervalo interjornada para trabalhadores portuários. 2. O intervalo interjornada constitui medida de higiene, saúde – visando a recompor o organismo humano para suportar a continuidade seguinte do esforço – e segurança do empregado, matéria que ostenta dignidade constitucional (art. 7º, inciso XXII, da CF). 3. Por isso, o art. 8º da Lei nº 9.719, de 27 de novembro de 1998, garante aos trabalhadores portuários avulsos o mesmo intervalo interjornada de 11 horas estabelecido para os empregados em geral (art. 66 da CLT), assentando, como regra, a indisponibilidade desse direito. Tal dispositivo admite eventual flexibilização, mediante negociação coletiva, somente em “situações excepcionais”, o que descarta a idéia de redução ordinária do intervalo interjornada. 4. Inválida a cláusula coletiva que reduz, de modo genérico e sistemático, o descanso entre duas jornadas dos trabalhadores portuários que laboram continuamente até seis horas, por extrapolar a condição permissiva precisamente delineada na norma heterônoma, derruindo a proteção outorgada por norma legal ao hipossuficiente. 5. Recurso ordinário interposto pelo Ministério Público a que se dá provimento. (TST – ROAA 2122 – SDC – Rel. Min. João Oreste Dalazen – DJU 17.10.2003)
Nesse contexto, é de se lamentar a pífia atuação sindical.
Dentro de um panorama maior, quando se analisa a atuação dos verdadeiros sindicatos legítimos e independentes, é possível estabelecer parâmetros legais e morais mínimos para as negociações coletivas. Para isso, basta ter sempre em mente o verdadeiro papel protetivo que deve ser desempenhado pelo sindicato. Esse tem por fim, como sua essência maior, um papel tuitivo em relação aos seus representados. Dessa feita, jamais poderia ferir, em qualquer grau, direitos dos trabalhadores.
Os primeiros pontos a serem respeitados pela negociação coletiva é o rol de direitos já consagrados pela nossa carta maior em seu art.7º. Distintos mandamentos são classificados, por muitos, com status de direito fundamental tamanha é sua importância e relevância para seus titulares e para toda coletividade.
Sendo assim, os denominados direitos sociais, por deterem um cunho eminentemente de fruição coletiva em evidência, acabam por guardar em sim um núcleo essencial mínimo, um conteúdo diretamente dirigido à dignidade da pessoa humana, a qual é violada quando não respeitado em sua essência material, essência esta que deve servir irrestritamente como ponto basilar mínimo a ser observado na negociação coletiva.
O segundo aspecto a ser observado é que as negociações coletivas devem ser pautadas pelos princípios da boa fé objetivas das partes, antes, durante e após a negociação, também pelo do respeito mútuo entres elas.
Outro fator a ser analisado, com bastante cautela, dentro do campo principiológico, é a transparência que deve reger a relação no campo das negociações coletivas. Tal comando é de fundamental importância no campo da negociação. Ora, é definitivamente impossível estabelecer um canal de medição sem saber o que efetivamente está ocorrendo. É preciso que as partes envolvidas coloquem todos os pontos e dados a serem debatidos às claras. Assim, com ela é possível criar um ambiente favorável para que a melhor solução possa emergir de interesses, inicialmente, divergentes.
Outro importante mecanismo a ser observado pelos operadores do direito com o intuito de fixar limites para a negociação coletiva é a presença de concessões mútuas dentro de uma negociação. Ora, não há como se conceber uma negociação coletiva que só precarize direitos dos trabalhadores, que dentro de um panorama simplista somente reduza direitos dos mesmos sem contraprestação de qualquer gênero. Nesse caso, valerá a máxima de que o ser humano que passa por necessidades não é livre para negociar, e bem por isso, deveria, nesses casos, estar assistidos, amparados, por sindicatos fortes e bem estruturados, cenário, infelizmente, minoritário em nossa realidade.
Dentro do que foi apresentado, resta claro que negociações coletivas não deveriam precarizar direitos trabalhistas, embora em certas situações, até se permita uma flexibilização temporária dos mesmos, mas sempre ter-se-á que ter por base os patamares mínimos acima demonstrados. Por fim, pelo fato de não haver no Brasil uma cultura sindical forte e realmente protetiva, deve-se analisar sempre restritivamente e, com mais cautela ainda, os argumentos acima explanados.
Advogado, pós-graduando
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