O crime de violação às prerrogativas da advocacia


O exercício pleno da advocacia, defesa de direitos, está resguardado por prerrogativas que perpassam o interesse individual do defensor para representar a garantia do múnus público que a reveste, embora se traduzam em normas que asseguram a atividade profissional do advogado, reconhecida pela Constituição Federal como indispensável à administração da justiça.


O Estatuto da Advocacia, Lei nº 8.906/94, art. 7º, sob o título Dos Direitos do Advogado, delineia como prerrogativas, a liberdade de exercício profissional; inviolabilidade de seu local e instrumentos de trabalho, em garantia da liberdade de defesa e do sigilo profissional; comunicação pessoal e reservado com seus constituintes; presença da Ordem, ao ser preso em razão do exercício da advocacia; prisão especial condigna antes de condenação transitada em julgado; acesso e comunicação livres nos locais de exercício da advocacia; exame e vista de autos de processos em órgãos públicos; desagravo público, quando ofendido no exercício profissional; e uso dos símbolos privativos da advocacia.


O preceito daquele artigo, deduz-se, até então se constitui em dispositivo de ordem deontológica, dirigido àqueles que são indicados no art. 6º, autoridades, servidores públicos e serventuários da justiça que devem dispensar aos advogados, no exercício da profissão, tratamento compatível com a dignidade da Advocacia, eis que igualada à Magistratura e ao Ministério Público no seu mister comum, ainda que sob incumbências diferenciadas.


No entanto, não são raros os casos de violação àquelas prerrogativas. E, um só que fosse, já justificaria a reação pronta de tantos quantos dela tomassem conhecimento (o dirigente da Ordem, os próprios pares, a autoridade judiciária, o promotor de justiça, ou qualquer autoridade superior ao ofensor), como forma de resguardar o interesse público e punir o deslize administrativo que viola aqueles direitos. 


A violação daquelas prerrogativas, e o pouco efeito que a censura ética tem gerado para inibir a ofensa, estimulou o encaminhamento de Projeto de Lei perante a Câmara de Deputados, de iniciativa da advocacia paulista (Seccional e Subseções), propondo a criminalização daquela conduta.  Ao PL nº 4.915/05 (Deputada Mariângela Duarte) somaram-se outros seis, apensados, merecendo, em 8 de agosto de 2007, parecer na Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania pela lavra do Deputado Marcelo Ortiz.


O relator manifestou-se no sentido de que todos os projetos atendiam aos pressupostos de constitucionalidade quanto à competência, ao processo e à legitimidade, e não vendo óbice à juridicidade votou pelo apenso PL nº 5.762/05 (Deputado Marcelo Barbieri) que lhe pareceu estar revestido de melhor técnica legislativa. O projeto de lei, introduzindo o artigo 7º-A no Estatuto da Advocacia, segundo texto disponível no saite da Câmara, e que merece revisão no ordenamento dos parágrafos, prevê:


 “Art. 1. Esta lei torna crime a violação de direitos e prerrogativas do advogado.


Art. 2. A Lei nº 8.906, de 4 de Julho de 1994, Estatuto da Advocacia e da Ordem dos Advogados do Brasil, passa a vigorar com o acréscimo do seguinte dispositivo:


`Art. 7º-A. Violar direito ou prerrogativa do advogado, impedindo ou limitando sua atuação profissional.


Pena: detenção de 06 (seis) meses a 02 (dois) anos, sem prejuízo da pena correspondente à violência, se houver.


Parágrafo único – A pena será aumentada de um sexto até a metade, se do fato resultar prejuízo ao interesse patrocinado pelo advogado.


§2º A Ordem dos Advogados do Brasil, por intermédio de seus Conselhos Seccionais, poderá requerer a sua admissão como assistente do Ministério Público nas ações penais instauradas em virtude da aplicação desta lei.


§3º O Conselho Seccional da OAB, por intermédio de seus Presidentes, poderá requerer à autoridade policial competente a abertura de inquérito por violação dos direitos e às prerrogativas do advogado.´


Art. 3. Esta lei entra em vigor na data de sua publicação.”


No voto o relator destacou os fundamentos lançados pela autora do PL nº 4.915/05 reproduzindo que “a violação das prerrogativas do advogado compromete os direitos correspondentes às liberdades individuais que lhe são confiadas”, e que a “inobservância desses direitos por qualquer autoridade, seja ela do Poder Judiciário, Legislativo ou Executivo, impede o ministério público do advogado, vale dizer, a prestação do serviço público e da função social por ele desenvolvido”.


O PL nº 4.915/05, e o apenso PL nº 5.562/05, teve célere trâmite na CCJC da Câmara, cerca de três meses com o relator, e agora, a partir do relatório apresentado em 8 de agosto, estará aguardando pauta para votação.


Finalmente, a aprovação do projeto implicará em significativo marco à dignidade da Advocacia, e de cidadania aos titulares de direito que são defendidos pelos advogados, profissionais que por dever têm fé no direito, o melhor instrumento para a convivência humana, e na liberdade, sem a qual não há direito e nem justiça, como preleciona o oitavo artigo de seu secular decálogo.



Informações Sobre o Autor

João Moreno Pomar

Advogado – OAB/RS nº 7.497; Professor de Direito Processual Civil da Fundação Universidade Federal de Rio Grande; Doutor em Direito Processual pela Universidad de Buenos Aires.


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