Sumário: 1. História do protesto cambial; 2. Finalidade do protesto cambial; 3. A intimação no protesto cambial para fim falimentar; 4. Conclusão; 5. Referências bibliográficas.
Resumo: O artigo trata do aperfeiçoamento da intimação do devedor comerciante no protesto cambial para fim falimentar. Inicialmente, abordamos a história e a finalidade do protesto cambial. Em seguida, analisamos o aperfeiçoamento da intimação. O protesto cambial destina-se apenas ao registro de não-aceites e de não pagamentos para garantir o direito de regresso do credor contra os coobrigados da letra: sacador, endossante e respectivos avalistas. O devedor deve ser intimado para possibilitar a purgação da mora. Para o aperfeiçoamento da intimação, é imprescindível a identificação da pessoa que a recebeu. Se não houver identificação, o protesto estará viciado e não poderá ser fundamento para decretação da falência.
Palavras chaves: Protesto Cambial. História. Finalidade. Intimação. Aperfeiçoamento. Vício. Falência.
1. História do protesto cambial
Segundo Dylson Dória, “as origens do protesto cambial remontam à prática medieval italiana.” O protesto realizado em Gênova, no ano de 1384, relativo à letra de câmbio proveniente de Bolonha, seria o mais antigo. [1]
Contra esta tese insurge-se José A. Saraiva, o qual afirma que o primeiro protesto cambiário conhecido é de 1335. Este autor noticia que publicou no Direito cambiário brasileiro o protesto de uma letra de câmbio datada de 05/10/1339. [2]
Não obstante a discussão sobre a origem do protesto, o fato é que nos séculos XI e XII houve uma expansão comercial gerada pelas cruzadas que enfraqueceu o feudalismo e fomentou a formação dos Estados Nacionais. Neste ambiente, relata José Leal Ferreira Pires, ressurgem as feiras, como grandes centros distribuidores, aumentando sensivelmente o comércio e a circulação de moeda e das letras de câmbio.[3]
Conforme assinala José Saraiva, a Breve Collatio Notarium de Piza já incluía, entre as funções dos notários, a praesentatio e a protestatio literararum. [4] Na França, há referência ao protesto cambial no Edito de Luiz XI, de 08/03/1462. Na Alemanha, o protesto somente foi conhecido no século XVI.
A palavra protesto vem do latim protestor, que significa, genericamente, declarar em alto e bom som. Em sua origem, eram observados os seguintes atos no protesto: praesentatio literarum, requisitio e prostetatio.[5] Não havia diferença entre falta de aceite e de pagamento. “Era lavrado diante de testemunhas pelo notário, que relatava o fato da recusa, copiava a letra de câmbio e, para impedir a usura, acrescentava a indicação do curso do câmbio; medida esta ineficaz por causa da especulação, que já se manifestava com intensidade, e ao ponto de estar, entre os italianos, generalizado o adágio: câmbio e vento variam sempre.”[6]
A Ordenação Francesa de 1673 dispôs sobre o protesto, dando-lhe os seguintes efeitos: 1) conservação dos direitos de regresso; 2) demonstração de que o portador do título desejava obter o seu aceite ou pagamento; 3) o protesto era ato definitivo e não poderia ser substituído por nenhum outro; 4) o prazo para protesto por falta de aceite era imediato; e 5) por recusa do pagamento havia variação de acordo com a legislação a ser aplicada.[7]
No Brasil, o protesto cambial era regulado pelo Alvará de 19/10/1789. Depois o Código Comercial (Lei n.º 556, de 25/06/1850), em seu Título XVI (artigos 354 a 427), regulou a matéria, dispondo sobre as letras de câmbio, notas promissórias e créditos mercantis. Neste Diploma Legal, conforme assinala José Saraiva, o protesto era necessário: 1) para recusa de aceite; 2) no caso de não ser encontrado, ou ocultar-se o aceitante; 3) no caso de recusar-se o aceitante a entrega da letra; 4) quando desconhecido o domicílio do sacado ou do aceitante; 5) no caso de aceite limitado; 6) recusa de pagamento; 7) falência do aceitante; e 8) no caso de falta de data do aceite na letra a tempo certo de vista. [8]
O Decreto n.º 2.044, de 31/12/1908, revogou os dispositivos do Código Comercial que regulamentavam as cambiais, tratando do protesto cambial nos artigos 28 ao 33.
O Decreto n.º 57.663, de 24/01/1966, promulgou as convenções para adoção da Lei Uniforme de Genebra em matéria de letra de câmbio e notas promissórias. No entanto, a adoção da Lei Uniforme não revogou completamente o Decreto n.º 2.044/1908, posto que, conforme salienta José Paulo Leal Ferreira, o Brasil opôs ressalvas, inclusive sobre os artigos 28 a 33, que cuidam do protesto.[9]
No que tange à duplicata, a matéria está regulada nos artigos 13 e 14 da Lei Federal n.º 5.474, de 18/07/1968. Segundo José Paulo Leal Ferreira, “este título de crédito, originariamente brasileiro, enseja a efetivação de um tipo especial de protesto, denominado, na prática, ‘protesto por indicação’ e, no seu art. 25, dá à legislação sobre Letra de Câmbio e Nota Promissória aplicação subsidiária em relação às Duplicatas, inclusive no que tange ao protesto cambial.”[10]
A Lei Federal n.º 7.357, de 02/09/1985, dispôs, em seus artigos 47 e 48, de forma sucinta, sobre o protesto do cheque.
Em 10 de setembro de 1997, foi publicada da Lei de Protestos – Lei n.º 9.492. Esta lei define competência, regulamenta os serviços concernentes ao protesto de títulos e outros documentos de dívida e dá outras providências. Em seu artigo 1º definiu o protesto como sendo “o ato formal e solene pelo qual se prova a inadimplência e o descumprimento de obrigação originada em títulos e outros documentos de dívida.”
2. Finalidade do protesto cambial
O instituto do protesto deveria servir apenas para registrar a falta de aceite ou de pagamento para resguardo dos credores cambiais. No entanto, a sua função foi completamente desfigurada e o instituto passou a ser utilizado como forma de intimidação e de cobrança extrajudicial. Nesse sentido, salienta Pedro Vieira Mota que “o protesto, de fato e a revelia da lei, ficou armado de uma sanção econômico-financeira temível, e a ameaça de protesto converteu-se em meio cogente de cobrança cambial, tornou-se, em realidade, uma execução forçada. Surgiu o protesto-execução.” [11] O instituto que deveria servir apenas para registrar não-aceites e não-pagamentos, para resguardo dos credores cambiais, passou a ser utilizado para fins escusos, e até extorsão de comerciantes.
Sobre a finalidade do protesto, assinala João Eunápio Borges que o mesmo destina-se, sobretudo, a provar, opportuno tempore et loco, a sua apresentação a quem deve pagá-lo, posto que, uma vez apresentado, poderá o portador voltar-se contra os coobrigados da letra, sacador, endossante e respectivos avalistas. [12]
E sobre a deturpação do instituto, assinala: “É, pois, lamentável que de simples meio de prova – oficial e solene – da apresentação da letra e recusa por parte do sacado, do aceite ou do pagamento, o protesto tenha convertido em meio violento de cobrança ou intimidação, levado a efeito por intermédio do oficial do protesto. E os abusos, neste sentido, são tais, tantos e tão repetidos que já constituem praxe sobreposta à lei que poucos conhecem, muitos desprezam e ninguém cumpre.”[13]
3. A intimação no protesto cambial para fim falimentar
Sob a égide do Decreto-lei n.º 7.661/45, tinha-se por aperfeiçoada a intimação em protesto para fim falimentar quando a mesma era recebida pelo devedor (art. 10, § 1º). Não era necessária a intimação pessoal, mas, consoante o entendimento do Egrégio Superior Tribunal de Justiça, deveria constar do instrumento a identificação da pessoa que recebeu a intimação.[14]
Com o advento da Lei Federal n.º 9.492/97, alguns julgados, com base numa interpretação literal do art. 14 da Lei de Protestos, que considera cumprida a intimação com a simples entrega no endereço fornecido pelo apresentante do título[15], passaram a dispensar a exigência de identificação da pessoa que a recebeu, considerando aperfeiçoada a intimação com a entrega no endereço indicado pelo apresentante.[16]
Tal interpretação é deveras descabida e certamente acarreta inúmeras injustiças. O protesto destina-se tão somente a registrar a falta de aceite ou a falta de pagamento para resguardo dos credores cambiais, e não para intimidação, cobrança ou quebra de empresas. Caso prevaleça tal entendimento, basta ao credor sem escrúpulos, mais interessado na quebra, do que em receber o título, indicar endereço diverso, para que seja decretada a falência à revelia do devedor.
A correta exegese do dispositivo é no sentido de que se considera cumprida a intimação com a comprovação da entrega à pessoa identificada. É imprescindível a identificação da pessoa que recebeu a intimação para o aperfeiçoamento desta. O protesto para fim falimentar não pode ser feito à revelia do devedor. Mister seja este intimado para purgação da mora, evitando, dessa forma, a quebra.
Frise-se que não é necessária a intimação pessoal do devedor, mas a identificação de quem recebeu a intimação é imprescindível, sob pena de não se aperfeiçoar a intimação. O protesto não é meio de cobrança, muito menos instrumento de intimidação ou de quebra. O instituto destina-se apenas a registrar a falta de aceite ou de pagamento para resguardo dos credores cambiais. A dispensa de identificação de quem recebeu a intimação não encontra guarida no Superior Tribunal de Justiça. Neste tribunal, diga-se de passagem, responsável pela uniformização da jurisprudência nacional, é uníssono o entendimento de que deve haver a identificação da pessoa que recebeu a intimação. [17]
A Lei Federal n.º 11.101, de 09/02/2005, que regula a recuperação judicial, a extrajudicial e a falência do empresário e da sociedade empresária, não trouxe alterações a esta sistemática, posto que o art. 94, inc. I, § 3º, remeteu o protesto para fim falimentar à legislação específica (Lei n.º 9.492/97). [18]
4. Conclusão
O protesto cambial destina-se apenas ao registro de não-aceites e de não-pagamentos, para resguardo dos credores cambiais. Por meio dele, prova-se a apresentação do título a quem deve pagá-lo ou aceitá-lo, para voltar-se contra os coobrigados da letra, sacador, endossante e respectivos avalistas.
O instituto não pode ser utilizado como forma de extorsão, muito menos como ameaça de falência. O protesto para fim falimentar não pode ser feito à revelia do devedor. Este deve ser intimado para possibilitar a purgação da mora, evitando, dessa forma, a decretação da quebra.
Não é necessária a intimação pessoal do devedor, mas a identificação de quem recebeu a intimação é imprescindível, sob pena de não se aperfeiçoar a intimação.
Assim, se o instrumento de protesto não mencionar a identificação da pessoa que recebeu a intimação, o protesto estará viciado e não poderá ser fundamento para a decretação de falência, posto que o art. 96, inc. VI, da Lei n.º 11.101/2005, determina que a falência “não será decretada se o requerido provar vício em protesto ou em seu instrumento.”
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