Introdução
O Brasil, há mais de duas décadas, encontra-se em um impasse sobre a forma de superação do modelo desenvolvimentista de Estado e de organização econômica e social. Impasse que acaba exacerbando constrangimentos em toda a sociedade, dificultando ainda mais as possibilidades de elaboração de um novo paradigma de desenvolvimento econômico que crie os fundamentos de uma unidade nacional e, ao mesmo tempo, permita uma visão de futuro sobre o qual se redefinirá a sociedade.
O contexto de dificuldades econômico, político e social pelo qual passa o Brasil nessas últimas duas décadas, tem como cerne o questionamento da forma de configuração e atuação do Estado-Nação[1]. Situação que, além de estar sintonizada com os acontecimentos internacionais de questionamento do Estado Nacional e da organização de uma “nova ordem mundial” financeira e de divisão internacional de trabalho na atualidade, tem suas causas primeiras profundamente assentadas em condições internas de como se processou o modelo desenvolvimentista ao longo da história do Brasil, criando especificidades que obstaculizaram as transformações para um novo modelo de desenvolvimento.
Para construirmos a síntese explicativa dessa crise em si, suas causas e perspectivas de solução, consideramos importante avaliar o processo de mudanças pelo qual passa o País e, consequentemente, alguns caminhos percorridos ou que estão sendo propostos. Ao buscarmos os elementos que diagnosticam e prognosticam esse período, estamos priorizando o nível político-institucional como uma possível base explicativa para mais de duas décadas de dificuldades e de impasses na reconfiguração do Estado brasileiro – fortemente intervencionista – e, consequentemente, tornando inteligíveis várias das transformações que ocorrem na sociedade. Assim, estamos fazendo uma opção teórico-metodológica e, ao mesmo tempo, estabelecendo os limites da presente análise.
A NECESSIDADE DA REESTRUTUÇÃO DO ESTADO
No caso brasileiro, devemos ressaltar que as relações sociais, políticas e econômicas em todos os níveis da sociedade são fortemente mediatizadas pelo Estado (Draibe, 1985; Faoro, 1973; Fernandes, 1975; Franco, 1969; Gomes, 1988; Koval, 1982; Martins, 1985; Nardini, 1989; Saes, 1985a; Schwartzman, 1982; Trindade, 1986; Uricochea, 1978) e, por isso, esta instituição acabou historicamente assumindo um papel central na definição da forma de organização da sociedade, seja devido às bases patrimonialistas e ao clientelismo de seu funcionamento, seja, a partir da sua ingerência nas esferas das relações sociais e econômicas (intervencionismo), tornando, assim, complexa a situação brasileira nesse atual processo de transformação do Estado (globalização). A especificidade da constituição do Estado e de seu intervencionismo permitiram-nos lastrear e, de certa forma, dirigir o desenvolvimento econômico e fundamentar os elementos de estruturação da sociedade brasileira, principalmente a partir do desenvolvimentismo, assim, acreditamos que, sob a égide do Estado, nasceu a sociedade brasileira moderna e de massa.
O desenvolvimentismo, construído a partir dos anos 30 e definido dentro da estrutura do Estado (Varguista), oriundo este da crise final da primeira república e de seu Estado oligárquico, representa mais que um projeto de desenvolvimento econômico através do Estado; caracteriza-se como um modelo que estabelece as bases de união (os critérios do consenso imposto) aos interesses privados via constituição de um interesse público – fundamentado no crescimento econômico e na industrialização do País – e, junto com isso, a forma de organização da sociedade e da própria identidade coletiva dos agentes e dos indivíduos. Ou seja, o desenvolvimentismo passa a determinar através do Estado e do crescimento econômico industrial os elementos constitutivos do que podemos definir, a partir de então, como os padrões organizacionais da sociedade e os fundamentos da identidade coletiva. E nesse sentido, o desenvolvimentismo – enquanto um sistema de organização social, econômica e política – pode ser definido como base dos ideais e projetos de desenvolvimento nacionais que foram elaborados e/ou operacionalizados no período.
Consideramos, pois, o projeto de desenvolvimento nacional como uma forma de pactuação ou repactuação social que dispõe de uma sinergia de desenvolvimento, ou seja, uma perspectiva teleológica que lhe é inerente. O desenvolvimentismo, então, é o modelo que criou as bases de estruturação da sociedade brasileira a partir de 1930, dando-lhe uma organicidade estrutural, uma operacionalidade de inter-relacionamento social e um Estado interventor que se tornou o elemento central para sua realização e lhe deu os fundamentos, pois foi através das bases do Estado Varguista que se estruturou este “sistema desenvolvimentista”. Sem desconsiderar a especificidade de cada momento político e os conflitos de interesses que em uma perspectiva retrospectiva nos permite estabelecer uma unidade, uma linha de continuidade, até o final do século XX, a qual definimos como “sistema desenvolvimentista”.
I
A década de 80, os anos 90 e seus acontecimentos exprimem mais que a passagem de um regime autoritário para um democrático, simbolizam também do fim o modelo desenvolvimentista do pós – 30, fatos que se expressam e são reforçados pelas dificuldades econômicas e fiscais, na falta de perspectiva de viabilização de um novo padrão de desenvolvimento no curto prazo e nas transformações que ocorrem no mundo e estão demonstrando a instabilidade no equilíbrio das forças que lastrearam a estrutura organizacional da sociedade e o modelo de Estado até então vigente no Brasil. Situação que obriga a reformulação dos interesses privados e um novo consenso entre os agentes políticos, numa realidade na qual há grande descrédito na ação planejadora e interventora do Estado e em cuja situação a proposta desestatizante é muito forte. Uma realidade conflituosa entre os interesses particulares e deles com as estruturas do Estado (Oliveira, 1997), que ganha profundidade e complexidade e impõe dificuldades ao processo de reestruturação do Estado e a qual, acreditamos, só encontra paralelo político na década de 30.
Nesse momento, mais do que nunca, tornam-se incontroláveis as expectativas coletivas … agrupam interesses extremamente variáveis e inorgânicos [constituindo acordos instáveis e efêmeros]. Adensa-se o peso da força material dos grupos de interesses e das vontades políticas de cada setor ou região na imposição de uma solução que nascerá, inevitavelmente, de prolongada luta sem leis nem fronteiras, que não sejam os impostos pelo próprio desenvolvimento do conflito. (Fiori, 1995b, p. 134)
Dessa forma, fica aparentemente deslocada a esfera política institucional como centro da constituição de posições consensuais. E o Estado passa a representar discursivamente um empecilho para equacionar as diferenças. Assim, o pessimismo sobre as possibilidades e capacidades da arena política é reforçado, o que permite a ascensão ideológico-discursiva da esfera do mercado que se referencia como centro emanante de uma mais qualificada regulamentação social. E, ao mesmo tempo, geram-se fortes entraves estruturais, intelectivos e utópicos à construção de um novo projeto de desenvolvimento nacional. Um projeto norteador e de inserção a nova realidade mundial, capaz de referenciar o País de forma específica a realidade mais liberalizante e interdependente que está sendo produzida internacionalmente (Santos, 2002).
II
A dificuldade de encontrar uma solução (consenso) no curto prazo exacerba o imediatismo e o individualismo dos interesses, o que potencializa ainda mais a sinergia de estilhaçamento do Estado e a sua impossibilidade de orquestração de um modelo de organização social que contemple e estabeleça, sob outro patamar, as bases organizacionais da sociedade civil. Dessa forma, podemos considerar que a velha fórmula de equalização das distintas posições sociais e políticas através da ação de um Estado forte e autoritário não tem funcionado mais e, também, que existe, supostamente, uma perspectiva (política) “totalmente” aberta para o futuro. Realidade que nos possibilita caracterizar então a falência sistêmica do desenvolvimentismo através de sua expressão política e institucional (o Estado). Ou seja, uma crise político-sistêmica que tornou o Estado o centro, o elemento de expressão e o princípio de inteligibilidade do período atual e, assim, acaba, por essas características, dificultando o engendramento de uma possível solução ou equacionamento dos conflitos, pois se desvalorizou a política e o Estado como espaços de elaboração de consenso.
Aparentemente, essa realidade nos permite entender que se chegou ao limite da capacidade de atuação do Estado desenvolvimentista através do seu padrão de “compromisso” (Weffort, 1978) entre os vários setores (interesses) na manutenção do modelo organizacional de sociedade e de identidade coletiva. Especificidades do desenvolvimentismo que geram o que podemos definir como crise sistêmica, ou seja, a impossibilidade crescente de operacionalidade da estrutura vigente e de aglutinação entre os vários elementos (agentes sociais e seus interesses) constituídos no período através dos processos de definição de consenso e compromisso até então utilizados como configuração da unidade desse sistema, fortalecendo, assim, os interesses privados sem uma perspectiva de unidade e colocando, a princípio, o então modelo de Estado e os padrões que fundamentaram os interesses públicos, gerados na antiga forma desenvolvimentista, fora da nova base de consenso.
A CONSTITUIÇÃO DER POSIÇÕES CONFLITUOSAS NA REESTRUTURAÇÃO DO ESTADO
A crise econômica mundial do início da década de oitenta, unida às dificuldades enfrentadas pelo Estado nacional em crescente ineficácia, e a contestação de sua configuração e de suas ações desde o final do “milagre econômico” produziram uma realidade que determinou e/ou explicitou o fim do suporte para a elaboração de determinados modelos de desenvolvimento, de uma forma organizacional da sociedade e de sua identidade coletiva, constituídos a partir da primeira metade desse século, que aglutinavam, sob o “guarda-chuva” protetor de um Estado centralizado e interventor, interesses heterogêneos internos à sociedade (Diniz & Boschi, 1991; Fiori, 1995a; Gouvêa, 1994; Schneider, 1994).
A presença de um Estado centralizado e o fracionamento heterogêneo dos diferentes grupos regionais, setoriais e funcionais da sociedade (diversidade de racionalidade e de interesses não hegemônicos da sociedade civil), dentro de uma tradição patrimonialista e clientelista de atrelamento entre grupos e seus interesses a essa instituição (corporativismo), permitiram a execução do projeto desenvolvimentista pelo Estado, garantindo, assim, sua primazia através de sua estrutura burocrática diante desses outros setores no estabelecimento dos consensos sociais (Ianni, 1971; Schneider, 1994; Weffort, 1978). Essa realidade configura-se com a formulação de alianças extremamente instáveis de interesses heterogêneos, via Estado (Cardoso, 1972; Fiori, 1993; Gouvêa, 1994; O’Donnell,1987). Uma ordenação política e social que, durante essas últimas décadas, entra em colapso e, ao mesmo tempo, vem impossibilitando a formulação de um novo consenso e modelo alternativo a essa realidade. Pois, devido ao fim das alianças que o sistema promovia entre os interesses privados no Estado, torna-se conflituosa a convivência dos diferentes grupos sociais (com interesses e racionalidades próprias). A falência do desenvolvimentismo também desfez a funcionalidade em níveis adequados das alianças entre interesses privados através dos grupos burocráticos do Estado (que também desenvolveram interesses próprios) e acabou por torná-los todos concorrentes na disputa pelo poder e pelas cada vez menores – devido a dificuldades econômicas -, benesses do Estado (Oliveira, 1997).
Nestas últimas duas décadas, a diversidade de racionalidades (interesses) em conflito acaba obstaculizando sua solução e agravando ainda mais a situação de crise – pois prolonga o período para sua resolução – e, assim, produz reforço à conjuntura da cada vez maior desvalorização do Estado. Como veremos, a exacerbação dos conflitos entre os mais variados interesses que estavam incrustados no Estado, impõe dificuldades para a sua reelaboração e para uma nova ordenação social a fim de produzir um outro modelo de desenvolvimento, como também, a rápida superação da crise. Essa realidade pode ser classificada através dos conceitos estabelecidos por Habermas (1980 e 1984) e Offe (1984 e 1989), como uma situação de déficit de legitimidade e, dessa forma, torna o Estado cada vez menos operante e menos capaz de dar respostas (output) aos problemas e às demandas (input) da sociedade (déficit de racionalidade). Situação que contribui ainda mais para o esgarçamento da solidariedade social e da própria identidade coletiva[2].
A demora e as dificuldades encontradas na solução da hiperinflação brasileira que se tornou crônica, são o exemplo mais visível desse fato. A Constituição de 1988 e a forma como se elaborou o consenso para a sua confecção, o aparecimento de movimentos separatistas, mesmo incipientes, juntos de uma guerra fiscal entre os estados da federação (crise do modelo de pacto federativo vigente) para atrair investimentos, expressam bem essas dificuldades.
A DIFICULDADE DE SUPERAÇÃO DO DESENVOLVIMENTO
Os problemas enfrentados internamente pelo Brasil nestas últimas décadas estão limitados por características históricas, sociais e econômicas que configuraram nossa sociedade, dando-lhe unidade e funcionalidade. Tais características são sintetizadas por um modelo de estruturação e configuração social definido por nós como “sistema desenvolvimentista”. Nesse momento, cabe-nos explicitar o nosso entendimento sobre o desenvolvimentismo e o porquê de trabalharmos com a idéia de “sistema desenvolvimentista”.
Sem uma filiação completa aos postulados da “teoria dos sistemas”, nossa perspectiva teórica nos permite apropriar de alguns de seus conceitos analíticos que encontram-se em conformidade com a proposta de nossa pesquisa. Desse modo, podemos compreender as características do desenvolvimentismo e as alternativas para sua superação a partir do que esses teóricos dos sistemas definem como “isomorfismo histórico” (estruturas estáveis) e “transformações” (estruturas dinâmicas). Ou seja, compreender os limites e os caminhos possíveis para a constituição de um novo modelo de desenvolvimento que comporte as características históricas do País e também uma nova perspectiva de futuro, alinhavando dessa maneira, em bases reconstruídas, a solidariedade e a identidade social brasileira.
O conceito de sistema nos parece muito promissor na definição inteligível do desenvolvimentismo e pertinente para caracterizá-lo como uma forma estruturada de organização social, um modelo de desenvolvimento e uma perspectiva de futuro, assim abarcá-lo pelas expressões que nos permitirão compreender em conjunto os acontecimentos de quase quatro décadas com diferentes governos, regimes e visões de projeto nacional (Vargas, Kubitschek, período Militar) na indefinição de uma reestruturação do Estado e em conseguinte um novo modelo de desenvolvimento.
Não obstante, cabe-nos aqui observar que o desenvolvimentismo aparece mais claramente como um sistema acabado a partir da era JK e principalmente em sua última fase – com o golpe de estado de 1964 -, mas as bases de sua estrutura e o seu padrão funcional podem ser percebidos desde o primeiro governo Vargas. Assim consideramos, como não poderia deixar de ser, o desenvolvimentismo como um produto de conflitos e opções sociais que se conjuminaram ao longo de várias décadas[3]. O desenvolvimentismo é uma construção histórica de longo prazo que vista retrospectivamente pode ser inteligível e condensada através da forma de sistema a fim de servir como modelo analítico aplicável à realidade dessas últimas décadas. Com isso afirmamos que não pretendemos ignorar os vários conflitos internos (no Estado e/ou na sociedade) que estão presentes na construção e operacionalidade desse padrão de desenvolvimento e modelo de ordenação social, mas deixamos claro que, segundo nosso entendimento, esse não é o enfoque que nos melhor auxilia na nossa pesquisa.
O desenvolvimentismo, através dessa perspectiva e de nossos objetivos, pode ter sua organicidade expressa em algumas variáveis e demonstrar que elas explicitam determinados processos que fundamentaram esses modelos e garantiram a sua manutenção. Assim as características do desenvolvimentismo, seu funcionamento e suas transformações podem ser apreciadas a fim de determinar a forças e as pressões da sociedade que a produziram, ou seja, as resposta do sistema, suas alterações e princípios de equalização também demonstram e caracterizam as pressões e os distúrbios que ele sofria, bem como nos permite caracterizar essas forças e compreender seus interesses e limites.
I
O desenvolvimentismo enquanto um sistema estável – de organização da sociedade – criou processos de aquisição de legitimidade. Processos que utilizaram-se de características já historicamente definidas na sociedade e, assim, estabeleceram padrões de estruturações sociais específicas.
Esse sistema tem fundamentado sua organização isomórfica nas características estruturais advindas de anteriores formas de organização dessa sociedade, que reelaboradas estruturam o desenvolvimentismo e dão as bases para constituição de suas características fundamentais e os limites de sua transformação. A legitimidade do sistema está entrelaçada a esses fundamentos, o seu funcionamento tem esses limites e a sua manutenção depende de sua capacidade de resposta a reelaboração dessas características nesse novo patamar.Um outro e importante fator para nossa análise está na funcionalidade do sistema ao longo de quatro décadas – as formas de organização que ele elaborou na sociedade e o seu próprio caráter teleológico – no tocante aos limites e possibilidades que isso vem a se constituir na fase de superação desse sistema.
II
O desenvolvimentismo que se tornou possível devido a processos históricos que permitiram, ao mesmo tempo, a exacerbação da capacidade de atuação e o prestígio do Estado diante dos diversos agentes da sociedade (interesses privados) e a modernização-conservadora como forma de viabilização pactuada de transformações econômicas, políticas e sociais do País, constituiu-se, assim, em um sistema orientado de organização da sociedade em suas múltiplas esferas tendo como princípio teleológico básico (como interesse público) a industrialização enquanto um modelo de desenvolvimento econômico e via de entrada do Brasil – da nação brasileira – na modernidade capitalista, ou seja, o desenvolvimentismo pode ser entendido como um sistema orientado para a construção de um modelo de desenvolvimento nacional, constituindo-se em um projeto de nação.
Fundamentado num modelo de interesse público – obtido através da modernização-conservadora resultante do pós 30 – que tinha como base a ideologia pequeno-burguesa oriunda da classe média desvinculada de sua origem oligárquica e que passou a ocupar espaços na política e na estrutura burocrática do Estado, o desenvolvimentismo foi criando estruturas e procedimentos (subsistemas e processos) que viabilizaram sua execução e lhe garantiram sua existência por quase meio século e sobre as quais repousam o seu sucesso, suas mazelas e sua crise, como também, as dificuldades para sua superação.
O desenvolvimentismo proporcionou o surgimento de um princípio organizativo e burocrático que atua de forma a se ampliar obrigando a organização tanto do Estado como da sociedade a assumirem a sua lógica e limites de atuação (técnico-burocratizada).
As vantagens técnicas da racionalização burocrática como centro articulado de um Estado centralizado e interventor e que subjuga os partidos políticos e atrela as organizações sociais fizeram com que surgisse um espaço fértil para a propagação dessa estrutura e de seus ideais diante dos outros setores.
O desenvolvimentismo lastreado na capacidade de planejamento e primazia da burocracia começa a ganhar apoio (Sola, 1998) a ponto de ser irresistível até para os indivíduos contra a prática do intervencionismo estatal na economia.
O trabalho de Gouvêa (1994), Martins (1985), Sola (1998) nos permitem entender como a estrutura burocrática, seus órgãos e agentes se utilizam dos mais variados procedimentos para conquistar o poder decisório. As várias “gramáticas” (Nunes, 1985) vão desde o clientelismo, até o corporativismo e os anéis burocráticos utilizados pela burocracia demonstra uma luta político-ideológica pela busca da hegemonia a favor de um determinado entendimento de mundo. A supremacia ideológica do planejamento burocratizado não acontece sem conflito e passividade até mesmo dentro de sua estrutura como a sociedade. Como nos demonstra Gomes (1988) em relação as estruturas sindicais e organizações sociais que só passam a ser reconhecidas regras e Sola (1998) que deixa claro as divergências internas à burocracia entre os próprios técnicos desses órgãos. É o corporativismo que ira estruturar essa supremacia e colocar a organização burocrática como modelo de estruturação social e fonte emanante das especificidades da continuidade do desenvolvimentismo.
A “gramática” corporativa, segundo Nunes (1985) passa a ser a forma de linguagem do desenvolvimentismo e sobre a qual se constituíram os elos que o compuseram. E, assim, definiram o Estado como o ente primordial na organização social, o estamento burocrático como o centro emanante das formas dessa organização.
O corporativismo dá funcionalidade para a exacerbação do desenvolvimento como sistema de organização das redes de solidariedade social e da constituição de processos que garantiram a participação dos interesses privados organizados – dentro dos parâmetros corporativos – na arena decisória do Estado. Dessa forma, também, especificando a constituição da identidade coletiva. É através do corporativismo e da nova base de solidariedade e identidade coletivas que o clientelismo e o patrimonialismo são reelaborados e redefinidos como formas e gramáticas de ação e intercâmbios entre os diversos interesses que se encontram na arena decisória do Estado nacional.
O populismo é a expressão política do desenvolvimentismo e se constitui em um de seus principais elementos. Pelo seu aporte específico, que possibilitou a agregação da grande massa social e interesses marginal ao modelo definido de organização social, o populismo, representou também uma grande força mobilizadora da sociedade principalmente à classe operária.
O desenvolvimentismo opera com a centralização do poder no Estado e ao mesmo tempo com a incorporação dos mais diversos interesses sociais ao longo do tempo com a finalidade de manutenção da ordem social e constituição de um ambiente o mais propício possível ao desenvolvimento econômico posto em prática. Sendo assim, a organização partidária e o modelo político, erigidos no Estado Novo, estão atrelados ao sistema que veio se organizando, dele depende e a ele se operacionaliza via o clientelismo que lhe é fundamento.
O ambiente político de então funcionava sem uma ampla liberdade de organização partidária. São três grandes partidos que controlavam esse espaço institucional, sendo que dois deles – o PTB e o PSD estão diretamente ligados ao Estado e do qual recebem benefícios, o outro – a UDN – congrega interesses marginalizados pelo sistema, mas quase que totalmente cooptáveis pelo Estado como demonstram os estudos de Gouvêa (1994) e Sola (1998) entre outros. Sendo assim o espaço institucional político-partidário está atrelado ao modo operante do desenvolvimentismo e sob a tutela do Estado.
A arquitetura da arena político-partidária constituída já dentro do padrão desenvolvimentista buscava sobre tudo a legitimação do sistema e a domesticação dos mais diversos grupos – de toda a sociedade. Sendo uma organização política de massa, o populismo buscava dar forma organizativa e espaço participativo na arena decisória, mesmo que de forma muito restrita, aos mais diversos grupos da sociedade e, dessa forma, atrelar o máximo de apoio possível ao sistema. Essa legitimidade era conquistada através de formas clientelistas sob a égide dos processos fundados no corporativismo que fundamentaram as formas meritocráticas de ação do Estado.
O processo de constante incorporação das massas a esfera política do populismo e o apoio a constituição de grupos de interesse (corporativos) acarretaram uma forte pressão sobre o sistema que ultrapassaram os limites possíveis ao clientelismo e a institucionalização de interesses no Estado. O processo de politização das massas controlada entra em crise. Pressões e distúrbios ao “sistema desenvolvimentista” exigem transformações no modelo de organização política.
A falência do populismo não se tornou em uma crise sistêmica que comprometesse o desenvolvimentismo, pois, como as agências burocráticas já haviam ocupado os principais espaços decisórios, o reforço a essa tendência foi a saída para os grandes interesses que controlavam o Estado na manutenção do status quo. Passa também para a burocracia do Estado muitas das funções de legitimação e de distribuição das benesses do Estado (processos clientelistas) através dos anéis burocráticos.
III
Assim, racionalização e burocratização do Estado ganharam especificidades no desenvolvimentismo ao tornarem gradativamente a burocracia estatal no elemento primordial da sua execução e na manutenção de seus princípios ideológicos e como base de definição do que se estabeleceu como interesse público (industrialização e crescimento econômico permanente via Estado).
A burocratização, enquanto parte de um dos principais pilares do desenvolvimentismo criou processos garantidores do crescimento através de reestruturação do intervencionismo estatal via a concentração de poder no Executivo federal e depois a descentralização pelas agências burocráticas a ele ligadas. O que vai imprimir também forma e direção única à qualquer sinal de disfuncionalidade do sistema, qual seja: produzir uma centralização ainda maior nas mãos do Executivo, conseqüentemente um reforço à liberdade e capacidade de atuação das agências burocráticas a ele ligadas, definindo, assim, a forma operacional do desenvolvimentismo e sua maneira de evitar as crises como uma concentração-descentralização do poder (Martins, 1985) e uma permanente “fuga para frente” (Fiori, 1995a).
Ao mesmo tempo em que o “sistema desenvolvimentista” apóia-se no princípio da racionalização e burocratização do Estado e em seu reforço, também, elabora o corporativismo como um de seus fundamentos na organização das redes de solidariedade social e seus processos que garantem a participação do interesses privados organizados (de forma corporativa) na arena decisória através da reelaboração do patrimonialismo e do clientelismo (anéis burocráticos) e da primazia do Estado diante da sociedade, dessa maneira, especificando a identidade coletiva.
Esses subsistemas e processos garantidores permitiram ao desenvolvimentismo constituir um arcabouço ideológico que formula a própria nacionalidade brasileira através dos processos de elaboração da solidariedade social e da identidade coletiva. Sendo assim, o “sistema desenvolvimentista” permanece operacional e suportando várias crises, tornando-se disfuncional apenas quando não mais consegue manter o crescimento econômico e incorporar novos agentes sociais criados pelo seu próprio funcionamento e pela conseqüente crescente complexificação da sociedade. Dessa forma torna-se inoperante a racionalidade de seu Estado (interesse público) o que mina a sua legitimidade gerando uma crise sistêmica fundamentada na sua deslegitimação política por parte dos agentes privados – beneficiados ou não pelo sistema – e na incapacidade operacional (déficit de racionalidade daí decorrente) em manter funcionais seus princípios teleológicos. Crise político-sistêmica que expressa a inoperância dos processos definidos pela racionalização e burocratização, pela forma de organização social e de sua identidade e pela incapacidade da participação da grande diversidade de interesses na arena decisória, constitui-se, assim, na falência do desenvolvimentismo e das bases reais que definem a nacionalidade.
A crise político-sistêmica se caracteriza pela situação de conflito entre os diferentes agentes sociais organizados de forma corporativa e, assim, a defenderem apenas seus interesses. Os antigos aliados e os pactos interburocráticos (anéis burocráticos) funcionais no desenvolvimentismo começam a se romperem e a inviabilizar formas consensuais de superação dessa realidade. Os subsistemas operando, mas de forma disfuncional, acabam por maximizar a crise e, assim, levando ao fim um modelo de desenvolvimento, de Estado, de organização social e de nacionalidade.
As reestruturações do Estado produzidas depois do retorno à democracia e em suas várias formas são a expressão dessa crise e de como ela vem sendo deglutida pela sociedade, além, de uma demonstração dos caminhos formulados para a sua superação e para a elaboração de um novo consenso social, ou seja, a constituição das bases de definição de um novo interesse público que origine quiçá um novo projeto de desenvolvimento e de nacionalidade ao País como um todo (um novo projeto nacional).
A realidade da década de 80 com o protecionismo, as altas taxas de juros, o aumento da dívida externa e interna, da inflação e da recessão, entre tantos outros indicadores demonstram que existem contradições e inoperâncias no modelo de organização da sociedade como um todo e não apenas sintomas de uma crise conjuntural da economia. A incapacidade dos governantes de perceberem estes fatos como oriundos de um mesmo problema que é a falência do modelo a que tudo isso estava atrelado (Camargo, 1990; Fiori, 1995a e b; Jaguaribe, 1990; Leite, 1990; Marcelino, 1987; O’Donnell, 1989; Rodrigues, 1987; Schmidt, 1989; Singer, 1986) pode explicar em termos a ineficácia do programa de desburocratização (Beltrão, 1981) do governo Figueiredo e as proposta de pacto social, de democratização e de estabilidade econômica da pactuada Nova República (Mantega, 1984), bem como certos resultados da assembléia constituinte e o próprio Governo Collor e de Cardoso.
A constatação da realidade dos fatos da década de 80 começa a se dar através da iniqüidade do combate seus efeitos econômicos. Segundo Jaguaribe (1989) o combate à inflação aparece como contraponto à definição da profunda crise pela qual passa o Brasil no período. Uma situação que afeta todos os setores e, de acordo com Bresser Pereira (1985), acaba levando o País da união nacional à incerteza[4] ou como define Velloso (1991) a um Brasil sem projeto e com grandes impasses na definição do espaço público, onde devem interagir, sob determinadas regras (consensuais), os interesses privados.
A crise de governabilidade (Martins, 1995 a e b) e/ou de governança (MARE/ENAP, 1995)[5] decorrente desse contexto de crise político-sistêmica institui uma fase destrutiva e negativa, no início da década de noventa, para o Estado, agravando as condições de sua estrutura e, assim, produzindo a falência de sua capacidade de avaliação e atuação que chega ao limite com a estagnação econômica e os casos de corrupção no Governo Collor[6] (Coimbra, 1994; Krieger, Novaes e Faria, 1992 e Rua, 1994). A concepção negativa do Estado criou uma realidade que minimizou o uso da capacidade técnica que havia sido conquistada dentro da estrutura do Estado, chegando a ponto de destrui-la. Fato advindo da disfuncionalidade do “sistema desenvolvimentista” em manter os interesses unidos sob o comando da burocracia e da então conseqüente situação conflitiva entre os diversos interesses particulares, sejam eles privados ou da esfera estatal, dessa forma, colocando em competição acirrada os antigos aliados dos anéis burocráticos e não apenas constituídos por uma crise econômica ou falta de patriotismo e de interesse dos agentes sociais.
Desta nova conjuntura, emana do debate político uma variada gama de documentos e ações para a reconstrução do Estado com contornos mais definidos (Albuquerque, 1991; Bresser Pereira, 1996; Fiori, 1991, 1993, 1995 a, 1995 b, 1995 c; IPEA 1994 ; MARE/ENAP, 1995; Rossetto e Maldonado, 1995; Tavares, 1993; Velloso, 1991, 1992 e 1995 a), mas não totalmente convergentes nos seus fundamentos institucionais, capacidade de ação e gerenciamento diante das outras esferas da sociedade e, assim, aparentemente sem potencialidade de elaborar um consenso social que possibilite lastrear um novo modelo organizacional para a sociedade.
As formas assumidas pelas privatizações (Amaral Filho, 1996), as reformas do Estado (Abranches, 1991; Holanda, 1992) todas consideradas indispensáveis (Tito, 1995) constituem em linhas gerais o pensamento que tem tomado mais fôlego e consistência depois da “operação desmonte” do governo Collor e dos acontecimentos internacionais como o fim da guerra fria. Mas a princípio essas ações nos parecem apenas como se cada qual quisesse defender interesses particulares e não a construção de um projeto definitivo que suplante o desenvolvimentismo (se isso ainda for possível) com uma definição dos fundamentos do interesse público, da forma e do espaço de interação entre todos eles (projeto nacional).
Aparentemente constitui-se a partir dos meados da década de 90 (pós-Collor) uma perspectiva de reestruturação do Estado e da máquina pública sob uma agenda positiva, mas, ao que podemos perceber ainda não se constituiu num modelo de desenvolvimento ou muito menos num projeto nacional. A sociedade ainda convive com conflitos que demonstram a falta de conexão entre os diferentes níveis da estrutura e também entre seus agentes e interesses. Pois a nova forma de configuração do Estado parece que só pode ser definido através da constituição de um novo modelo de desenvolvimento de consenso nacional, que estabeleça um pacto entre as várias forças atuantes e, assim, conquiste a hegemonia social através da definição dos interesses públicos e lance as bases de um novo projeto nacional de desenvolvimento para o Brasil adequado as novas realidades internas e externas (conjunturais e estruturais). Forma que se faz necessária por, aparentemente, não mais poder – e/ou não mais querer – contar com a supremacia do Estado e sua ação interventora perante a sociedade.
Dessa forma, podemos definir que as vicissitudes da falência do “sistema desenvolvimentista”, que produz crises em todas as esferas sociais, implicam em entraves não suplantados desde as últimas décadas do século XX.
Para além do desenvolvimentismo
Ao fundamentarmos a análise no caráter endógeno da crise do “sistema desenvolvimentista”, expusemos as dificuldades que a sociedade civil constituída a partir dos princípios do desenvolvimentismo, no agir predominantemente corporativo, encontra para se superar e, assim, produzir um consenso mínimo capaz de permitir a constituição de uma realidade para além da paralisia do presente e do ofuscamento e do futuro.
A reelaboração da sociedade em sua forma de organização, expressão de interesses e de produção torna-se indispensável para a construção de novos fundamentos associativos e em institucionais que possibilitem o redesenho seu estrutural e do Estado. Uma realidade que crie condições favoráveis à ação governamental. Só através da reelaboração e explicitação de um novo consenso e remodelação institucional é que a ação governamental pode ser eficiente e liberta do presente imediato. Assim, a constituição de condições para a elaboração de perspectivas norteadoras para o futuro é umas das as maiores dificuldades encontradas dentro da realidade brasileira.
Uma situação que vem agregando dificuldades advindas da complexificação social nas últimas décadas oriundo da diversificação e aumento dos agentes e de seus interesses sejam eles nacionais, sejam eles externos, incorporados e/ou com o representados internamente. Tudo isso agregada a uma realidade democrática que, sem definição de finalidade, serve de caixa de ressonância da polifonia criada pela heterogeneidade de interesses, amplificando os discursos com pouca energia gravadora e ainda menor capacidade de formulação de perspectivas.
A aposta da sociedade civil enquanto agente da mudança em um ambiente democrático (Bresser, 2001) nos parece carecer de algo fundamental, ou seja: uma teoria social da transformação, ou seja, um discurso agregador e razoavelmente amplo em suas premissas e perspectivas a fim de permitir a formulação de elementos consensuais e norteadores de um futuro.
O choque de realidade (Sola, 1998) ao que exposto com os fundamentos de uma visão mais liberalizante e minimizadora da política (mercado como elemento regulador da sociedade) nos mostra os limites, o autoritarismo, dessas concepções unidiscursivas. Bem como, a inviabilidade de sua aplicação e uma configuração social como a brasileira.
Ao invés da minimização nossa realidade exige a ampliação do espaço político, uma configuração de fóruns e arenas para a elaboração de diretrizes e possíveis consensos que permitam avançar para uma a reformulação organizacional e institucional da sociedade.
I
Um componente essencial de qualquer proposta de modificação da sociedade e em seus caminhos deve objetivar uma reorganização do Estado seja na sua configuração estrutural seja na sua forma de atuação diante da sociedade.
A reforma do Estado tão almejada, discutida e “promovida” nestas últimas décadas torna-se o elemento tanto de síntese desse período como para a explicitação de um novo consenso e de um novo modelo de desenvolvimento.
Em uma perspectiva para além do presente podemos considerar o quão imprescindível se faz, na reforma do Estado, a revitalização do espaço do planejamento na elaboração de políticas públicas agregadoras, redistributivas e saneadoras dos limites e entraves da ação do mercado.
A complexidade moderna combina-se com pobreza e exclusão, que se alastram rapidamente e se tornam muito ostensivas. Vincula-se com o enfraquecimento do Estado e da política, com uma espécie de aposta desenfreada nas possibilidades de uma regulação puramente espontânea, feita através do mercado e da livre afirmação dos agentes econômicos e dos indivíduos singularmente considerados. Exige desesperadamente e dificulta dramaticamente o planejamento: ao mesmo tempo em que complica as condições para a planificação democrática, impõe um esforço de planejamento de ampla envergadura, embebido de visão estratégica e ágil e flexível o suficiente para dar conta de um sem-número de situações-problema e de crises que se sucedem e se combinam ‘em tempo real’. (Nogueira, 1998, p. 16)
Um novo paradigma de reestruturação e funcionalidade para Estado precisa ser elaborado, seria prematuro afirmar que o gerencialismo constituem o novo “tipo ideal“ de administração (Abrucio, 1997), mas a sua perspectiva de menores entraves na operacionalização das políticas públicas parece necessário para se dar mais agilidade na instituição Estado. É imprescindível um Estado mais forte e atuante no qual se fundamentem estruturas dinâmicas e estratégicas de acomodação, consolidação e implementação de interesses e consensos de futuro.
O Estado mais republicano no qual a participação societária se faça mais presentes em de arenas propícias para a explicitação dos diversos entraves reconfiguração do consenso parece ser adequado a conformidade da situação.
Para além de uma democracia formal – de executivo imperial – surge a necessidade de uma ampliação dos espaços democráticos (legislativos), a fim de criar uma democracia direta. Arena setorizadas e, também, espaços mais amplos e pluri-setorizados nos parecem adequados à conformidade de acordos e de consensos. E, ao mesmo tempo, mais formatados à realidade histórica da sociedade brasileira.
Os acordos setoriais expostos e confrontados a realidades macro–estruturais poderiam em arenas adequadas emergir elementos de consensos e perspectivas de ação. Dessa forma, se estruturaria um Estado agregante, enquanto espaço de formulação de consensos, e não apenas regulador como se fosse possível a essa instituição posicionar-se fora da política e dos interesses que a constituem. Dessa forma, criam-se condições e condicionantes para que os interesses particulares se modulem e se aliem compatívelmente aos reelaborados interesses públicos (Prezrworki, 1996).
Evitar a captura do poder público por interesses particulares ou – o que nada mais é senão a outra face da questão – o uso abusivo das prerrogativas do cargo por parte da burocracia é uma tarefa complexa. Requer que se produza um meio institucional e associativo favorável ao desempenho governamental eficiente. (Diniz, 1996, p. 14).
Como nos parece claro que a base da reforma do Estado está para além de sua estrutura burocrática e administrativa, mas contida nos espaços políticos que o constitui, a formulação de consenso não está em uma reforma do Estado, mas a reforma do Estado esta no consenso socialmente produzido. Sendo assim, a priorização desse consenso e não sua imposição seria uma das principais tarefas do Estado de então.
Uma forma de acabar com adormecimento das reservas técnicas e políticas, e ampliar a sua capacidade de ação e planejamento, conseqüentemente, de orientação consciente sobre caminhos e objetivos socialmente definidos a serem atingidos.
Conclusão
O “sistema desenvolvimentista” – modelo de desenvolvimento econômico, social e político fundamentado -, nos anos 30, na substituição das importações e na priorização do mercado interno e operante até as últimas décadas do século XX no Brasil – influenciou todas as esferas da sociedade, o comportamento das classes e dos mais diversos agentes sociais a ponto de constituir um padrão de organicidade para a sociedade. Padrão este fundamentado em uma hegemonia ideológica pequeno-burguesa (de classe média, urbana e industrializante) e através da exacerbação da burocracia estatal e do corporativismo societal. Organicidade sistêmica operacionalizada via a constituição e exacerbação de um Estado interventor e promotor do desenvolvimento e através da industrialização. Dessa maneira, a sua falência produziu acontecimentos e efeitos para além da esfera propriamente econômica atingindo as inter-relações sociais e a inteligibilidade dos agentes sobre tais acontecimentos e possíveis formas de superação. Circunstâncias que, principalmente nos anos 80 e 90, podem ter trazido inúmeras conseqüências à sociedade e muitas dificuldades para a resolução das crises econômicas.
Este Trabalho fundamentou-se na reconstrução analítica do “sistema desenvolvimentista” através dos seus principais processos a fim de dar inteligibilidade a esse modelo de desenvolvimento e organização social e sua operacionalização através da reorganização do Estado e da Sociedade, assim, tal análise pode ser confrontada com as reformas institucionais, ocorridas nos anos 80 e 90, que pretenderam alterar a estrutura do Estado e o seu relacionamento com a sociedade além das várias tentativas de combater as crises econômicas orquestradas pelos diferentes governos do período. Reformas que foram organizada dentro de três tópicos: o primeiro como os processos de democratização do Estado que engloba o plano de desburocratização e de descentralização implementados ainda meados dos anos 80, o segundo, analisando nos anos 90 as privatizações e as proposituras fiscalistas de recuperação do Estado e mais recentemente os processos de imposição de uma reforma administrativa gerencial como marco de um novo patamar de inter-relacionamento entre Estado e Sociedade.
Procedimentos que demonstram como o fim da funcionalidade econômica do desenvolvimentismo não significou a sua rápida superação nos níveis político, institucional e social. Tal metodologia assentada na propositura da análise sistêmica busca a definição de processos que se constituem em um modelo analítico – definido como sistema observante – que permite, neste caso, uma visão de conjunto sobre os anos 80 e, assim, uma análise das dificuldades econômicas concomitantemente com a forma organizacional da sociedade ainda atrelada ao modelo de desenvolvimento cada vez mais inoperante e disfuncional.
Dessa forma pode-se observar que a falência do “sistema desenvolvimentista” acarretou alterações na sociedade, mas sem uma sincronia entre as suas diferentes esferas, sem um modelo a ser seguido, o que potencializou os conflitos e aumentou as dificuldades de resolução das crises que se sucederam no período. Fatos e acontecimentos que inviabilizaram a constituição do que se pode definir como um novo modelo de desenvolvimento ou algum tipo de teleologia para além crise nessa década.
Os anos 80 e 90 são importantes na demonstração de que, lastreadas na realidade construída sob o auspício do desenvolvimentismo e por sua falência, todas alterações na forma e no regime de governo, tanto como na economia – executadas de maneira desconectadas – não produziram os efeitos desejados. Sendo assim, fica claro a necessidade de uma repactuação social e de que ao se produzir as ações, deve-se contemplar conjuntamente as diferentes partes que constituem a sociedade, bem como, levar em consideração a forma organizacional da sociedade – o seu passado – e as então possibilidades de futuro, a fim de estabelecer um novo projeto nacional de desenvolvimento.
Doutor e Mestre em Sociologia, com especialização em Ciências Sociais Aplicadas na área da Administração Pública, com experiência em construção de banco de dados (pesquisa em andamento financiada pelo Cnpq) aperfeiçoamento em Procedimentos Didático-Pedagógicos e aperfeiçoamento em Ensino a Distância. Graduado, Bacharel e Licenciado, em Ciências Sociais. Atua como docente no Centro Universitário de Araraquara – UNIARA no Curso de Direito. Além de ter experiência docente no ensino fundamental, médio, superior e em pós-graduação. É coordenador e pesquisador do Núcleo de Pesquisa em Direito da UNIARA, atuando em grupos de pesquisa no CNPq e em orientações de iniciação científica. Atua na área social voltada as crianças e adolescentes através de uma pesquisa financiada parcialmente pelo Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico – CNPq e com apoio dos Juizes de Direito das Varas da Infância e da Juventude de Araraquara e de São Carlos. Essa pesquisa pretende criar através de critérios científicos um banco de dados sobre os atos infracionais cometidos por crianças e adolescentes na cidade de Araraquara com o objetivo de aprimorar a atuação tanto pública como privada na defesa dos direitos das crianças e dos adolescentes, bem como, na prevenção das infrações penais. Busca desenvolver metodologia de pesquisa, em conjunto com o CEDECA – Centro de Defesa da Criança e do Adolescente de Araraquara, com o objetivo de avaliar a questão da prostituição infantil na cidade. Participou de Congressos e Fórum Nacionais e Internacionais. Tem diversas publicações em revistas científicas e livros, bem como, já organizou várias publicações.
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