Resumo: Este artigo foi desenvolvido para uma análise de situações pontuais sobre o exercício de Jurisdição no Brasil, de maneira estatal ou não, como meio de apaziguamento social num mundo onde as relações jurídicas são muitas, plurais subjetiva e objetivamente, e hoje também virtuais.
Palavras-chave: Jurisdição; Coisa Julgada; Judiciário; Não-Estatal.
Abstract: This article was carryed for an analysis of specific situations on the procedure of Jurisdiction in Brazil, in or out bureau office, as a way of social appeasement in a enviroment where legal relations are many, plural subjective and objective, and now also virtual.
Keywords: Jurisdiction; Res judicata; Judiciary; Non-State.
Sumário: 1. Introdução. 2. O Poder Judiciário e a jurisdição. 3. O exercício de jurisdição no brasil por além dos muros do judiciário nacional. 3.1. Índios. 3.2. Arbitragem. 3.3. Justiça Despostiva. 3.4. Jurisdição Internacional com Efeitos no Território Nacional. 4. Conclusões. 5. Referências.
1. INTRODUÇÃO:
A República Federativa do Brasil, ente de Direito Público Internacional, possui ordenamento jurídico próprio, símbolo de sua soberania. A Constituição Federal de 1988 estabeleceu, inaugurando o ordenamento jurídico brasileiro atual, pois inicial, os Poderes da República, de maneira não exaustiva os direitos fundamentais de sua população, instituiu os entes federativos, assim como previu a possibilidade de poderes constituintes decorrentes, valorizando a federação nacional.
Com a Constituição de 1988, se estabeleceu quais seriam a partir dali os órgãos do Judiciário, trazendo vários órgãos antes já existentes, mas com algumas novidades. Talvez a maior delas, originariamente, a criação do Superior Tribunal de Justiça. Traz o art. 92 do Texto Político Maior:
“Art. 92. São órgãos do Poder Judiciário:
I – o Supremo Tribunal Federal;
I-A o Conselho Nacional de Justiça; (Incluído pela Emenda Constitucional nº 45, de 2004)
II – o Superior Tribunal de Justiça;
III – os Tribunais Regionais Federais e Juízes Federais;
IV – os Tribunais e Juízes do Trabalho;
V – os Tribunais e Juízes Eleitorais;
VI – os Tribunais e Juízes Militares;
VII – os Tribunais e Juízes dos Estados e do Distrito Federal e Territórios.
§ 1º O Supremo Tribunal Federal, o Conselho Nacional de Justiça e os Tribunais Superiores têm sede na Capital Federal. (Incluído pela Emenda Constitucional nº 45, de 2004)
§ 2º O Supremo Tribunal Federal e os Tribunais Superiores têm jurisdição em todo o território nacional”. (Incluído pela Emenda Constitucional nº 45, de 2004)
No Brasil, Estado constitucionalista, o Judiciário tem grande importância por ser ‘’a última defesa de um cidadão’’ frente a algum ato ilícito praticado pelo Estado, pelo menos quanto ao Ordenamento Jurídico interno, ou ainda por outro cidadão, conforme a Teoria da Eficácia Horizontal dos Direitos Fundamentais. O Judiciário, poder da República, ao lado do Poder Executivo e ainda do Poder Legislativo, terá (quase sempre) a última palavra numa discussão em que há resistência ao cumprimento de uma obrigação. Estamos diante do exercício de Jurisdição do Poder Judiciário.
Enfatizamos a expressão ''quase sempre'' visto que o Judiciário Brasileiro prima pela sua inércia, e se não for provocado por um ou mais sujeitos da relação jurídica que se quer discutir, nem palavra o Judiciário terá nesta relação. Pequenas e pontuais exceções ainda vigem no Ordenamento Nacional, como o procedimento de inventário.
2. O PODER JUDICIÁRIO E A JURISDIÇÃO:
Avançando no tema, o Judiciário, baluarte do cidadão frente ao Poder Público, difere-se dos outros poderes da República principalmente no que tange às qualidades extrínsecas de suas decisões. Trata-se da qualidade de coisa julgada, que dá às decisões jurisdicionais a possibilidade de imutabilidade.
A coisa julgada, com sua imutabilidade, é fruto de requisitos temporais, procedimentais e materiais, e difere o Poder Judiciário dentre os outros poderes da República. É o exercício da Jurisdição. Aqui nos referimos à coisa julgada material, na medida em que a coisa julgada formal nada mais é que uma preclusão processual.
A jurisdição é, insistimos, o exercício de atividades típicas do Poder Judiciário, que produzirá decisões com qualidade potencial de imutabilidade, em processo fruto de demanda e de resistência, proferida em devido processo legal onde se garanta o contraditório e a ampla defesa. Deve ainda a decisão ser prolatada por terceiro imparcial. Nenhum outro Poder da República além do Judiciário é capaz de produzir, sob o manto da Constituição de 1988, decisão fruto de Jurisdição, decisão esta que traria qualidade de imutabilidade, de coisa julgada.
Segundo Freddie Didier[1] (2015, p. 154) entende-se que
‘’a jurisdição é a função atribuída a terceiro imparcial de realizar o Direito de modo imperativo e criativo (reconstrutivo), reconhecendo/ efetivando/protegendo situações jurídicas concretamente deduzidas, em decisão insuscetível de controle externo e com aptidão para tornar-se indiscutível’’.
A jurisdição é, para o Judiciário brasileiro, o exercício de suas atividades típicas. Como todo poder da República, tem ele atribuições e competências típicas e atípicas. Delimitando ainda mais essa qualidade da coisa julgada, visto que ao lado de pacificação social pode ensejar danos duradouros, nem toda decisão do Judiciário será capaz de ganhar qualidades de coisa julgada, mas apenas aquelas fruto de Jurisdição, ou seja, fruto de exercício de competências típicas do Judiciário. Decisões administrativas, legiferantes e de mero expediente do Judiciário não serão passíveis de salvaguardar-se pelo manto em tela.
3. O EXERCÍCIO DE JURISDIÇÃO NO BRASIL POR ALÉM DOS MUROS DO JUDICIÁRIO NACIONAL.
O Judiciário nacional, como visto, dentre os Poderes da República, é o único capaz de produzir decisão com qualidade de coisa julgada material. É o exercício de jurisdição. Esta é, assim, um símbolo do Judiciário dentre os poderes da República.
Fora do Poder Judiciário, entretanto, também se dá jurisdição. A Constituição listou hipóteses pontuais, e muito pouco destrinchadas em estudos acadêmicos, quanto a possibilidade de atividades estranhas ao Judiciário que teriam o condão de proferir decisões com qualidade de coisa julgada material, e que obedecidos requisitos de tempo e procedimento, se tornariam imutáveis.
Veja que além desses extranei[2] decidirem com qualidade de coisa julgada, podemos ainda diferenciá-los quanto ao controle posterior mitigado e/ou não-meritório pelo Judiciário, mas não como uma condição de dar qualidade de coisa julgada, ocorrida em momento anterior, e sim como controle da legalidade do procedimento, ou seja, não meritório.
Como um artigo científico, mas com interesse pessoal, me reservarei a apenas trazer algumas características legais, constitucionais e práticas sobre esses institutos constitucionais, mas de tão pouco debruçamento doutrinário. A curiosidade, acredito, é a semente de todo o conhecimento.
3.1. Índios
O Brasil pré-colombiano era habitado por índios[3], e os Europeus que por aqui passaram até então historicamente o fizeram como rota de passagem ou por escambos precários. Com a colonização, Portugal passa a extrair pau-brasil do litoral do Nordeste Brasileiro. Tem aqui início um contato mais permanente dos exploradores portugueses com os nativos da terra nova.
Para sempre os índios serão, hoje quase extintos ou já ocidentalmente aculturados, a origem desta terra. As poucas conhecidas tribos no Brasil ainda isoladas são monitoradas por terra e por ar, mas sempre com a sensibilidade de proteção, mantendo-lhes na medida do possível isolados. Agentes da FUNAI – Fundação Nacional do Índio velam por essa prática por dever funcional-legal.
Essa valorização da cultura indígena, como forma de provimento de parte da cultura nacional, foi consagrada na Constituição Federal de 1988, que trouxe entre outras medidas, a proteção e valorização da cultura tribal, inclusive no que tange aos julgamentos pelos líderes dos componentes que violassem as tradições respectivas. Vejamos o que diz a Constituição:
“Art. 231. São reconhecidos aos índios sua organização social, costumes, línguas, crenças e tradições, e os direitos originários sobre as terras que tradicionalmente ocupam, competindo à União demarcá-las, proteger e fazer respeitar todos os seus bens”.
Deste modo, podemos antever que o ordenamento jurídico nacional permite que convivam sub-ordenamentos jurídicos próprios de tribos indígenas, e que por ordem constitucional cabe ao Poder Público apenas o monitoramento para a proteção das atividades desses povos.
Logicamente, como inaugurador do Ordenamento Brasileiro, a Constituição Federal de 1988, ao permitir a coexistência de ordenamentos internos não estatais, não o faz sem rédeas, visto que a Constituição Cidadã tem regras e princípios que balizam e fundamentam todo o ordenamento jurídico nacional. Sem estes pilares, não seria possível coexistir nem a parte, nem o todo. Regras de punição milenares devem ser mantidas no seio da tribo, desde que proporcionais, e que não violem direitos fundamentais.
Essas decisões, trazendo o que já dito sobre jurisdição em tópico supra, consideramos decisum (parcialmente) jurisdicional, apesar de não judiciais nem governamentais, pois constitucionalmente possuem imutabilidade. Tradições e costumes tribais legítimos podem, legitimamente, substituir o que dispõe normas do Novo Código Civil, por exemplo, e ao meu ver não traria, guardadas as exigências de razoabilidade e proporcionalidade, qualquer afronta à dignidade da pessoa humana.
Mesmo no que tange aos aspectos penais e procedimentais penais, podemos prever, num exercício de logicidade, a existência de penas corporais no âmbito de tribos indígenas. Mas repito, se não beirarem ao sacrifício ou risco à existência do indivíduo, constitucionalmente os Poderes Públicos nacionais devem, sim, tolerar a existência desse ordenamento jurídico paralelo.
No Estatuto do índio, temos:
“Art. 57. Será tolerada a aplicação, pelos grupos tribais, de acordo com as instituições próprias, de sanções penais ou disciplinares contra os seus membros, desde que não revistam caráter cruel ou infamante, proibida em qualquer caso a pena de morte.”
Finalizando este sub-tema, não considero decisões em julgamento tribal jurisdição pura pelo fato de não termos certeza sobre a imparcialidade de quem julga, mas apenas sobre a qualidade inerente de imutabilidade de suas decisões, tomadas por terceiro. Ressalto ainda que serão tantos microordenamentos quantos forem os blocos de costumes indígenas, por dentre aldeias e grandes grupos étnicos.
3.2. Arbitragem
A Arbitragem no Brasil está regulamentada pela lei 9.307/1996. Ela dá a possibilidade de se afastar das mazelas procedimentais e procrastinatórias permitidas legalmente e presentes na lei processual, quando se aciona ao Judiciário.
A arbitragem inicia-se, extrinsecamente, com o compromisso arbitral. Com este, partes de um negócio jurídico compromissam-se a resolver uma resistência, existente ou futura, através da arbitragem. Serve para um único negócio jurídico, de efeitos instantâneos ou de cumprimento duradouro, ou ainda para uma série de negócios numa relação jurídica complexa dentro de um período de tempo, determinado ou não.
Para poder compromissar, as partes devem ser capazes, e os direitos em discussão disponíveis.
Como dito antes, a arbitragem traz várias vantagens para as partes que compromissam, como a celeridade, pois não precisam esperar fila de processos até que o seu caso chegue às mãos de um magistrado; permite ainda que se solucione a lide por equidade, fato restrito a poucos objetos quando se trata de julgamento pelo Judiciário (em resumo, apenas quando permitido por lei); com a arbitragem não há custas judiciais, não há sucumbências, e os compromissados dirimem rapidamente uma questão.
3.2.1. A Arbitragem é Jurisdição?
Como dito sobre jurisdição acima, ela se diferencia de outras decisões administrativas, legislativas e até judiciais (de âmbito administrativo e legiferante lato senso) pelo fato de ter pretensão de coisa julgada. Ou seja, é jurisdição porque o que se decidiu em seu exercício pode, com o tempo, ter qualidade de coisa julgada material. Deve ainda ter julgamento por terceiro desinteressado, investido da jurisdição.
Procedimentalmente, com a arbitragem, temos um contrato, pretérito ou não, chamado compromisso arbitral. Por este, as partes se comprometem a submeter caso pretérito (submissão) ou futuro (compromisso) à arbitragem. Por ser compromisso, doravante, a arbitragem será sempre voluntária, e uma vez compromissada, é obrigatória para o feito.
Por que seria a arbitragem jurisdição? Bem, como vimos, e rapidamente relembrando, jurisdição é decisão com pretensão de imutabilidade material, oriunda de terceiro desinteressado. Vejamos o que diz a lei 9.307/1996:
“Art. 18. O árbitro é juiz de fato e de direito, e a sentença que proferir não fica sujeita a recurso ou a homologação pelo Poder Judiciário.”
Podemos concluir, sobre a arbitragem, que um outro completo ordenamento jurídico pode surgir, submisso aos princípios do Ordenamento Jurídico Nacional naquilo peremptoriamente imposto, todo baseado em equidade, inclusive, que resolva questões pontuais num espaço humano e negocial, onde se afastaria normas dispositivas do ordenamento nacional, em sua maioria civis, processuais civis e empresariais.
Há ainda, em legislação administrativa, a possibilidade de a própria Administração Pública se afastar do que a lei nacional diz e se submeter ao arbitramento internacional, senão vejamos alguns exemplos extraídos de Legislação Federal. Diz a lei nº 9.472, de 16 de julho de 1997, que dispõe sobre a organização dos serviços de telecomunicações e cria a ANATEL (Agência Nacional de Telecomunicações):
“Art. 93. O contrato de concessão indicará:(…)
XV – o foro e o modo para solução extrajudicial das divergências contratuais”.
Vejamos agora a lei nº 9.478, de 6 de agosto de 1997, que dispõe sobre a política energética nacional, as atividades relativas ao monopólio do petróleo, institui o Conselho Nacional e Política Energética e a Agência Nacional do Petróleo (ANP):
“Art. 43 O contrato de concessão deverá refletir fielmente as condições do edital e da proposta vencedora e terá como cláusulas essenciais: (…)
X- as regras sobre solução de controvérsias, relacionadas com o contrato e sua execução, inclusive a conciliação e a arbitragem internacional;”
Agora a Lei nº 10.233, de 5 de junho de 2001 que dispõe sobre a reestruturação dos transportes aquaviário e terrestre, cria o Conselho Nacional de Integração de Políticas Públicas de Transporte, a Agência Nacional de Transportes Terrestres, Terrestres, a Agência Nacional de Transportes Aquaviários e o Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes:
“Art. 35. O contrato de concessão deverá refletir fielmente as condições do edital e da proposta vencedora e terá como cláusulas essenciais as relativas a: (…)
XVI – regras sobre solução de controvérsias relacionadas com o contrato e sua execução, inclusive conciliação e arbitragem;”
Lei nº 11.079, de 30 de dezembro de 2004, que institui normas gerais para licitação e contratação de parceria público-privada no âmbito da administração pública:
“Art. 11. O instrumento convocatório conterá minuta do contrato, indicará expressamente a submissão da licitação às normas desta Lei e observará, no que couber, os §§ 3o e 4o do art. 15, os arts. 18, 19 e 21 da Lei no 8.987, de 13 de fevereiro de 1995, podendo ainda prever: (…)
III – o emprego dos mecanismos privados de resolução de disputas, inclusive a arbitragem, a ser realizada no Brasil e em língua portuguesa, nos termos da Lei no 9.307, de 23 de setembro de 1996, para dirimir conflitos decorrentes ou relacionados ao contrato.”
Por fim, a Lei nº 8.987, de 13 de fevereiro de 1995, que dispõe sobre o regime de concessão e permissão da prestação de serviços públicos previsto no art. 175 da Constituição Federal, com redação dada pela Lei nº 11.196, de 21 de novembro de 2005:
“Art. 23-A. O contrato de concessão poderá prever o emprego de mecanismos privados para resolução de disputas decorrentes ou relacionadas ao contrato, inclusive a arbitragem, a ser realizada no Brasil e em língua portuguesa, nos termos da Lei nº 9.307, de 23 de setembro de 1996.”
Esse posicionamento do Legislativo, permitindo, por legislação federal, que a Administração Pública adote a arbitragem, nacional e internacional, revela uma modernização da arcaica burocracia pública que caracterizada o Brasil nas últimas décadas, e a superação da solução favorável como único interesse presente em litígios quando está presente a Fazenda Pública. Nada mais errado. A valorização da arbitragem revela que mercados modernos, ao lado de terem seus direitos protegidos e concedidos, velam também por uma solução rápida, justa e meritória, solução esta possibilitada pela arbitragem.
3.3. Justiça Desportiva
A justiça desportiva está prevista constitucionalmente no art. da CF88. Vejamos:
“Art. 217. É dever do Estado fomentar práticas desportivas formais e não-formais, como direito de cada um, observados: (…)
§ 1º – O Poder Judiciário só admitirá ações relativas à disciplina e às competições desportivas após esgotarem-se as instâncias da justiça desportiva, regulada em lei.
§ 2º – A justiça desportiva terá o prazo máximo de sessenta dias,
contados da instauração do processo, para proferir decisão final. (…)”
A justiça desportiva, não estatal, não pode ser considerada uma subespécie de um instituto maior, o gênero, que é a arbitragem. A arbitragem, como visto, tem poder de decisão jurisdicional, com qualidade de coisa julgada material. Isto não ocorre na Justiça Desportiva.
Essa justiça, que não compõe o Poder Judiciário, mas tem suas regras procedimentais determinadas por leis oriundas do Legislativo, o que veste-lhe de ares mais públicos e estatais que o ordenamento indígena e arbitragem e todo o seu leque de liberdade, nada mais é que um exercício de particulares especializando poderes sobre direitos disponíveis, no caso, o desporto e suas regras substantivas.
A justiça do desporto é formada por não por magistrados, apesar de em muitos Estados da Federação contarem em sua composição com membros do Poder Judiciário e do Ministério Público, que nela atuam por seus conhecimentos pessoais e paixões desportivas, mas não por suas qualidades institucionais que os ligam ao Estado, ocupantes de cargos políticos de provimento efetivo.
Regulada hoje pela Lei Pelé, lei 9.615/98, corroborando o que diz a Constituição de 1988, nos traz o parágrafo único de seu artigo 13:
“Art. 13. O Sistema Nacional do Desporto tem por finalidade promover e aprimorar as práticas desportivas de rendimento.
Parágrafo único. O Sistema Nacional do Desporto congrega as pessoas físicas e jurídicas de direito privado, com ou sem fins lucrativos, encarregadas da coordenação, administração, normatização, apoio e prática do desporto, bem como as incumbidas da Justiça Desportiva e, especialmente: (Redação dada pela Lei nº 12.395, de 2011). (…)”
Segue a Lei Pelé, em seu artigo 23 compilado:
“Art. 23. Os estatutos ou contratos sociais das entidades de administração do desporto, elaborados de conformidade com esta Lei, deverão obrigatoriamente regulamentar, no mínimo: (Redação dada pela Lei nº 13.155, de 2015)
I – instituição do Tribunal de Justiça Desportiva, nos termos desta Lei;
II – inelegibilidade, por dez anos, de seus dirigentes para desempenho de cargos e funções eletivas ou de livre nomeação de: (Redação dada pela Lei nº 13.155, de 2015)
a) condenados por crime doloso em sentença definitiva;
b) inadimplentes na prestação de contas de recursos públicos em decisão administrativa definitiva;
c) inadimplentes na prestação de contas da própria entidade;
d) afastados de cargos eletivos ou de confiança de entidade desportiva ou em virtude de gestão patrimonial ou financeira irregular ou temerária da entidade;
e) inadimplentes das contribuições previdenciárias e trabalhistas;
f) falidos.
III – a garantia de representação, com direito a voto, da categoria de atletas e entidades de prática esportiva das respectivas modalidades, no âmbito dos órgãos e conselhos técnicos incumbidos da aprovação de regulamentos das competições. (Incluído pela Lei nº 13.155, de 2015)
§ 1o Independentemente de previsão estatutária, é obrigatório o afastamento preventivo e imediato dos dirigentes, eleitos ou nomeados, caso incorram em qualquer das hipóteses do inciso II do caput deste artigo, assegurados o processo regular e a ampla defesa para a destituição. (Incluído pela Lei nº 13.155, de 2015)
§ 2o Os representantes dos atletas de que trata o inciso III do caput deste artigo deverão ser escolhidos pelo voto destes, em eleição direta, organizada pela entidade de administração do desporto, em conjunto com as entidades que os representem, observando-se, quanto ao processo eleitoral, o disposto no art. 22 desta Lei.” (Incluído pela Lei nº 13.155, de 2015)
Vejamos que o artigo 23 da Lei Pelé, que lida sobre as entidades privadas que administrarão o desporto nacional, prevê que as próprias federações estaduais e nacionais criarão seus próprios tribunais desportivos. E mais, os componentes desses tribunais, segundo este mesmo artigo 23, deverão primar pela imparcialidade e pela probidade, visto que terão de ter uma série de qualidades antecedentes ao exercício de suas atividades.
Os componentes dos Tribunais Desportivos no Brasil, tribunais estes que não fazem parte do Poder Judiciário, não poderiam decidir com jurisdição. Como vimos, seus componentes devem primar pela imparcialidade e probidade. Mas falta-lhes a capacidade de proferir decisões com qualidade de imutabilidade. O fato de questões sobre matéria desportiva não poderem ser levadas diretamente ao Judiciário, frente à previsão constitucional de condição de procedibilidade do parágrafo 1° do art. 217 da Constituição Federal de 1988, não lhes dá características de coisa julgada, mas apenas uma barreira superável para que a questão seja levada ao Judiciário.
3.4. Jurisdição Internacional com Efeitos no Território Nacional:
O Brasil, no trato de suas relações internacionais, pode fazer parte, originária ou adesivamente, de um tribunal colegiado que reforce a diplomacia, e que procure punir determinados fatos que poderiam ser camuflados e não punidos pela fraqueza das relações internacionais e da grande independência (cega) dos ordenamentos jurídicos nacionais. Com a criação destes grupos, fatos cuja punição seja interesse de uma coletividade internacional, serão lá processados.
Na Constituição Federal de 1988, há previsão da aceitação desses ordenamentos internacionais pelo Brasil. Vejamos o que diz o art. 5, §4º, do Texto Maior Nacional:
“Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer
natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: (…)
§ 4º O Brasil se submete à jurisdição de Tribunal Penal Internacional a cuja criação tenha manifestado adesão.” (Incluído pela Emenda Constitucional nº 45, de 2004)
Essa jurisdição, também objeto deste trabalho, apesar de não podemos considerá-la não estatal, não será pura. Será um exercício de julgamento, cuja decisão terá força de definitividade. E mais, se houver garantias de ampla defesa, com contraditório, e ainda de um julgamento por terceiro desinteressado, haverá jurisdição (mista, em território brasileiro).
Essa previsão de participação da República Federativa do Brasil em tribunais internacionais pode abranger órgãos internacionais perenes ou criados apenas para temas referentes às certas relações comerciais, graves violações de direitos humanos, e mais uma infinidade de temas e casos, que sempre visarão estreitar a cooperação internacional, a criação de um Ordenamento Jurídico Mundial, e que valores fundamentais adotados pelo Brasil e por outros signatários tenham um mínimo de similaridade e imponibilidade para todos os seus cidadãos.
É caso de Jurisdição fora do Judiciário Nacional, com decisões capazes de ter força de definitividade, bastando que o órgão julgador tenha garantida sua imparcialidade e independência.
4. CONCLUSÕES:
A heterocomposição de litígios, como a Jurisdição estatal, serve a trazer paz social. E essa paz só será alcançada por completo quando a decisão que resolver o conflito ganhar qualidades que a torne imutável.
Essa imutabilidade, que pode ser formal (dentro do processo) ou a verdadeira, material (fora do processo), finalizará uma disputa que poderia se prolongar por até além da vida das partes do processo, seguindo nas pessoas de seus sucessores.
O Direito pátrio não poderia isso permitir.
A razoabilidade e a ponderação pessoais são as qualidades de quem quer uma solução para seu caso, justa, dada por alguém independente, permitindo uma defesa ampla, e com decisão sem vícios. Uma decisão dada nesse quadro não haverá de causar indignação à parte vencida desse procedimento.
A sociedade brasileira se mostrou ao longo dos tempos ser altamente litigante, abarrotando os porões dos prédios do Poder Judiciário com questões pessoais, causas com valor de moedas, brigas por abarroamentos e toda sorte de ocasiões que, numa sociedade minimamente evoluída socialmente, nem mesmo o contencioso administrativo de trânsito seria necessário.
Se não uma solução amigável, que se valha de outros mecanismos nacionais que sejam capazes de proferir decisões com possibilidade de ter qualidade de coisa julgada, trazendo paz social para o Ordenamento Jurídico Nacional e para a sociedade brasileira.
Sobre esse ponto, salutar a toda a sociedade brasileira que haja escapes não estatais, frutos da cultura nacional ou ainda de esforços administrativo-estatais, onde a solução de conflitos, de maneira perene, justa e independente, se torne um hábito, e que causas cujo interesse nacional tenham liberadas as barreiras de congestionamento que enfrentam.
A composição não judicial de litígios, com todas as suas vantagens, é incentivada pelo Conselho Nacional de Justiça. Veja o que diz a resolução 125 de 2010 deste órgão, em seus artigos 4º e 6 º:
“Art. 4º Compete ao Conselho Nacional de Justiça organizar programa com o objetivo de promover ações de incentivo à autocomposição de litígios e à pacificação social por meio da conciliação e da mediação. (…)
Art. 6º Para desenvolvimento dessa rede, caberá ao CNJ: (Redação dada pela Emenda nº 1, de 31.01.13) (…)
II – desenvolver parâmetro curricular e ações voltadas à capacitação em métodos consensuais de solução de conflitos para servidores, mediadores, conciliadores e demais facilitadores da solução consensual de controvérsias, nos termos do art. 167, § 1°, do Novo Código de Processo Civil; (Redação dada pela Emenda nº 2, de 08.03.16)
III – providenciar que as atividades relacionadas à conciliação, mediação e outros métodos consensuais de solução de conflitos sejam consideradas nas promoções e remoções de magistrados pelo critério do merecimento;
VI – estabelecer interlocução com a Ordem dos Advogados do Brasil, Defensorias Públicas, Procuradorias e Ministério Público, estimulando sua participação nos Centros Judiciários de Solução de Conflitos e Cidadania e valorizando a atuação na prevenção dos litígios;”
Fica a ideia defendida nesse trabalho: solução não-estatal definitiva de conflitos é algo que deve ser incentivado.
Advogado graduado pela Universidade Federal do Rio Grande do Norte. Pós-Graduado em Direito do Estado pela UNIDERP
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