O Alto Custo Da Corrupção Na Saúde Pública Dos Brasileiros

Kathleen Gomes Silva – Acadêmica do curso de Direito no Centro Universitário São Lucas de Ji-Paraná – UniSL. E-mail kathleen_gomees@hotmail.com

Renata Miranda de Lima – Professora Orientadora, Bacharel em Direito. Especialista em Direito Administrativo. Mestre em Direitos Humanos e Desenvolvimento da Justiça. E-mail renata.lima@saolucas.edu.br

Resumo: No Brasil existem fatores que induzem negativamente o combate a corrupção, resultando em demasiado prolongamento desse mal, essa pesquisa tem por objetivo encontrar os problemas que ocasionam essa perpetuação. Analisando o excesso de leis, assim como, a punição aos agentes infratores de modo ineficiente. Iremos expor que a pandemia da COVID-19 demonstrou a realidade vivida na saúde pública brasileira que nos acomete há anos. Em detrimento do caráter excepcional, houve a necessidade da criação de leis para dispor em relação ao enfrentamento, assim como a dispensa de licitações referente aos contratos de utensílios para o combate. Como metodologia, trata-se de uma pesquisa aplicada, com abordagem qualitativa, com objetivos explicativo e exploratório, utilizando-se como procedimento metodológico a pesquisa bibliográfica.  Como veremos, muitos governantes desviaram verbas públicas que deveriam ser destinadas ao enfrentamento da epidemia, ocasionando mais sofrimento ao povo brasileiro, ou seja, o vírus da corrupção, juntamente com o da COVID-19 demonstra alto índice de prejudicial no aspecto socioeconômico.

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Palavras-chave: Corrupção. Saúde Pública. Pandemia. Licitação.

 

Abstract: In Brazil there are factors that negatively, induce the fight against corruption, resulting on a expansive prolongation of that evilness, this research aims to find the problems that cause this perpetuation. Analyzing the excess of laws, as well as the punishment of the offending agents inefficiently. We will expose that the COVID-19 pandemic demonstrated the reality experienced in Brazilian public health, that has affected us for years.  To the detriment of the exceptional character, there was a need to create laws to deal with the confrontation, as well as the waiver of bids related to the contracts for utensils for combat. As a methodology, it is an applied research, with a qualitative approach, with explanatory and exploratory objectives, using bibliographic research as a methodological procedure. As we will see, many government officials diverted public funds that should be used to face the epidemic, causing more suffering to the Brazilian people, that is, the corruption virus, together with that of COVID-19, shows a high level of damage in the socioeconomic aspect.

Keywords: Corruption. Public health. Pandemic. Bidding.

 

Sumário: Introdução, 1. Origem da corrupção mundial. 2. Origem da corrupção no Brasil. 3. Conceito de corrupção. 4. O alto custo da corrupção. 4.1. Insegurança Jurídica é um campo fértil para a corrupção. 5. Operação Mãos Limpas e sua influência na Lava Jato. 6. Dispensa de licitação em época de pandemia. 6.1. Saúde pública no Brasil. Conclusão. Referências.

 

Introdução

O Brasil está saturado de atos de corrupção. Por todos os lados, observamos suas inúmeras formas de aparições, começando pelas manifestações no campo social, em que não temos a capacidade de nos atentar ao fato de que já são demonstrações de corrupções, o jeitinho brasileiro está enraizado na sociedade, buscando sempre modos mais fáceis de alcançar os objetivos.

O amplo campo de legislações que se encontra nosso país, é um fator prejudicial a não diminuição da corrupção, interferindo de modo assíduo no prolongamento dela, pois o brasileiro tentará de todas as formas buscar brechas nas normas, que na grande maioria, são ilegais, e de baixo custo. Sendo assim, é muito dispendioso seguir à risca as leis.

Atualmente estamos enfrentando uma difícil realidade que devasta o mundo, a pandemia da COVID-19. E o que mais notamos são empresas se aproveitando de um momento de extrema urgência e calamidade pública, elevando os preços dos materiais essenciais ao combate, e ainda, agentes públicos desviando verbas públicas, que deveriam ser destinadas ao enfrentamento da pandemia.

A corrupção tem o poder crucial de fazer um estrago onde ela se prolifera. Na saúde pública ela ataca na falta de meios para se ter um bem-estar de excelência, em que governantes inescrupulosos não medem esforços para tirar da população o pouco que lhe é dado. Mas esses corruptos acreditam que não estão fazendo mal a sociedade, uma vez que, as consequências não são individualizadas, pois atingem a sociedade em um todo. Tornando mais trágica as consequências da corrupção na saúde pública, sendo impossível dimensionar quantas pessoas são afetadas pelo vírus da corrupção.

                       

  1. Origem da corrupção mundial

É enganoso dizer que a corrupção advém dos dias atuais, podemos considerá-la como um dos fenômenos mais antigos da nossa sociedade, ela evoluiu juntamente com o ser humano ao decorrer dos anos. Contudo, só foi tipificada no Direito Romano, onde as penas iriam ao pagamento de multa, até pena de morte. Entender como esse fenômeno começou a ser punido, nos trará clareza para distinguir o que já foi feito, e para o que ainda podemos fazer (CORDEIRO, 2017).

 

Na era medieval, a corrupção ainda não havia sido identificada como um crime, mas sim, considerada como ganância, o querer ser melhor que o outro. Era vista como um pecado, atrelada a qualquer conduta ruim do ser humano. Sendo conceitualizada por muito tempo, como um desvio de caráter, dificultando a condenação do ato, por ser em sentido muito amplo. A corrupção era chamada de “barataria”, que significava a atividade de dar, já pensando na retribuição.

 

Ao longo da história, no século XVII, podemos considerar como uma das causas de perpetuação da corrupção, o baixo salário de integrantes do poder público, nos dizeres de Adriana Romeiro “[…] os indivíduos mais bem remunerados, como os vice-reis, mostravam-se menos propensos às práticas de enriquecimento ilícito, ao contrário dos ouvidores, os oficiais do tesouro real e os funcionários inferiores das províncias.” (2017, p.65).

 

Não há como dizer quando de fato começou a corrupção, mas há indícios de punições a prática, como por exemplo, na Grécia Clássica, nas palavras de George Sarmento, (2002, p.28),

 

“[…] em Atenas, três crimes justificavam a abertura de processo contra um magistrado eleito pelo povo: a conspiração contra a democracia, a traição em favor de um inimigo da cidade e a corrupção, ou seja, a utilização do mandato popular para a satisfação dos interesses pessoais. (Apud CORDEIRO, 2017, p. 70).”

 

A corrupção era uma das características mais conhecidas no Egito, A Folha de São Paulo veiculou uma notícia, onde em 2004, um pesquisador egípcio encontrou indícios de corrupção e nepotismo, que datam 3.000 anos atrás. A ocasião foi de que houve um roubo de joias que estavam escondidas na tumba de um faraó, e quem cometeu o crime foram pessoas que trabalhavam no governo, elas foram livradas das penas, e jogaram a culpa em pessoas comuns. (ABDELHADI, 2004).

 

Havia atitudes antigamente que não era consideradas atos ilícitos, um exemplo, nas palavras da historiadora Adriana Romeiro, “Como é sabido, na Espanha do final do século XVII, como meio de contornar as necessidades econômicas da Hacienda Real, os cargos políticos e de justiça do governo americano passaram a ser vendidos.” (2017, p.61). Esse foi um dos meios mais fáceis e transparentes de comprar funções no poder público.

 

Esses são alguns casos de corrupção, e a forma como eles foram tratados ao decorrer dos anos. Ter esse conhecimento histórico sobre o assunto é importante, em razão de todo ser humano estar inserido em um contexto ao nascer, e o comum é ele dar segmento aquele pensamento, ou a cultura estabelecida no seu convívio social, ou seja, é o que lhe é apresentado ao decorrer de sua vida.

 

  1. Origem da corrupção no Brasil

Na formação do Brasil, foi enviado uma elite para administrar o país, em nome do Rei de Portugal, para cobrar impostos, e extrair o máximo de riquezas de nossas terras. Não havia nenhuma intenção de construir uma nação, um dos motivos para a má formação de caráter dos brasileiros (FURTADO, 2012).

 

“Desde o tempo colonial, ocorreu uma reprodução na matriz política da Coroa Portuguesa, referente à gestão e às políticas aplicadas no Brasil-colônia. Ou seja, desde o início, a corrupção faz parte da história nacional. A desorganização do governo e do Estado português foi transferida à colônia brasileira, com muitas particularidades, como, por exemplo: leis confusas, morosidade e ineficiência das estruturas administrativas. Não havia sistema jurídico operoso e ocorria uma enorme confusão entre o público e o privado, ou seja, houve a possessão do espaço público pelo privado e, também, por

agentes públicos corruptos. Eram altos índices de práticas e aceitação de práticas corruptivas. (Caroline Fockink, 2019, p.184)”

 

Com as condutas trazidas pelos portugueses, deram margem para perpetuação da corrupção, os brasileiros foram acostumados com a confusão do que é público com o que é privado, nas palavras do ministro Luís Roberto Barroso,

 

“A corrupção no Brasil tem origens e causas remotas. Aponto sumariamente três. A primeira é o patrimonialismo, decorrente da colonização ibérica, marcada pela má separação entre a esfera pública e a esfera privada. Não havia distinção entre a Fazenda do rei e a Fazenda do reino – o rei era sócio dos colonizadores -, e as obrigações privadas e os deveres públicos se sobrepunham. (2019, p. 10).”

 

Encontramos a corrupção, em todos os elementos do Estado, assim como na política, nas igrejas, o primeiro bispo do brasil, Pedro Fernandes Sardinha, já demonstrava características, ou seja, ele vendia os perdões aos fiéis, que deveriam pagar pelo perdão, de acordo com o pecado cometido e para isso, existia uma tabela com os valores de cada pecado. Ele teve um fim trágico, no caminho de volta a Portugal, foi comido pelos índios caetés.  Mais uma história, que comprova que a corrupção não se encontra apenas na política (REZZUTTI, 2018).

 

Corrupção é tirar vantagem em cima dos outros. Enquanto ela é apenas um suborno ao policial para não ser mutado, “está tudo bem”, mas, e quando ela retira dinheiro do SUS (Sistema Único de Saúde)? E quando mortes são causadas diretamente por governantes que desviam o dinheiro público destinado a saúde? O mal é o mesmo, mas as consequências, são vidas.

 

O problema não está no sistema que foi adotado no Brasil, não está na monarquia, não está na ditatura, não está na democracia, não é um sistema que corrompe, é um sistema que foi corrompido, o grande problema está em uma sociedade que não quer se livrar dessas práticas. Nesse sentido Mairal escreve, “[…] quando um sistema político está contaminado pela corrupção encontrará oportunidades para obter subornos sob qualquer regime econômico.” (2018, p.27).

 

Hoje em dia só descobrimos os casos de corrupção no país, porque as delações premiadas estão sendo feitas com mais frequência. Visto que, a corrupção não é o ato apenas de uma pessoa, existe a necessidade de duas ou mais pessoas para as práticas serem realizadas com sucesso. Não há como só uma pessoa fazer. Deve haver essa troca, é uma colaboração.

 

O caso do “mensalão” foi um marco inicial de uma sociedade que deixou de aceitar os casos de corrupção, que deixou de julgar normal as práticas ilícitas entre o setor privado e o poder público; e o maior processo da história do nosso país que perduram até os dias atuais, é a Lava Jato, onde foi descoberto um dos maiores esquemas de propinas e desvios da Petrobras (PINOTTI, 2019).

 

  1. Conceito de corrupção

Os estudos sobre as causas da corrupção se iniciaram nos anos de 1950, nos Estados Unidos. O país, estava com dificuldades em seu processo de modernização, sem conseguir progredir, precisando de soluções, com isso deram, de um modo mais sistêmico, uma abertura maior ao assunto (FILGUEIRAS, 2009).

 

No significado original, a palavra é “derivada do latim corruptione, que significa putrefação, decomposição e adulteração” (Adriana Romeiro, 2017, p.19), porém, não podemos nos apegar a um significado tão sucinto, cabendo a nós nos aprofundarmos em suas diversas aparições, para um melhor entendimento do que realmente vem a ser a corrupção na qual nos vemos inseridos diariamente.

 

Temos um difícil papel de conceitualizar corrupção, logo devemos abranger suas inúmeras formas de aparições. Para começar, não devemos apenas nos restringir as manifestações políticas, visto que, ela se encontra primeiramente no âmbito da vida social de cada ser humano. A corrupção tem sido tratada nos últimos anos de uma forma mais assídua, o Escritório das Nações Unidas sobre Drogas e Crimes (UNODC), compreende,

 

“A corrupção é um complexo fenômeno social, político e econômico que afeta todos os países do mundo. Em diferentes contextos, a corrupção prejudica as instituições democráticas, freia o desenvolvimento econômico e contribui para a instabilidade política. A corrupção corrói as bases das instituições democráticas, distorcendo processos eleitorais, minando o Estado de Direito e deslegitimando a burocracia. Isso causa o afastamento de investidores e desestimula a criação e o desenvolvimento de empresas no país, que não conseguem arcar com os “custos” da corrupção. (Disponível em < https://www.unodc.org/lpo-brazil/pt/corrupcao/index.html> Acesso em 02 março de 2021).”

 

Um traço natural de cada indivíduo, é preservar o convívio em sociedade, o pensamento pelo bem comum, e por conseguinte, o cuidado pelo bem público. O desvio dessa personalidade resulta, no egoísmo, na ganância, e quando ela é vista no âmbito social, consequentemente, será notada na política também (FILGUEIRAS, 2009).

 

A dificuldade origina-se das várias práticas que podem se enquadrar como corrupção. O fato de os indivíduos perpetuarem esse ato, nos mostra que a corrupção foi sendo aceita dentro das repartições públicas, tornando mais árduo o trabalho de combatê-la. De tanto ser praticada, tornou-se comum, um bom exemplo, é quando, “Um funcionário que aplique rigorosamente a lei administrativa (aduaneira, fiscal etc.) a um familiar ou amigo será socialmente objeto mais de críticas do que elogios.” (Mairal, 2018, p.25) perante um país acostumado em burlar as leis, não há lugar para quem vá de encontro a essa prática.

 

Quando falamos da corrupção dentro do âmbito social, estamos falando do dia a dia de cada pessoa, onde ela está presente mesmo que nós não a percebamos. Está presente no trânsito, quando passamos no sinal vermelho, ou quando invadimos a preferencial. De plano, foi um ato tão pequeno que não há problema, e sempre que a pressa aperta aos condutores, eles dão um jeitinho de conseguir o que querem.

Outro exemplo, é quando conhecemos alguém que possa facilitar, ou até mesmo ajudar a apressar algum serviço, seja em empresa privada, ou no serviço público, a frase dá um jeitinho aí é dita com tanta propriedade e tranquilidade, que não afeta ninguém, e quem fez esse serviço, fica com o sentimento de que quem pediu está te “devendo uma”. E assim se propaga a corrupção, uns cobrando os outros por estarem lhe devendo um favor, e nisso vão burlando normas e princípios.

A cada dia que passa, o que vemos são pessoas e mais pessoas, presas a situações, normais e decorrentes da vida em sociedade, buscando formas de “facilitarem” essas situações, com vistas a alcançar o que querem de forma mais efetiva e rápida. Mais um exemplo, é quando uma pessoa está na fila de um banco, esperando por atendimento, com pressa, assim como várias outras pessoas que também estão na fila, se lembra que possui um certo “conhecido” que trabalha nesse mesmo banco, e decide pedir para que ele dê uma “mãozinha”, passando-o à frente dos demais, mesmo que alguns desses demais detenham preferência, como os idosos. O “conhecido”, acata o pedido, e em minutos, toda a questão se vê resolvida. Bom, a quem devemos apontar como um corrupto? Ambos, pois aquele que cedeu ao pedido, é tão corrupto quanto aquele que fez o pedido.

 

Essas situações, são recorrentes em pessoas que preferem “dar um jeitinho”, ao invés de seguirem as regras. Para essas pessoas, quando surge a oportunidade de se dar bem às custas de um método mais fácil, não há por que seguir leis. É um modo tão egoísta de viver, onde o bem comum é deixado de lado, para seguir os próprios interesses. Onde pequenos atos são realizados dentro do campo social, e as grandes práticas são encontradas na esfera política, e econômica. (CONSTANTINO, 2016).

 

Mas como podemos julgá-los? Se nosso país é tão cheio de normas, que existem leis que pegam, e leis que não pegam. Quanto a isso, Rodrigo Constantino afirma “[…] (pois a função precípua da burocracia parece ser a de criar dificuldades legais para vender facilidades ilegais depois) […]”. (2016, p.19).

 

É tão sufocante esse emaranhado de diretrizes, que o jeito mais fácil de o enfrentar é não o seguir, e não o seguindo, vemos de forma clara, a corrupção se espalhar por todos os cantos, se entrelaçando nas mais diversas situações existentes na sociedade, nos mostrando a obviedade do que é a corrupção: a opção de não seguir o certo, para alcançar o objetivo final, de uma forma mais rápida e por, muitas vezes, a custo zero.

Uns dizem que a corrupção impede o desenvolvimento, e outros alegam que ela é um fator impulsionador da modernização, sobre o viés da concepção positiva da corrupção, na visão de Ivan César Ribeiro,

 

“Na esfera econômica a corrupção permitiria contornar o excesso de regulação e acelerar procedimentos. Uma empresa em busca de uma licença para comerciar poderia, por exemplo, reduzir os seus custos e aumentar a eficiência pagando ao agente do governo um valor para acelerar o processo de expedição desta licença. Assim, a corrupção também funcionaria como um incentivo de produtividade aos agentes públicos. (2005, p.12).”

 

Seguindo o mesmo pensamento, o professor Fernando Filgueiras escreve, “Do ponto de vista dos benefícios, a corrupção pode agilizar a burocracia, ao tornar mais rápida a emissão de documentos e autorizações formais por parte do Estado.” (2009, p. 395). O excesso de leis, abre oportunidades para métodos mais ágeis, implicando em um crescimento “falso” do país. Onde as empresas vão crescer firmadas em burlar leis e conseguir privilégios.

 

Em contrapartida a esse pensamento, Walfrido Warde, escreve, “A corrupção é uma das mais importantes causas da desigualdade. A ausência de um combate adequado à corrupção aprofunda as desigualdades intoleráveis e odiosas do nosso país […]”. (2018, p.12). A corrupção tem sido fundamental para a estagnação do desenvolvimento do país, não há crescimento seguro alicerçado em trapaças.

 

Não há como falar em um desenvolvimento igualitário de uma sociedade que está enraizada por corrupção. O progresso é de apenas uns, justamente aqueles que se dão bem às custas de “jeitinhos”.

 

  1. O alto custo da corrupção

O brasileiro passou a ter como qualidade, a malandragem. Como se dar bem as custas dos outros pudesse ser um atributo, mal sabem que são tão titulares da corrupção como os políticos de Brasília. A naturalidade que é trazida a malandragem ultrapassa os limites da singularidade. Para Rodrigo Constantino, “O jeitinho é, em essência, apelar a um elo pessoal ou emocional para burlar alguma norma e obter algum privilégio.” (2016, p. 19).

 

O “jeitinho brasileiro” é capaz de distorcer o que deveria ser reto, para algo absurdo praticado por pessoas “tolas”. Quem faz o certo, é visto como errado, uma vez que, há meios mais fáceis, menos burocráticos para se conquistar os desejos. Mas qual o custo dessas práticas recorríveis da nossa sociedade?

Ao enumerarmos os custos da corrupção, começaremos pelos custos econômicos que nosso país vem sofrendo, com tantos desvios de dinheiro público, impossibilitando a melhoria dos setores básicos do país, como principalmente, a saúde. A mais prejudicada com tudo isso é a população, que ao mesmo tempo, é a única que pode mudar essa realidade.

 

Um dos empecilhos para redução da corrupção está justamente alicerçado no fato dela “não causar prejuízo a ninguém”. Um exemplo disso, é quando tratamos das classes mais carentes do nosso país, destes lhes são retirados o direito a melhor educação, aos melhores tratamentos na área da saúde, a um transporte público de qualidade, mas o mais interessante, é que elas não têm dimensão do que elas poderiam ter, então, não há como acionar a Justiça, pois não sabem o que de fato poderia lhes serem ofertados pelo Estado.  (PINOTTI, 2019).

 

A pandemia causada pelo vírus da COVID-19, vem ceifando vidas, sem olhar a quem, não importa a classe social, não importa a cor, o vírus não se atenta a isso. A falta de hospitais, e equipamentos tem sido marcos importantes de um país que não destinou o suficiente, e desviou milhões de reais, não apenas em época de pandemia, mas desde antes disso, nosso sistema de saúde já se encontrava precário, justamente porque a corrupção não vem de hoje. Estamos apenas sofrendo as consequências, e quais são elas? São vidas.

É lastimável analisar que, em um momento tão crítico, onde deveria haver mais união, o que mais tem importância é o dinheiro, pasmem, o interesse particular vem acima de qualquer interesse de coletividade, independentemente de qualquer colapso instaurado.

 

O Índice de Percepção da Corrupção, criado pela Transparência Internacional, classifica os países em todo mundo, sendo avaliados com notas de 0 a 100, onde 0 indica um país altamente corrupto, e 100 o país mais íntegro. O Brasil se manteve estagnado, com nota 38 em 2020, e em 2018 e 2019 com nota 35, não há o que se falar em um avanço significativo nos últimos anos, pois o IPC conta com uma margem de erro de 4,1 pontos para menos ou para mais. A Transparência Internacional ainda trouxe que o Brasil vem sofrendo sérios retrocessos no combate efetivo da Corrupção. (BRASIL, 2020).

 

Nos últimos anos, o combate a corrupção veio sendo abordado pelos candidatos políticos de uma forma mais assídua nas suas campanhas, pois perceberam que os brasileiros começaram a se posicionar e a cobrar das autoridades um combate confiável a corrupção. Isso não significa que eles fizeram algo, apenas que aprenderam um modo prático e fácil de ganhar votos. O Brasil encontra-se muito aquém do esperado no combate a corrupção, está abaixo da média do BRICS (39) e mais abaixo ainda da média mundial que perfaz 43 pontos (BRASIL, 2020).

 

A estagnação do Brasil no IPC deve ser questionada sim, pois nosso país está muito longe de alcançar a meta de ser um país limpo de corrupção. Com a diminuição da corrupção teremos um país mais evoluído moralmente e economicamente, e então, viveremos em uma sociedade que terá confiança.

 

4.1 A Insegurança Jurídica é um campo fértil para a corrupção

Outro custo que é trazido pela corrupção, é a insegurança jurídica. É clara a incerteza da população em um ordenamento jurídico frágil, pois a sensação de impunidade nos invade de uma forma gigantesca, o sentimento é que estamos em um país onde a lei vale para alguns, mas não para todos.

 

Crimes de colarinho-branco vão se repetir por muitos anos ainda, visto que, raramente a lei é aplicada para eles. “[…] um direito penal seletivo e absolutamente ineficiente em relação à criminalidade de colarinho-branco criou um país de ricos delinquentes.” (Luís Roberto Barroso, 2019, p.18). Uma frase dura, que retrata a realidade do nosso país, não estamos sob um sistema legislativo igualitário.

 

O sistema deveria agir de uma forma a trazer segurança à população, a resultar em certeza de que crimes vão ser punidos. E não é por falta de penas, pois disso, nosso sistema conhece bem, ao ponto de sobrecarregá-lo, neste sentido, a mestre em direito penal, Caroline Fockink, aponta,

 

“A confiança nas instituições é considerada um elemento fundamental, pois elas são criadas legalmente para atender às demandas sociais, prestando segurança pública, assistência jurisdicional e demais serviços sociais necessários e estabelecidos legalmente. O objetivo na criação de uma instituição pública justamente está centrado no dever de dar atenção, com eficiência, honestidade e probidade ao propósito a que foi criada. Quando isso ocorre, cria-se um círculo positivo de confiança da população nas instituições. A instituição pública está, então, respondendo positivamente às

expectativas sociais. (2019, p. 184).”

 

No Brasil, vemos o quão acessível é operar em situações ilícitas, havendo incentivo para essas ações, como o ganho fácil e farto, e pior, não há grandes riscos de condenação a esses infratores, elevando os índices de criminalidade no país. O Sistema Legislativo brasileiro perdeu a eficácia em agir como uma forma de prevenção geral, causando temor de punição. (BARROSO, 2019).

 

O excesso de leis, e o cumprimento delas de modo não igualitário, resulta em um campo fértil para a corrupção. Na primeira, as brechas serão a procura incansável para conseguir vantagens, ou seja, alternativas mais baratas e menos penosas, e na segunda a busca será por quem tem mais poder, ou seja, em todos os casos, sempre se livrando do cumprimento das normas. Obvio que, em muitas situações o excesso de normas traz dificuldades para seu cumprimento. E a quem iremos atribuir a culpa dessa vez? Aos legisladores? A cultura brasileira é a grande vilã dessa história, o jeitinho brasileiro fugirá dos trâmites legais, sempre que possível seja, para facilitar sua vida.

 

“[…] quanto mais ambiciosa a norma for, mais aumentarão as oportunidades para a corrupção: “Uma regulamentação mais rigorosa não garante produtos de maior qualidade (…). O que sim estimula é o aumento da corrupção” observe-se que, além disso, a proliferação de requisitos leva a que requisitos importantes coexistam com os secundários. E se o cumprimento dos últimos for muito difícil, tende-se a recorrer à corrupção para contorná-los. Assim o suborno pode levar a que não se controle nenhum tipo de requisito. (Héctor A. Mairal, 2018, p.117).”

 

Quando dizemos que o excesso de leis, é um fator da corrupção, podemos dar como exemplo os altos impostos que são cobrados no nosso país. Encontraram uma brecha, em que quanto mais alto fica, mais dinheiro o governo tem. Só que não há distribuição eficaz desses valores nas principais necessidades da sociedade. Sendo assim, é insignificante o crescimento do Brasil, poderíamos facilmente ser um país de primeiro mundo, se não enriquecêssemos apenas uma classe de pessoas. E isso é resultado de um povo que está impregnado em sua grande maioria pela cultura da malandragem.

 

“O Brasil é de longe o campeão mundial no tempo gastos pelas empresas na preparação de documentos para o pagamento de impostos e contribuições: 1.958 horas ao ano, seis vezes a média de 332 horas registrada nos países da América Latina e Caribe, de acordo com o mais recente relatório do Banco Mundial sobre ambiente de negócios em todo o mundo. (EXAME, 2017, Disponível em <https://exame.com/> Acesso em 07 de abril de 2021).”

 

Mais um dado assustador que representa a abundância de normas que se encontra o Brasil, é “O país acumula 5,9 milhões de normas editadas nas três esferas de governo (União, Estados e municípios) desde a Constituição de 1988.” (Luciana Albernaz, 2021, disponível em < https://sindeprestem.com.br > acesso em 10 abr. 2021). Esse excesso causa a procura por brechas, e na maioria delas são brechas ilegais. Por exemplo, hoje em dia é muito difícil abrir uma empresa, pois há muitos trâmites a serem seguidos, que trazem duas alternativas, a primeira é procurar o mais fácil de forma ilícita, ou seja, pedindo “uma ajudinha” aos funcionários públicos, ou as pessoas que detêm poder, e o segundo, é não fazer, não abrir. Das duas formas, a economia é atingida, trazendo prejuízos.

 

“O Brasil é um dos países com a mais intricada burocracia do mundo, o que representa não só um custo adicional para empresas e desincentiva investimentos, como também produz aumento nas oportunidades para que atos de corrupção sejam praticados. Afinal, o pagamento de propina tem como objetivo, com frequência, superar entraves e obstáculos burocráticos. (Unidos Contra a Corrupção, p.41. 2018).”

 

Quando um funcionário público renuncia ao seu dever legal de preservar o bem comum, para buscar seu enriquecimento próprio, ele não está apenas colocando em descrédito os funcionários públicos, mas também está colocando os entes públicos do Estado, fazendo com que os cidadãos não acreditem nas instituições. Os agentes públicos têm poderes positivos e negativos sobre a sociedade, capazes de resultar em respeito pelos entes públicos e pelas leis, quando suas atitudes forem benéficas a sociedade. (FOCKINK, 2019).

 

Os maiores prejudicados somos nós, enquanto população, pois não confiamos no sistema do nosso país, e muito menos nos funcionários que o representam. Essa insegurança de que as leis só funcionam para alguns, traz consequentemente o não seguimento das normas, visto que, elas não são impostas para todos.

 

  1. Operação Mãos Limpas e sua influência na Lava Jato

A operação Lava Jato, teve inspiração na operação Mãos Limpas, que ocorreu na Itália entre os anos 1992 – 1994, ou como ficou conhecida, MANI PULITE, teve grande repercussão pois tratava-se da máfia italiana envolvida diretamente em esquemas fraudulentos com os funcionários públicos. (DAVIGO, 2019). O início da operação se dá com a narração a seguir,

 

“SEGUNDA-FEIRA, 17 DE FEVEREIRO DE 1992, 17H30MIN. Luca Magni, um empresário de 32 anos, comparece na Via Marostica 8, em Milão, no escritório de Mario Chiesa, presidente do Pio Albergo Trivulzio, histórica casa de repouso para idosos fundada no século 18. Magni é dono de uma pequena empresa de limpezas, a ILPI, de Monza, que trabalha também para o Trivulzio. Chiesa é um representante do Partido Socialista Italiano e não esconde suas ambições políticas: sonha em se tornar prefeito de Milão em um futuro próximo. Magni é recebido após meia hora de espera. Ele deve entregar quatorze milhões de liras a Chiesa, valor da propina negociada por um contrato de 140 milhões de liras.’ Carrega uma caneta transmissora no bolso do casaco e segura uma maleta com uma câmera escondida. “Para dizer a verdade”, recorda Magni, “eu tinha muito medo, estava muito nervoso. O engenheiro Chiesa estava ao telefone, e tive de esperar dez minutos em pé até que ele concluísse a ligação. Então, dei-lhe um envelope que continha sete milhões de liras. Disse a ele que ainda não tinha os outros sete” Chiesa não reage. Apenas pergunta: “Quando você trará o resto?” “Na próxima semana”, responde o agitado Magni Depois, despede-se e, ao sair, quase esbarra com um policial à paisana.  (Gianni Barbacetto, 2016, p. 37).”

 

A partir daí muitas acusações foram feitas, e a mais desafiante foi quando Chiesa declarou que era apenas quem fazia os trabalhos, mas que quem mandava era o Partido Socialista Italiano. E deu início as investigações sobre líder do Partido (MIGALHAS, 2017). Como é relatado pelo Doutor Walfrido Warde (2018, p.96) “A operação levou à prisão inúmeros políticos e empresários, dentre eles o primeiro-ministro e líder do Partido Socialista Italiano, Bettino Craxi, determinando o fim da Primeira República Italiana (1948-1994)”.

 

O diferencial da operação foi a realização de condenações aos verdadeiros chefes da Máfia Italiana, exterminando dois partidos que mandavam na Itália. Foram acusadas cerca de 4.520 pessoas envolvidas nos crimes de corrupção, sendo vista como um “efeito dominó”, descobrindo casos inescrupulosos. A cada momento das investigações, era evidente o fato de que na Itália o pagamento de propina era uma regra. (MORO, 2016).

 

A operação Mãos Limpas foi um marco divisor na Itália, incorrendo em antes da operação e depois, pois acabou com dois partidos que dominavam o país, essa é uma das referências positivas, vejamos,

 

“A consequência a curto prazo foi a derrocada dos principais partidos que governaram a Itália desde o início da Republica: Democracia Cristã e Partido Socialista Italiano, os quais sumiram do mapa político, deixando espaço para o avanço de forças novas […] Esta mudança abrupta no esquema a que Itália havia se acostumado desde o início da Republica, fez surgir a concepção da ‘Mani Pulite’ como um divisor de aguas na vida pública italiana, de forma que se fala de Primeira República (antes de Mani Pulite) e Secunda República (depois de Mani Pulite), apesar de não ter ocorrido alguma ruptura institucional – os termos são apenas jornalísticos, mas entraram na linguagem comum e, com certeza, entrarão na história. (MIGALHAS, 2017, disponível em < https://www.migalhas.com.br/ > acesso em 16 de abr. de 2021).”

 

A Mani Pulite tem um final trágico, em razão da corrupção sistêmica enraizada naquele país. Os próprios magistrados foram acusados de cometer excessos em prisões cautelares, pasmem, mesmo sem ter a comprovação de que havia inocentes. Alegando ainda não estarem em um Estado de Direito Democrático. Houve diminuição das penas, aprovaram leis que dificultavam os processos de investigações, visando apenas reduzir as consequências dos processos judiciais, e infelizmente, conseguiram (MORO, 2016).

 

A Itália parece funcionar de forma contrária ao que está escrito nas leis. Após a descoberta dos esquemas de corrupção, o sistema político reagiu, imediatamente no ano de 1994, por meio do governo. Na tentativa de aprovar o decreto-lei nº 440/1994 que dispunha sobre o impedimento de prisão preventiva as pessoas submetidas as investigações por crimes de corrupção, porém, com a pressão popular, o decreto não foi sancionando pelo Parlamento, e perdeu sua validade. Os efeitos foram trágicos, ao notarem que não havia uma união entre os poderes, e que facilmente as normas estavam afrouxando para os corruptos, diminuiu significativamente as pessoas dispostas a denunciar e a colaborar com as investigações (DAVIGO, 2019).

 

Mas o que a operação Mãos limpas tem a ver conosco? Nesta operação descobrimos algo muito importante, que não estamos confrontando casos excepcionais de corrupção, e sim, como uma forma de operar o sistema. Piercamillo Davigo, um magistrado Italiano que fez parte da operação Mãos Limpas, nos escreveu, “O instrumento principal utilizado pela máfia e outras organizações não é a violência, e sim a corrupção.” (2019, p.103). Essa frase nos remota ao fato do quão letal é a corrupção.

 

Devemos tomar como exemplo a Operação Mãos Limpas realizada na Itália, ela demonstra a primordialidade imperiosa de unir todas as instituições contra um sistema corrupto. Não teremos chances contra esse mal, se apenas alguns lutarem contra ele, precisamos nos unir para o combate.

 

  1. Dispensa de licitação em época de pandemia

Outro fator que tem trazido riscos evidentes ao combate a corrupção é a dispensa da obrigação de licitações em contratos, em face do momento excepcional que estamos enfrentando. A pandemia da COVID-19 veio mostrando o quão precário é nosso sistema de saúde. Há mais de um ano foi declarado estado de pandemia no mundo, e foi necessário medidas emergenciais para romper com as burocracias para licitações.

 

As Leis 8.666/1993 e 10.520/2002 estabelecem normas gerais sobre licitações, incluindo os requisitos para o requerimento delas. Tais leis foram substituídas e unificadas pela nova lei de licitações 14.133 que foi sancionada recentemente em 01 de abril de 2021. Nas palavras de Alexandre Mazza, “A Licitação é um procedimento obrigatório que antecede a celebração de contratos pela Administração Pública” (2019, p.826).

 

Ainda demonstrando um conceito mais abrangente, Mazza traz que é “o procedimento administrativo pelo qual entidades governamentais convocam interessados em fornecer bens ou serviços […] estabelecendo uma competição a fim de celebrar contrato com quem oferecer a melhor proposta” (2019, p.827-828).

 

O Poder Público não pode escolher livremente por determinada empresa como fazem as empresas privadas, pois devem estar preceituados nos princípios de isonomia, impessoalidade, moralidade e indisponibilidade do interesse público. Devendo ocorrer uma seleção imparcial do melhor contrato para o Poder Público

A Constituição Federal trouxe normas a serem seguidas no âmbito da administração pública, em específico sobre as licitações, e com exceções de casos especificados em Lei, a Carta Magna, dispõe,

 

“Art. 37, inciso XXI, ressalvados os casos especificados na legislação, as obras, serviços, compras e alienações serão contratados mediante processo de licitação pública que assegure igualdade de condições a todos os concorrentes, com cláusulas que estabeleçam obrigações de pagamento, mantidas as condições efetivas da proposta, nos termos da lei, o qual somente permitirá as exigências de qualificação técnica e econômica indispensáveis à garantia do cumprimento das obrigações.”

 

Foi imposto ao Estado a criação de medidas eficazes de combate a pandemia, implicando em uma facilitação de compras de bens e serviços, “[…] exige que a Administração Pública seja cada vez mais rápida e eficiente na sua atuação, justamente para desburocratizar as aquisições que estão sendo feitas no combate a essa doença.” (Bruno Teles, 2020, p.3)

 

A Lei 13.979 de 09 de fevereiro de 2020, ponderando o Estado de Calamidade Pública, trouxe medidas consideradas adequadas para o enfrentamento da COVID-19, no âmbito nacional. A referida Lei trata da dispensa de licitações enquanto perdurar a pandemia da COVID-19, e aduz dois fatores importantes em seu art. 4º, onde o primeiro é que deve ser usada apenas enquanto perdurar a emergência de Saúde Pública internacionalmente, e o segundo é que a dispensa de licitações é destinada apenas aos bens, serviços ou insumos referentes ao enfrentamento da pandemia, (BOAVENTURA, 2020), vejamos,

 

“Art. 4º – É dispensável a licitação para aquisição ou contratação de bens, serviços, inclusive de engenharia, e insumos destinados ao enfrentamento da emergência de saúde pública de importância internacional de que trata esta Lei. (Redação dada pela Lei nº 14.035, de 2020)

  • 1º – A dispensa de licitação a que se refere o caput deste artigo é temporária e aplica-se apenas enquanto perdurar a emergência de saúde pública de importância internacional decorrente do coronavírus.”

 

Ainda sobre o art. 4º da Lei 13.979, ao fazer referência aos bens, serviços e insumos para o enfrentamento da COVID-19, torna-se vasta as opções, por exemplo, se os servidores públicos precisarem de notebook para trabalhar em home office não haverá licitação, pois versa sobre a não aglomeração nas repartições públicas que é uma das medidas essenciais para o combate a pandemia. É um modo de dar continuidade aos trabalhos, sem exposição ao vírus.  (BOAVENTURA, 2020).

 

“O atual cenário de enfrentamento de uma crise sanitária com amplos reflexos na prestação da saúde pública demanda uma pluralidade de providências a serem tomadas pelo Poder Público para que haja um mínimo planejamento da execução das ações voltadas ao atendimento das novas demandas geradas pelo cenário adverso. Há um fator de escassez de recursos estatais para atendimento rápido de múltiplas demandas, associado com uma crise econômica que mingua os cofres do Estado e desafia o gestor público. (Gustavo Assed Ferreira, Rafael Assed de Castro, 2021, p.8)”

 

Em vista da necessidade de rapidez nos processos de compras de materiais para o combate, mais uma vez a Lei teve que dispor sobre a transparência nos processos, pois se tratando do país da malandragem deve se esperar atos de aproveitamento, e foi o que infelizmente aconteceu, e vem acontecendo, vejamos,

 

“Entre os problemas identificados nos processos de compras públicas estão: grande variedade de preços, valores unitários que não apresentaram reduções nem em compras em grandes quantidades, contratos feitos com empresas de outros setores que não o da saúde e pagamento antecipado por parte das autoridades públicas por materiais ou equipamentos médicos que tinham defeitos, chegaram com atraso ou nunca foram entregues. (Transparência Internacional Brasil, 2021, p. 44).”

 

A imposição rigorosa de licitações, demonstra mais uma vez a burocracia que está entrelaçada no nosso país. A pandemia da COVID-19 trouxe um caráter de urgência a esses processos, visto que, a demora para concessão de utensílios indispensáveis para o combate à pandemia, tem levado a mortes, de milhões de pessoas. O momento de crise que estamos passando, nos faz pensar em relação a esses inúmeros trâmites que existem no nosso país, nesta perspectiva,

 

“[…] nos traz uma tarefa no sentido de contratar o mais rápido possível, deixando de lado o formalismo excessivo e tutelando os direitos fundamentais do ser humano, que é o direito à vida e à saúde, sem, no entanto, permitir situações ilegais e permeadas de abusos. Premente é, portanto, a necessidade de mudança de mentalidade, admitindo a flexibilização das normas, como instrumento de inovação, evitando procedimentos burocráticos, que se oponham aos princípios da celeridade e do interesse público. (Carmen Boaventura, 2020, disponível em < https://www.effecti.com.br.> Acesso em 15 de abr. de 2021).”

 

Contudo, nota-se uma população sedenta por oportunidades de se dar bem na vida, seja elas boas ou ruins, não perdem o momento, se aproveitam de uma emergência para melhorarem de vida, demostrando que o problema não está apenas nos políticos, está na raiz da sociedade brasileira. É incrível como não houve empatia em meio a uma pandemia.

Além do sofrimento com a epidemia, as lotações dos hospitais, as faltas de equipamentos para as UTIs, como por exemplo a falta de oxigênio enfrentada por Manaus/AM, vejamos,

 

“Documentos obtidos pelo Ministério Público de Contas indicam que 31 pessoas morreram por falta de oxigênio em Manaus nos dias 14 e 15 de janeiro, quando a capital atingiu o ápice da falta do insumo. Nesses dois dias, falta de oxigênio nos hospitais de Manaus levou a cidade a um cenário de caos: com recordes nos casos de Covid, a cidade precisou enviar pacientes que dependiam do insumo para outros estados. Parentes de pessoas internadas tiveram que comprar cilindros com o gás por conta própria. (G1 AM, 2021, disponível em < https://g1.globo.com/ > acesso em 13 de abr. de 2021).”

 

Ainda, no início da pandemia, os equipamentos essenciais para o enfrentamento da COVID-19 tiveram aumentos exorbitantes em relação aos preços antes da pandemia, como por exemplo, nos produtos de álcool em gel, máscaras, luvas. Podemos perceber mais uma vez como o brasileiro é cheio de esperteza e malandragem, aproveitando-se de um momento de vulnerabilidade da população para superfaturar. No final do ano passado, o Ministério Público de Contas do Espírito Santo, investigou, e apontou um superfaturamento na compra de cloro na cidade de Alto Rio Novo, para desinfectar os ambientes usados para enfrentamento, observemos,

 

“Em razão da compra sem licitação de cloro ativo pela Prefeitura de Alto Rio Novo por valores acima dos praticados no mercado, o Gabinete Especial do Ministério Público de Contas (MPC) apresentou representação na qual pede a condenação dos responsáveis pela aquisição do produto – prefeito, secretário de Saúde e servidora municipal autora do termo de referência – e da empresa contratada à devolução do valor relativo ao dano causado aos cofres públicos pelo sobrepreço do produto, destinado ao enfrentamento da Covid-19. (MPC, 2020, disponível em < https://www.mpc.es.gov.br/ > acesso em 13 de abr.de 2021).”

 

Nos Estados Unidos, no ano de 2004, quando o furacão Charley assolou o estado da Flórida, além dos inúmeros prejuízos causados, trouxe ainda um debate fervoroso pelos altos preços após o furacão, o Procurador-Geral do Estado, Charlie Crist ficou indignado, em suas palavras,

 

“Não se trata de uma situação normal de livre mercado, na qual pessoas que desejam comprar algo decidem livremente entrar no mercado e encontram pessoas dispostas a vender-lhes o que desejam, na qual um preço obedece à lei da oferta e da procura. Numa situação de emergência, compradores coagidos não têm liberdade. A compra de artigos básico e a busca de abrigo seguro são algo que lhe são impostas. (Apud SANDEL, 2020, p.13).”

 

Na Flórida, existe a lei contra os preços abusivos, e ao tentar o cumprimento dela, o Procurador Crist foi coagido por vários economistas que articulavam ter sido impostos “preços justos” pois foram fixados de acordo com demanda de oferta e procura. No entanto, não é assim que uma sociedade boa deve funcionar, a tentativa de obter vantagens em cima da população em tempos de crise, é mais uma demonstração de ganância, essa que deve ser coagida pelo Estado para, ao menos, restringir sua expressão descarada. (SANDEL, 2020).

 

Ao passarmos por momentos de urgência, não temos outra alternativa a não ser comprar alguns itens necessários para o enfrentamento, a exemplo da COVID-19, máscaras e álcool em gel, e é inadmissível que se aproveitem do momento de fragilidade para faturamento exorbitante, e podemos notar que não são apenas os agentes públicos, mas também a população, os comerciantes. Atitudes como essas, devem ser arrancadas da nossa sociedade, o bem comum deve prevalecer para que todos possam sair da situação de urgência.

 

6.1 Saúde Pública no Brasil

A Constituição Federal de 1988, imputou ao Estado a obrigação do direito à saúde, no art. 196,

 

“A saúde é direito de todos e dever do Estado, garantido mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença e de outros agravos e ao acesso universal e igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação.”

 

Entretanto, com a falta de orçamento para financiar essa enorme responsabilidade, consequentemente houve um excesso de demanda. Ao estabelecer que é direito do Estado prover o necessário para a saúde dos brasileiros, notamos o quão pesado foi esse encargo para o Governo, por mais que por trás somos nós quem financiamos através de impostos, mas saúde pública ainda se encontra precária.

 

Não obstante, o Estado não suportou a incumbência de oferecer um sistema de saúde a todos os brasileiros, visto que, a CF ao versar sobre lhe incumbe a oferecer todos os serviços, levando a demanda infinita e dificilmente controlada (GARSCHEGEN, 2020). O Estado por meio de mais burocracias tentou limitar o teto a ser usado pelos Estados e Munícipios, levando a uma “oferta limitada e demanda infinita, ocorre o inevitável: a escassez.” (Bruno Garschagen, 2020, p.157).

 

Além disso, a corrupção embolsa uma parcela gigantesca que deveria ser disponibilizada ao SUS, ocasionando filas de espera perpétuas. Quem perde mais uma vez, somos nós. Nós que temos que ter limitações ao procurar o Estado para ter uma saúde de qualidade.

E onde está o problema? Nas filas infinitas que sobrecarregam um sistema precário? Ou está em nós, brasileiros, que procuramos o direito à saúde que nos foi dado na Constituição Federal? A dificuldade consiste na não punição a agentes infratores que conduzem esse Sistema. Já que ao Estado lhe foi imputado essa obrigação, deve ele fazer de tudo para seguir essa norma. E assim, punir os agentes que desviam dinheiro da saúde pública.

 

Ao darmos poderes aos políticos sem conhecermos ao menos suas propostas, e além de tudo sermos gananciosos, nas palavras do escritor e colunista Rodrigo Constantino, sobre as eleições no nosso país, “Parece um balcão de negociatas em que os princípios são colocados de lado e os interesses imediatos, priorizados. O malandro vota com o bolso e olhando apenas para o hoje.” (2016, p. 63).

 

Precisamos pensar e agir como sociedade, analisando as necessidades do país, principalmente com a saúde, e frisamos tanto sobre ela, pois é de suma importância ter uma saúde pública de qualidade, porque acima de tudo, do pobre ao rico, do preto ao branco, estamos falando de vidas. A corrupção na saúde pública é capaz de levar pessoas ao óbito por falta de recursos, nas palavras do Ministro Barroso,

 

“Corrupção mata. Mata na fila do SUS, mata na falta de leitos, mata na falta de medicamentos, mata nas estradas que não têm manutenção adequada, destrói vidas que não são educadas por falta de escolas. O fato de o corrupto não ver nos olhos da vítima não o torna menos perigoso. (Luís Roberto Barroso, 2018, Disponível em: <https://portal.stf.jus.br> Acesso em 15 abr. 2021).”

 

Não adianta apenas enumerar os fatores que ajudam na perpetuação da corrupção, ao contrário disso, precisamos buscar formas de nos livrar desse mal que assola nossa sociedade, uma alternativa que o Banco Central encontrou para agilizar nossas vidas, foi também uma forma de ter mais transparência nas transações, de modo a evitar a circulação de dinheiro em espécie, vejamos,

 

“Em novembro, o Banco Central lançou um novo sistema online de transferências e pagamentos, o PIX. A plataforma tem o potencial de reduzir pagamentos em espécie (uma prática que corresponde a cerca de 70% das transferências financeiras no país) e de aumentar a rastreabilidade de transações, o que pode auxiliar na prevenção de crimes como corrupção e lavagem de dinheiro. (Transparência Internacional Brasil, p.16, 2021).”

 

Buscando opções de diminuir a corrupção na sociedade brasileira, temos dois elementos importantíssimos para o avanço da mudança que visa a transformação na base do cidadão, ou seja, nos valores morais, e prezar pela transparência nos atos públicos, nas palavras do professor Fernando Filgueiras,

 

“No que diz respeito à corrupção, constata-se que não basta uma mudança do aparato formal ou da máquina administrativa do Estado propriamente dita, mas reforçar os elementos de uma cultura política democrática que tenha no cidadão comum, feito de interesses, sentimentos e razão, o centro de especulação teórica e prática para uma democratização informal da democracia brasileira. Os avanços das reformas da máquina pública, nas duas últimas décadas, são inegáveis, com o reforço da transparência. Contudo, falta, à democracia brasileira, um senso maior de publicidade, pelo qual a transparência esteja referida a uma ativação da cidadania, à accountability e à participação, sem os quais os esforços de combate e controle da corrupção ficarão emperrados em meio a uma cultura política tolerante às delinquências do homem público. (2009, p. 418).”

 

Para se ter melhores resultados nessa busca, os valores morais interferem na construção da confiança dos brasileiros nas instituições, e isso se dá, porque os servidores públicos quando não agem de acordo com o art. 37 da Carta Magna, seguindo os “princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade” põem em descredito as instituições do Estado.

 

É necessário que os servidores tenham atitudes pensando no bem comum, para que os cidadãos possam respeitar e acreditar, nas instituições que deveriam apenas proteger. Para o bom andamento da democracia é de suma importância que tenha confiança recíproca, com a população acreditando nas intuições públicas, aumentam a confiança nas leis, pois notam que os funcionários de sua administração seguem e fazem de tudo para que sejam eficazes, esse é um dos caminhos para fugir da corrupção.  (FOCKINK, 2019)

 

Conclusão

Podemos notar uma população mais sedenta por respostas aos incontáveis casos dos crimes de corrupção que permanecem no Brasil, porém, sem compreender que precisam fazer algo para mudar essa triste realidade. A cobrança aos agentes públicos, é essencial, assim como, o conhecimento pelas propostas dos candidatos a cargos públicos, não pensando em apenas uns, mas sim em sociedade. Quando se almeja algo em troca por um voto, você não está pensando no bem comum. E o bem comum, sem sombras de dúvidas, é uma sociedade sem corrupção.

É de suma importância compreendermos que por mais que façam a população se acostumar com atos de corrupção, trazendo-os como se não fizessem mal a sociedade, não é bem assim. Não devemos mais aceitar práticas de corrupção que estão tirando do povo o pouco que lhe é dado, de modo a afetar diretamente a saúde pública dos brasileiros. A pandemia da COVID-19 demonstrou as consequências vividas diariamente no nosso Sistema Único de Saúde.

O Brasil transmite a população a existência de um caos no ordenamento jurídico brasileiro, onde evidência uma insegurança, em relação ao fato de que as normas não são impostas a todos da mesma forma, trazendo uma desigualdade até na aplicação das leis. Como no excesso delas, implicando na busca por brechas, ocorrendo em mais casos de corrupção. A confiança nas instituições é de grande valia, uma vez que, constroem uma coesão entre o que está no papel, na lei, com o que é praticado.

Outra forma de buscar a diminuição da corrupção, é ter uma transparência dos gastos de uma forma mais efetiva, para que os órgãos competentes, como a, Controladoria-Geral da União (CGU), Tribunal de Contas da União (TCU), Polícia Federal (PF) e o Poder Judiciário, possam investigar com mais facilidade os crimes de corrupção, de modo, a quebrar a burocracia que está enraizada fielmente no nosso país.

Uma questão a ser pensada é em como se dará os processos de licitações após a pandemia da COVID-19, ainda, em como será realizado os processos de corrupção em especial na saúde pública, pois, alguns governantes não pensaram nas vidas que seriam afetadas por esse vírus mortal. Dessa forma, não há justificativas para ter paciência e cautela com governantes que não mediram esforços para passarem a mão no dinheiro público que deveria ter sido destinado para salvar pessoas.

 

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