Resumo: O escopo do presente artigo é analisar o reconhecimento do direito à segurança pública como típico direito fundamental. É fato que o processo de construção e reconhecimento dos direitos humanos confunde-se, não por acaso, com a evolução da sociedade e o processo de reconhecimento da dignidade da pessoa humana. Doutrinariamente, os direitos humanos, de maneira uníssona, são agrupados em três dimensões distintas, as quais refletem o ideário da Revolução Francesa, a saber: liberdade, igualdade e fraternidade, constituindo verdadeiro primado indissociável para o desenvolvimento humano. A partir de tal cenário, ao se reconhecer o direito à segurança pública como direito fundamental, erige-se um marco de responsabilidades inafastáveis do Estado, sobremaneira no que toca ao reconhecimento de tal direito como “meio” para a concretização de tantos outros. A metodologia empregada foi o método indutivo, auxiliado pela revisão de literatura e consulta à doutrina especializada. [1]
Palavras-chave: Segurança Pública. Direito Fundamental. Ônus do Estado.
Abstract: The scope of this article is to analyze the recognition of the right to public security as a typical fundamental right. It is a fact that the process of construction and recognition of human rights is not confused, not by chance, with the evolution of society and the process of recognition of the dignity of the human person. Doctrinally, human rights, in a unified way, are grouped into three distinct dimensions, which reflect the ideals of the French Revolution, namely freedom, equality and fraternity, constituting a true primacy indissociable for human development. From such a scenario, recognizing the right to public security as a fundamental right, a framework of unassailable responsibilities of the State is erected, especially as regards the recognition of this right as a "means" for the realization of so many others. The methodology used was the inductive method, aided by the literature review and consultation with the specialized doctrine.
Keywords: Public Security. Fundamental right. Burden of State.
Sumário: 1. Introdução; 2. Direitos fundamentais: delimitação conceitual; 3. As dimensões dos direitos fundamentais; 4. O direito à segurança pública como direito fundamental; 5. Conclusão. Referências.
1 INTRODUÇÃO
A Constituição de um país é um conjunto de normas mais importante dentro de um ordenamento jurídico. Nela estão escritas como se da todo o funcionamento de um Estado, logo, por conta da evolução da sociedade ela também está sujeita a modificações Porém, existem alguns direitos denominados de direitos fundamentais, que não são passíveis dessa fragilidade de mudança ou uma ruptura. Como o próprio nome já diz, são fundamentais para sociedade. Os direitos fundamentais estão positivados a partir do art. 5º da Constituição Brasileira de 1988, descrevendo as diversas dimensões de aludidos direitos.
O assunto segurança pública tem se tornado recorrente no cenário atual brasileiro, devido ao aumento da violência. Crimes são praticados e o que se percebe é uma ausência de segurança neste contexto nacional. Embora não esteja expressamente presente no rol dos direitos fundamentais, o presente trabalho vem trazer a discussão sobre a consideração da segurança pública como um direito fundamental, sendo assim, prioridade do Estado á garantia desse direito para o progresso da sociedade. Mas, é necessária uma abordagem sobre o conceito de direito fundamental e sua classificação legal e doutrinária em dimensões para uma melhor reflexão.
2 DIREITOS FUNDAMENTAIS: DELIMITAÇÃO CONCEITUAL
Segundo José Afonso da Silva (2005), é difícil conceituar os direitos fundamentais de forma sintética, por conta da ampliação e transformação desses direitos do homem. Adite-se, ainda, essa dificuldade quando se emprega várias expressões para designa-los, tais como: direitos naturais, direitos humanos, direitos do homem, direito individuais, direitos públicos subjetivos, liberdade fundamentais, liberdade públicas e direitos fundamentais do homem. Nesta esteira, oportunamente, José Afonso da Silva vai preconizar que: “situações jurídicas, objetivas e subjetivas, definidas no direito positivo, em prol da dignidade, igualdade e liberdade da pessoa humana”. (SILVA, 2005, p.179). Já Marmelstein, em seu escólio, define como:
“Os direitos fundamentais são normas jurídicas, intimamente ligadas a ideia de dignidade da pessoa humana e de limitação de poder, positivada no plano constitucional de determinado Estado Democrático de Direito, que, por sua importância axiológica, fundamentam e legitimam todo ordenamento jurídico”. (MARMELSTEIN, 2008, p.20)
Observa-se que os direitos fundamentais são direitos essenciais do ser humano, que ele necessita para viver bem. Eles são escritos em um ordenamento jurídico, que protegem e garantem que esses sejam aplicados e eficazes, ou seja, produzam efeito. E defendem a dignidade humana, que pode se caracterizar como o valor do ser humano, a igualdade sendo como tratamentos iguais para os iguais e desiguais para os desiguais e a liberdade, dando o direito de agir as pessoas.
Nesta esteira de exposição, cuida reconhecer que os direitos fundamentais desempenham papel proeminente na ordem jurídica, sobretudo quando se reconhece que aqueles constituem elementos integrantes do princípio da dignidade da pessoa humana, ou seja, pilar estruturante da República Federativa do Brasil, consoante dicção ofuscante do inciso III do artigo 1º da Constituição de 1988. Os direitos fundamentais têm por objetivo se certa forma limitar o poder público, para que não haja privação de direitos que é do homem. Para Morais:
“Ressalte-se que o estabelecimento de constituições escritas está diretamente ligado à edição de declarações de direitos do homem. Com a finalidade de estabelecimento de limites ao poder político, ocorrendo a incorporação de direitos subjetivos do homem em normas formalmente básicas, subtraindo-se seu reconhecimento e garantia à disponibilidade do legislador ordinário.” (MORAIS, 2016, s.p.)
Nesta linha, de acordo com Moraes (2017), na visão ocidental de democracia, o governo é exercido pelo povo e a limitação do poder estão indissoluvelmente combinados, porquanto o povo escolhe seus representantes, os quais, na condição de mandatários, decidem o destino da nação. Ao lado disso, o poder delegado pelo povo a seus representantes, contudo, não se apresenta de forma absoluta, mas sim conhece várias limitações, inclusive no tocante à previsão de direitos e garantias individuais e coletivas do cidadão, relativamente aos demais cidadãos (relação horizontal) e ao próprio Estado (relação vertical). Ora, há que se reconhecer, em tal cenário, que os direitos fundamentais desempenham verdadeiro papel de limitação, salvaguardando o cidadão dos demais concidadãos e do Estado.
A Constituição Brasileira, promulgada em 1988, positivou esses princípios, direitos e garantias fundamentais em seu texto, no primeiro título: “Dos princípios fundamentais”, e no segundo título: “Dos Direitos e Garantias fundamentais” (BRASIL,1988). Verificam-se, em sobreditos títulos, direitos e garantias indissociáveis do desenvolvimento humanos, os quais materializam elementos imprescindíveis para afirmação da dignidade da pessoa humana e para a salvaguarda do indivíduo. Direitos humanos e direitos fundamentais estão inteiramente ligados. Nesta linha de apresentação, “os direitos humanos, sob a análise do Direito Constitucional, podem ser denominados de direitos fundamentais” (BAHIA, 2017, p.102). Já os direitos fundamentais seriam os direitos humanos escritos em uma constituição. (BAHIA, 2017, p.102)
Além disso, os direitos fundamentais possuem algumas características que descrevem algumas peculiaridades desse direito, quais sejam: relatividade, complementariedade, indisponibilidade, universalidade, irrenunciabilidade, historicidade e aplicabilidade imediata. Nesta trilha, a relatividade pressupõe que os direitos fundamentais não são absolutos, ou seja, não são inquestionáveis, pois diante de um conflito pode-se ser relativizado. Já a complementariedade diz que os direitos fundamentais não são analisados de forma isolada, porquanto cada direito fundamental complementa o outro.
Por sua vez, a indisponibilidade salienta que por não possuir valor econômico nesse direito, ele não pode ser transferido para outro. Imprescritibilidade reforça que os direitos fundamentais não estão ligados a período de tempo, ou seja, o tempo não tira a validade desses direitos. A dita universalidade aponta que os direitos humanos são destinados a todos esses direitos. Irrenunciabilidade que é de não há possiblidade de alguém abrir mão ao núcleo do seu direito fundamenta. No que atina à historicidade, os direitos fundamentais existentes não são definitivos, pois com o passar da história eles vão sendo construídos e estão sempre passando por processo de modificação. Por derradeiro, a aplicação imediata afirma que esses direitos não são meramente interpretativos para se extrair ao máximo de efeitos jurídicos, a sua aplicação é imediata (BAHIA, 2017, p.106-109). Essas características mostram o quanto os direitos fundamentais são necessários para uma pessoa. E que é imprescindível que o Estado garanta esses direitos para o bem o povo.
Quanto à abrangência dos direitos fundamentais, a Constituição Brasileira de 1988, no seu artigo 5º, caput, diz que: “Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:” (BRASIL,1988). Em uma simples leitura do Texto Constitucional, nota-se que os direitos fundamentais estão restritos aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País ou até mesmo, somente as pessoas físicas. Porém, boa parte da doutrina contraria a compreensão nesse sentido. Segundo a interpretação de Alexandre de Morais:
“Observe-se, porém, que a expressão residentes no Brasil deve ser interpretada no sentido de que a Carta Federal assegura ao estrangeiro todos os direitos e garantias mesmo que não possua domicílio no País, só podendo, porém, assegurar a validade e gozo dos direitos fundamentais dentro do território brasileiro, não excluindo, pois, o estrangeiro em trânsito pelo território nacional, que possui igualmente acesso às ações, como o mandado de segurança e demais remédios constitucionais. Igualmente, as pessoas jurídicas são beneficiárias dos direitos e garantias individuais, pois reconhece-se às associações o direito à existência, o que de nada adiantaria se fosse possível excluí-las de todos os seus demais direitos. Dessa forma, os direitos enunciados e garantidos pela constituição são de brasileiros, pessoas físicas e jurídicas”. (MORAIS, 2016, s.p.)
Reforçando essa ideia, Flávia Bahia diz que: “apesar de o estrangeiro de passagem no país e às pessoas jurídicas carecerem de proteção na literalidade do dispositivo, não há dúvidas quanto a serem titulares de direitos fundamentais ao lado dos brasileiros e dos estrangeiros que aqui residem.” (BAHIA, 2017, p.113). Parte da doutrina assevera que os direitos fundamentais configuram direito de todos, sejam pessoas naturais ou jurídicas e que, independente da nacionalidade, estando em território brasileiro, esses são possuidores dessas prerrogativas. Logo, caracteriza-se a universalidade.
3 AS DIMENSÕES DOS DIREITOS FUNDAMENTAIS
A doutrina costuma classificar os direitos fundamentais em dimensões ou gerações, agrupando-os em perfis históricos. As divisões das dimensões podem ser facilmente entendidas baseando no lema da Revolução Francesa, no qual a Primeira dimensão representa a Lealdade, a Segunda a Igualdade e a Terceira a Fraternidade. (DIÓGNES JÚNIOR, 2012). O termo “gerações” não é tão aceito por boa parte da doutrina. Conforme diz BAHIA (2017, p.109):
“Dentro dessa perspectiva transformadora, a doutrina resolveu dividi-los em gerações para apontar quando e como foram sendo consagrados na história do constitucionalismo. O termo “gerações” recebe algumas críticas tendo em vista que pode gerar uma visão errônea de substituição de direitos com o tempo, ou de superação de direitos, e hoje o termo mais aceito seria o que traz a ideia de “dimensões””. (BAHIA, 2017, p109)
Percebe-se que a crítica pelo termo se da pela possível interpretação de que com o surgimento de novos direitos, iriam substituir os direitos já garantidos, o que na realidade os direitos são acumulativos. Por isso, o termo ideal, segundo a doutrinadora, é “dimensões”. Os direitos fundamentais de primeira dimensão são inerentes à liberdade e protegem os cidadãos de ações do Estado que privam a sua liberdade. (DIÓGNES JÚNIOR, 2012). Ademais, de acordo com Bahia (2017), em tal período, o Estado seria detentor de um dever de prestação negativa, ou seja, um dever de nada fazer (non facere), exceto observar e respeitar as liberdades do homem.
Em tal cenário de reconhecimento e afirmação de direitos, comporiam o rol dos direitos de primeira dimensão: o direito à vida, à liberdade, à propriedade, à manifestação, à expressão, ao voto, ao devido processo legal. Neste sentido, em complemento as ponderações expendidas até o momento, faz-se oportuno trazer à colação o magistério acurado de Paulo e Alexandrino, que rezam no sentido que:
“Os direitos de primeira geração realçam o princípio da liberdade. São os direitos civis e políticos, reconhecidos nas Revoluções Francesa e Americana. Caracterizam-se por impor ao Estado um dever de abstenção, de não fazer, de não interferência, de não intromissão no espaço de autodeterminação de cada indivíduo. São as chamadas liberdades individuais, que têm como foco a liberdade do homem individualmente considerado, sem nenhuma preocupação com as desigualdades sociais. Surgiram no final do século XVIII, como uma resposta do Estado liberal ao Estado absoluto.” (PAULO; ALEXANDRINO, 2017, p.98)
Por meio do reconhecimento e da efetivação desses direitos, as pessoas têm garantia de viver com certa autonomia, o que constitui diretamente o ideário de dignidade da pessoa humana. Os direitos fundamentais de segunda dimensão estão relacionados à concepção de igualdade, em que o Estado tem o dever de agir para que possa chegar o mais próximo de uma equidade dentro de uma sociedade, que seria uma igualdade material. Esse direito obriga o Estado, por meio de politicas públicas, prestar um serviço que garanta o funcionamento de tal premissa. Portanto, trata-se de direitos positivos. (DIÓGNES JÚNIOR, 2012). Paulo e Alexandrino, sensíveis à temática, vão explicitar, ainda, que:
“Os direitos fundamentais de segunda geração correspondem aos direitos de participação, sendo realizados por intermédio da implementação de políticas e serviços públicos, exigindo do Estado prestações sociais, tais como saúde, educação, trabalho, habitação, previdência social, assistência social, entre outras. São, por isso, denominados direitos positivos, direitos do bem-estar, liberdades positivas ou direitos dos desamparados”. (PAULO; ALEXANDRINO, 2017,p.99)
Reforçando esse entendimento, Bahia, ainda, vai explicar que:
“Sob a inspiração da Constituição Mexicana de 1917, a Declaração Soviética dos Direitos do Povo Trabalhador e Explorado, de 1918, e a Constituição de Weimar, de 1919, nasce a denominada segunda dimensão de direitos fundamentais, que traz proteção aos direitos sociais, econômicos e culturais, em que do Estado não mais se exige uma abstenção, mas, ao contrário, impõe-se a sua intervenção, visto que a liberdade do homem sem a sua participação não é protegida integralmente. Essa necessidade de
prestação positiva do Estado corresponderia aos chamados direitos sociais dos cidadãos, direitos que transcendem a individualidade e alcançam um caráter econômico e social, com o objetivo de garantir a todos melhores condições de vida. Nesse diapasão, seriam exemplos clássicos desses direitos: o direito à saúde, ao trabalho, à assistência social, à educação e os direitos dos trabalhadores”. (BAHIA, 2017, p.110)
Fazendo uma analogia dos direitos integrantes da primeira dimensão em relação aos direitos compreendidos pela segunda dimensão, Marmelstein, em suas ponderações, diz que:
“[…] os direitos de primeira geração tinham como finalidade, sobretudo, possibilitar a limitação do poder estatal e permitir a participação do povo nos negócios públicos. Já os direitos de segunda geração possuem um objetivo diferente. Eles impõem diretrizes, deveres e tarefas a serem realizadas pelo Estado, no intuito de possibilitar aos seres humanos melhores qualidade de vida e um nível de dignidade como pressuposto do próprio exercício da liberdade. Nessa acepção, os direitos fundamentais de segunda geração funcionam como uma alavanca ou uma catapulta capaz de proporcionar o desenvolvimento do ser humano, fornecendo-lhe as condições básicas para gozar, de forma efetiva, a tão necessária liberdade”. (MARMELSTEIN, 2008, p.51)
Com esse pensamento, usa-se o Estado como uma solução de resolução dos problemas de cunho social, sendo, portanto, um fator que geraria a igualdade entre as pessoas dentro de uma sociedade. Os direitos de Terceira dimensão estão ligados à fraternidade ou à solidariedade. É a proteção dos direitos da coletividade, não sendo atribuído aos interesses de um individuo especifico, mas sim reconhecendo o gênero humano como destinatário dos direitos fundamentais. Por meio do Estado existe uma preocupação com as gerações humanas presentes e futuras, as quais devem usufruir de direitos e condições imprescindíveis para o desenvolvimento. (DIÓGNES JÚNIOR, 2012). Conforme Bahia vai afirmar,
“Marcada pelo espírito de fraternidade entre os povos com o fim da Segunda Guerra Mundial, a terceira geração representa a evolução dos direitos fundamentais para alcançar e proteger aqueles direitos decorrentes de uma sociedade já modernamente organizada, que se encontra envolvida em relações de diversas naturezas, especialmente aquelas relativas à industrialização e densa urbanização. Nesta perspectiva, são exemplos desses direitos: direito ao desenvolvimento, direito à paz, e direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado.” (BAHIA, 2017, p.110)
Paulo e Alexandrino, ao discorrerem acerca da terceira dimensão de direitos humanos, vai complementar ainda que:
“Os direitos de terceira geração consagram os princípios da solidariedade e da fraternidade. São atribuídos genericamente a todas as formações sociais, protegendo interesses de titularidade coletiva ou difusa. São exemplos de direitos fundamentais de terceira dimensão, que assistem a todo o gênero humano, o direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, à defesa do consumidor, à paz, à autodeterminação dos povos, ao patrimônio comum da humanidade, ao progresso e desenvolvimento, entre outros. O Estado e a própria coletividade têm a especial incumbência de defender e preservar, em beneficio das presentes e futuras gerações, esses direitos de titularidade coletiva e de caráter transindividual”. (PAULO; ALEXANDRINO, 2017, p.99)
Logo, os direitos fundamentais de terceira dimensão possuem sua titularidade um coletivo, pois não enxerga o homem como um indivíduo, mas sim os direitos que engloba e compreende a todos, de maneira indistinta, tendo por norte a proteção do gênero humano. Além dessas três dimensões, ainda se discute a ideia de uma quarta dimensão, existem autores que defendem também o surgimento de uma quinta dimensão. Porém, não existe um consenso entre os doutrinadores sobre esta matéria. Sobre a celeuma acerca da (in)existência de quarta e quinta dimensão dos direitos fundamentais, Paulo e Alexandrino vão expor que:
“No tocante aos direitos fundamentais de quarta dimensão, por exemplo, o Prof. Paulo Bonavides entende que constituem o direito à democracia, o direito à informação e o direito ao pluralismo jurídico, dos quais depende a concretização da sociedade aberta ao futuro, em sua dimensão da máxima universalidade. Já para o Prof. Norberto Bobbio, a quarta dimensão decorre dos avanços da engenharia genética, que colocam em risco a própria existência humana, pela manipulação do patrimônio genético.” (PAULO; ALEXANDRINO, 2017, p.99)
Nota-se que não há uma unanimidade em relação aos direitos fundamentais de quarta dimensão. Enquanto um defende os avanços tecnológicos e pluralismo político já outro reconhece como avanços da manipulação do patrimônio genético.
A classificação doutrinária dos direitos fundamentais encampados pelo Texto Constitucional compreende a extensão do artigo 5º ao 17, sendo agrupados em cinco categorias distintas, a saber: direitos individuais e coletivos, direitos sociais, direitos de nacionalidade, direitos políticos e direitos relacionados à existência, organização e participação em partidos políticos. (BRASIL,1988). Os direitos individuais estão inteiramente ligados direitos essenciais do ser humano e a sua personalidade, como, por exemplo, direito à liberdade, vida e igualdade, sendo inerentes aos indivíduos. É oportuno consignar que os direitos alocados sob a rubrica de “direitos individuais”, em regra, não necessitam de atuação Estatal para sua concretização, exigindo apenas a observância daquele e a ausência de interferência.
Já os direitos sociais estabelecem liberdade positiva, ou seja, intervenção estatal para um bom propósito, com o objetivo de melhoria de vida dos hipossuficientes, visando à efetivação da igualdade material, tratando os iguais com iguais e os desiguais como desiguais. Os direitos sociais, diversamente dos direitos individuais, são caracterizados pela necessidade de programatismo, ou seja, o estabelecimento de políticas públicas e normas de cunho cogente, em relação ao Estado, a fim de assegurar, no plano concreto, sua efetivação. Assim, em que pesem sua salvaguarda no Texto de 1988, fazem-se carecidas medidas positivas para sua materialização.
Os direitos de nacionalidade, por seu turno, tratam da ligação politica-jurídica de um individuo ao um País, remetendo ao cumprimento de certos deveres e reivindicando a proteção do Estado. Os direitos políticos zelam pelos conjuntos de normas que regulam as formas de atuação da soberania popular, garantido ao cidadão a participação na política do Estado. Os direitos relacionado a existência, organização e participação em partidos políticos estabelecem os partidos políticos ferramenta necessária à conservação do Estado Democrático de Direito. (PAULO; ALEXANDRINO, 2017, p.107)
À luz da Constituição Brasileira de 1988, Morais (2017, s.p.) define as dimensões dos direitos fundamentais da seguinte forma: primeira dimensão compreende os direitos contidos no artigo 5º (direitos e garantias individuais) e no artigo 14 (direitos políticos); segunda dimensão no artigo 6º (direitos sociais), no artigo 7º (direitos dos trabalhadores) e no artigo 225; terceira dimensão no artigo 225 (direitos de solidariedade); e quarta dimensão nos artigos 1º ao 3º (fundamentos da República Federativa do Brasil, tripartição dos Poderes Constituídos e objetivos da República Federativa do Brasil).
4 O DIREITO À SEGURANÇA PÚBLICA COMO DIREITO FUNDAMENTAL
Com a evolução da sociedade tem gerado complexidades nas relações humanas e sociais. Surgem direitos e perspectiva de direitos, com isso, vai acontecendo uma disputa de interesses de modo que se exterioriza no comportamento do individuo de tal forma que atinge o íntimo de não só um indivíduo, mas de uma coletividade. Assim, a fim de resolver esta instabilidade de convivência social, o Estado intervém através de seus órgãos competentes, para que a ordem seja estabelecida. Isso se dá pela segurança pública. (MORAES, 2010, p.79). Neste sentido, Moraes, ainda em seu magistério, vai definir a segurança pública como:
“Elemento necessário à prática democrática, é indissoluvelmente compatibilizada com a manutenção da ordem pública. Através desta se garante a incolumidade das pessoas e o patrimônio público e privado. Os objetivos mencionados consubstanciam um dever do Estado para com os seus cidadãos, que têm direito à própria segurança, vinculando-se, contudo, às responsabilidades que dela decorrem. A lei disciplina a organização e o funcionamento dos órgãos de segurança pública, tendo em vista a eficiência de suas atividades”. (MORAES, 2010, p.80)
A segurança pública está positivada na Constituição Federal de 1988, no caput do artigo 144, em que diz: “A segurança pública, dever do Estado, direito e responsabilidade de todos, é exercida para a preservação da ordem pública e da incolumidade das pessoas e do patrimônio, através dos seguintes órgãos:” (BRASIL, 1988). Portanto, a segurança pública, em tal lógica de fundamentalidade dos direitos, é uma incumbência estatal de pacificar o povo e trazer a ordem na sociedade, também é de responsabilidade de todas as pessoas zelar pela segurança, fortalecendo assim o progresso de uma nação.
No art. 5º caput da Constituição Federal de 1988, como direito fundamental individual diz que: “Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:” (BRASIL, 1988). Já no art. 6º da constituição federal de 1988, como direito fundamental social diz que: “São direitos sociais a educação, a saúde, a alimentação, o trabalho, a moradia, o transporte, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à infância, a assistência aos desamparados, na forma desta Constituição.” (BRASIL, 1988) (grifo nosso).
Percebe-se que a própria Constituição Federal Brasileira garante a segurança como direito fundamental individual e social, que é protegido pelo Estado de forma que as pessoas possam viver com dignidade.Considera-se o direito à segurança como um direito de terceira dimensão. A segurança pública é dever do Estado, existe uma obrigação do poder público de agir quando for preciso, para que se garanta essa segurança das pessoas. Sendo a segurança um direito difuso, cujos titulares são todos, não havendo individualização da titularidade. Logo, declara-se o direito de terceira dimensão. (MARCHI, 2010, p.39). Andrade, em complemento ao expendido, também concorda com essa classificação, quando diz que:
“O Direito Fundamental à Segurança Pública logicamente requer a necessidade de prestações positivas do Estado, mas na perspectiva de direitos coletivos, direitos difusos, direitos vinculados à vida em sociedade, está atualmente ligado à fraternidade, e não como outrora, relacionado a segunda geração de direitos vinculados à igualdade. Portanto, está inserido na seara dos Direitos Fundamentais de Terceira Geração devido à titularidade difusa e o caráter trans-individual, onde a titularidade é de todos, sem poder especificar exatamente quem o seja”. (ANDRADE, 2014, p.33)
Outro fator que se comprova a segurança pública como direito fundamental é que é esse assunto abrange diversos tratados internacionais sobre direitos humanos, que alguns têm força de emenda constitucional no ordenamento jurídico brasileiro, como cita Moraes:
“A segurança pública, como se percebe, é vital a todas as pessoas, sem distinção. O aspecto pessoal (físico) da segurança pessoal é amplamente regrado em diversos tratados internacionais sobre Direitos Humanos, dentre os quais os mais importantes são a Declaração Universal dos Direitos do Homem (art. 3º), a Declaração Americana dos Direitos e Deveres do Homem (art. 1º e 28º), o Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos (art. 9º) e a Convenção Americana de Direitos Humanos – Pacto de San José da Costa Rica (art. 7º). Como o interesse deste trabalho se orienta pelos dispositivos já constitucionalizados e concernentes à segurança pública é válido reportar que, dentre esses importantes documentos protetores dos direitos fundamentais, somente o Pacto de San José da Costa Rica foi ratificado pelo governo brasileiro. Portanto, tendo em vista que a Constituição Federal, no parágrafo 3º do seu art. 5º, determina que os tratados e convenções internacionais que forem aprovados pelo Congresso Nacional serão equivalentes às Emendas Constitucionais, se conclui que a atuação da segurança pública também está vinculada ao disposto no referido “Pacto””. (MORAES, 2010, p.83-84)
Cabe ressaltar que, em relação à segurança, não há de se falar de sua diminuição de implementação ou não aplicação, haja vista que isso resultará numa insegurança urbana. Ora, para o desenvolvimento da sociedade é preciso uma ordem mínima, com o escopo de salvaguardar a população do aumento da violência e da criminalidade, bem como assegurar que, por meio do direito em destaque, a gama de direitos fundamentais reste preservada e capaz de produzir efeitos. Assim, quando a segurança, na condição de direito fundamental, é inobservada ou mesmo renegada a segundo plano, há, por via de consequência, a desconsideração do próprio ser humano, conforme bem observa Moraes (2010, p.84-85)
5 CONCLUSÃO
Os direitos fundamentais são direitos ligados ao ser humano, cujo fundamento está abalizado na premissa de proporcionar a dignidade, igualdade e liberdade as pessoas fazendo com elas possam viver bem. Além de limitar o poder público para que não haja transgressões desses direitos. Eles também possuem algumas características como relatividade, complementariedade, indisponibilidade, imprescritibilidade, universalidade, irrenunciabilidade e historicidade o que mostra a necessidade desses direitos a uma pessoa. Doutrinariamente, cuida destacar que os direitos fundamentais são classificados como direitos individuais e coletivos, direitos sociais, direitos de nacionalidade, direitos políticos e direitos relacionados à existência, organização e participação em partidos políticos. Já pela doutrina são classificados, em unanimidade, em três dimensões distintas, representando a liberdade, a igualdade e a fraternidade, respectivamente.
Considerando o art. 6º da Constituição Federal de 1988 observou-se o direito à segurança como um direito social, sendo um direito fundamental e indissociável do conceito contemporâneo de dignidade da pessoa humana, logo, imprescindível ao desenvolvimento de cada indivíduo e compondo o ideário de mínimo existencial. Nesta esteira, haja vista que a segurança pública é “dever do Estado”, como diz o art.144 da CF 1988, reconhece-se que a segurança pública é um típico direito fundamental. No mais, em que pese sua alocação no rol do artigo 6º do Texto de 1988, a doutrina mais abalizada firma entendimento que a segurança pública um direito de terceira dimensão, pois é uma ação estatal em prol da coletividade.
Acadêmico de Direito da Faculdade Metropolitana São Carlos (FAMESC) – Unidade Bom Jesus do Itabapoana
Doutorando vinculado ao Programa de Pós-Graduação em Sociologia e Direito da Universidade Federal Fluminense (UFF), linha de Pesquisa Conflitos Urbanos, Rurais e Socioambientais. Mestre em Ciências Jurídicas e Sociais pela Universidade Federal Fluminense. Especializando em Práticas Processuais – Processo Civil, Processo Penal e Processo do Trabalho pelo Centro Universitário São Camilo-ES. Bacharel em Direito pelo Centro Universitário São Camilo-ES
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