Por: Tatiana Cardoso Sqqueff [1]
A primeira tentativa de negociações entre Ucrânia e Rússia em virtude das hostilidades iniciadas ainda no dia 24 de fevereiro de 2022 foi realizada na Bielorrússia, na fronteira deste país com a Polônia, no dia 28 de fevereiro de 2022.
Enquanto o lado ucraniano foi representado por Mikhailo Podoliak, conselheiro do governo, pelo Ministro da Defesa, Oleksiy Reznikov, pelo Ministro das Relações Exteriores, Mykola Tochytskyi, entre outros assessores; o lado russo foi representado pelo assessor presidencial Vladimir Medinsky e pelo Ministro de Relações Exteriores, Andrey Rudenko, além de outros assessores.[2]
Este primeiro encontro diplomático foi finalizado sem nenhuma resolução conclusiva entre as partes, muito embora o mesmo tenha sido importante para apontar-se quais são os elementos centrais por trás das requisições de ambas nações.[3]
Os pedidos ucranianos centram-se na cessação das hostilidades e na retirada total das tropas militares do país. Já as requisições russas giram em torno de alguns pontos. O elemento principal é a desmilitarização ucraniana, especialmente em função das hostilidades que ocorrem no leste do país, na região de Donbas, desde 2014, que fundamentaram, inclusive, a própria invasão russa no dia 24, consoante a explanação dada por Putin à sua população.[4] Ademais, o próprio reconhecimento da independência de Luhansk e Donetsk estariam em pauta.[5]
Outro pedido feito pelos negociadores russos para que um cessar-fogo ocorra é que se garanta a neutralidade ucraniana por meio de uma modificação constitucional, no sentido de inibir suas conversas com a Organização do Tratado do Atlântico Norte – OTAN. O terceiro ponto sob a mesa é o reconhecimento da soberania russa sob a Criméia, já sob sua posse desde 2014, quando a região então autodeclarada independente realizou um referendo manifestando a sua vontade de tornar-se parte da Rússia, o que, à época, foi prontamente aceito por este país.[6]
Há, ainda, um quarto ponto levantado pelos russos acerca da “desnazificação” da Ucrânia. Em que pese tenham apenas recebido 2% das intenções de voto nas eleições de 2019 da Ucrânia, para as autoridades russas, grupos ultranacionalistas no Estado vizinho, como o batalhão de Azov[7], estariam agindo contra os descendentes de russos, cuja maioria se encontra ao sul e ao leste do país.[8]
Por fim, há quem diga, ainda, que Putin estaria almejando a volta do Ex-Presidente ucraniano Victor Yanukovych ao poder.[9] Este foi o Presidente destituído em 2014 quando do acirramento das manifestações em torno da sua negativa de assinatura de um tratado de livre comércio com a União Europeia em novembro de 2013.[10] Entretanto, salienta-se que esse ponto não está nas pautas formais dos debates entre as partes.
Já a segunda reunião foi realizada dia 2 de março de 2022, novamente na fronteira entre Bielorrússia e Polônia. Esse segundo encontro teve como escopo debater os mesmos tópicos da reunião anterior, nomeadamente, o cessar-fogo e um consequente armistício entre as partes, cujo tema não foi muito desenvolvido, em especial, pelos russos, que demandam firmemente a desmilitarização do país vizinho.[11] Até mesmo, relatos apontam que este teria sido o motivo da retirada dos ucranianos das conversas desta segunda tentativa de negociações.
Apesar disso, as partes também debaterem a possibilidade de arquitetar corredores humanitários para evacuar pessoas das regiões que estão sendo bombardeadas, como em Mariupol, cidade portuária ao sul do Estado[12], dentre outras localidades, incluindo Kiev – a capital ucraniana.
Corredores humanitários são zonas geograficamente delimitadas e desmilitarizadas, com o fito de serem utilizadas por civis que buscam fugir de uma área de conflito ou mesmo para o provimento destes por entidades neutras (como o Comitê Internacional da Cruz Vermelha – CICV), particularmente em momentos em que determinadas regiões estão sitiadas ou apresentam grande falta de abastecimento de suprimentos básicos. Esses corredores funcionam temporariamente, significando, na prática, numa interrupção das hostilidades; num cessar-fogo momentâneo. Eles se fundamentam nos preceitos de direito humanitário, mais especificamente, na quarta Convenção de Genebra de 1949, voltada a garantia dos direitos dos civis em meio a conflitos, reduzindo, assim, os flagelos da guerra.
Os debates não foram fáceis, pois as autoridades ucranianas presentes nas negociações não estariam aceitando que algumas rotas sugeridas pelos russos tivessem como destino cidades na Bielorrússia ou mesmo na Rússia.[13] De qualquer forma, desde o dia 5 de março tenta-se o seu estabelecimento em algumas localidades ucranianas, muito embora com falhas de ambos os lados[14], que desrespeitam o cessar-fogo provisório e que acabam vitimando civis em fuga.
Esta situação gerou, até mesmo, um apelo por parte de outras lideranças mundiais, como do Presidente francês, Emmanuel Macron[15], e do Diretor Geral da Organização Mundial da Saúde, Tedros Adhanom[16], reivindicando o seu (re)estabelecimento.
Em vista disso, a terceira rodada de conversas ocorre hoje, dia 07 de março de 2022, tendo os corredores humanitários como ponto central.[17] Os demais tópicos, em especial aqueles externados pelos russos, não parecem se alterar. Ou seja, o final da incursão militar russa em território ucraniano chegaria ao fim apenas se a desmilitarização e a neutralidade ucraniana fossem asseguradas.[18]
Deve-se pontuar que era esperado que essa reunião ocorresse ainda no final de semana passado, tendo sido os ucranianos a parte que protelara o encontro.[19] Talvez, a expectativa para com a realização de audiências na Corte Internacional de Justiça para a apreciação do pedido de medidas provisórias – que incluem a cessação de hostilidades[20] – agendada para hoje, 7 de março de 2022, tenha feito com que os debates fossem adiados. Acerca disso, deve-se pontuar que a Rússia não compareceu à audiência em Haia, tendo apenas a Ucrânia apresentado os seus argumentos. A decisão deve sair em breve.
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