O estado como garantidor da liberdade sindical

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Resumo: Objetiva-se demonstrar a importância do Estado no papel de tornar efetivo o Princípio da Liberdade Sindical.  Inicialmente, realiza-se breve escorço histórico acerca do sindicalismo no país, ao final do qual são delimitados os contornos dados ao tema pela Constituição Federal de 1988. Então, passa-se à análise precípua do tema, a partir da conceituação de liberdade sindical, enquadrando-a como um direito fundamental. Devidamente definido o princípio em questão, passa a ser demonstrado que não basta uma atuação negativa do Estado para restar garantida a liberdade dos sindicatos, cabendo a ele, Estado, assegurar, mediante atitudes positivas, que ela será aplicada na prática, por meio do Legislativo, do Ministério Público e do Judiciário. Por fim, é apreciado, com enfoque no entendimento jurisprudencial, o papel do Poder Público em polêmicos temas: o custeio, a democracia e a representatividade sindicais.

Palavras-chave: Direito Coletivo do Trabalho. Liberdade sindical. Direitos fundamentais. Estado Garantidor.

Abstract: This study aims to show the roll of the State in making effective the principle of Syndical Freedom. Firstly, it is exposed a brief historical retrospect concerning syndicalism in Brazil, which is delimited by the CF/88. Secondly, it is proceeded to a deeper analysis regarding the theme, through the concept of syndical freedom as a fundamental right. Having better defined the principle studied in this paper, it is demonstrated that it is not enough for the syndical movement to have a State that does not intervene in the relationships between the parties, as that does not guarantee the syndicate's freedom. It is the State's roll, then, to assure, through positive attitudes, that the syndicate's freedom is applied practically by the Legislative, the Public Prosecutor and the Judiciary. Finally, the roll of State is studied, by showing court decisions, concerning polemic situations, such as financial issues, democracy and representation in syndicates.

Keywords: Collective labour law. Freedom. Fundamental Right. Guaranty State.

Sumário: Introdução. 1. Escorço histórico do sindicalismo no Brasil: de 1930 até os dias atuais. 1.1. 1930 a 1943: a montagem do modelo sindical corporativista. 1.2. 1943 a 1988: a permanência do modelo sindical formado no governo Vargas e as manifestações por uma nova Constituinte. 1.3. O modelo de liberdade sindical adotado pela Constituição de 1988. 2. A atuação do estado na garantia da liberdade sindical. 2.1. O direito fundamental à liberdade sindical. 2.2. As formas e os limites da atuação do Estado em seu escopo garantista 2.2.1. Legislativo. 2.2.1.1. A promoção da liberdade sindical. 2.2.1.2. Limites e restrições ao exercício da liberdade sindical. 2.2.1.3. Os limites aos limites. 2.2.2. Ministério Público. 2.2.3. Judiciário. 3. A atuação do estado em prol da liberdade sindical: o custeio, a democriacia e a representatividade. 3.1. O custeio das entidades sindicais e a atuação do Estado diante da exigibilidade contributiva em face de não associados. 3.2. O Estado e a democracia no interior do sindicato. 3.3. A representatividade sindical como o pilar do sindicalismo. Conclusão. Referências.

Introdução

O sindicato, antes de ser uma associação de direito comum sui generis[1] inserida e regulamentada no âmbito do Direito do Trabalho e garantida constitucionalmente, é uma entidade social. Com efeito, não é de hoje que os indivíduos, notadamente aqueles mais fracos (econômica, social e politicamente), procuram unir-se para fazer frente aos mais fortes, detentores dos meios de produção econômica.

Obviamente, pelo perigo que esse tipo de associação representa ao poder econômico, durante séculos foi duramente repreendida. Mesmo quando reconhecido pelo Estado e aceito legalmente, esse modelo de organização, denominado posteriormente de sindicato, foi por muito tempo vinculado ao Estado, o que fulminava com os interesses da classe representada.

Daí a importância de se reconhecer constitucionalmente a liberdade sindical, que pode ser considerada como a coluna vertebral dos direitos e garantias do sindicato, o princípio base que irá orientar e nortear o tratamento que devem essas associações receber, à luz do Direito.

Não obstante a clarividente importância dessa garantia constitucionalmente conferida aos sindicatos no art. 8º da Carta Política Brasileira, é notória também a intangibilidade do termo, o que acaba por ocasionar uma série de incompreensões no que diz respeito ao seu significado, à sua abrangência e aos seus limites.

O que parece, todavia, ser comum nos tratados e doutrinas que versam acerca do tema é a importância dada ao direito de os sindicatos se organizarem de forma autônoma, como bem desejarem, sem que sofram qualquer interferência ou intervenção do Estado.

De fato, diante de uma história em que se registram sindicatos muito mais vinculados ao atendimento dos interesses estatais e empresariais do que à persecução dos anseios daqueles que supostamente defendiam, manter o sindicato distante da interferência estatal é fundamental.

Apesar disso, o que se pretende com a elaboração deste trabalho, é demonstrar algo que, à primeira vista, pode parecer contraditório, mas que, com o discorrer do tema, apresentar-se-á em total consonância com os princípios constitucionais. Trata-se da importância que possui o Estado na garantia da efetividade da Liberdade Sindical.

Por diversas vezes, a estrutura e a organização sindical são tão falhas, precárias e antidemocráticas, que é necessário ao Estado intervir na entidade, a fim de apaziguar a situação, garantindo o princípio democrático e a liberdade de fato da associação.

Não basta assegurar constitucionalmente que o sindicato será dotado de liberdade e autonomia para exercer suas funções e para organizar-se da forma que lhe aprouver, sempre em prol da coletividade que defende, é preciso, mais do que isso, asseverar que, de fato, essa liberdade será efetivada, bem como que os interesses dos representados serão sempre resguardados e perseguidos.

Só quem pode garantir isso é o Estado, que não deve se manter tão distante dos sindicatos, como sugerido por grande monta dos juristas. Inobstante, manifesto que não deve também interferir nas entidades sindicais ao seu bem entender, sem que haja uma razão relevante para tanto, sob pena de retrocesso ao tempo dos sindicatos cooptados pelo Estado. Em virtude disso, deve-se ter bastante cuidado na defesa deste tema.

Para demonstrar essa tese, partir-se-á de um breve escorço histórico do sindicalismo no Brasil, a partir do Governo de Getúlio Vargas até os dias atuais, cuja consequência será o delineamento do modelo de liberdade adotado pelo país. No segundo capítulo deste trabalho, será traçada razoável definição do termo “liberdade sindical”, com enfoque no seu caráter de direito fundamental. Em seguida, na mesma toada, discorrer-se-á acerca das formas de atuação do Estado em prol da garantia desse princípio, dividindo a apreciação em três setores: o Legislativo, o Ministério Público e o Judiciário. Por fim, no terceiro capítulo, o papel do Poder Público no âmbito sindical será analisado em seus aspectos mais polêmicos (o custeio, a democracia e a representatividade), com ênfase no entendimento jurisprudencial.

Escorço histórico do sindicalismo no brasil: de 1930 até os dias atuais.

O objetivo deste capítulo é traçar um panorama da estrutura sindical brasileira formulada no Governo de Getúlio Vargas, passando pelos avanços que esse modelo sofreu até chegar ao Direito Sindical na atualidade, com especial ênfase na liberdade adotada em cada período.

Como lembra Robert Darnton[2], o valor da história “não é ensinar lições, mas fornecer perspectivas”. Dessa forma, traçar um horizonte evolutivo do sindicalismo no Brasil é fulcral para se entender apropriadamente o modelo que foi adotado e as implicações dessa escolha política na relação entre Estado e sindicatos.

O momento histórico escolhido, neste trabalho, como importante ponto de partida do Direito Sindical no Brasil é o início da década de 1930, tendo em vista que foi a partir daí que se iniciou a montagem do modelo corporativista que repercutiria em todo o decorrer da história brasileira, mantendo fortes resquícios, inclusive, na atual Constituição Federal.

1.1. 1930 a 1943: a montagem do modelo sindical corporativista

Getúlio Vargas assumiu o governo do país por meio de um Golpe de Estado, com o auxílio dos chefes militares, passando a comandar uma nação predominantemente agrícola, mas que já apresentava certos polos industriais importantes. No cenário trabalhista, fortemente influenciado pela doutrina fascista corporativista, a atuação do governo revolucionário foi no sentido de conter o sindicalismo, impondo, à força, uma falsa harmonia entre capital e trabalho.

O termo corporativismo, recorrentemente utilizado para explicar a formação do modelo sindical brasileiro, deriva das influências que a Carta del Lavoro italiana, publicada pelo governo fascista de Mussolini, exerceu sobre a legislação brasileira. Para o cientista político Lêoncio Martins Rodrigues[3], corporativismo significa “uma forma de organização das classes sociais ou das forças produtoras, através de uma ação reguladora do Estado que busca integrar os grupos profissionais representativos do Capital e do Trabalho em organizações verticais e não conflitivas”.

No Brasil, o corporativismo consistiu na execução de um projeto elaborado ainda antes do golpe político. O objetivo principal era a modernização do Estado e da sociedade sem deslocar as antigas elites, acompanhada de um desenvolvimento econômico que mantivesse a submissão das classes subalternas ao grupo das classes dominantes.[4]

O Governo Provisório, após a Revolução de 30, não demorou a atuar na edificação desse modelo. Um dos primeiros atos de Getúlio Vargas foi a criação do Ministério do Trabalho, Indústria e Comércio, cuja finalidade incluía a fiscalização das entidades sindicais. Em março de 1931, começou, efetivamente, a montagem do sistema de controle dos órgãos representativos dos trabalhadores, capitaneado pelo Decreto 19.770, que estabeleceu a unicidade sindical e a obrigatoriedade do reconhecimento das entidades pelas autoridades públicas.

Os sindicatos deixaram de ser meras pessoas jurídicas de direito privado para serem publicizados, estando sua criação sujeita à chancela do Ministério do Trabalho, Indústria e Comércio. Sob a tutela deste, as entidades sindicais tornaram-se órgãos consultivos, técnicos e de colaboração com o Poder Público, o qual exigia estatutos padronizados e a apresentação de relatórios periódicos sobre suas atividades.[5]

Indubitável, portanto, que o modelo sindical montado no Brasil estava fortemente vinculado tanto ao corporativismo, quanto ao autoritarismo. Era autoritário, na medida em que se buscava a centralização do poder e o fortalecimento do Estado nacional, a quem competiria a tarefa de organizar a sociedade ‘de cima para baixo’. E, corporativo, no sentido de que o objetivo central era integrar os sindicatos ao Estado, com a finalidade declarada de controlá-los, no intuito de alcançar a paz social.

Os trabalhadores, entretanto, apresentavam certa resistência a essa estrutura montada, a despeito das previsões legais. Para reverter essa situação, impondo a aplicação da lei, o Estado estabeleceu uma estratégia de desmobilização do movimento operário, recorrendo tanto a medidas drásticas, como a repressão violenta, quanto a formas mais sutis de controle, a exemplo da cooptação de líderes sindicais.[6] É nesse contexto que começa a adquirir relevância a prática do peleguismo, com a criação de entidades completamente infensas a conflitos, com o único objetivo de alcançar a conciliação com os empregadores e ao mesmo tempo negociar com os próprios governantes, não trazendo, necessariamente, os melhores resultados à base representativa.

A evolução desse modelo sindical autoritário sofreu pequeno – e pouco consistente – interregno de menos de dois anos, entre 1934 e 1935, com a promulgação da Constituição de 1934, quando voltou a florescer, no país, maior liberdade e autonomia sindicais.[7] Nessa época, foi inclusive reimplantado o pluralismo sindical, contudo, de maneira claramente trôpega e capenga, já que limitada pelo texto legal, que exigia, para a criação de nova entidade, a participação de 1/3 dos empregados com a mesma profissão na localidade (requisito praticamente inalcançável).

De qualquer forma, o sistema supostamente plural instaurado pela Constituição de 1934 não teve vida longa. O Golpe de 1937 acabou com essa pequena margem de liberdade, sendo outorgada uma nova constituição, a partir da qual se iniciou o período ditatorial que os historiadores intitulam de “Estado Novo”.

A Constituição de 1937 trouxe, novamente, traços indiscutivelmente autoritários e intensificou o corporativismo, de forma a revelar cristalinamente a intenção do Estado de extirpar o conflito capital-trabalho, a partir da montagem de uma sociedade cuja intervenção estatal encontrava-se todos os âmbitos.

Exemplos desse autoritarismo eram os arts. 138 e 140 da então Carta Magna[8]. O primeiro dispositivo limitava a criação das entidades sindicais ao reconhecimento do Estado, além de estabelecer o exercício pela entidade de funções delegadas de poder público. O segundo, por sua vez, passava a organizar a economia de produção em corporações protegidas pelo estado, destacando a natureza de Direito Público dos sindicatos.

Após a outorga da Constituição de 1937, um passo importante no desenvolvimento do complexo arranjo sindical ocorreu com a regulamentação da Justiça do Trabalho e, principalmente, com o reconhecimento de seu poder normativo (Decreto-Lei 1.237). A partir daí, os conflitos coletivos passaram a ser diretamente intermediados pelo próprio Estado, incentivando a colaboração entre as classes. Para a cientista social Maria Celia Paoli[9]: “A Justiça do Trabalho nasce comprometida não com um ideal de Justiça ou com a ideia da igualdade, mas com a tarefa de manter a paz social e solucionar os conflitos a partir do pressuposto da colaboração entre as classes, eliminando, de inicio, a possibilidade de uma interlocução real entre elas”.

A efetiva materialização do corporativismo, contudo, apenas se deu com a Lei de Sindicalização (Decreto-Lei 1.402), verdadeiro sustentáculo infraconstitucional desse modelo sindical absolvido pelo Estado. A novel disciplina buscava proporcionar um controle ainda mais rígido das entidades, o que foi alcançado, principalmente, a partir da previsão da unicidade sindical, do monitoramento da gestão financeira dos sindicatos e da faculdade conferida ao Estado de cassar a carta de investidura sindical.

Não obstante o caráter autoritário do recém-instituído diploma legal, inexistia nele qualquer dispositivo que tornasse obrigatória a sindicalização. Não se tratava, porém, de uma falha, mas de uma ação estratégica, que foi complementada pela criação do imposto sindical em 1940. O fim a ser atingido, segundo Ricardo Machado Filho[10], era reduzir a influência das entidades profissionais, ao manter fora delas grandes contingentes de trabalhadores.

Dessa forma, o imposto sindical representou a verdadeira oclusão desse modelo que permitiria a manutenção dos sindicatos de forma atrelada ao Estado e dependente deste, ao mesmo tempo em que manteria as entidades distantes de sua base representativa. Os recursos arrecadados permitiriam o custeio de todo o aparato burocrático dos sindicatos, independentemente da sua maior ou menor representatividade, de forma que não havia estímulo direto à sindicalização, mas à criação de sindicatos, contribuindo para o enfraquecimento do movimento.

Foi no bojo dessa conjuntura que surgiram e se multiplicaram os sindicatos de gaveta, com diretorias especialistas em se perpetuarem no poder, cujo objetivo era muito mais captar recursos em proveito próprio, do que lutar por melhores condições de trabalho.

O historiado José Murilo Carvalho[11] reproduz bem essa ideia em sua obra: “Não era necessário fazer campanha pela sindicalização, pois o imposto era cobrado compulsoriamente de todos, embora beneficiasse apenas alguns. Se o imposto não incentivava a sindicalização, incentivava a formação de sindicatos, pois era a maneira mais simples de conseguir recursos sem fazer força”.

Finalmente, com a promulgação da Consolidação das Leis Trabalhistas (CLT), em 1º de maio de 1943, reuniu-se toda a legislação anterior, dando sistematização aos textos esparsos. No diploma consolidado, foram mantidos os quatro principais pilares que sustentavam o modelo sindical corporativo, quais sejam: o necessário reconhecimento pelo Estado das entidades sindicais; o sindicato único; o imposto sindical; e o poder normativo da Justiça do Trabalho. A composição dos três primeiros elementos (reconhecimento estatal, unicidade e imposto sindical) conferia um caráter de autossuficiência a essa estrutura, enquanto o poder normativo da Justiça do Trabalho servia como meio para a intermediação estatal das reivindicações e dos conflitos sociais.

E assim se concluía a montagem do engenhoso projeto corporativista.

O curioso é o fato de esse modelo constituído em um período específico de um governo ditatorial, influenciado por uma doutrina fascista, ter permanecido praticamente inalterado até os dias de hoje, resistindo a dois momentos de transição democrática e a uma diversidade de regimes políticos.

1.2. 1945 a 1988: a permanência do modelo sindical formado no governo Vargas e as manifestações por uma nova Constituinte

Como adiantado, no plano jurídico, a estrutura do corporativismo, implementada pelo Governo de Vargas, resistiu por longas décadas, permanecendo praticamente incólume até os dias de hoje.

Seria, contudo, extremamente superficial e até mesmo inocente imaginar que, em todos esses anos, a ação sindical tivesse permanecido linear, sempre sob o controle e a custódia do Estado. Na verdade, em que pese a manutenção de todas as ferramentas autoritárias e corporativistas montadas no período varguista, o movimento coletivo operário sofreu recorrentes declínios e ascensões, de acordo com o modelo político adotado por cada governo.

Como amplamente exposto, o sindicalismo foi arquitetado para conter o conflito social, permitindo que o Estado pudesse lidar com uma sociedade dócil e previsível; não obstante, era de se esperar que esse controle não fosse perene. Nos períodos democráticos, o sindicalismo, ainda que convivendo com as amarras legais, pôde desenvolver-se com certa autonomia, pois o uso das ferramentas autoritárias e corporativistas não se coadunavam com a proposta de governo democrático. No entanto, em momentos de autoritarismo, o controle sobre a autonomia sindical foi intenso e o espaço de atuação das entidades, completamente tolhido.[12]

Dessa forma, a legislação restritiva da autonomia sindical permanecia como a Espada de Dâmocles[13] sobre a cabeça dos trabalhadores: ela não atacava de imediato, mas continuava ali, preparada para, diante de qualquer contingência, aniquilar a atividade sindical. A efervescência política ocorrida no período anterior a 1964, por exemplo, foi abafada pelo golpe militar, que voltou a valer-se dos instrumentos de controle legalmente estabelecidos, como a possibilidade de intervenção nos sindicatos, além dos já conhecidos e repugnantes meios de repressão (perseguição a líderes sindicais, prisões, torturas e até assassinatos).

Observe-se, todavia, que um dos principais responsáveis pela sobrevivência do sistema sindical até os dias de hoje foi exatamente esse espaço, relativamente autônomo, que os sindicatos tinham, em períodos democráticos, para se desenvolver no interior do Estado, de acordo com as próprias estruturas montadas por ele.[14]

Foi num desses espaços, no final da década de 1970 – quando o país iniciou seu processo de redemocratização –, que voltou a florescer o movimento sindical. Nesse contexto, iniciou-se o primeiro movimento para a formação de uma entidade geral para representar todos os trabalhadores, a Conferência Nacional da Classe Trabalhadora (CONCLAT), dando um importante salto no desenvolvimento do sistema sindical no Brasil.

Após a CONCLAT, vários outros grupos, posteriormente denominados de centrais sindicais, foram sendo formados, sempre à margem da legislação trabalhista[15]. Não sendo reconhecidas pela lei, elas se organizavam em torno da necessidade de defender interesses comuns a toda a classe trabalhadora, coordenando a ação dos sindicatos por meio de grandes linhas de ação, muito mais voltadas ao âmbito político.

Nesse cenário, as centrais sindicais, assim como os próprios sindicatos, as federações e as confederações, foram de suma importância para a efetiva redemocratização do país, deflagrando inúmeros e importantes movimentos grevistas[16], que aceleraram esse processo. Pela atuação marcante, evidente que os sindicalistas obtiveram também destacado espaço na Assembleia Nacional Constituinte, responsável por conceber o atual Estado Democrático de Direito.

Era de se esperar, portanto, que, com a participação do movimento sindical na Constituinte, o Brasil fosse, finalmente, afastar-se das amarras corporativistas e adotar um modelo sindical realmente autônomo e liberal. Não foi o que aconteceu.

As novas lideranças mantinham uma relação ambígua com os elementos corporativistas dessa estrutura, em decorrência principalmente das vantagens por ela propiciadas[17]. Ao mesmo tempo em que rejeitavam a intervenção estatal nos sindicatos, reconheciam que a unicidade, a obrigatoriedade de participação dos sindicatos nas negociações, a criação da Justiça do Trabalho e, principalmente, o imposto sindical[18] tinham sido importantes trunfos para o movimento.[19]

Nesse diapasão, as críticas à estrutura sindical foram paulatinamente reduzindo. As lideranças trabalhistas passaram, então, a conduzir uma luta pela mudança do modelo sindicalista oficial, ao mesmo tempo em que defendiam a manutenção de sua essência. Consequentemente, se, de um lado, a opção dos novos líderes viabilizou a rápida reorganização do movimento sindical; de outro, permitiu – e favoreceu – a permanência de três dos quatro pilares do sistema corporativo (a unicidade, a contribuição obrigatória e o poder normativo da Justiça do Trabalho).

Foi repetido, assim, o histórico modo de modernização da nação brasileira, sempre resguardando os traços mais característicos do passado e mantendo, no cerne, o mesmo atraso das décadas passadas e ultrapassadas. Nesse sentido, alude o sociólogo José de Souza Martins[20]: “Na sociedade brasileira, a modernização se dá no marco da tradição, o progresso ocorre no marco da ordem. Portanto, as transformações sociais e políticas são lentas, não se baseiam em acentuadas e súbitas rupturas sociais, culturais, econômicas e institucionais. O novo sempre surge como desdobramento do velho”.

Dessa forma, o resultado da Constituinte para o sindicalismo brasileiro, em suma, foi a consagração de um modelo de liberdade sindical sui generis, o qual, ao mesmo tempo em que garante a livre associação, restringe a opção do trabalhador a apenas uma entidade e ainda lhe impõe uma contribuição compulsória. Essa opção política de liberdade, mas com unicidade traz consequências para o sindicalismo brasileiro que afetam profundamente o modo como Estado deve lidar com as entidades de trabalhadores. É o que restará explanado a seguir.

1.3. O modelo de liberdade sindical adotado pela Constituição de 1988

A Carta Política de 1988, responsável por instituir o atual Estado Democrático de Direito, previu no art. 8º, inserido no título destinado aos Direitos Fundamentais, a liberdade de associação sindical. Ocorre que, logo no inciso II desse mesmo dispositivo, encontra-se a determinação da unicidade sindical, ao passo que o inciso IV estabelece a manutenção da contribuição obrigatória. Com essas limitações, é possível dizer que existe efetivamente liberdade sindical no Brasil?

Para a Organização Internacional do Trabalho (OIT), conforme se extrai da Convenção nº 87, liberdade sindical é o direito de os trabalhadores, sem nenhuma distinção e sem autorização prévia, constituírem as associações que estimem convenientes e de filiarem-se a essas associações. Aliado a essa vertente, o diploma ainda prevê a livre organização das entidades sindicais, com autonomia para redigir seus próprios estatutos e eleger seus representantes, devendo as autoridades públicas abster-se de toda intervenção que tenha por objetivo limitar este direito ou entorpecer seu exercício legal.

Infere-se da conceituação acima delineada que, para a OIT, a pluralidade é ínsita ao conceito de liberdade sindical, é parte integrante deste postulado. O mesmo se pode dizer quanto à vedação à contribuição compulsória, tendo em vista que a própria Organização já manifestou o entendimento de que ela fere o princípio da liberdade sindical, conforme será melhor abordado no último capítulo deste Trabalho.

O Governo Brasileiro, todavia, não ratificou esse importante instrumento internacional, exatamente por manter modelo de liberdade divergente daquele entabulado pela Organização Internacional do Trabalho. O Brasil, no exercício de sua soberania, decidiu conferir conceituação ímpar à liberdade sindical; isso não significa, contudo, que tal princípio não esteja albergado pela Carta Magna, mas que sua interpretação e aplicação devem observar as limitações trazidas pela própria Constituição.

Essa liberdade mitigada que foi adotada pelo Estado Brasileiro faz com que não exista propriamente, no país, um “sistema” sindical, já que isso demandaria coerência, organização e postulados específicos que levassem a uma unidade geral. Tem-se, na melhor das hipóteses, um modelo sindical, marcado pela contradição e, diversas vezes, pela ineficiência.

A falta de coesão no modelo de liberdade sindical instituído pela atual Carta Política é evidente. Como dito, ao mesmo tempo em que foram acolhidos alguns dos primados expressos pela Convenção nº 87 da OIT, o legislador constituinte optou por manter a unicidade sindical, a contribuição compulsória e o poder normativo da Justiça do Trabalho. Além disso, foi acolhido o modelo de organização rígida e por “categoria”, algo que acabou desvirtuado pelo tempo, em virtude do fenômeno da “pulverização” sindical, de forma que algumas categorias foram divididas, passando a conter, por vezes, meros punhados de trabalhadores, com um grau de especificidade que atinge o absurdo. Tudo isso afeta a representatividade sindical, entendido como o mais importante pilar que sustenta a existência do sindicalismo.

Por outro lado, é importante reconhecer que a Constituição de 1988 trouxe sim relevantes mudanças ao modelo sindical, engendrando grande avanço na seara trabalhista. Com o novel texto constitucional, proibiu-se a interferência e a intervenção do Estado de maneira discricionária nas entidades, garantiu-se o reconhecimento das negociações coletivas, assegurou-se a representatividade dos sindicatos na defesa dos membros da categoria (art. 8º) e reconheceu-se a greve como direito fundamental, estabelecendo sobre ela importantes pilastras (art. 9º).

Veja-se, portanto, que o princípio da liberdade sindical encontra-se formalmente estatuído pela Constituição brasileira, ainda que de forma atônita, ou desconcertada. Em vista disso, é preciso particular esforço hermenêutico-interpretativo para que o aplicador da norma faça valer efetivamente tal direito fundamental, assegurando sua existência também no plano material, mormente tendo em vista que a liberdade em questão não se trata de uma liberdade genérica, mas qualificada, vez que voltada sempre ao benefício da categoria.  

Na aplicação da liberdade sindical, é preciso atentar, ainda, para a experiência sindical brasileira, cujos conflitos internos e contradições resultaram na criação de sindicatos representativos e atuantes ao lado de outros preocupados apenas em arrecadar a contribuição sindical compulsória. Concomitantemente, o sindicalismo, no país, convive com entidades cuja representatividade é ínfima ou nula; a média de associados no país não supera a casa dos 18%[21] por categoria, ao passo que, desse percentual, poucos participam ativamente das ações do seu sindicato; o restante (talvez 5%, com otimismo) torna-se um grupo pequeno, facilmente detectável e suscetível de pressões, coações e retaliações.[22]

Pela situação acima relatada, se a liberdade disposta no art. 8º da CF/88 fosse interpretada de maneira plena e irrestrita, sem levar em consideração a história e a realidade brasileiras, ela se tornaria um meio para o fácil controle e anulação da ação sindical, transformando-se em um fardo para o sindicalismo.

Cabe, portanto, ao Estado garantir a efetividade da liberdade sindical, nos moldes por ele mesmo constituídos, protegendo os trabalhadores em face dos próprios sindicatos – que, não raramente, elaboram estatutos antidemocráticos, realizam eleições fraudulentas e desviam recursos –; dos empregadores – que, diversas vezes, atuam no sentido de retaliar a prática sindical, fulminando a liberdade das entidades –; e, inclusive, dele mesmo Estado – o qual, eventualmente, excede-se nesse escopo garantista e adentra inconstitucionalmente na autonomia das entidades sindicais.

Note-se que todos os direitos fundamentais previstos na Constituição demandam uma ação proativa por parte do Estado, no escopo de asseverar o cumprimento real do disposto, de acordo com o que será aprofundado no capítulo seguinte. Nada obstante, a liberdade sindical carece de especial cautela e prudência, haja vista seu caráter de liberdade qualificada e suas demais peculiaridades, conforme relatado.

A atuação do estado na garantia da liberdade sindical

Neste capítulo, dividido em duas partes ou tópicos, adentrar-se-á, verdadeiramente, na abordagem do tema precípuo desta Monografia, qual seja a atuação do estado na garantia da liberdade sindical.

Inicialmente, no primeiro segmento deste segundo capítulo, objetiva-se assentar uma concepção apropriada de liberdade sindical e seus contornos como direito fundamental, traçando as implicações de tal classificação e expondo a necessidade de interferência do Poder Público para a sua efetiva observância.

Em seguida, estabelecida essa noção primordial, será apresentada a forma e a medida da ação do Estado no desiderato de garantir a eficácia da liberdade sindical, dividindo essa atuação em três espécies: Legislativo, Ministério Público e Judiciário. Evidentemente, a conduta desses três aspectos distintos do Estado não se dará de forma completamente independente e autônoma, sendo imprescindível uma ação conjunta e complementar para a efetiva salvaguarda desse tão importante princípio. Apesar disso, uma divisão sistemática do conteúdo, ainda que se observe a interferência de um poder em outro, é a forma mais indicada para se aprimorar a análise, facilitando o entendimento da matéria e da tese que se pretende defender.

Salienta-se que o Executivo, capitaneado pelo MTE, foi excluído da apreciação, tendo em vista que, com a promulgação da Constituição de 1988, o papel intervencionista desse Poder nas entidades sindicais foi praticamente extinto. A legitimidade para realizar registros sindicais permanece apenas como consequência da opção do constituinte pela unicidade, configurando-se como condição indispensável para que o sindicato adquira personalidade jurídica[23], no mesmo sentido da súmula 677[24] do STF. Dessarte, despicienda uma análise mais aprofundada acerca do tema para os objetivos do presente trabalho.

1.1. O direito fundamental à liberdade sindical

A Liberdade Sindical possui um conteúdo muito mais extenso e complexo do que aquele expresso no texto do art. 8º da Constituição Federal Brasileira. Seria pífio defini-la, simplesmente, como a ausência de interferência do Estado na entidade sindical. Em verdade, sua conceituação possui vida própria e está em constante mutação, sempre acompanhando os avanços sociais, sob interferência constante da doutrina, da legislação e do Direito Internacional.

Para Octavio Bueno Magano[25], liberdade sindical se traduz como “o direito dos trabalhadores e empregadores de não sofrerem interferências nem dos poderes públicos nem uns em relação aos outros, no processo de se organizarem, bem como o de promoverem interesses próprios ou dos grupos a que pertençam”.

Arnaldo Sussekind[26] adota a concepção de liberdade sindical fundamentada sob o prisma triangular: a) liberdade sindical coletiva, correspondendo ao direito dos grupos de empresários e de trabalhadores de constituir o sindicato de sua escolha, com a estruturação por eles escolhida; b) liberdade sindical individual, compreendendo o direito de cada trabalhador ou empresário de filiar-se ao sindicato que preferir e dele desligar-se; c) autonomia sindical, concernente à liberdade de organização interna e de funcionamento da associação sindical, além da faculdade de constituir federações e confederações.

Amauri Mascaro Nascimento[27], por sua vez, concebe a liberdade sindical em cinco facetas: liberdade de associação, liberdade de organização, liberdade de administração, liberdade de filiação sindical e liberdade de exercício das funções.

Todas essas conceituações e classificações formuladas pelos renomados doutrinadores possuem notável significado e importância. O objetivo deste capítulo, contudo, vai além de estabelecer um suposto significado ideal a esse postulado; busca-se aqui, como maior prioridade, expor a denotação de direito fundamental da liberdade sindical e as consequências dessa constatação.

Com efeito, de acordo com o exposto no capítulo anterior, a complexa história do sindicalismo brasileiro desaguou no surgimento de um modelo de liberdade sui generis, que convive, ao mesmo tempo, com os primados democráticos e corporativistas. Por esse motivo, uma definição precisa dos contornos da liberdade sindical, à luz da sua classificação como direito fundamental ganha especial importância.

Após detalhado estudo acerca do assunto, José Rodrigo Rodriguez traçou interessante panorama a respeito da liberdade sindical, que merece, aqui, ser reproduzido, dada a finalidade, já apresentada, deste trabalho. Segundo o autor, a liberdade sindical é o conjunto de posições jurídicas que tutelam a atividade sindical, compreendendo: a) faculdades, tituladas pelos indivíduos, de criar um sindicato, aderir, não aderir ou demitir-se dele; b) poder-dever de representação, capitaneado pelo sindicato e composto de uma série de poderes-deveres de organização institucional, formação de entidades de grau superior, regulação das atividades internas ao sindicato, estabelecimento de relações com a categoria e com os sindicatos de empregadores; e c) imunidade em relação à vontade estatal, ou à vontade de qualquer outro ente, titulada também pelo sindicato, com ressalva aos limites existentes na Constituição, aqueles autorizados por ela e os decorrentes da colisão com outros direitos fundamentais.[28]

A liberdade sindical, em apertada síntese, seria, portanto, um direito fundamental concretizado na faculdade de criação de sindicatos imunes à vontade de qualquer ente e dotados de poderes-deveres que devem ser exercitados em favor dos interesses da categoria, mas limitado pela própria Constituição e pelo seu caráter principiológico de direito fundamental.

É importante ressaltar, novamente, o mencionado caráter de direito fundamental, ínsito à liberdade sindical e parte indispensável do conceito acima delineado. Além de formalmente fundamental, uma vez que previsto expressamente no art. 8º da CF/88, no capitulo relativo aos Direitos Sociais, o qual se insere no título “Dos Direitos e Garantias Fundamentais”, versa a liberdade sindical, claramente, acerca da dignidade da pessoa humana, sendo imprescindível para o equilíbrio entre capital e trabalho, bem como para a constante evolução social, o que faz dela também um direito materialmente fundamental.

A importância desse princípio é tamanha que, na doutrina francesa, Jean-Claude Javillier, eleva-o a uma posição superior, de destaque, na medida em que a liberdade sindical condicionaria outras liberdades e direitos fundamentais. Ele a define como “liberdade condição”, vez que, em sua ausência, os demais direitos sociais não seriam colocados em prática. [29]

Ocorre que não basta a previsão constitucional de que a liberdade será preservada, para que ela de fato o seja. Os direitos fundamentais contêm uma ordem dirigida ao Estado no sentido de que a este incumbe a obrigação permanente de sua concretização e realização. Para que tal ocorra, cabe ao ente estatal que zele, inclusive preventivamente pela proteção dos direitos fundamentais dos indivíduos, não apenas contra comportamentos do próprio Poder Público, mas também contra agressões de terceiros[30], dentre os quais se encontram o empregador e a própria entidade sindical, quando atua em desrespeito ao interesse da categoria.

Corrente doutrinária, certamente inspirada na “teoria dos quatro status”[31], desenvolvida por Georg Jellinek, considera, em síntese, que os direitos fundamentais se dividiriam em positivos e negativos. Os direitos de liberdade teriam caráter negativo, pois implicariam um não agir, enquanto os direitos de igualdade teriam um status positivo, pois sua implementação necessitaria de um agir por parte do Estado, mediante o gasto de verbas públicas. Tal corrente, contudo, não leva em conta a multiplicidade de comandos que emanam das normas definidoras de direitos fundamentais. Na verdade não existem direitos exclusivamente negativos, sendo um erro pensar que os direitos de liberdade não geram custos ou tarefas para o Poder Público. A proteção de qualquer direito exige a mobilização de recursos financeiros, administrativos, legislativos e judiciais, sem os quais nenhuma garantia é protegida.[32]

Todo direito fundamental gera, portanto, dever de respeito, de proteção e de promoção. Ou seja, o Estado tem o dever de respeitar (não violar o direito), de proteger (não deixar que o direito seja violado) e de promover (possibilitar que todos usufruam o direito) os direitos fundamentais estabelecidos pela Carta Magna.[33] A insuficiente implementação dos deveres de proteção do Estado, aliás, além de caracterizar violação ao princípio em apreço, constitui flagrante ato antijurídico.[34]

Conceder uma liberdade pura e simplesmente, sem, contudo, proporcionar os meios necessários para exercê-la, seria o mesmo que não concedê-la. Um Estado que defende a livre concorrência, por exemplo, embora não deva ser o agente direto da economia, por outro lado, não pode deixá-la inteiramente à sua sorte. Isso porque a tendência à formação de monopólios e oligopólios exige uma intervenção do Estado, para garantir a livre concorrência em bases realistas, pressupondo um regramento mínimo, a coibir práticas abusivas.[35] O mesmo raciocínio aplica-se às demais espécies de liberdades garantidas constitucionalmente, assim como à liberdade sindical, objeto do presente estudo.

O dever geral de efetivação está associado ao monopólio estatal do exercício da força. Diante da vedação à autotutela, não se pode esperar a concretização compulsória de qualquer outro sujeito que não seja o próprio Estado.[36] No caso da liberdade sindical, esse dever estatal de efetivação dos direitos fundamentais, ganha especial importância, como já se vem destacando, haja vista a fulcral necessidade de se combater práticas antissindicais, entendidas como aquelas ações voltadas a prejudicar as entidades de classe, atingindo diretamente sua liberdade de atuação.

Portanto, sob a ótica defendida, apresenta-se, permissa vênia, insuficiente o entendimento de doutrinadores que, quando do estudo da matéria, apresentam apenas o caráter de atuação negativa do Estado, no sentido de vedar a interferência ou intervenção externa, sem, contudo, abordar sua esfera positiva, de proteção e promoção da liberdade sindical exatamente por parte do Poder Público. Essa conclusão, ainda que em um primeiro momento pareça contraditória, em verdade, não o é. O Estado, obviamente, tem sim o dever de abster-se de intervir e interferir nas entidades sindicais; o que se propugna, todavia, é que sua atuação deverá ir além da prática abstencionista, de forma a agir, também, no sentido de evitar que outros agentes tolham essa liberdade, prevenindo-se, inclusive, dele mesmo, Estado, o que só é possível pela separação dos poderes.

Demais disso, insta lembrar que, sendo um Direito Fundamental, a liberdade sindical constitui um princípio, e, como tal, deverá ser interpretado e aplicado levando em consideração toda a gama de direitos e garantias fundamentais, para que com eles se compatibilize.

O princípio da liberdade não autoriza o titular a vilipendiar outros direitos, até porque os limites dos direitos fundamentais esbarram no círculo de outras garantias fundamentais.

Nesse mesmo sentido aduz Túlio de Oliveira Massoni[37]: “Não é possível o desenvolvimento da liberdade sindical sem a preexistência efetiva dos demais direitos humanos e tampouco é possível o completo exercício destes sem a vigência daquela”.

1.2. As formas e os limites da atuação do Estado em seu escopo garantista

Nesta segunda parte do capítulo, conforme já mencionado, será abordado como deverá – e em que medida – ser a atuação do Estado na garantia do Princípio da Liberdade Sindical, a fim de que este seja realmente efetivado, de acordo com a concepção trazida pela Constituição de 1988; bem como de que forma esse princípio será aplicado para se compatibilizar com as demais garantias fundamentais previstas constitucionalmente.

1.2.1. Legislativo

A primeira forma que o Estado possui para garantir que o Princípio da Liberdade Sindical será verdadeiramente aplicado na prática é por meio do Poder Legislativo.

Como se sabe, esse Poder tem duas funções típicas: a de elaborar normas jurídicas e a de fiscalizar o Poder Executivo e o uso do patrimônio público. Com relação a esta segunda incumbência, cabe registrar que o Tribunal de Contas da União, órgão do Legislativo, segundo a melhor interpretação do art. 70, parágrafo único[38], da CF/88, está habilitado a fiscalizar a destinação das verbas oriundas da contribuição sindical obrigatória, por tratar-se de receita pública. Foi exatamente isso que entendeu o STF, no recente julgamento do MS 28465/2014, de relatoria do Ministro Marco Aurélio.

Com efeito, a mera fiscalização não importa em malferimento à liberdade sindical tal qual concebida pela Constituição Federal, mas representa apenas uma consequência da opção do constituinte pela manutenção da contribuição compulsória, de natureza tributária, cuja destinação está vinculada ao interesse da categoria, e, portanto, sujeita ao controle do TCU.

Nada obstante, pela grande quantidade de entidades sindicais existentes e pela restringibilidade dos recursos do TCU, essa fiscalização não tem sido tão eficiente.

O papel do Poder Legislativo, no escopo de garantir a liberdade sindical, será, portanto, prioritariamente, o de formular normas jurídicas que asseverem o cumprimento a esse postulado, evitando interferências indesejadas e coibindo excessos ou abusos; sem, contudo, imiscuir-se demasiadamente na autonomia e independência das entidades.

Encontrar um equilíbrio entre essas três vertentes – promoção, restrição e preservação da liberdade – é matéria tormentosa e tem gerado intensos e calorosos debates na doutrina e na jurisprudência. Portanto, não se pretende, aqui, esgotar a matéria, mas expor o ponto de vista deste autor acerca das principais problemáticas que circundam o tema.

1.2.1.1. A promoção da liberdade sindical

Nesta dimensão do papel legislativo do Estado, defende-se que é imprescindível uma atuação no sentido de promover e proteger a Liberdade Sindical, garantindo que ela não será vilipendiada por quem quer que seja.

Acerca do tema, preleciona, com propriedade, Viera de Andrade[39] que deve ser observado o Principio de Proibição de Défice, segundo o qual o Estado estaria obrigado a assegurar um nível mínimo adequado de proteção dos direitos fundamentais, sendo responsável pelas omissões legislativas que não assegurem o cumprimento dessa imposição genérica.

Para Canotilho[40], existe um defeito de proteção quando aqueles entes estatais sobre os quais recai um dever de proteção adotam medidas insuficientes para garantir uma proteção constitucionalmente adequada dos direitos fundamentais.

No que concerne à Liberdade Sindical, essa tese, segundo Rodrigo Rodriguez[41], tem sido contrariada por alguns juristas, cujo entendimento é o de que a juridificação do sindicalismo representa uma intervenção inaceitável sobre a espontaneidade dos grupos sociais, os quais, caso fossem deixados livres, encontrariam, naturalmente, a disciplina mais adequada. Não parece ser esta a ótica mais razoável; a desregulamentação da atividade sindical faria desse princípio letra morta, ou instituto vazio, mormente tendo em vista a já destacada realidade brasileira. Na verdade, a normatização ou juridificação do sindicalismo não constitui ofensa à liberdade das entidades, mas, a própria realização dessa garantia democrática.

Nessa esteira, defende Túlio de Oliveira Massoni[42]: “Não pode a Liberdade Sindical exaurir-se em uma abstrata possibilidade de fazer, devendo existir uma rica legislação promocional com medidas de estímulo e de incentivo, atribuindo aos trabalhadores e a suas organizações determinados poderes e instrumentos concretos de participação para tornar verdadeiramente efetiva essa liberdade. Assim, evolui-se para um conceito de liberdade que o ordenamento não apenas tolera e garante, mas que favorece e promove”.

Parece inexorável a conclusão de que, para o pleno gozo da liberdade sindical, são necessárias certas garantias, pois não basta reconhecer formalmente a liberdade sindical, é necessário reprimir os atos que impeçam ou limitem seu efetivo exercício.

Exemplificativamente, se inexistisse a norma que garante estabilidade provisória aos dirigentes sindicais (art. 8º, VIII da CF/88 e art. 543 da CLT), poderia o empregador simplesmente despedir todos aqueles que estão à frente da entidade, o que acabaria por ferir de morte a liberdade que possui o sindicato de se auto-organizar, inviabilizando também uma atuação eficaz da associação na promoção e na defesa dos direitos da categoria.

Nesse mesmo sentido é a imposição de que, durante um movimento grevista, não se poderá despedir aqueles que participam da parede ou contratar trabalhadores em substituição a eles (art. 7º, parágrafo único da Lei 7.783/1989). Se a empresa pudesse, sempre que se visse diante de uma manifestação grevista, despedir todos os envolvidos e contratar novos empregados, o movimento perderia sua eficácia, vez que, pelo temor de perder o emprego, nenhum trabalhador aderiria à greve, ao passo que nenhum patrão cederia às reivindicações obreiras. Assim, frustrado o direito de greve, ter-se-ia por vilipendiada também a liberdade sindical, pois estaria sendo claramente tolhida a atuação da entidade em prol dos trabalhadores. A liberdade sindical, dessa forma, alcança tanto o direito de atuação dos trabalhadores nos movimentos de reivindicação, quanto o direito de não sofrer qualquer conduta discriminatória por essa atividade.

Nesse diapasão, papel do Estado-Legislador situa-se no combate a essas práticas violadoras da liberdade sindical, os chamados atos antissindicais, seja evitando que ocorram, seja prevendo sanções. Não obstante essa obrigatoriedade de atuação do Estado, a legislação brasileira é rasa em estabelecer condutas antissindicais específicas e suas consequências jurídicas. Como solução para esse hiato normativo, é preciso que o intérprete se valha de certos dispositivos que trazem consigo importante carga normativa (a exemplo dos arts. 8º e 9º da CF/88), aplicando-os em consonância com o Direito Internacional (notadamente o tutelado pela OIT) e com os direitos e garantias fundamentais, dentro dos quais se enquadram os direitos sociais e os princípios de Direito Coletivo do Trabalho. Tudo isso tem possibilitado à doutrina e à jurisprudência estabelecer obrigações de fazer e de não fazer, a fim de evitar e punir tão reprovável conduta.

Atos antissindicais não devem ser entendidos apenas como aqueles praticados pelos empresários ou pelo Estado. A própria entidade, quando atua em desfavor da base de trabalhadores que representa, pratica tal ato danoso, atingindo, invariavelmente, o direito fundamental à liberdade sindical, que deve sempre ser interpretado à luz do benefício da categoria.

A análise de todos os atos antissindicais e as consequências de suas práticas iriam além do objetivo deste trabalho, todavia, fica o registro de que a formulação de normas acerca dessa matéria é também um dos papeis do Estado, como forma de garantir a efetividade do Princípio da Liberdade Sindical entabulado na Carta Maior. De extrema valia seria, então, a elaboração de uma Lei que esmiuçasse e caracterizasse tais condutas violadoras da liberdade das entidades, prevendo precauções e sansões em caso de descumprimento; isso, por certo, evitaria uma série de inconstitucionalidades e garantiria uma atuação mais eficaz por parte dos sindicatos.

Em suma, o Estado-Legislador, no seu escopo promocional, deverá legislar para evitar e punir toda e qualquer atitude antissindical, viabilizando uma atuação verdadeiramente autônoma por parte dos sindicatos. Dever-se-á, assim, proteger legalmente a entidade, contra ele, Estado; contra o empresariado; e até mesmo contra a própria entidade e seus trabalhadores, que, por razões escusas, poderão atuar em desfavor da associação sindical, cuja finalidade jamais poderá contrariar o interesse dos trabalhadores.

1.2.1.2 Limites e restrições ao exercício da liberdade sindical

A importância do Poder Legislativo, no cenário da liberdade sindical, vai, contudo, além do caráter já elucidado. Ele é necessário também para evitar abusos ou excessos por parte dos agentes sindicais. Afinal, segundo a fórmula kantiana, a liberdade de um há de encontrar limites na liberdade de outrem.

Nessa senda, cabe trazer à baila lição de Canotilho[43], segundo a qual se devem diferenciar limites de restrições. De acordo com o tratadista português, os limites constitucionais são compreendidos como aqueles positivados na própria Carta Magna, a exemplo, no caso da liberdade sindical, da exigência pela unicidade (art. 8º, II, CF/88). Ao lado desses, existem as restrições estabelecidas por lei, cabíveis se e quando a norma jusfundamental autorizar; é o caso da Lei de Greve (7.783/1989), cujo alicerce constitucional está no art. 9º, que prevê a posterior elaboração de norma para tratar dos serviços essenciais, bem como dos abusos porventura praticados. Por último, há os limites imanentes ou limites constitucionais não escritos, que têm status constitucional e resultam implicitamente do entrechoque de direitos fundamentais ou da relação entre a norma e outros valores jurídicos constitucionalmente tutelados.

Exemplo clássico de limite imanente é o abuso de direito, que ocorre quando há o exercício malicioso de determinado direito fundamental, em aproveitamento mal intencionado da disposição literal da norma. Nessa hipótese, apenas aparentemente a conduta é protegida pelo Direito; examinado detidamente um caso de abuso, resultaria possível conceber que os fins almejados pelo autor são diversos daquele defendido pela norma constitucional, incluindo-se, na verdade, fora do âmbito de aplicação do dispositivo.[44]

Destarte, nos casos de abuso de direito, independentemente de previsão legal, a conduta será rechaçada pelo Ordenamento, haja vista que ela não se insere no quadro de aplicação da norma. Trata-se de uma limitação imanente, intrínseca ao texto constitucional, segundo Canotilho.

Inobstante o caráter implícito já relatado, é de suma importante que o Estado atue na criação de normas jurídicas como forma de prever as condutas que são aceitáveis e as que devem ser entendidas como abusivas, bem como, nestes casos, as consequências de suas práticas. Dessa forma, garante-se uma segurança maior ao agente, tanto para atuar, quanto para deixar de fazê-lo; ao mesmo tempo, assegura-se ao terceiro que, ocorrendo o comportamento descrito como abusivo, incidirão as sanções cabíveis. Quanto ao Judiciário, garante-se maior uniformidade nas decisões, porquanto as condutas estarão descritas na norma, de forma a dirimir certas divergências interpretativas.

Imprescindível, nesse viés, que o Estado-Legislador atue na elaboração de normas, seja em virtude de uma obrigação constitucional expressa (restrição constitucional), seja no caso de uma limitação implícita ou imanente (abuso de direito). Não é possível que, com base no postulado da liberdade, os sindicatos prejudiquem a categoria, imponham ônus excessivos aos empregadores ou atinjam de forma especialmente prejudicial a sociedade.

É com fulcro nesse raciocínio que se fundamenta a Lei de Greve (Lei 7.783/1989). Ao mesmo tempo em que resulta de uma previsão constitucional, conforme mencionado, visa coibir a prática de abusos no exercício de um direito fundamental que facilmente poderá ultrapassar o limite do razoável. A título exemplificativo, cabe mencionar o art. 6º, I, que assegura aos grevistas a utilização apenas de meios passivos como forma de persuadir os trabalhadores a aderirem à greve; nos parágrafos desse mesmo dispositivo, está, ainda, vedado aos grevista valer-se de depredações, impedir o acesso de quem deseja trabalhar ou constranger os direitos de outros trabalhadores. Tais mandamentos visam assegurar que não haverá abusos por parte dos manifestantes a afetar de forma ilegal os bens do empregador, a prestação de serviços ou mesmo os direitos dos demais trabalhadores.

Outro exemplo é a disciplina que a mesma lei estabelece aos serviços essenciais (arts. 10, 11, 12 e 13), de forma a proteger, nesse caso, a sociedade contra as consequências nefastas que uma greve poderia causar numa atividade considerada indispensável, como o é, por exemplo, os trabalhos em hospitais ou em transportes públicos. Em ocasiões como essas, deverão ser garantidos quantitativos mínimos, a evitar prejuízos irreparáveis.

Por fim, cabe mencionar, ainda que de forma perfunctória, a celeuma que envolveu a recepção ou não pela Constituição do art. 522 da CLT, o qual limita a composição da diretoria sindical a um máximo de sete e a um mínimo de três membros. Em uma leitura inicial, poder-se-ia concluir que o dispositivo não foi recepcionado por ferir frontalmente a liberdade sindical, na medida em que tolhe a autonomia que possuem as entidades de se organizarem da forma que entenderem mais vantajoso para a categoria, sendo essa uma questão interna corporis, a ser tratada no âmbito de cada sindicato. Ocorre que a prática demonstrou a existência de várias entidades sindicais com quantidades absurdas de dirigentes[45], de forma que, pela regra da estabilidade provisória, nenhum deles poderia ser despedido sem que antes fosse processada a apuração por falta grave. O Supremo Tribunal Federal (STF), em 28/05/1999, no julgamento do RE 193.345[46], de relatoria do Ministro Carlos Velloso, fixou, então, o entendimento da receptividade do art. 522 da CLT, de maneira que, consoante a tese aqui delineada, aplicou-se uma restrição imanente ao direito fundamental à liberdade sindical, como forma de evitar o abuso de direito que vinha sendo cometido contra os empresários.

No subtópico seguinte, quando da abordagem dos limites à atuação do Legislativo, o tema da receptividade do art. 522 da CLT será novamente trazido a cotejo, dessa vez sob outro enfoque.

1.2.1.3. Os limites aos limites

A interferência do Poder Legislativo, seja promovendo um direito fundamental, como o da liberdade sindical, seja coibindo-lhe os excessos, deve sempre observar certos limites.

O ponto de partida, para tanto, é a compatibilidade formal e material com a Constituição. Sob a perspectiva formal, cumpre que se investigue a competência, o procedimento e a forma adotados pela autoridade estatal; já no aspecto material, diz-se essencial a observância da proteção do núcleo ou conteúdo essencial desses direitos, bem como o atendimento às exigências da proporcionalidade e da razoabilidade. Os chamados ‘limites aos limites’ das normas fundamentais funcionam, portanto, como verdadeiras barreiras à restringibilidade desses direitos.[47]

A aferição da proporcionalidade de uma medida restritiva há de partir do pressuposto de que a compressão de um direito encontra sua razão de ser na tutela de outro bem jurídico constitucionalmente relevante, ou seja, a restrição deve ter uma finalidade constitucional legítima.[48] Tal constatação deve-se aplicar tanto no momento de se restringir a liberdade sindical, quanto, inclusive, no de promovê-la, uma vez que a produção de uma norma em favor desse direito fundamental, por certo, incidirá negativamente em outro valor igualmente relevante. É o que se observa, por exemplo, do art. 7º, parágrafo único, da Lei de Greve, que veda a contratação de trabalhadores em substituição aos grevistas: ao mesmo tempo em que se garante a efetividade do direito de greve e da liberdade sindical, restringe-se a livre iniciativa e a liberdade de contratar do empregador. Neste caso, indiscutível que o juízo de ponderação foi realizado corretamente.

De acordo com a posição doutrinária corrente, aclamada pela jurisprudência, o princípio da proporcionalidade se desdobra em três elementos ou três fases: a) adequação ou conformidade, no sentido de que deve ser possível alcançar o fim almejado por aquele determinado meio; b) necessidade, significando que a opção escolhida deve ser a menos gravosa para o direito objeto da restrição; e c) proporcionalidade em sentido estrito ou razoabilidade, ocasião em que se deve realizar uma análise comparativa entre os meios utilizados e os fins colimados, já que mesmo uma medida adequada e necessária poderá ser desproporcional.

Resta, contudo, enfrentar até que ponto medidas adequadas e necessárias podem resultar em compressão excessiva do bem afetado. Nessa seara, surgiu a tese do núcleo essencial, o qual, para Alexy e, entre nós, Virgílio Afonso da Silva[49], seria parte integrante do processo de ponderação, a terceira fase da aplicação do princípio da proporcionalidade. Para a teoria, cada direito fundamental seria composto de duas partes: uma envolvendo o conteúdo central da norma, que seria intangível e ilimitável; e outra composta de um conteúdo periférico, passível de sofrer restrições pelo Estado.

Defendendo essa tese, Ingo Sarlet[50] preceitua que a inclusão dos direitos fundamentais dentre as cláusulas pétras (art. 60, §4º, IV, CF/88) não constitui garantia absoluta, mas sim de preservação do seu núcleo essencial. Para o autor, decorre daí que afetações operadas por emendas constitucionais não invasivas ao núcleo duro do direito em questão devem ser tidas como aceitáveis, porque constitucionalmente adequadas, ao passo que aquelas tendentes a abolir o âmago da norma fundamental devem ser consideradas inconstitucionais. Nesse mesmo sentido posicionou-se o STF quando do julgamento da ADIN 2.024, em 22/06/2007, de relatoria do Ministro Sepúlveda Pertence.

Questão espinhosa é a que diz respeito ao possível conceito de ‘núcleo essencial’. Enfrentando o tema, Flávio Novelli[51], com arrimo em Klaus Stern, propôs razoável definição, de acordo com a qual por núcleo essencial poder-se-á considerar: Os elementos que constituem a própria substância, os fundamentos, os elementos ou componentes dele inseparáveis, a eles verdadeiramente inerentes, por isso que integrantes de sua estrutura e do seu tipo, conforme os define a Constituição, isto é, seus elementos essenciais, e não meramente acidentais.

Segundo o raciocínio acima transcrito, qualquer limitação legislativa ao direito à liberdade sindical deve estar vinculada à observância de sua essência, ou de seus componentes inseparáveis. Dessa forma, pode-se afirmar peremptoriamente que está vedado ao Estado imiscuir-se na organização e na atuação dos sindicatos de forma engessá-los; cumpre que se restrinja a criar normas que garantam a liberdade eficaz das entidades sindicais e evitem os mencionados abusos de direito. Caso o Estado, em sua atividade legiferante, ultrapasse os limites constitucionais implícitos ou expressos, estabelecendo norma que vai de encontro com a essência da liberdade sindical, de forma a minar a atividade das entidades, por óbvio, tal ato normativo deverá ser interpretado e declarado inconstitucional, exatamente por ferir a Carta Magna. De igual forma, aqueles dispositivos pretéritos ao atual Texto Maior, com notável condão corporativista, devem ser detidamente analisados, com a finalidade de se perquirir sua recepção ou não pela Constituição de 1988.

Nada obstante, na esteira do que defende Virgílio Afonso da Silva[52], a exata determinação de qual o núcleo essencial[53] de um direito fundamental dificilmente poderá ser estabelecida em abstrato e previamente; a aferição deve-se dar, portanto, de acordo com cada situação concreta.

No caso da controvérsia envolvendo o art. 522 da CLT, conforme mencionado alhures, o STF posicionou-se pela recepção do dispositivo. Na ocasião, entendeu o Supremo que a limitação da diretoria a um máximo de 07 membros e um mínimo de 03 não feriria o núcleo duro da liberdade sindical. Com o devido respeito ao entendimento pretoriano, não parece ser esse o caminho mais razoável, afinal cada entidade tem suas peculiaridades, possuindo diferentes números de associados e representando bases de trabalhadores também singulares. Não é crível, por exemplo, estabelecer para o sindicato dos comerciários de São Paulo, que conta com mais de 60 mil associados, a mesma composição de diretores de uma pequena entidade interiorana com algumas centenas de trabalhadores representados. Limitar de tal forma a organização significa atingir frontalmente a essência da liberdade sindical.

Amenizando os efeitos da receptividade do art. 522 da CLT, o TST[54] tem interpretado tal dispositivo no sentido de que a limitação ao quantitativo de diretores tem por objetivo restringir apenas a quantidade de empregados dotados de estabilidade provisória, de forma que podem existir outros gerenciadores no sindicato, desde que apenas 07 deles sejam estáveis. Conquanto esse não seja ainda o entendimento ideal para se assegurar verdadeira liberdade organizacional aos sindicatos, ele garante maior flexibilidade às entidades, evitando que se destrua por completo o núcleo essencial da liberdade sindical, que, no caso, deve ser a autonomia na organização.

O disposto no art. 522 da CLT, certamente, fere a essência da liberdade sindical. O que se entende como o melhor caminho a ser seguido seria a aprovação de norma que estabelecesse variações na composição das diretorias de acordo com a quantidade de trabalhadores associados ao sindicato, concedendo sempre uma margem de escolha às entidades. Desse modo, garantir-se-ia a almejada liberdade organizacional, ao mesmo tempo em que se vedariam, com a devida proporcionalidade, eventuais abusos a serem praticados. Na atual situação, todavia, como o Judiciário não é competente para a edição de normas jurídicas, e tendo em vista que é preciso fixar algum entendimento, sob pena de inviabilizar o trabalho dos juízes e desembargadores, a cognição contida na súmula 369, II, do TST parece o mais razoável e proporcional, porquanto se veda os abusos e se garante alguma autonomia aos sindicatos.

1.2.2. Ministério Público

Outra forma de atuação do Estado, no escopo de garantir a aplicação eficaz da Liberdade Sindical, é por meio do Ministério Público, mais especificamente, do MPT, o qual possui função de destaque nesse objetivo.

O papel do Ministério Público, no âmbito da liberdade sindical, é o de proteção e promoção. Para tanto, pode valer-se, por exemplo, de recomendações; de campanhas em prol da liberdade sindical; da realização de eventos, como congressos; de negociações ou mediações; da celebração de Termos de Ajustamento de Conduta; ou do ajuizamento de ações judiciais, principalmente, neste último caso, para combater práticas antissindicais.

Em virtude de uma atuação de destaque, o parquet brasileiro vem sendo cada vez mais reconhecido pela sociedade, o que se estende para o âmbito trabalhista e sindical. Tem sido cada vez mais frequente as interferências ministeriais em greves, eleições e até mesmo na organização sindical, desde que constatadas flagrantes irregularidades ou inconstitucionalidades. Conquanto o resultado prático, nesses casos, tenha sido bastante positivo para sociedade e para os trabalhadores, tem-se notado, também, uma série de insatisfações e insurgências, notadamente por parte daqueles que são prejudicados pela ação escorreita dessa instituição.

Nesse diapasão, é preciso aclarar, de início, que o MPT não pode, por exemplo, discricionariamente intervir na entidade sindical, passando a conduzir um processo eletivo ou elaborando um estatuto da forma como entender correta. Tais atividades são próprias do sindicato, garantidas a ele constitucionalmente no intuito de que seja livre para, no caso concreto, analisar a melhor forma de atuação, em favor da coletividade. E é melhor que assim o seja, caso contrário, restaria irreparavelmente prejudicado o exercício da associação, afinal cada situação específica exige uma atuação diferenciada; não se pode imaginar que um sindicato com 100 associados tenha o mesmo processo eleitoral de um com 100 mil associados, isso seria um contrassenso.

Em um cenário hipotético, no qual todos os sindicatos agem perfeitamente, de acordo com as determinações legais e segundo os primados constitucionais, bem como perseguindo unicamente o interesse da categoria que representa, não seria necessária qualquer interferência robusta do Ministério Público.

Ocorre que o mundo real é bem destoante do ideal, de forma que a necessidade impulsiona a realidade. Consoante já destacado, o modelo de tutela das relações sindicais no Brasil tem peculiaridades derivadas de sua formação que devem ser levadas em conta. O sindicalismo brasileiro, ao contrário do modelo europeu, desenvolveu-se no interior das estruturas montadas pelo Estado Corporativista nascido com a Revolução de 30, encontrando espaços para desenvolver, ao longo do tempo, uma ação legítima e representativa dos interesses dos trabalhadores que convive com práticas condenáveis de sindicatos voltados apenas para o gozo dos benefícios proporcionados pela estrutura sindical brasileira.[55]

A prática tem demonstrado que não são poucos os sindicatos completamente esfacelados, com estruturas precárias, ou que buscam muito mais atender a interesses privados do que propriamente a coletivos.

Nessas situações, é imprescindível que o Estado intervenha, mormente tendo em vista que a Constituição brasileira, na contramão das tendências internacionais, consagrou a Unicidade Sindical, permitindo a existência, em uma mesma base territorial, de apenas um sindicato representativo de uma dada categoria, a qual está necessariamente atrelada e vinculada a essa entidade. Tal fato induz que, se a representação não se der a contento, fica o trabalhador irremediavelmente prejudicado, sem qualquer outra entidade sindical à qual recorrer para a defesa de seus interesses. Daí a necessidade de o Poder Público garantir uma atuação minimamente razoável por parte dos sindicatos.

Não é admissível, assim, que a diretoria se perpetue no poder, que viole os primados democráticos, que gerencie mal as finanças do sindicato ou que busque benefícios próprios em detrimento dos interesses da coletividade. Tais práticas o Estado deve combater, em preservação do sindicato democrático, igualitário, correto e transparente; apenas assim será ele, efetivamente, livre, apto a defender os interesses da categoria.

Seria inviável, contudo, conceber que é papel do Ministério Público fiscalizar todos os sindicatos, analisando-os minunciosamente, a fim de averiguar se ali está ocorrendo alguma prática ilícita ou alguma violação constitucional que atente contra a Liberdade Sindical. Tal forma de atuação, além de impraticável, seria uma intervenção inconstitucional nas entidades, principalmente nos casos em que o sindicato seja integro e cumpra seu papel de maneira irrepreensível. A ação ministerial, em verdade, dar-se-á, no mais das vezes, mediante provocação.

Com efeito, se realmente está sendo tíbia ou ilícita a atuação do sindicato, é comum que tenha alguém ou alguma organização que perceba e se descontente com tal fato, levando-o ao crivo do MPT. Nessa circunstância, o Parquet, deve analisar o caso concreto para concluir quais medidas devem ser tomadas, estando certo de que, por vezes, será necessária uma intervenção mais intensa. Seria o caso, por exemplo, da anulação de uma eleição antidemocrática, com a condução ministerial de um novo pleito; da anulação de cláusulas inconstitucionais de um estatuto; da deposição de dirigentes sindicais corruptos; ou da anulação de um instrumento coletivo celebrado em claro desfavor dos trabalhadores ou em conluio fraudulento com os empregadores. Tal forma de atuação, destaque-se, deverá necessariamente receber o aval do Judiciário e será algo excepcional, que, todavia, não pode ser descartado.

Diante de medidas bruscas como essas, é comum a irresignação dos prejudicados, que costumam alegar violação ao primado da liberdade sindical, o qual, na verdade, foi violado por eles, e não pelo Estado, que busca, nesse caso, unicamente restaurar a verdadeira liberdade.

Saliente-se que a garantia da Liberdade Sindical não se presta ao acobertamento de vícios que maculem os mesmos valores que ela busca proteger: independência, eticidade, representatividade e legitimidade. Afinal, os sindicatos são sim autônomos, mas isso não quer dizer que sejam soberanos. Como dito, é preciso compatibilizar a liberdade sindical com os demais princípios e garantias fundamentais.

Exemplificativamente, cabe trazer à baila a Reclamação de nº 2734 oferecida, em 02/09/2009, à OIT pelas centrais sindicais brasileiras (CGTB, CUT, Força, UGT, Nova Central e CTB), juntamente com o MST, contra o Ministério Público do Trabalho, segundo a alegativa de violação às Convenções 98 e 154, com ofensas à liberdade sindical. Dentre as práticas supostamente reprováveis, estavam a anulação de termos de convenções coletivas, devassa nos sindicatos e, principalmente, a criação de barreiras para o recolhimento das contribuições sindicais. Na verdade, o objetivo primordial da mencionada reclamação relacionava-se à atuação de inúmeros procuradores do trabalho, que questionavam o desconto de contribuições assistenciais ou confederativas, previstos em instrumentos coletivos, em desfavor de trabalhadores não filiados ao sindicato. Sobre a denúncia, manifestou-se o Comitê de Liberdade Sindical, com base em precedentes da própria OIT, no sentido de que cada país pode, de acordo com seus costumes e sua legislação, permitir ou proibir que contribuições sindicais sejam descontadas de trabalhadores não associados a um sindicato, não sendo reconhecida qualquer agressão à liberdade sindical.[56]

O tema da contribuição assistencial será minunciosamente abordado no capítulo seguinte; cabe, contudo, assinalar, de logo, que a atuação dos membros do MPT foi e é legítima e válida, tendo o aval do Judiciário e, inclusive, da OIT. Curiosamente, à exceção da CUT, todas as centrais sindicais autoras da denúncia são radicalmente contrárias ao fim do imposto sindical, em oposição ao que preceitua a OIT, na Convenção de nº 87, instrumento que é reputado, pela própria Organização, como uma das oito convenções mais importantes até então criadas.

Do caso narrado, observa-se apenas uma das constantes irresignações por parte do sindicalismo brasileiro em face de uma atuação legítima e escorreita do Parquet trabalhista. Comportamento, em verdade, natural, visto que seus objetivos lucrativos são constantemente combatidos por esse importante órgão.

Portanto, dúvidas não restam acerca não só da possibilidade, mas da necessidade de atuação do Estado na entidade sindical, por meio do Ministério Público, no sentido de proteger e promover a Liberdade Sindical.

1.2.4. Judiciário

O papel do Judiciário, por sua vez, na consecução do importante fim de garantir a Liberdade Sindical é, certamente, o mais evidente. Na verdade, esse Poder estatal possui tão grande magnitude que é essencial para garantir o equilíbrio não só na seara sindical, mas em todos os âmbitos sociais.

O art. 5º, XXXV da Carta Magna assegura expressamente o livre acesso à Justiça, diante de lesão ou ameaça a Direito. No âmbito sindical não poderia ser diferente. Mostrando-se lesado ou ameaçado, poderá a entidade recorrer ao Poder Público para obter dele um provimento judicial a sanar a situação periclitante ou mesmo para reparar o prejuízo sofrido.

A atuação jurisdicional, no campo sindical, ganha curioso relevo em virtude da competência normativa da Justiça do Trabalho. Conforme estabelece o art. 114, §2º, da CF/88, é facultado aos atores sociais, de comum acordo, ajuizarem dissídio coletivo de natureza econômica, ficando a cargo do juízo trabalhista decidir o conflito. Note-se que o dispositivo em referência constitui mais uma limitação à liberdade sindical estabelecida pelo art. 8º, uma vez que, por meio dele, restringe-se a livre negociação entre as partes, transferindo ao Estado o poder de definir os rumos de um instrumento cuja essência, em tese, seria o acordo mútuo.

Demais disso, outro papel fundamental do Judiciário é o de equilibrar as ações dos demais poderes, ou aspectos, do Estado. Diante de uma atuação claramente açodada e desmotivada do Ministério Público, poder-se-á recorrer ao Judiciário para que este tome as devidas providências, de acordo com o caso concreto. Caso o Legislativo, por sua vez, aprove norma que fira expressamente o núcleo duro do primado da liberdade sindical, também caberá ao Judiciário, caso provocado, declarar a invalidade dessa Lei, ante as determinações legais ou constitucionais.

De igual forma, poderá, inclusive, a empresa socorrer-se do Judiciário para perquirir a correta aplicação da liberdade sindical. Seria o caso de eventuais abusos praticados por parte do sindicato, a exemplo de uma greve na qual os manifestantes realizam depredações ao patrimônio privado.

Nas situações levadas ao Estado Juiz, o magistrado deverá valer-se dos princípios interpretativos já elucidados, como os da proporcionalidade e da razoabilidade, resguardando, sempre, o núcleo essencial da liberdade sindical. Nesse aspecto, cabe fazer uma crítica a recorrentes julgados do Judiciário brasileiro: não raramente, diante de um dissídio coletivo de greve envolvendo atividade essencial, a exemplo dos transportes públicos, o magistrado tem acolhido o pleito autoral, para determinar a manutenção de todos, ou praticamente todos, os trabalhadores em serviço durante os horários de pico. É que o art. 11, da Lei de Greve (L. 7.783/89) prescreve que, nos serviços ou atividades essenciais, os sindicatos, os empregadores e os trabalhadores ficarão obrigados, de comum acordo, a garantir, durante o movimento paredista, a prestação dos serviços indispensáveis ao atendimento das necessidades inadiáveis da comunidade; como, no mais das vezes, não há o mencionado acordo, fica a cargo do juiz a determinação desse quantitativo mínimo. Não é razoável, todavia, que, com a pretensa finalidade de cumprir a determinação legal, todos os empregados grevistas sejam obrigados a trabalhar; tal medida retira integralmente os efeitos da greve e frustra os resultados pretendidos, anulando, por completo, o exercício desse direito, e, em última análise, ferindo o núcleo essencial da liberdade sindical. Melhor seria analisar cada situação concreta, encontrando patamar razoável que mantenha os efeitos da paralisação, sem, contudo, inviabilizar totalmente o gozo do transporte público pela população.

O magistrado trabalhista, diante de uma lide sindical, embora deva preocupar-se com a aplicação do direito positivo, deve, mais do que isso, atentar para a efetiva resolução do conflito. Frequentemente, chegam ao Judiciário brasileiro, além de questões envolvendo o direito de greve, diversas disputas eleitorais e de representação sindical. Nestes casos, não parece bastante que o juiz laboral simplesmente anule um sufrágio, sem determinar a condução lídima de um novo processo, ou julgue pela representação de um sindicato observando apenas os aspectos legalistas, sem, contudo, ater-se à verdadeira legitimidade que cada entidade possui perante os trabalhadores.

Por fim, cabe destacar a atuação do parquet, que poderá e deverá contar com a atuação jurisdicional, a fim de garantir a liberdade sindical. Em algumas situações, não será possível a atuação ministerial isoladamente, vez que o Ministério Público, conquanto seja considerado o guardião da lei, não é o responsável por aplicá-la ao caso concreto, prerrogativa essa do Poder Judiciário.

Destarte, caso, por exemplo, o MPT, exercendo seu poder investigativo, verifique a existência de situação insustentável em determinado sindicato, com desvio de valores, prática de ilícitos e de atos antidemocráticos, não poderá tomar qualquer atitude isoladamente, mas deverá requerer a intervenção pelo Poder Judiciário. Nessa circunstância, será cabível o ajuizamento de Ação Civil Pública, visando obter determinação judicial, para que, então, aja segundo as necessidades da ocasião.

Nesse diapasão, cabe mencionar a Ação Civil Pública ajuizada pelo Ministério Público do Trabalho da 17ª Região (0128600-41.2008.5.17.0008[57]), com a finalidade de combater uma série de irregularidades constatadas no âmbito do Sindicato dos Trabalhadores em Transportes Rodoviários do Estado do Espírito Santo – SINDIRODOVIÁRIOS/ES.

A peça de ingresso do MPT teve lastro e sustentáculo nos fatos investigados e apurados no Inquérito Civil 04/2007 e nos Procedimentos Preparatórios 02/2007 e 48/2008. A partir das perquirições realizadas pelo órgão ministerial revelou-se um manancial probatório significativo a demonstrar uma quantidade descomunal de ilicitudes no âmbito sindical, tais como: simulação de lide em favor dos advogados sindicais; abertura de contas bancárias clandestinas; irregularidades contábeis; irregularidades no recolhimento e pagamento de impostos; sonegação de impostos; suspeita da existência de "caixa dois"; malversação de verbas etc.

Requereu, então, o Parquet a condenação do sindicato em uma série de obrigações de fazer e de não fazer, com vistas a adequar a atuação da entidade às determinações legais e combater a persecução de objetivos escusos, direcionando a atividade unicamente ao proveito da categoria.

Em sede de contestação, o SINDIRODOVIÁRIOS sustentou que a pretensão autoral esbarraria na Constituição e no princípio da liberdade sindical, defendendo ser ilícita a intervenção estatal nas entidades sindicais.

Em primeira instância, o magistrado entendeu pela total improcedência dos pedidos, ao fundamento de ferirem exatamente a liberdade sindical e contratual. In verbis: “(…) Pois bem. Consoante se depreende da inicial, o autor formula pleitos que violam o princípio da liberdade sindical e o inciso I, do art. 8º, da Carta Magna de 1988, posto que, se atendidos implicariam na intervenção do Estado na gestão do sindicato e na organização sindical. São eles: (…) É fácil perceber que o autor, através da presente ação, pretende, em suma, sanar irregularidades de ordem administrativa, tributária e contábil do sindicato-réu com o escopo de evitar que o mesmo possa experimentar prejuízos financeiros maiores do que aqueles apurados em inquéritos civis. Ora, o objeto da presente demanda, diz respeito à gestão do próprio sindicato. (…)”.

Inconformado com a decisão de primeira instância, o MPT interpôs Recurso Ordinário, levando a matéria à apreciação do TRT-17ª Região. O recurso foi parcialmente provido, tendo o tribunal modificado substancialmente o entendimento contido na sentença vergastada. Daí a importância do julgado: ter apreciado diversos pontos que, em uma leitura inicial, poderiam significar violação à liberdade sindical, mas que, em análise mais detida, significou exatamente o oposto, a garantia a esse princípio, em completa sintonia com o objeto deste Trabalho.

Assim se manifestou o TRT sobre a generalidade de pedidos do Parquet trabalhista e a suposta violação ao primado da liberdade sindical: “(…) De todo o exposto, percebe-se que o referido princípio possui caráter instrumental, destinando-se a preservar os interesses não somente da pessoa do sindicato, mas principalmente da categoria, contra a interferência indevida de terceiros, especialmente do Estado. Com efeito, a liberdade sindical não é ilimitada, a ponto de tornar o sindicato soberano, isento de qualquer controle e fiscalização, sob pena de desvirtuar o instituto e acabar prejudicando o fim último do sindicato, que é a defesa da categoria. Assim, não fere a liberdade sindical a exigência de que a entidade se submeta às determinações legais, impostas legitimamente pelo Estado, através dos representantes eleitos pelo povo, conforme esclarece o art. 1º da Convenção 135, da OIT, promulgada pelo Decreto 131/1991: (…) Assim, não há qualquer contradição entre a liberdade sindical e a submissão da entidade às regras impostas pelo legislador, como por exemplo, aquelas que versem sobre obrigações contábeis, recolhimentos fiscais, previdenciários e preservação da democracia interna. Permanece incólume a possibilidade de controle judicial para sanar eventuais desvios na atuação do sindicato, até porque o art. 5º, XXXV, da CF, assegura a inafastabilidade da jurisdição. (…) A gestão do sindicato, enquanto ente coletivo, deve ser pautada pela mais lídima transparência e seus dirigentes devem ter uma atuação acima de qualquer suspeita. Enquanto gestores de coisa alheia, não podem dispor do patrimônio da entidade como se fosse seu, razão por que todas as despesas devem ser sobejamente comprovadas, todos os tributos efetivamente recolhidos e toda ação fundada no interesse maior da categoria”.

Note-se que, no caso, o princípio da liberdade sindical foi posto em lados opostos, segundo argumentos e interpretações diversos, de forma que o mesmo fundamento foi utilizado para se chegar a conclusões diametralmente divergentes.

Diante da situação, analisando-se unicamente os fundamentos acima transcritos, entende-se que foi bem o Tribunal Regional ao reconhecer a possibilidade de intervenção no sindicato em face das flagrantes irregularidades e ilicitudes cometidas, de acordo com a tese defendida neste trabalho monográfico.

Bem por isso, José Cláudio Monteiro de Brito Filho[58], ao discorrer sobre a liberdade sindical, observa, com propriedade, que: “(…) tal não significa permitir que as organizações sindicais e empresas simplesmente pairem acima do ordenamento jurídico e dos outros grupos, mas garantir que eles possam se organizar com liberdade, bem como possam, entre si e, claro, sem ferir direitos de terceiros ou violar o interesse público, solucionar os seus conflitos”.

Como se observa, é fulcral a atuação do Poder Judiciário na real consecução da liberdade sindical. Em verdade, até o presente momento, em todo o discorrer da matéria, apresentou-se pontualmente ações do Estado-Juiz exatamente nesse sentido.

A grande questão é até que ponto pode e deve ir a ação do Judiciário para que ele realmente garanta a liberdade sindical, sem interferir demasiadamente na autonomia das entidades, ou seja, qual a medida da ponderação na atuação jurisdicional junto aos sindicatos? Indubitável que esse questionamento não pode nem jamais poderá ser respondido em abstrato, independentemente dos esforços doutrinários em estabelecer parâmetros razoáveis para tanto. Por essa razão uma análise eficiente do papel jurisdicional nesse escopo apenas poderá se realizar a partir da análise de casos concretos, verdadeiramente apreciadas pelo Judiciário.

Fica, então, a ressalva de que a análise deste tópico se propaga por toda a extensão do presente trabalho, encontrando sua oclusão no capítulo seguinte, em que serão abordadas e analisadas situações que se entende serem mais polêmicas acerca do assunto.

2. A atuação do estado em prol da liberdade sindical: o custeio, a democracia e a representatividade.

O presente capítulo tem por escopo apreciar o entendimento jurisprudencial, suas divergências e suas repercussões no que tange ao custeio e à democracia interna das entidades; temas diretamente relacionados com a representatividade sindical, que também será objeto de breves comentários.

O custeio, a democracia e a representatividade constituem o tripé que garante sustentáculo a um sindicato verdadeiramente combativo, atuante e efetivo. Exatamente por essa razão, o papel do Estado tem sido notável nesses aspectos, a fim de garantir a aplicação da liberdade sindical, em consonância com os demais primados constitucionais, o que acaba por gerar inúmeras insurgências vindas de diversas partes. Daí a importância da presente análise para o alcance do objetivo primordial deste trabalho.

2.1. O custeio das entidades sindicais e a atuação do Estado diante da exigibilidade contributiva em face de não associados.

O primeiro tema a ser abordado trata-se dos meios pelos quais o sindicato está habilitado a custear suas atividades. Dar-se-á especial ênfase à contribuição confederativa e, principalmente, à assistencial, mormente no que tange ao imbróglio envolvendo sua exigibilidade em face de não associados, tendo em vista a evidente intercessão da matéria com a atuação do Estado em prol da liberdade sindical.

Diante da livre organização dos sindicatos, tem-se que, atualmente, os meios de custeio da entidade são diversos, e não taxativos, não se limitando às hipóteses arroladas pelo art. 548, da CLT. Nada obstante, a prática tem demonstrado a prevalência de quatro espécies contributivas: a contribuição social; a contribuição sindical; a contribuição confederativa; e a contribuição assistencial.

A primeira, e clássica, espécie de custeio do sindicato é a contribuição social, também conhecida como mensalidade sindical, por meio da qual é estabelecida, em assembleia, quantidade fixa a ser paga por cada associado, a fim de manter as atividades da entidade. Na CLT, ela encontra previsão no art. 548, b, mas, na verdade, constitui-se como corolário lógico do direito positivo de associação ou de filiação, independendo, portanto, de previsão legal.

Essa deveria ser a principal fonte de custeio dos sindicatos – como o é na maior parte do mundo –, o que implicaria a necessidade de se aumentar o número de associados com a finalidade de elevar a renda da entidade, provocando campanhas de filiação e uma atuação necessariamente convincente.

No Brasil, porém, em virtude do modelo contraditório que foi adotado, a contribuição mais influente tem perfil totalmente oposto ao da mensalidade sindical. Trata-se da contribuição sindical[59], cobrada compulsoriamente de trabalhadores e empregadores, independentemente da sua condição de associados ou não. Com natureza evidentemente de tributo, visto que perfeitamente enquadrada no art. 3º, do CTN[60], essa espécie contributiva se destina ao custeio de todo o sistema confederativo, sendo repartida entre sindicato, federação e confederação, com previsão de destinação, atualmente, também às centrais sindicais, por força da Lei 11.648/08.

A criação da contribuição sindical remonta, como já adiantado no primeiro capítulo deste trabalho, ao período corporativista, de controle dos sindicatos pelo Estado. Por isso mesmo, a OIT, em seu verbete de nº 321 asseverou que o estabelecimento de contribuição imposta por lei contraria o princípio da liberdade sindical. In verbis: “Conviene distinguir entre cláusulas de seguridad sindical permitidas por la ley y las impuestas por la ley, dado que unicamente estas últimas tienen como resultado um sistema de monopólio sindical contrario a los princípios de libertad sindical”. [61]

Essa notória restrição à liberdade sindical apenas está autorizada, porque encontra expressa previsão na própria Carta Magna, em seu art. 8º, IV, in fine, constituindo-se em uma espécie de limite constitucional, na esteira do que foi abordado pelo capítulo segundo deste trabalho. Dada a relevância do dispositivo, cumpre que se transcreva o seu teor: “Art. 8º, IV: a assembleia geral fixará a contribuição que, em se tratando de categoria profissional, será descontada em folha, para custeio do sistema confederativo da representação sindical respectiva, independentemente da contribuição prevista em lei”.

A possibilidade de cobrança da contribuição sindical extrai-se da seguinte assertiva: “independentemente da contribuição prevista em lei”. A norma instituidora do “imposto” sindical, a que se refere o texto constitucional, trata-se dos arts. 579 a 591, da CLT, o que se coaduna com a noção de que a Constituição não cria tributo, mas apenas autoriza a sua criação, realizada necessariamente por lei.

O mesmo dispositivo constitucional acima transcrito (art. 8º, IV), na sua parte inicial, prevê a terceira espécie de custeio das entidades, a contribuição confederativa. Esta, assim como a contribuição sindical, tem o objetivo de custear o sistema confederativo de representação sindical, sendo descontado, igualmente, na folha salarial do empregado. A distinção essencial entre as duas categorias de custeio é que a confederativa não é instituída por lei, mas deliberada em assembleia geral.

Nos primeiros anos após a promulgação da Carta de 1988, diversas entidades sindicais trataram de instituir essa contribuição, estabelecendo quantia a ser cobrada de todos os trabalhadores da categoria, o que, no mais das vezes, era feito em valores bem elevados[62]. Os sindicatos interpretavam, portanto, o dispositivo constitucional de forma literal, entendendo que todos estariam submetidos à referida contribuição, fossem filiados ou não. Essa conclusão é, todavia, notoriamente equivocada.

Conforme se extrai do texto constitucional, a contribuição confederativa é estabelecida em assembleia, não encontrando previsão em lei; ou seja, não pode ser considerado tributo, a exemplo do “imposto” sindical. Portanto, sendo uma colaboração definida pelos filiados do sindicato, em assembleia da qual apenas eles participaram e apenas eles puderam emitir declaração de vontade, imperioso reconhecer que apenas eles mesmos, os filiados, estariam vinculados à determinação de contribuir, assemelhando-se essa espécie à mensalidade sindical.

Admitir a cobrança compulsória de uma contribuição definida por assembleia em face de trabalhadores não filiados, que não possuem vínculo jurídico com a entidade, seria estabelecer natureza de tributo a essa espécie contributiva, já que este é o único meio pelo qual se pode exigir o aporte financeiro em face de uma generalidade de pessoas sem vínculo associativo. Tal conclusão, todavia, é flagrantemente inconstitucional, uma vez que se estaria atribuindo competência tributária a uma associação privada, o que ofende toda a Ordem Constitucional Tributária e, especialmente, o art. 149[63], da CF/88. Demais disso, esse mesmo entendimento, caso aceito, vilipendiaria o princípio da legalidade, segundo o qual ninguém é obrigado a fazer ou deixar de fazer algo, senão em virtude de lei (art. 5º, II, da CF/88), bem como a liberdade de filiação (art. 8º, V, da CF/88), já que todos estariam suportando o ônus de serem sócios de uma entidade, sem que tivessem manifestado vontade para tanto.

A principal reação em face das cobranças inconstitucionais alhures relatadas partiu do Judiciário, principalmente do STF, cujo informativo de nº 12, de 1996, demonstra bem o posicionamento da Corte.

“A contribuição confederativa prevista no art. 8º, IV, da CF/88, distingue-se da contribuição sindical por não possuir natureza tributária (art. 149 da CF) e, portanto, não tem caráter compulsório para os trabalhadores não filiados ao sindicato. Com base nesse entendimento, a turma não conheceu de recursos extraordinários interpostos por diversos sindicatos que pretendiam cobrar a referida contribuição confederativa de todos os membros das respectivas categorias (Ac. RE-198.002. RE-170.439 e EW-193-972, Boletim Informativo do STF n. 12, de 26 a 30 de agosto de 1996; DJ de 4.9.96)”.[64]

Pacificando o entendimento sobre a matéria, foi, posteriormente, editada, pelo STF, a súmula de número 666[65] (posteriormente convertida na súmula vinculante nº 40), que, empós, inspiraria o Precedente de nº 119 do TST.

Note-se que o Supremo, legitimamente provocado, atuou como representante do Estado, de forma a adequar a liberdade sindical de instituir contribuições aos primados constitucionais, sem os quais não se pode falar em verdadeira liberdade, mas apenas em subversão da ordem pública.

Em que pese a evidência dos argumentos acima delineados, bem como a pacificação do assunto pela Corte Suprema, alguns doutrinadores continuaram e continuam a sustentar que a contribuição confederativa deveria ser cobrada de todos os integrantes da categoria, segundo o argumento de que a norma constitucional previu o desconto direto na folha de salário dos empregados, não estabelecendo distinção se filiados ou não. Defendendo esse posicionamento, Amauri Mascaro Nascimento[66]:

“Minha opinião é que a jurisprudência restringiu a incidência das contribuições para defender os não filiados dos sindicatos de cobranças em valores elevados. A procuradoria da Justiça do Trabalho teve de interferir, propondo perante os Tribunais, a anulação de cláusulas, de convenções coletivas, pactuadas entre os dois sindicatos, o profissional e o patronal, aprovadas em assembleias inexpressivas com baixo comparecimento de votantes. Mas, a rigor, a lei permite o desconto da contribuição confederativa dos salários. A contribuição tem por finalidade o custeio do sistema confederativo. Esse sistema abrange toda a categoria e não apenas os sócios do sindicato. Portanto, tendo em vista a sua finalidade, é uma contribuição devida por todo membro da categoria integrante do sistema confederativo, e não apenas dos sócios. É uma interpretação que a lei permite ao declarar: “… será descontada em folha, para custeio do sistema confederativo da representação sindical respectiva…”

Corroborando a tese de Mascaro, assim preleciona Arnaldo Sussekind[67]:

“Data vênia, não comungamos com esse entendimento, que desestimula a filiação ao sindicato daqueles que não precisam contribuir para serem beneficiados pela ação coletiva sindical. O mesmo art. 8º, que assegura a liberdade de filiação sindical (inciso V), estabelece a representação unitária da categoria (inciso II) e autoriza a instituição da contribuição confederativa com descontos em folha dos integrantes da categoria profissional (inciso IV), isto é, dos trabalhadores filiados ou não ao respectivo sindicato”.

Com o devido respeito à concepção dos eméritos juristas, entende-se, aqui, que agiram corretamente tanto o STF, quanto o TST, ao editarem as respectivas súmulas. O direito é, sabidamente, um sistema, não podendo um dispositivo ser aplicado de forma ilhada, sem se compatibilizar com as demais normas constitucionais. Interpretar literalmente o art. 8º, IV, da CF/88, sem incluir ali, implicitamente, a restrição de cobrança apenas em face dos membros do sindicato, seria autorizar entidade privada a instituir tributo na modalidade contribuição, enquanto o art. 149 do Texto Maior dispõe que essa é uma competência exclusiva da União. Ao mesmo tempo, estar-se-ia malferindo o princípio da legalidade e anulando, por completo, a liberdade de filiação sindical.

Com efeito, na esteira do que defende Cláudio Monteiro de Brito Filho[68], a liberdade sindical individual (liberdade de filiação) engloba, necessariamente, a liberdade de não colaboração no que se refere às contribuições instituídas por deliberação interna das entidades sindicais, sob pena de se perder praticamente toda a eficácia da norma constitucional.

A permanente discussão doutrinária acerca da cobrança de contribuição confederativa dos não associados, obviamente, alcançou o Poder Judiciário, dando azo a decisões contraditórias ao entendimento firmado. Diante disso, o STF foi levado a editar súmula vinculante, impedindo, de maneira imperiosa, que atos contrários ao preceito sejam praticados, visando à segurança jurídica necessária em um Estado de Direito.

O debate e a conversão, por unanimidade, do enunciado 666 na súmula vinculante 40 ocorreu em 11/03/2015, ocasião em que vários dos argumentos aqui delineados foram expostos e adotados, na manutenção do entendimento já pacificado da corte[69].

Por fim, a última forma de custeio das entidades a ser abordada no presente tópico trata-se da contribuição assistencial. Essa espécie recebe também outras alcunhas, tais como desconto assistencial, taxa de fortalecimento sindical ou taxa assistencial, sendo cobrada, normalmente, para custear as despesas de campanha das entidades sindicais, após o estabelecimento de convenções e acordos coletivos de trabalho ou até de sentenças normativas.

Não existe amparo legal para a efetiva cobrança dessa espécie de custeio; isso, todavia, não é um óbice, haja vista a mencionada liberdade que as entidades possuem para criar, via assembleia, novas contribuições. Sua natureza, portanto, na linha do que pontifica Sérgio Pinto Martins[70], é de desconto convencional. A conclusão lógica, em virtude da origem e da natureza da taxa assistencial, é que sua cobrança apenas poderá se dar em face de associados, os quais verdadeiramente emitiram ou puderam emitir vontade na instituição da contribuição, nos mesmos termos do que já restou explanado.

Malgrado a coerência da conclusão a que se chegou, a questão da exigibilidade da contribuição assistencial ainda é tema polêmico e objeto de acirradas divergências, inclusive jurisprudenciais. As entidades defendem que toda a categoria estaria submetida à cobrança da mencionada contribuição quando estabelecida em convenção coletiva, tendo em vista que o sindicato é representante de todos os trabalhadores, sendo todos eles beneficiados pela celebração do instrumento coletivo. Esse posicionamento – que se refere tanto à contribuição assistencial, quanto à confederativa – tem reflexo nas previsões coletivas, de forma que diversos sindicatos mantêm cláusulas exigindo-as de todos os trabalhadores, o que motiva centenas de ações anulatórias propostas pelo Ministério Público do Trabalho, todos os anos.

Os sindicatos apontam violação à liberdade sindical por parte do MPT, acusando o órgão de interferir na liberdade que as entidades possuem de instituir contribuições. Com esse argumento foi oferecida Reclamação à OIT, que tombou sob o nº 2734, conforme adiantado no segundo capítulo deste Trabalho. Sobre o tema, a Organização Internacional se manifestou no sentido de que cada país pode, de acordo com seus costumes e sua legislação, permitir ou proibir que contribuições sindicais sejam descontadas de trabalhadores não associados a um sindicato, não sendo reconhecida qualquer agressão à liberdade sindical. É o que se extrai do verbete de nº 322 da OIT: “La admisibilidad de las cláusulas de seguridade sindical em virtude de convenciones colectivas, fueron dejadas a la elección de los Estados ratificantes, según so desprende de los trabajos preparatórios del Convenio núm. 98”.[71]

Não há, portanto, qualquer violação à liberdade sindical por parte do órgão ministerial. O que ocorre, em verdade, é uma atuação do MPT em prol de uma efetiva liberdade sindical, tendo em vista que a instauração da contribuição assistencial em face de não associados fere frontalmente a liberdade individual, que faculta ao trabalhador filiar-se ou não ao sindicato. Além disso, esse tão importante princípio sindical deve, consoante exaustivamente abordado, compatibilizar-se com os demais primados constitucionais, o que não ocorre na hipótese vergastada, por expressa ofensa ao comando da legalidade.

O entendimento aqui defendido é amparado pelo Tribunal Superior do Trabalho, conforme se depreende do Precedente Normativo 119:
“A Constituição da República, em seus arts. 5º, XX e 8º, V, assegura o direito de livre associação e sindicalização. É ofensiva a essa modalidade de liberdade cláusula constante de acordo, convenção coletiva ou sentença normativa estabelecendo contribuição em favor de entidade sindical a título de taxa para custeio do sistema confederativo, assistencial, revigoramento ou fortalecimento sindical e outras da mesma espécie, obrigando trabalhadores não sindicalizados. Sendo nulas as estipulações que inobservem tal restrição, tornam-se passíveis de devolução os valores irregularmente descontados”.[72]

Nesse mesmo sentido é a OJ 17, do TST:

“As cláusulas coletivas que estabeleçam contribuição em favor de entidade sindical, a qualquer título, obrigando trabalhadores não sindicalizados, são ofensivas ao direito de livre associação e sindicalização, constitucionalmente assegurado, e, portanto, nulas, sendo passíveis de devolução, por via própria, os respectivos valores eventualmente descontados”.[73]

Em pese a hodierna vigência do PN 119, bem como da OJ 17 acima transcritos, a polêmica acerca do tema continua atual, inclusive dentro do próprio TST. Note-se que, em 25/08/2014, houve nova discussão, no âmbito do Tribunal Superior, acerca da manutenção ou não do precedente e da orientação jurisprudencial. Na ocasião, foi posta em votação proposta de alteração na redação do PN e o cancelamento da OJ, o que foi aceito por 12 votos, contra 11 contrários; o Regimento Interno do TST, porém, exige, para aprovação, revisão ou cancelamento de súmula ou de precedente normativo, a aprovação da maioria absoluta, ou seja, 14 votos. Por esse motivo, embora houvesse maioria a favor da mudança, o Pleno declarou a manutenção da redação atual do PN 119 e a vigência da OJ 17.[74]

O texto encaminhado à Comissão de Jurisprudência, subscrito por 14 dos 27 ministros do TST (atualmente 26, pois uma vaga aguarda nomeação), propunha que a redação do PN 119 fosse alterada para prever a extensão da contribuição sindical a não associados mediante acordo coletivo, tendo o trabalhador 20 dias para manifestar formalmente sua recusa. Quanto à OJ 17, a proposta era o cancelamento.[75]

Na mesma direção da proposta de alguns ministros do TST, o ministro de Estado do Trabalho e Emprego, em 24 de março de 2009, editou a Ordem de Serviço n. 1, “legislando” a respeito da matéria e afirmando, ao arrepio do PN 119, ser possível a cobrança da contribuição assistencial, desde que, instituída em assembleia geral, esteja prevista em contrato coletivo e seja garantido ao trabalhador não sindicalizado o direito de oposição, que deve ser exercido em 10 dias. A iniciativa do MTE, na ocasião, padece de flagrante ilegalidade e inconstitucionalidade, sendo uma ofensa à ordem pública e um desrespeito aos entendimentos sumulados do TST e do STF. Sobre o tema, interessante transcrever o posicionamento de Cláudio Monteiro de Brito Filho[76].

“Embora a ordem de serviço somente gere efeitos para a fiscalização do trabalho, é completamente inconstitucional e ilegal, e dá mostras claras do que tem sido o comportamento da administração pública federal nos últimos tempos em matéria sindical, que é simplesmente ignorar as normas jurídicas e as decisões judiciais a respeito”.

O principal argumento das centrais e dos sindicatos que defendem a extensão da referida cobrança a todos os trabalhadores da categoria é o de que as vantagens conquistadas beneficiam a todos, não sendo lícito gozar desses direitos e procurar escusar-se do cumprimento das obrigações. Defendem que considerar que os não filiados não devem sofrer o desconto seria o mesmo que incitá-los a não se filiar sob a vantagem de não arcarem com o débito.

Ocorre que essa suposta “justiça” não é bastante para autorizar que um sindicato exija o pagamento de uma contribuição instituída internamente em face daqueles que não possuem com ele qualquer vínculo jurídico. Essa hipótese, por certo, atingiria frontalmente o Estado Democrático de Direito, sustentado pelo princípio da legalidade, assim como ofenderia a liberdade sindical individual.

A justificativa de alguns doutrinadores, dentre os quais Arnaldo Süssekind, para contornar os empecilhos acima destacados, é a de que o desconto assistencial, operado em face de não associados, seria, na verdade, uma doação tácita, não havendo malferimento ao princípio da liberdade sindical ou da legalidade, já que os trabalhadores teriam concordado “voluntariamente” com aquela contribuição. Para Süssekind[77]:

“A circunstância de o empregado permitir, ainda que por consentimento tácito, que a precitada taxa seja descontada do seu salário não gera vínculo associativo de que cogitam as disposições constitucionais citadas. O fundamento para a exclusão da cláusula do desconto assistencial, alcançando tanto os sindicalizados como os não filiados ao sindicato, poderia ser o fato de todos os componentes da categoria já pagarem a contribuição sindical anual, mediante desconto obrigatório nos salários. Conceituado, porém, como doação consentida, com efetiva publicidade no sentido de que qualquer empregado a ela pode se opor, não vemos como sustentar a bitributação”.

Com todo o respeito ao entendimento desse insigne doutrinador, o argumento de que a contribuição assistencial teria natureza de doação tácita padece de clara incongruência. É que um ramo do direito não é competente para alterar os institutos próprios de outro ramo, de forma que, no caso da doação, ela já se encontra regulamentada pelo Direito Civil, inexistindo, nesta disciplina, a figura da doação tácita. De acordo com o Código Civil, em seu art. 538, “considera-se doação o contrato em que uma pessoa, por liberalidade, transfere do seu patrimônio bens ou vantagens para o de outra”. Veja-se que a figura da “liberalidade” de forma alguma pode se compatibilizar com a ideia de consentimento implícito ou tácito. Cogitar essa tese seria, na verdade, kafikiano, pois permitiria a existência de inúmeras situações nas quais um indivíduo, detentor apenas da posse de certo objeto, e movido de má fé, poderia opor a outro a aplicação do instituto, sem que tivesse o proprietário a verdadeira intenção de doar o bem em questão. Preocupado exatamente com essa situação, o Legislador (no art. 541, do CC[78]) atribuiu à doação a característica da formalidade, exigindo, para que se perfectibilize, a existência de escritura pública ou instrumento particular, aceita excepcionalmente a doação verbal, mas nunca de forma tácita.

Destarte, descartada a hipótese de doação tácita, bem como inviável se cogitar da natureza de tributo, por ausência dos requisitos legais, imperioso reconhecer que a contribuição assistencial é necessariamente um desconto convencional, conforme exposto por Pinto Martins, incidindo tão somente sobre a remuneração dos filiados ao sindicato. Evidentemente, caso um trabalhador não sindicalizado deseje contribuir para a entidade, poderá fazê-lo, revestindo-se a hipótese em efetiva doação, que deve necessariamente ser expressa, com iniciativa voluntária do trabalhador, sendo vedado supor que ele acatou o desconto sem que categoricamente o tenha feito.

Conclui-se, então, que a única espécie contributiva que permite a cobrança compulsória de todos os trabalhadores da categoria é a contribuição sindical, por expressa previsão constitucional e regulamentação em lei. Todas as demais devem, indispensavelmente, observar o expresso consentimento do trabalhador não filiado.

Na verdade, como mencionado, a contribuição sindical constitui um limite constitucional ao direito fundamental de liberdade sindical. Qualquer outra limitação que não encontre amparo no Texto Maior será flagrantemente inconstitucional.

Antes, porém, de pôr fim à questão, vale destacar que ela vai além do plano constitucional. As centrais sindicais e os diversos sindicatos, acompanhados de suas respectivas federações e confederações, exercem incessante lobby no escopo de modificar o correto entendimento do Tribunal Superior do Trabalho atualmente vigente. Isso porque, em face da carência de associados, a maioria esmagadora da receita dos sindicatos é obtida de forma compulsória, seja pela legítima cobrança da contribuição sindical, seja pelas demais formas eivadas de inconstitucionalidade.

Ocorre que ceder às pressões externas e reconhecer a legitimidade da cobrança da contribuição assistencial a não associados seria retroceder no avanço do Direito Sindical no país, pois isso apenas colaboraria, ainda mais, com a desnecessidade de as entidades angariarem novos filiados, tornando dispensável uma atuação convincente e produtiva. Não só desnecessária, a filiação, nesse caso, poderia ser desestimulada, pois se mostraria muito mais vantajoso ao sindicato possuir um quadro reduzido de associados, os quais representariam pouca ou nenhuma oposição à cúpula sindical.

Afetada a participação dos trabalhadores diretamente junto ao sindicato, fica, também, prejudicada a representatividade da entidade, que poderá deixar de transmitir a verdadeira vontade dos obreiros, conforme será abordado especificamente no terceiro tópico deste capítulo.

2.2. O Estado e a democracia no interior do sindicato.

A segunda parte deste trabalho se destina a tratar da atuação do Estado em face da democracia interna dos sindicatos, sem a qual não se pode falar em efetiva liberdade sindical. Isso porque não é possível que uma entidade se proclame verdadeiramente livre se seus dirigentes se perpetuam no poder; se os pleitos eleitorais são fraudulentos ou injustos; ou se os trabalhadores não possuem oportunidade para manifestarem suas insatisfações. Enfim, não existe verdadeira liberdade sindical, se não houver efetiva democracia.

A democracia, no âmbito das entidades sindicais, advém diretamente da Constituição Federal, bem como das diversas convenções internacionais da OIT, senão da própria Constituição deste organismo internacional, de que o Brasil é membro fundador. Assim, nenhuma lei ou estatuto sindical pode dispor ofensivamente à democracia ou à limitação da representação da categoria.

José Carlos Arouca defende que, nas eleições sindicais, devem ser seguidos dois princípios: democracia interna e razoabilidade. Segundo o autor:

“Democracia interna implica a igualdade de oportunidades, não podendo o regimento obstaculizar o direito de votar e de ser votado, a previsão de uma instancia recursal também coletiva, independente e neutra, a garantia de transparência da convocação das eleições e dos procedimentos a serem adotados, a possibilidade de efetiva fiscalização de lisura na coleta de votos e de sua apuração”.[79]

Com efeito, não há de se admitir que, dentro de um Estado Democrático de Direito, permita-se que a principal unidade de democracia social (os sindicatos) viole exatamente os princípios democráticos. Dentre esses primados, cabe destacar: a eleição pelos próprios representados; a liberdade na escolha dos dirigentes; a livre concorrência e a igualdade entre os que pretendam se submeter ao sufrágio; a eticidade no processo eletivo e no exercício da função; os mandatos dos dirigentes, sem a perpetuação no poder; e a sucessão entre representantes do sindicato, a fim de assegurar o rodízio nas instâncias da direção da entidade.[80]

A escolha dos dirigentes pela própria categoria é uma das máximas da democracia sindical, reconhecida pela OIT no art. 3º[81] da Convenção de nº 87. Esse entendimento encontra-se também consubstanciado no verbete 416 do Comitê de Liberdade Sindical, in verbis:

“La libertad sindical implica el derecho de los trabajadores y de los empleadores a elegir libremente a sus representantes y a organizar su administración y atividades sin injerencia alguna de las autoridades públicas”.[82]

De fato, o processo eleitoral, no âmbito das entidades sindicais, apenas poderá ser tido como verdadeiramente democrático se for efetivamente livre, sem qualquer interferência externa, inclusive do poder público. Negar a capacidade de cada sindicato realizar seu próprio pleito seria rechaçar a própria liberdade sindical.

Apesar disso, a mesma OIT prevê a possibilidade de limitações ao exercício dos direitos enunciados no art. 3º da Convenção de nº 87, desde que o objetivo seja assegurar o respeito às regras democráticas do movimento sindical. É o que se observa do verbete nº 463, a seguir transcrito:

“Las únicas limitaciones a los derechos enunciados en el artículo 3 del Convenio núm. 87 que eventualmente se podrían admitir, deberían circunscribirse a assegurar el respeto de las reglas democráticas em el movimento sindical”.[83]

Tem-se, destarte, como imprescindível que cada categoria conduza seu próprio processo eleitoral, em homenagem ao princípio da liberdade sindical. Nada obstante, por outro lado, é evidente que as ofensas a direitos e garantias constitucionais, inclusive em eleições sindicais, podem e devem ser submetidas ao controle judicial, em processo público, afinal nenhuma ameaça ou lesão a direito está infensa à apreciação pelo Poder Judiciário. Nessa seara, o julgamento deve limitar-se ao controle da legalidade e dos princípios constitucionais de liberdade e democracia sindical, de forma a propiciar meios de assegurar a vontade da categoria nas eleições.

Ao receber eventual ação judicial, a respeito de processos eleitorais internos, o magistrado deve agir com o máximo de autocontrole, para não causar prejuízo aos princípios da democracia sindical. A função jurisdicional não pode romper os propósitos constitucionais e internacionais do sindicalismo. Portanto, seu papel principal é o de assegurar as cláusulas magnas referentes às liberdades sindicais, garantindo que a vontade da categoria, na escolha de seus dirigentes seja promovida e respeitada. Este, pois, é o marco que delimita a atuação do Judiciário, e que, de outro lado, impõe às entidades o dever de respeitar o Estado Democrático de Direito e as liberdades da categoria, cujos interesses podem estar na iminência de serem violados pelo próprio sindicato.

Nesses casos, não há, pois, que se questionar de violação à liberdade sindical pelo Poder Judiciário. O direito de autogestão que possui o sindicato não pode ferir o direito fundamental que têm os integrantes da categoria de participarem da vida sindical democrática, de opinarem sobre os acordos firmados com a classe patronal, de votarem e serem votados para a resolução democrática dos conflitos intra-sindicais. Aliás, a autogestão do sindicato somente se realiza quando esses direitos são respeitados. Do contrário, o que se tem é arbitrariedade, desvio da finalidade sindical e abuso do direito de gestão pelos que temporariamente capitaneiam a diretoria.

2.3. Representatividade sindical

A representatividade sindical, como se observa, constitui o cerne de praticamente todas as questões polêmicas envolvendo o Direito Sindical. O objetivo deste tópico é demonstrar a intercessão do presente tema com os dois antecedentes e com todo o fundamento deste trabalho, de modo a configurar a representatividade como o pilar central que garante sustentação ao sindicato.

O art. 8º, III[84], da CF/88, garante à entidade a função de representar toda a categoria profissional em dada base territorial. Portanto, para atuar em substituição aos trabalhadores, o sindicato não precisa de autorização expressa, de assembleia homologatória ou de qualquer outro meio que ateste o conformismo dos empregados representados; basta que a entidade tenha sido regularmente criada e registrada no MTE, de acordo com os requisitos legais. Evidentemente, em certas situações, faz-se necessária a realização de assembleia geral, com a finalidade de ouvir os anseios dos trabalhadores, para que seja, por exemplo, deflagrada uma greve ou celebrado um instrumento coletivo; isso não significa, contudo, que o poder de representação do sindicato está condicionado à realização das referidas assembleias, mas apenas que, em situações específicas, é fundamental contar com o suposto aval dos empregados, para garantir legitimidade a uma importante decisão.

Note-se, portanto, que é ínsito ao sindicato o exercício da função de representação; devendo, para tanto, ser observados critérios de ordem unicamente legal. Tais critérios, todavia, mesmo obedecidos, não implicarão efetiva representatividade.

A representatividade sindical, diferentemente da representação, não se trata de uma incumbência do sindicato, mas de um atributo conferido pelos próprios trabalhadores, sendo dotada de extrema subjetividade, razão pela qual é incapaz de ser prevista por lei. Ela constitui-se, em verdade, como uma legitimação conferida à entidade para verdadeiramente representar os interesses da classe, o que exige, em princípio, a confiança dos trabalhadores. Tal credibilidade deve ser adquirida com a aproximação do sindicato às suas bases de representação, fazendo dele o porta-voz da categoria[85].

Exatamente por essa razão, destaca Amauri Mascaro Nascimento[86] que “o sindicato pode ter o vínculo formal de representação, mas, na prática, não representar efetivamente os interesses da categoria, furtando-se da representatividade”.

Nesse viés, a representatividade configura uma conquista, que deságua em uma atuação eficaz do sindicato em prol da base representada. É o que preleciona Marcus de Oliveira Kaufmann[87]:

“Por essa razão é que é comum se sustentar, com fundamento, que a representação sindical, por ser uma questão de forma e de legalidade, se adquire, mas que a representatividade sindical, por ser uma questão de matéria e de legitimidade, se conquista, assim como em modelos de pluralidade e de concorrência sindicais, dado sindicato, eventualmente, conquista a qualidade de o mais representativo.(…) que os entes sindicais, a partir de determinado momento a ser fixado na experiência brasileira para um novo sistema sindical (…), teriam, necessariamente, que ser forçados a conquistar maior representatividade nas bases, no contato com a vida associativa, coletiva, de empregados e de empregadores, em toda a sua dinamicidade”.

De nada serve a entidade sindical dizer-se legalmente formada e, portanto, verdadeira representante da classe, se os trabalhadores não lhe atribuírem legitimamente tal condição. Se os empregados não reconhecerem os compromissos firmados ou os instrumentos coletivos celebrados, estes não passarão de folhas de papel, meras “letras mortas”. Se o sindicato, por sua vez, não possuir o poder de influenciar os trabalhadores, de ouvi-los e de ser ouvido ou de obter legitimação às suas decisões, não haverá sentido de ele sequer existir.

O sindicato laboral possui uma finalidade muito clara. Seu objetivo, sua razão de ser é apenas o de perseguir os anseios dos trabalhadores, constituindo-se como porta-voz da categoria, com o desiderato de unir as forças obreiras e fazer frente ao poderio econômico do empregador. Se, contudo, a entidade não encontra o aval dos trabalhadores no exercício de suas atividades, definha-se por completo o seu espírito, deixando de haver motivo para sua existência. Quando isso ocorre, diversos outros problemas surgem, conforme já foi relatado neste trabalho: a entidade passa a se voltar aos interesses particulares de alguns poucos integrantes da diretoria; a democracia deixa de existir; e os trabalhadores afastam-se da entidade, passando ela a se valer apenas das contribuições compulsórias para manter a sobrevivência debilitada do sindicato.

Por outro lado, se a entidade sindical for atuante, demonstrar a obtenção de resultados concretos e trabalhar unicamente em prol da categoria, cada vez mais trabalhadores se filiarão, aumentando a receita do sindicato. Ao mesmo tempo, a participação de mais trabalhadores será capaz de impedir ou dificultar as práticas ilegais e antidemocráticas. O sindicato será, enfim, verdadeiramente representativo, sendo cada vez menos necessária a atuação do Estado em prol da liberdade sindical, que já estará sendo genuinamente observada.

Considerações finais

O sindicalismo brasileiro é resultado de um complexo arranjo histórico, cuja origem remonta ao regime ditatorial de Getúlio Vargas, sob inspiração da doutrina fascista. Foi estabelecido, à época, o modelo corporativista de controle pelo Poder Público dos sindicatos, com o objetivo de conter o conflito social, permitindo que o Estado pudesse lidar com uma sociedade dócil e pacífica.

Com a Constituinte de 1988, que contou com significativa participação das centrais sindicais, foi, paradoxalmente, manifestada a preferência pela manutenção dos principais contornos do período anterior. Lograram êxito os sindicalistas que defendiam o estabelecimento de entidades imunes ao controle estatal, mas com a preservação das bases do corporativismo (unicidade sindical, contribuição compulsória e competência normativa da Justiça do Trabalho), além da permanência do sistema rígido de organização sindical. Obtiveram, assim, o que se pode chamar de “melhor dos dois mundos”, a beneficiar unicamente os dirigentes sindicais, em detrimento do progresso social.

Toda essa conjuntura, que tem proporcionado a existência de sindicatos honestos e combativos ao lado de outros preocupados apenas em arrecadar a contribuição sindical compulsória, deve, indispensavelmente, ser levada em consideração no momento de interpretação e aplicação do princípio da liberdade sindical. Se essa liberdade for levada ao plano absoluto, de forma a vedar toda e qualquer interferência estatal, ela poderá facilmente voltar-se ao prejuízo exatamente dos trabalhadores que supostamente deveria representar.

Além disso, no estudo e na aplicação da liberdade sindical, deve-se sempre atentar para a sua principal característica: a de direito fundamental, a qual faz gerar ao Estado o dever não só de respeitá-lo, mas também de protegê-lo e de promovê-lo. Entendido como direito fundamental, imprescindível ainda que se observe, no plano concreto, a sua compatibilidade com as demais garantias e direitos fundamentais, afinal nenhum princípio é absoluto.

Cabe ao Estado, portanto, asseverar que a liberdade sindical não será vilipendiada por quem quer que seja, bem como que será exercida, verdadeiramente, em prol da categoria e de acordo com demais direitos e garantias constitucionais.

De fato, mostra-se inviável interpretar o art. 8º da Carta Política isoladamente, sem compatibilizá-lo com os demais postulados constitucionais, assim como se revela impraticável uma atuação meramente negativa do Estado para restar garantida a aplicação da liberdade sindical, pelo que deve o Poder Público, em diversos âmbitos de atuação (principalmente: Legislativo, Ministério Público e Judiciário), empreender esforços para efetivar o referido preceito.

O Legislativo atuará no sentido de promover a liberdade sindical, elaborando normas jurídicas que garantam a observância desse postulado, sendo necessário reprimir os atos que impeçam ou limitem seu efetivo exercício, as conhecidas práticas antissindicais. O poder legiferante do Estado é importante, ainda, para o estabelecimento de restrições ao exercício da liberdade sindical, com vistas a evitar eventuais abusos, sempre com a preservação do núcleo duro desse direito fundamental.

Já a atuação ministerial deve voltar-se, no mais das vezes, àquelas situações em que o desempenho da entidade mostra-se pífio, tíbio, sendo fundamental que se impeça a prática de atos ilícitos ou prejudiciais à categoria. Caberá ao Ministério Público, portanto, investigar as situações que chegarem ao seu crivo, decidindo pela melhor forma de agir segundo o caso concreto, pelo que se garantirá um sindicato, efetivamente, livre, apto a defender os interesses dos trabalhadores.

O Judiciário, por sua vez, apresenta-se como o mais evidente meio de garantia da liberdade sindical. Sua atuação se dá mediante provocação, no desiderato de sanar uma situação periclitante ou reparar um prejuízo já causado, realizando julgamentos com base nos princípios da proporcionalidade e da razoabilidade, mas sem afetar o núcleo essencial da liberdade sindical.

A atuação do Estado em garantia à liberdade sindical tem sido bastante questionada, principalmente por aqueles que se beneficiariam de uma eventual omissão estatal. Tais insurgências ganham especial relevo no que tange ao custeio das entidades e à democracia interna dos sindicatos. Nesses aspectos, observou-se como autêntico e legítimo o combate do Poder Público contra a cobrança de contribuições definidas em assembleia em face de não associados; bem como a interferência ministerial em pleitos eleitorais, quando a situação se mostra flagrantemente antidemocrática e insustentável.

 Em todo caso, as questões e polêmicas envolvendo o Direito Sindical desaguam sempre no critério da representatividade. Fossem as entidades sindicais sempre representativas, funcionando como verdadeiras porta-vozes dos anseios dos trabalhadores, as demais mazelas, que devem ser combatidas pelo Estado, praticamente deixariam de existir, passando a ser despicienda qualquer robusta atuação do Poder Público em prol da liberdade sindical, que já estaria sendo genuinamente observada.

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Notas:
[1][1] NASCIMENTO, Amauri Mascaro. Compêndio de Direito Sindical. 4ª Edição. LTr: 2005, p. 32.
[2] DARNTON, Robert. Os dentes falsos de George Washington: um guia não convencional para o século XVIII. Tradução de: José Geraldo Couto. São Paulo: Companhia de Letras, 2005, p. 12. Apud LOURENÇO FILHO, Ricardo Machado. Liberdade Sindical: Percursos e Desafios na História Constitucional Brasileira. São Paulo: LTr, 2011, p. 8.
[3] RODRIGUES, Leôncio Martins. Partidos e Sindicatos. São Paulo: Ática, 1991, p. 54.
[4] LOURENÇO FILHO, Ricardo Machado. Liberdade Sindical: Percursos e Desafios na História Constitucional Brasileira. São Paulo: LTr, 2011, p. 29.
[5] RODRIGUEZ, José Rodrigo. Dogmática da Liberdade Sindical: Direito, Política, Globalização. Rio de Janeiro: RENOVAR, 2003, p. 30.
[6] LOURENÇO FILHO, Ricardo Machado. Op. Cit., 2011, p. 33.
[7] DELGADO, Maurício Godinho. Curso de Direito do Trabalho. 12ª Ed. São Paulo: LTr, 2013, p. 1395.
[9] PAOLI, Maria Celia. Os Direitos do Trabalho e a sua Justiça. Revista da USP. Nº 21, março/abril/maio de 1994, p. 106.
[10] LOURENÇO FILHO, Ricardo Machado. Op. Cit., 2011, p. 43.
[11] CARVALHO, José Murilo. Cidadania no Brasil – o longo caminho. 9a ed. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2007, pp. 121, 122.
[12] RODRIGUEZ, José Rodrigo. Op. Cit., p. 46.
[13] Na estória, oriunda da mitologia grega, Dâmocles, um bajulador na Corte de Dionísio I, aceita trocar de lugar, por um dia, com o rei, passando a ser servido com todas as regalias e benesses da Coroa, até perceber que, sobre sua cabeça, pendia uma espada sustentada por um único e tênue fio de crina de cavalo, o qual poderia vir a romper-se a qualquer instante. Atormentado com a hipótese de a espada despenhar-se em sua cabeça, Dâmocles abdica da situação de rei e devolve-a a Dionísio.
[14] RODRIGUEZ, José Rodrigo. Op. Cit., 2003, p. 8.
[15] Em março de 2008, no Governo Lula, seria publicada Lei das Centrais Sindicais (L. 11.648), reconhecendo-as e incorporando-as ao sistema sindical corporativo, inclusive, com direito a repasse de parte do dinheiro arrecado com a contribuição compulsória.
[16] Os principais movimentos grevistas dessa época foram as paralisações ocorridas no ABC paulista. Em 1980, uma greve ocorrida em São Bernardo do Campo durou 41 dias e mobilizou 300 mil metalúrgicos.
[17] Os dirigentes sindicais que tiveram papel importante no Partido dos Trabalhadores (PT), como o próprio ex-presidente Lula, ascenderam com apoio na estrutura sindical corporativista
[18] A contribuição compulsória teve especial destaque por ter sido responsável por garantir os recursos que conduziram à profissionalização dos dirigentes e à independência do aparato sindical quanto às conjunturas econômicas e aos próprios índices de sindicalização.
[19] LOURENÇO FILHO, Ricardo Machado. Op. Cit., 2011, p 60.
[20] MARTINS, José de Souza. O Poder do Atraso. São Paulo: Hucitec, 1994, p. 30.
[21] Com exceção dos sindicados de servidores públicos, onde a filiação se dá quase automaticamente, ainda no ato de posse do servidor, ficando os índices na faixa dos 90%; bem como daqueles que, mancomunados com as empresas, obtêm a filiação logo no ato da admissão, mediante a assinatura de ficha que, no mais das vezes, o empregado nem sabe do que se trata. – MARQUES DE LIMA, Francisco Gérson. Greve: um direito antipático. Ceará: PREMIUS EDITORA, 2014, p. 148.
[22] MARQUES DE LIMA, Francisco Gérson. Op. Cit., 2014, p. 148.
[23] BRITO FILHO, José Claudio Monteiro de. Direito Sindical. 4ª Ed, São Paulo, LTr: 2012, pp. 136-137.
[24] Súmula 677, do STF: Até que lei venha a dispor a respeito, incumbe ao Ministério do Trabalho proceder ao registro das entidades sindicais e zelar pela observância do princípio da unicidade.
[25] MAGANO, Octavio Bueno. Manual de direito do trabalho: direito coletivo do trabalho. 3ª ed., São Paulo: LTr, 1993, p. 27.
[26] SÜSSEKIND, Arnaldo; MARANHÃO, Délio; VIANNA, Segadas. Instituições de direito do trabalho. 14ª ed., São Paulo: LTr, 1994, pp. 995-994.
[27] NASCIMENTO, Amauri Mascaro. Op. Cit., p. 115.
[28] RODRIGUEZ, José Rodrigo. Op. Cit., p. 475.
[29] JAVILLIER, Jean-Claude. Droit du travail 7ª ed. Paris: LGDJ, 1999, p. 539. Apud: MASSONI, Túlio de Oliveira. Representatividade Sindical. São Paulo, LTr: 2007, p. 60.
[30] MARTINEZ, Luciano. Condutas Antissindicais. São Paulo, Saraiva: 2013, p. 113.
[31] Segundo essa teoria, são quatro os possíveis status do indivíduo na sua relação com o Estado: o passivo (status subjectionis), o ativo (Status activus civitates), o negativo (Status libertatis) e o positivo (Status civitates). – MARMELSTEIN, George. Curso de Direitos Fundamentais. 3ª Ed. São Paulo, Atlas: 2011, p. 320.
[32] Ibid.
[33] MARMELSTEIN, George. Op. Cit., p. 321.
[34] MARTINEZ, Luciano. Op. Cit., p. 113.
[35] MARTINS, Ives Gandra da Silva; MENDES, Gilmar Ferreira; NASCIMENTO, Carlos Valder do. Tratado de Direito Constitucional. 2ª Ed, São Paulo, Saraiva: 2012, p. 329.
[36] MARTINEZ, Luciano. Op. Cit., p. 113.
[37] MASSONI, Túlio de Oliveira, Op. Cit., p. 61.
[38] Art. 70, parágrafo único, CF/88: prestará contas qualquer pessoa física ou jurídica, pública ou privada, que utilize, arrecade, guarde, gerencie ou administre dinheiro, bens valores públicos ou pelos quais a União responda, ou que, em nome desta, assuma obrigações de natureza pecuniária.
[39] VIERA DE ANDRADE, José Carlos, Os direitos fundamentais na Constituição Portuguesa de 1976. 4ª Ed. Coimbra: Almedina, 2009, p. 140.
[40] CANOTILHO, José Joaquim Gomes. Direito Constitucional e Teoria da Constituição. Coimbra: Almedina, 1998, p. 265.
[41] RODRIGUEZ, José Rodrigo. Op. Cit., p. 54.
[42] MASSONI, Túlio de Oliveira. Op. Cit., p. 62.
[43] CANOTILHO, José Joaquim Gomes. Op. Cit., p. 1143.
[44] MENEZES CORDEIRO, Antônio Manuel da Rocha e. Da boa Fé no Direito Civil. Coimbra: Almedina, 1997, p. 882.
[45] Registra-se o caso de sindicato com 80 diretores, sendo 10 vice-presidentes e 14 tesoureiros, para uma categoria que contava apenas com 150 associados. Ao caso foi aplicada a tese do abuso de direito, restringindo a diretoria a sete dirigentes. NASCIMENTO, Amauri Mascaro. Panorama do sindicalismo brasileiro: organização, contribuição, tendências. Palestra proferida no IV Simpósio – Temas relevantes nas Relações de Trabalho – 20 e 21/10/2000 – São José do Rio Preto – SP, p. 68, apud MELLO, Laís Corrêa de. Liberdade sindical na constituição brasileira. São Paulo: Saraiva, 2005, p. 218.
[46] Ementa (Ementário n. 01952-04, p. 806): “Constitucional. Trabalho. Dirigentes: CLT, art. 522: Recepção pela CF/88, art. 8º, I. I – O art. 522, CLT, que estabelece número de dirigentes sindicais, foi recebido pela CF/88, art. 8º, I. II – RE conhecido e provido”.
[47] SARLET, Ingo Wolfgang; MARINONI, Luis Guilherme; MITIDIERO Daniel. Curso de Direito Constitucional. 2ª Ed, São Paulo, Revista dos Tribunais: 2012, p. 348.
[48] Ibid.
[49] SILVA, Virgílio Afonso da. O Conteúdo essencial dos direitos fundamentais e a eficácia das normas constitucionais. In Revista do Direito do Estado 4 (2006): 23-51. <Disponível em: http://teoriaedireitopublico.com.br/pdf/2006-RDE4-Conteudo_essencial.pdf> Acesso em: 02/10/2014.
[50] SARLET, Ingo Wolfgang; MARINONI, Luis Guilherme; MITIDIERO Daniel. Op. Cit., p. 358.
[51] NOVELLI, Flávio Bauer. Norma Constitucional Inconstitucional? A propósito do art. 2º, § 2º, da EC nº 3/93. Revista Forense, nº 330, 1995, p. 63. In. Revista da Faculdade de Direito da EURJ 2: 11-53, 1994.
[52] SILVA, Virgílio Afonso da. Op. Cit, p. 26.
[53] A respeito do tema, surgiram duas correntes opostas: a de que o núcleo essencial seria absoluto, ou seja, poderia ser determinado previamente e em abstrato, sendo sempre intangível; e a adotada neste trabalho, de que o núcleo seria relativo, determinável apenas diante de um caso concreto e variando de acordo com a situação. A favor da teoria absoluta, STERN Klaus; SACHS Michael; a favor da teoria relativa MAUZ Theodor; DÜRIG, Günter.
[54] Cf., TST/ SDC RO – 393.224/97, Rel. Min. Armando de Brito e TST/SDC RO 423.261/1998, Rel. Min. Ursulino Santos.
[55] RODRIGUEZ, José Rodrigo. Op. Cit., p. 477.
[56]GOMES. Rafael de Araújo. Desrespeito às convenções do Ministério Público do Trabalho é denunciado na OIT. Disponível em: <http://www.conjur.com.br/2011-ago-06/oit-ministerio-publico-trabalho-cobranca-contribuicoes-sindicais> Acesso em: 02/10/2014.
[57] Acórdão disponível em: <http://www.trtes.jus.br/sic/sicdoc/DocViewer.aspx?fmt=2&sq=803395401&id=236> Acesso em: 24/10/2014
[58] BRITO FILHO, José Cláudio Monteiro de. Op. Cit., p 73.
[59] A contribuição sindical é comumente denominada, também de imposto sindical. A alcunha, porém, não é a melhor tecnicamente, já que essa espécie de custeio não possui, verdadeiramente, a natureza de imposto, mas de contribuição especial.
[60] Art. 3º, CTN: Tributo é toda prestação pecuniária compulsória, em moeda ou cujo valor nela se possa exprimir, que não constitua sanção de ato ilícito, instituída em lei e cobrada mediante atividade administrativa plenamente vinculada.
[61] Tradução Livre: Convém distinguir entre cláusulas de seguridade sindical permitidas pela lei e as impostas pela lei, dado que unicamente estas últimas têm como resultado um sistema de monopólio sindical contrário aos princípios de liberdade sindical. – OIT. Liberdad sindical: Recompilación de decisiones y princípios del Comité de Libertad Sindical del Consejo de Administración de la OIT. Ginebra, Oficina Internacional del Trabajo, cuarta edición (revisada), 1996, p. 64.
[62] NASCIMENTO, Amauri Mascaro. Op Cit, p. 263.
[63] Art. 149, CF/88: Compete exclusivamente à União instituir contribuições sociais, de intervenção no domínio econômico e de interesse das categorias profissionais ou econômicas, como instrumento de sua atuação nas respectivas áreas, observado o disposto nos arts. 146, III, e 150, I e III, e sem prejuízo do previsto no art. 195, § 6º, relativamente às contribuições a que alude o dispositivo.
[64] Disponível em: <http://www.stf.jus.br/arquivo/informativo/documento/informativo12.htm> Acesso em: 24/10/2014.
[65] Súmula 666, STF: A contribuição confederativa de que trata o art. 8º, IV, da Constituição só é exigível dos filiados ao sindicato respectivo.[65]
[66] NASCIMENTO, Amauri Mascaro. Op Cit., p. 264.
[67] SÜSSEKIND, Arnaldo; MARANHÃO, Délio; VIANNA, Segadas. Op. Cit., p. 1176.
[68] BRITO FILHO, José Cláudio Monteiro de. Op. Cit., p. 131.
[69] Disponível em: <http://www.stf.jus.br/arquivo/cms/jurisprudenciaSumulaVinculante/anexo/SUV_40__PSV_95.pdf> Acesso em: 07/11/2015
[70] MARTINS, Sérgio Pinto. Contribuições sindicais: direito comparado e internacional: contribuição assistencial, confederativa e sindical. São Paulo: Atlas, 1998, p. 127.
[71] Tradução livre: A admissibilidade das cláusulas de seguridade sindical em virtude de convenções coletivas foi deixada à eleição dos Estados ratificantes, segundo se depreende dos trabalhos preparatórios da Convenção núm. 98 – OIT. Op. Cit., p. 74.
[72] Disponível em: <http://www.tst.jus.br/precedentes-normativos> Acesso em: 01/10/2014
[73] Disponível em: <http://www3.tst.jus.br/jurisprudencia/OJ_SDC/n_bol_01.html> Acesso em: 01/10/2014
[74]Falta de maioria absoluta impede TST de alterar jurisprudência sobre contribuição assistencial. Notícia disponível em: <http://www.tst.jus.br/noticias-teste/-/asset_publisher/89Dk/content/falta-de-maioria-absoluta-impede-tst-de-alterar-jurisprudencia-sobre-contribuicao-assistencial/pop_up?_101_INSTANCE_89Dk_viewMode=print> Acesso em: 01/10/2014.
[75] Ibid.
[76] BRITO FILHO, José Cláudio Monteiro de. Op. Cit., pp. 132 e 133.
[77] SÜSSEKIND, Arnaldo; MARANHÃO, Délio; VIANNA, Segadas. Op. Cit., p. 1170.
[78] Art. 541, CC/02: A doação far-se-á por escritura pública ou instrumento particular. Parágrafo único: A doação verbal será válida, se, versando sobre bens móveis e de pequeno valor, se lhe seguir incontinenti a tradição.
[79] AROUCA, José Carlos. Curso Básico de Direito Sindical. 2ª ed. São Paulo: LTr, 2009, p. 199.
[80] MARQUES DE LIMA, Francisco Gérson. Petição Inicial em Ação Civil Pública (Processo nº 77-84.2013.5.07.0017). Sindicato dos Trabalhadores no Serviço Público Estadual do Ceará (MOVA-SE). Ceará: Ministério Público do Trabalho/Procuradoria Regional do Trabalho da 7ª Região. Acesso em:  <http://servicos.prt7.mpt.gov.br/pecas/Gerson_2011_Eleicoes_sindicais-SINPOF.pdf> Acesso em: 02/10/2014, p. 10
[81] Art. 3º – Convenção nº 87: as organizações de trabalhadores e de empregadores terão o direito de elaborar seus estatutos e regulamentos administrativos, de eleger livremente seus representantes, de organizar a gestão e a atividade dos mesmos e de formular seu programa de ação.
[82] Tradução livre: A liberdade sindical implica o direito dos trabalhadores e dos empregadores a eleger livremente seus representantes e a organizar sua administração e atividades sem ingerência alguma das autoridades públicas. – OIT. Op. Cit., p. 97.
[83] Tradução livre: As únicas limitações aos direitos enunciados no artigo 3 da Convenção núm 87 que eventualmente se poderiam admitir devem se voltar a assegurar o respeito às regras democráticas no movimento sindical – OIT. Op. Cit., p. 98
[84] Art. 8º, III, CF/88 – ao sindicato cabe a defesa dos direitos e interesses coletivos ou individuais da categoria, inclusive em questões judiciais ou administrativas;
[85] FARIAS, Regina Sonia Costa. Estudo da entidade sindical de primeiro grau no contexto da liberdade sindical no Brasil: um perfil da atuação de sindicatos da categoria profissional no Município de Fortaleza, no período de 2010 a 2012. Tese (Mestrado em Direito constitucional), Faculdade de Direito, UFC, Ceará, 2013, p. 84.
[86]NASCIMENTO, Amauri Mascaro. Op. Cit.,. p. 242.
[87]KAUFMANN, Marcus de Oliveira. Da formal representação à efetiva representatividade sindical: problemas e sugestões em modelo de unicidade. Revista do Tribunal Superior do Trabalho, Porto Alegre, RS, v. 76, n. 2, p. 109-157, abr./jun. 2010, p. 138.

Informações Sobre o Autor

Felipe Arruda Aguiar Sobreira da Silveira

Advogado com graduação pela Universidade Federal do Ceará. Pós-graduando em Direito Constitucional pela Faculdade Damásio


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Equipe Âmbito Jurídico

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